MARIA EMILIA ACCIOLI NOBRE BRETAN VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES MEDIADA PELA TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO: ELEMENTOS PARA A PREVENÇÃO VITIMAL Tese apresentada à Banca Examinadora da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutorado em Direito, sob a orientação do Professor Associado Alvino Augusto de Sá. Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo São Paulo - 2012 1 VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES MEDIADA PELA TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO: ELEMENTOS PARA A PREVENÇÃO VITIMAL MARIA EMILIA ACCIOLI NOBRE BRETAN DATA ____/____/2012 BANCA EXAMINADORA 1º Examinador(a) _________________________________________________ Orientador Professor Associado Alvino Augusto de Sá 2º Examinador(a) _________________________________________________ 3º Examinador(a) _________________________________________________ 4º Examinador(a) _________________________________________________ 5º Examinador(a) _________________________________________________ 2 El viento Cuatro años cumplía Diego López y aquella mañana le brincaba en el pecho la alegría, la alegría era una pulga saltando sobre una rana saltando sobre un canguro saltan- do sobre un resorte, mientras las calles volaban al viento y el viento batía las ventanas. Y Diego abrazó a su abuela Glo- ria y en secreto, al oído, le ordenó: -Vamos a entrar en el viento. Y la arrancó de la casa. (Eduardo Galeano. Bocas del Tiempo, 2004.) 3 Às crianças e aos adolescentes. (Que tenhamos a coragem de segurar em suas mãos; e que, compartilhando de sua alegria, possamos, juntos, entrar no vento!) 4 AGRADECIMENTOS Uma tese não se faz sozinha. Uma tese não se faz sozinho. Quero agradecer às inúmeras pessoas que fazem parte de tantas partes da minha vida, e sem as quais este trabalho jamais seria possível. Aproveito para falar um pouquinho delas, e delas comigo, aqui: Aos meus pais, Isaura e Onivaldo: só o que posso esperar é ser digna de todo o amor e de tudo de melhor que me dedicaram, ensinaram, demonstraram, fizeram. Obrigada, por tudo, sempre. Ao meu irmão, Pedro(linus), obrigada pelo apoio, por sua amizade e pelo exemplo de perseverança que você é, para mim. Vanessa Agapejev, Mario Rui, Fabiana Coimbra (Bibs), Silvia Losacco, Anita Gabriela, Bruno Shimizu, Mari Chammas, Dani Costa, Fernanda (Cranci), Paulo Ferraz, Natália Fujita, Dimitri Brandi: é um privilégio enorme ter vocês na minha vida. Não tenho palavras para agradecer a amizade e o apoio de vocês. Aos amigos e amigas com quem compartilho ambientes e interesses diversos, meu agradecimento pelas horas sempre deliciosas de conversas e aprendizados, e por todas as broncas que me deram pela minha ausência. Com isso, me fazem perceber o quanto eu sou querida. Aos colegas da pós-graduação, co-orientandos, e coordenadores do GDUCC/GETCrim, o meu agradecimento por manterem viva a prática interventiva no cárcere e por compartilharem, comigo, as angústias e delícias da vida acadêmica. Aos docentes e estudantes da FACAMP, agradeço o constante exercício prático da dialética, e a energia compartilhada ao longo desses 4 anos. Suzanne, Chris, Michéal, Taryn, Rebeccah, Vanessa, Renee e Nancy, do IICRD: obrigada por confiarem em mim! Compartilhar sonhos e ideais com vocês é um privilégio pelo qual sou grata a cada dia! 5 (Suzanne, Chris, Michéal, Taryn, Rebeccah, Vanessa, Renee and Nancy, from IICRD: thank you for trusting in me! I’m privileged to share dreams and ideals with you, and for that I’m grateful each and every day!) Ao Benedito dos Santos, minha profunda admiração e agradecimento pela oportunidade de trabalho conjunto e aprendizado na CPP; à Patrícia Guisordi, sou grata pela energia contagiante e pelo apoio imprescindível na coordenação. A todos os parceiros e parceiras da CPP com quem tive a oportunidade de conviver, em especial às crianças e adolescentes envolvidos no projeto, obrigada por me ensinarem, sempre, e por compartilharem comigo o sonho de um mundo mais justo. Pelo balanço de corpo e de alma, e pela sensibilidade, força, leveza e beleza que espalham pelo mundo, sou profundamente grata ao Pedro Prado e à Andrea Prior. Às amigas e amigos do Espaço Rasa: compartilhar a energia do Odissi com vocês é muito especial! Aos amigos e amigas que compartilham comigo redes sociais e fóruns on-line, agradeço as palavras de incentivo nos momentos difíceis e a companhia durante dias e noites na frente da telinha. A rede pode ser virtual, mas o apoio que me deram foi muito real. À Fabiana Coimbra, à Alessandra Coelho, ao Ivan Carotti e ao Roberto Júnior deixo um agradecimento especial pela ajuda em diversos momentos desta jornada. Eu não teria conseguido sem o apoio e a amizade de vocês. Obrigada! À Dinah Borges e à Silvia Losacco agradeço a leitura atenta do trabalho, e as importantes considerações e alertas que me fizeram. Ao Daniel Aurélio sou profundamente grata pelo apoio fundamental durante todo o processo, pela leitura crítica da pesquisa e pelas inúmeras e estimulantes trocas de ideias, que começaram mesmo antes do início da redação, e que me obrigaram, constantemente, a refletir sobre o caminho percorrido. À Viviane Fontoura e ao sonhalista Paulo Lima, minha gratidão pela revisão das traduções do resumo! 6 Aos Professores Martha de Toledo Machado e Sérgio Salomão Shecaira: agradeço o necessário e preciso olhar crítico durante a qualificação e as preciosas sugestões para a elaboração desta pesquisa. Deixo para o final, não por ser menos importante, mas exatamente pelo contrário, o agradecimento ao meu orientador, Professor Alvino Augusto de Sá. Antes de tudo, sou-lhe grata por ter-me recebido com generosidade no programa de pós-graduação (e lá se vão 7 anos!), talvez sem ter a dimensão da importância que tal gesto teve na minha vida, naquele momento e dali por diante. Também agradeço a paciência e os puxões de orelha durante a cuidadosa orientação! Obrigada, Professor, pelo privilégio de desfrutar de sua convivência e de absorver um pouco de sua sabedoria, acumulada em uma instigante e inspiradora vivência da teoria e da prática. Obrigada por se permitir (e, com isso, nos permitir) a reinvenção, com a humildade de quem tem curiosidade científica e profundas convicções mas, ao mesmo tempo, sabe que é possível e necessário mudar. 7 LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ABMP - Associação Brasileira de Magistrados, Promotores de Justiça e Defensores Públicos da Infância e Juventude AIC – Instituto Australiano de Criminologia (Australian Institute of Criminology) ANCED - Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente CEDECA - Centro de Defesa de Direitos da Criança e do Adolescente CF 88 - Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CGI – Comitê Gestor da Internet no Brasil CIDC - Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança CONANDA - Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente CPP – Parceria para a Proteção da Criança e do Adolescente (Child Protection Partnership) ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069, de 13 de Julho de 1990) GDUCC – Grupo de Diálogo Universidade, Cárcere e Comunidade GETCrim – Grupo de Estudos sobre Temas de Criminologia IBCCrim – Instituto Brasileiro de Ciências Criminais IICRD - Instituto Internacional para os Direitos e Desenvolvimento da Criança e do Adolescente (International Institute for Child Rights and Development) NCA - Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Criança e o Adolescente do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da PUC/SP ONG – Organização Não Governamental ONU – Organização das Nações Unidas PUC/SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento SGD - Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente SINASE - Sistema Nacional Sócio Educativo TIC – Tecnologia da Informação e Comunicação UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância USP – Universidade de São Paulo 8 RESUMO A Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) é parte elementar da revolução tecnológica sem precedentes que caracteriza a “sociedade em rede” (Castells) e que vem acompanhada de transformações sociais, culturais e econômicas em diversos níveis. Ao mesmo tempo em que apresenta inegáveis benefícios, como a comunicação sem fronteiras, a revolução tecnológica nos coloca desafios também globais. Dentre esses, se encontra a violência sexual contra crianças e adolescentes, multifacetada, global e interconectada. Com o uso da TIC cada vez mais disseminado dentre as crianças e adolescentes brasileiras, os riscos de aliciamento e abuso sexual on-line, agrupados na pesquisa na categoria de violência sexual mediada pela TIC, atingem a todas; porém, crianças e adolescentes pertencentes às classes sociais mais baixas são as mais vulneráveis. Aos riscos reais somam-se a sensação de insegurança e o clamor por punição evocado por grande parte da sociedade e estimulado pela mídia. Sob a denominação de luta contra a “pedofilia na internet” prevalecem no Brasil, medidas de ordem punitiva, como criação de novos tipos penais e aumento de penas. A dinâmica da violência sexual mediada pela TIC, porém, indica o papel essencial que as vítimas desempenham para o sucesso do aliciamento ou do abuso on-line; no entanto, as políticas nacionais de inclusão digital não têm sido acompanhadas pelos necessários investimentos em estratégias de prevenção vitimal. A presente pesquisa, portanto, sistematiza, de forma interdisciplinar, elementos que possam subsidiar estratégias de prevenção vitimal de violência sexual contra crianças e adolescentes mediada pela TIC. Parte de uma perspectiva dos direitos humanos de crianças e adolescentes (com foco nos direitos à participação e ao desenvolvimento) conectada a uma vitimologia que, integrada à criminologia, política criminal e dogmática jurídico-penal (Baratta, Anyiar de Castro), situa-se no paradigma das inter(relações) sociais (Pires) e considera crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, mas também se preocupa com as percepções sociais a respeito do “crime” e do “criminoso”, razão pela qual é também realizado um estudo das modalidades de violência sexual e de sua atual conformação na lei penal brasileira, com foco na violência sexual mediada pela TIC. A proposta integradora dos elementos estudados parte de um modelo de prevenção multissetorial baseado na ecologia social, com foco no empoderamento de crianças e adolescentes para, em nível de prevenção primária, estimular a adoção de atitudes de prevenção e de auto-cuidado, e, em nível comunitário e social, informar estratégias de prevenção integradas e medidas de prevenção secundária e terciária. PALAVRAS-CHAVE Criança e adolescente; violência sexual; tecnologia da informação e comunicação; prevenção vitimal; vitimologia; direito da criança e do adolescente. 9 ABSTRACT The Information and Communication Technology (ICT) is an elementary part of the unprecedented technological revolution that characterizes the "network society" (Castells) and that is accompanied by social, cultural and economic changes at various levels. At the same time it has undeniable benefits, such as communication without borders, the technological revolution also poses global challenges. Among these lies the multifaceted, global and interconnected sexual violence against children and adolescents. With the increasingly widespread use of ICT among Brazilian children and adolescents, the risks of the sexual abuse and grooming online (grouped here within the category of sexual violence mediated by ICT), affect all, but children and adolescents belonging to lower social classes are the most vulnerable. The real risks are increased by feelings of insecurity and the urge for punishment evoked by much of society and encouraged by the media. In the name of fighting against "pedophilia on the Internet", punitive measures are prevalent in Brazil, such as the creation of new crimes and increase of criminal penalties. Whyle the dynamics of the sexual violence mediated by ICT points to the essential role that victims play in the success of deception or abuse online, national policies of digital inclusion have not been accompanied by adequate investments in strategies of victimal prevention. This research, therefore, systematizes interdisciplinary elements that may support strategies of victimal prevention of sexual violence against children and adolescents mediated by ICT. The perspective adopted is the one of children’s rights as human rights (focusing on the rights to participation and development) connected to a victimology (Baratta, Anyiar de Castro) that is integrated with criminology, criminal policy and criminal law, within the paradigm of social inter(relations) (Pires). The proposal, therefore, considers children and adolescents as subjects of rights, but also concerns the social perceptions about the "crime" and "criminal", reason why a study of the forms of sexual violence and its current conformation in the Brazilian criminal law is also carried out, focused in sexual violence mediated by ICT. A review of national and international victimological qualitative and quantitative surveys is included. These elements are integrated based on a multisectoral prevention model (social ecology), focusing on the empowerment of children and adolescents, at the level of primary prevention, to encourage the adoption of prevention attitudes and self-care, and, at community and social levels, to inform prevention strategies and integrated measures of secondary and tertiary prevention. KEY-WORDS: Children; sexual violence; Information and Communication Technology; victimal prevention; victimology; child’s rights. 10
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