UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE LETRAS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA A

116 Pages·2011·1.29 MB·Portuguese

UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

A Cerâmica Islâmica da Alcáçova de Santarém,
das unidades estratigráficas 17, 18, 27, 28, 30, 37, 39, 41, 193, 195, 196, 197 e 210

Volume 1

Marta Cristina de São Marcos Inácio da Silva

Mestrado em Arqueologia

Lisboa, Setembro 2011
UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

A Cerâmica Islâmica da Alcáçova de Santarém,
das unidades estratigráficas 17, 18, 27, 28, 30, 37, 39, 41, 193, 195, 196, 197 e 210

Volume 1

Marta Cristina de São Marcos Inácio da Silva

Dissertação de Mestrado em Arqueologia
apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa,
sob a orientação da Prof. Doutora Catarina Ferrer Dias Viegas Taveira

Mestrado em Arqueologia

Lisboa, Setembro 2011

2
À minha mãe
Pelo apoio incondicional

3
Resumo

Esta dissertação de Mestrado tem como base o estudo dos materiais do período
islâmico, recolhidos nos trabalhos de escavação realizados na Alcáçova de Santarém,
nos anos de 1999/2000.
Seleccionou-se um conjunto cerâmico, aqui apresentado, proveniente do interior
de treze fossas, pertencentes ao sector de escavação 1B. As peças teriam sido
depositadas nas referidas fossas em contexto de entulhamento, não correspondendo a
uma deposição primária.
A amostra seleccionada para este estudo caracteriza-se por ser maioritariamente
um conjunto de cerâmica comum, com formas cuja morfologia é bastante diversificada.
Este grupo de materiais enquadra-se quase na totalidade no período cronológico que
abrange os séculos XI e XII.
Este estudo pretende inserir as peças identificadas e, de forma mais geral
Santarém, no contexto das realidades islâmicas, principalmente através do
estabelecimento de paralelos no âmbito do território português.

Abstract

This dissertation is based upon the study of the Islamic period ceramics,
recovered in the excavation that took place on the Alcáçova de Santarém, between the
years of 1999 and 2000.
A pottery set was selected from the interior of thirteen pits, located in the
excavation sector 1B. This set had been deposited as a rubbish context, therefore, not
corresponding to a primary deposition.
The sample selected for this study was characterized as common pottery, with a
diversified morphology. These materials belong, almost totally, to the chronological
period between the XI and XII centuries.
This study aims to integrate the ceramics and, on a more general basis, the
territory of Santarém, by comparatively establishing common features with other similar
Islamic realities in the scope of the Portuguese territory.

Palavras chave: Alcáçova, Santarém, islâmico e cerâmica.
4
Agradecimentos

Gostaria de agradecer a todas as pessoas que contribuíram directa ou
indirectamente para a execução deste trabalho. Antes de mais um grande agradecimento
à orientadora desta Tese, Prof. Doutora Catarina Viegas bem como à Prof. Doutora Ana
Margarida Arruda, pela sugestão e disponibilização dos materiais cujo estudo produziu
esta dissertação. Ainda à Prof. Doutora Catarina Viegas, pela paciência, sugestões
variadas, atenção e disponibilidade demonstrada.
Quero igualmente agradecer a todos os Professores do Mestrado de Arqueologia,
bem como da Licenciatura, pela formação e pela vontade de questionar e saber que
despertaram em mim.
Ao Gabinete de Arqueologia de Santarém, à Dra. Carla Ferraz e ao Dr. António
Matias, que desde logo se disponibilizaram a ajudar, facilitando o acesso aos materiais e
criando condições para o estudo dos mesmos.
Ao Dr. Severino Rodrigues pelo interesse e vontade de me esclarecer e ajudar.
Às minhas amigas e colegas, Inês Varela Raimundo, pela companhia, troca de
ideias e incentivo, Ana Barradas Junceiro pela assertividade e disponibilidade que
demonstrou e Natacha Nogueira pela preocupação e companheirismo.
O maior agradecimento dedico à minha família, Isabel, Silvério, Inácia, José
Maria, Luísa e Nuno pela vossa contribuição para a minha formação, por me inspirarem
e acreditarem em mim.
Por último, mas não menos importante, agradeço ao David, pelos incentivos
constantes e ajuda sempre presente nos momentos de maior dificuldade.

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Índice

Volume 1

1. Introdução……………………………………………………………………….8

2. Enquadramento histórico e geográfico..……….……………………………..9

3. Síntese dos trabalhos arqueológicos realizados na
Alcáçova de Santarém……………………………………………………………....18

3.1. Trabalhos e estudos arqueológicos realizados…………………….18

3.2. Contexto de execução da intervenção de 1999/2000………………....22

3.2.1. Contextos estratigráficos……………………….………....22

4. A cerâmica islâmica da Alcáçova (conjunto estudado)......…………………….27

4.1. Metodologia…………………………………………………………….27

4.1.1. Composição da amostra…………………………………..27

4.1.2. Critérios de quantificação…………….…………………..28

4.1.3. Fabricos………………………………….……………………29

4.1.4. Formas e terminologia………………..…………………..29

4.2. Caracterização da amostra…………………………………………….31

4.2.1. Fabricos……………………………………………………31
6
4.2.2. Formas………………………………………………………...36

4.2.2.1. Grupo de armazenamento e transporte………..37

4.2.2.2. Grupo de serviço de mesa………………………45

4.2.2.3. Grupo de peças de cozinha……………………..63

4.2.2.4. Grupo de objectos de uso específico (lúdico,
doméstico, agrícola e para iluminação)………………....74

4.2.3. Decorações e técnicas de acabamento……………………81

5. Análise global do conjunto…………………………………………………...85

5.1. Cronologia………………………………………………………...100

5.2. Carácter regional e local: Integração do conjunto estudado no Sul
peninsular ……………………………………………………………..102

6. Bibliografia…………………………………………………………………104

Volume 2

ANEXOS:

1: Enquadramento
2: Estampas
3: Tabela de decorações
4: Fotografias
5: Base de dados: Inventário do conjunto estudado

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1. Introdução

“Uma das vertentes da Arqueologia é o estudo do quotidiano, para o que é
indispensável o conhecimento da chamada cultura material. É graças à análise dos
materiais arqueológicos, sobretudo das cerâmicas, que os arqueólogos, neste caso
particular os que estudam a época islâmica, conseguem aferir períodos cronológicos e
filiações culturais [...]” (CATARINO, 2005, p. 363).

Esta dissertação de Mestrado surgiu da vontade de contribuir de alguma forma
para melhorar o conhecimento do período islâmico no Centro e Sul de Portugal, com
foco em Santarém. No seguimento de um crescente interesse por este período, que
resultou em diversos trabalhos realizados sobre o tema durante o percurso de
Licenciatura e Mestrado, pareceu um caminho lógico terminar mais uma etapa
académica com um estudo sobre a temática para a qual tenho vindo a direccionar grande
parte da minha atenção.
O conjunto de materiais cerâmicos que é aqui apresentado, foi proposto pelas
Prof. Doutoras Ana Margarida Arruda e Catarina Viegas e disponibilizado pelo Gabinete
de Arqueologia da Câmara Municipal de Santarém. Os exemplares são provenientes de
trabalhos de intervenções arqueológicas, realizados em 1999/2000 na Alcáçova de
Santarém, tendo, as peças em questão, sido recolhidas no ano de 1999, na área do sector
de escavação 1B, das fossas/silos [761], [40], [46], [59], [60], [211] e [212].
Este estudo baseou-se na análise de 379 exemplares cerâmicos, seleccionados de
um total de 4375 fragmentos nunca antes estudados. Um dos objectivos principais
centrou-se na comparação das cerâmicas com exemplares análogos, de estudos
anteriores, que tivessem datação atribuída. Identificaram-se formas que se conseguiram
associar a materiais de outros locais, com datações compreendidas entre os séculos IX e
XIII.
O desenvolvimento deste trabalho foi impulsionado por questões chave,
mencionadas de seguida, que surgiram do estabelecimento do esquema de abordagem
ao conjunto e durante a análise mais aprofundada dos materiais. Tendo como ponto de
partida a observação das principais características das cerâmicas, forma, função, fabrico
e decoração, tornou-se possível a classificação das mesmas, a partir dos estudos
8
realizados no âmbito das cerâmicas de época islâmica.
No que diz respeito à forma/função das peças, estas foram avaliadas tendo como
base os principais estudos que abordam a classificação formal e terminológica das
cerâmicas islâmicas, nomeadamente os trabalhos considerados de maior importância
para o desenvolvimento da classificação. Entre outros, destacamos os estudos realizados
por Rosselló-Bordoy (1978; 1991), Juan Zozaya (1990), Helena Catarino (1997-98),
Rosa Varela Gomes (2002), Susana Gómez Martínez (2004) e o Projecto de
sistematização para a cerâmica islâmica do Gharb al- Ândalus (BUGALHÃO et al,
2010). A partir destes trabalhos, tornou-se possível identificar algumas das formas
observadas e inseri-las em grupos funcionais, factor que permitiu só por si uma melhor
compreensão do conjunto estudado, embora com algumas reservas, pela possível e
provável diversidade utilitária que as diferentes formas poderiam possuir.
Uma das principais questões colocadas centrou-se na problemática da
possibilidade de distinção de realidades de produção local ou regional, assim como nas
possíveis rotas comerciais e contactos existentes durante a época islâmica, tendo como
base a análise dos materiais e estabelecendo comparações com outros sítios estudados,
principalmente em território português.
Por outro lado, a partir desta observação de paralelos com outros sítios,
pretendeu-se aferir se existiria uma matriz formal/funcional para época islâmica, em que
as produções obedeceriam a um mesmo padrão enraizado na sociedade.
Não menos importantes foram as problemáticas de cronologia com que nos
deparámos, sendo o conjunto estudado proveniente de contextos sem outros dados
cronológicos para além das cerâmicas. Pretendeu-se por isso, nesta dissertação,
concretizar uma comparação com base nas formas e fabricos, com peças islâmicas
anteriormente estudadas, tentando uma interpretação que nos pudesse permitir balizar o
período cronológico a que o nosso conjunto poderia corresponder.

2. Enquadramento histórico e geográfico

A cidade de Santarém está localizada na margem direita do Rio Tejo, sendo que
a sua parte Medieval mais antiga, Ribeira, Alfange e Alcáçova, tem as coordenadas
longitude de 0º27 e 50” a oriente de Greenwich e latitude de 39º14‟ a norte do Equador
9
(BEIRANTE, 1980, p. 23). A Alcáçova encontra-se na actual Freguesia de Marvila, no
concelho e distrito de Santarém, num
planalto em que a altitude actual média é de
103,8 metros, sendo a sua cota máxima de
106 metros acima do nível médio do mar,
encontra-se actualmente a 80 km da foz do
rio Tejo (Figura 1).
Actualmente tem uma extensão de
4.5ha, mas provavelmente esta seria maior,
podendo chegar a 5ha. A diminuição da sua
área deve-se ao rápido processo de erosão
das vertentes do planalto (ARRUDA, 2000,
p. 6-69).
Figura 1 – Carta Militar 1/25000
As principais redes viárias que
da Alcáçova de Santarém
permitiam o “contacto não apenas com Lisboa mas com todo o Mediterrâneo e
Atlântico” (CUSTÓDIO, 2002, p. 19) eram as mesmas utilizadas no período romano e
que foram herdadas pelos islâmicos. Apesar destas vias pré-existentes a criação de
novos núcleos urbanos e o desenvolvimento rural gerou a necessidade de construção de
novas estradas e caminhos secundários (CATARINO, 1993, p. 78). Para uma
interpretação clara desta rede viária, primeiro que tudo, é necessário ter uma consciência
da enorme acessibilidade territorial que o sítio apresenta (Figura 2).
Estas estradas podem ser identificadas através dos seus vestígios, que no caso da
área de Santarém são relativamente reduzidos. Através de outros métodos de
investigação, baseados numa análise variada tendo em conta múltiplas fontes, seria
possível estabelecer a relação entre vestígios islâmicos e romanos com o auxílio da
fotografia aérea e da toponímia (MANTAS, 2002, p. 108).
Em época romana Santarém seria um centro viário de grande relevância, pois
controlava um dos mais importantes pontos de travessia do Tejo, conjugando as
facilidades de navegação com os caminhos terrestres, este local atingiu um estatuto de
supremacia e destaque, tanto a nível defensivo como comercial (MANTAS, 2002, p.
108).
Segundo Vasco Mantas existiam no período romano duas estradas principais que
atravessavam Santarém, o percurso destas estradas entre Lisboa e Santarém por Paredes
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