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Um tipo americano de tristeza. O próximo romance de David Foster Wallace e os próximos romances americanos PDF

14 Pages·2012·7.96 MB·Portuguese
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Urn tipo americana de tristeza: 0 proximo romance de David Foster Wallace e os proximos romances . amerlcanos Caetano Waldrigues Galindo Resumo Este textobuscaconsiderarcertacorrentedaliteraturaNorte-Ameri para canarecente, vernelaumarejei~ao do onipotenteprincipiodaironia, tao intimamente ligado ao pos-modernismo. Como exemplo desse movimento, 0 textoexaminamaisde perto aaprodu~aode DavidFosterWallace (1962-2008), tantocomoficcionistaquantocomoensalsta,queparecemanifestarmelhorque qualquerdessesparesessatendencia. Pavavras-chave:DavidFosterWallace- Pos-modernismo- Ironia Abstract Caetano Waldrigues GalindoThis essay tries to look into a certain current ofrecent North-American literature, to find in it arejection ofthe all important ironic rule, so closelyassociatedwith post-modernism. To exemplify thismovement, theessayconsidersmorecloselytheproductionofDavidFoster Wallace(1962-2008),bothasafictionistandasanessayist,whoseemstoembody thistrendbetterthananyofhispeers. Key-Words: DavidFosterWallace- Post-Modernism- Irony 125 ------------------ outraC[ravessia DavidFosterWallace,aomenosdesdeapublica~aodo imensoromanceInfi nitejest,em1996,vernsendosaudadocomoagrandenovavozdoromanceamericano porboapartedacnticaliteranadaquele paise, nao menosimportante, porurnelenco consideriveldeseuscolegas. Nestesmaisdedezanoselejalan~ou doislivrosdecontos(urndeles-Breves entrevistas com homenshediondos- traduzido no Brasil e jaem processo de adapta ~ao para0 cinema), dois livros de ensaios eurn pequeno tratado sobre 0 conceito de infinito paraumaseriedevulgariza~ao cientifica (elevernde umaforma~ao emlogica formalematematica).Aevidenteexpectativaemtornodeurnseuproximoromancetern a no entanto se revestido de cores algo diversas1 luz de umaserie de fatores que vern apontando umaominosamudan~a de rumo emsuacarreira, mudan~a que naverdade come~a precisamentecomaquelaInfinitejest. Precisamente naquele livro sobre 0 qual ele uma vez declarou: eu queria fazeralgumacoisa triste. Eu tinhafeUo umascoisasengrafadaseumascoisaspesa das, inteleetuais, maseununcatinhafeito umacoisatristlr. Escritores envelhecem, seus temas se modificam e seu vies de leitura do mundo, nos melhorescasos, porvezesserefazcompletamente. Sabemosnoentanto0 quanto pade serdificilparaurnescritordevidamente enfronhadono sistemaeditorial americano (oubrasileiro)efetivamentepromoverumamudan~a deatitudeseposturas. AscoisasdivertidaseintelectuaisaqueWallacesereferianaentrevistaacima, afinal,eramseuprimeirolivrodecontosGirlwithcurioushaireseuprimeiroromance The broom ofthe system, respansaveis, especialmente este, precisamente pela reper cussaoepelopoderdefogo queIheproporcionaramapossibilidadedesequerpensar emlevaraurneditorurnromancedemaisdemilpaginas. Naoseapagaassimumatra jetoria,parmaisqueincipiente(eletinha34anosdeidadequandolan~ou seusegundo romance). EInfinitejest, parmais que sejarealmente livro triste que seu autorpre 0 tendiaescrever,aindapadeserlidoemalgumamedidacomoumasatira,comournlivro a engra~ado, taoacostumadosqueestavamosleitores, eacritica, persona que haviam decididoreconheceremseuautor. (Reavalia~6es sao sempre complicadas. Eao mesmo tempo em que novas correntesetendenciascnticaspodemrapidamentereacomodarfigurasdocinoneante rioremnovasposi~6es comquesesintammaisconfortiveis[0quenosdiainfinidade de Shakespeares que 0 mundo jaconheceu], escritores previamente estabelecidos po demserrenitentementetreslidos mesmoemseus esfor~os maisdissonantes. 0 ultimo romance de Thomas Pynchon, de que ainda teremos de falar, pode muito bern ser 0 perfeitoexemplodessatendencia.) PrecisamentenomomenloemquerevisavaeslelextOparapublica~o recebianOliciadosuiddiodeDavidFOSler Wallace.Vilimadedepressiocronica(agorarevelada)0escrilordesisliudelentarsuportar0seutiposingulardeIris tezanodia12deselembrode2008.Selembramosque0ultimocontodeseuultimo(agoratrislementeemsenlido diferente)livrotratavado11desetembrode2001,lalvezniosejaexcessivoconsiderarqueeSlelipomuiloameri canodelristezatenhaajudadoafazertransbordar0copodeDFW.QueeSlejaempaz.Euficocommuitasaudade. DecidonoentanlonaoalterarsignilicalivamenteeSlelextoemvisladessefalo.QueaobradeWallacesesuslenlee seja!idaporsipropria. 2 EmentrevislaarevistavirtualSalon.Todasastradu~6essaominhas. 126 l{nadeSantaCatarina David Foster Wallace era, afinal, 0 enfant terrible da satira feroz. Eferoz menteironica. * Masemurnensaiooriginalmentepublicadoem 1993,queviriaaserreedita donolivroAsupposedlyfunthingI'llneverdoagain,de1997,equeportantopertence precisamenteaoperfododaelabora~ao deInfiniteJest, 0 escritorjacome~ava aapontar claramentenovosrumosenovasdUvidas. o ensaio se chamaEunibuspluram. Etratada televisao ede suapresen~a na cultura norte-americana. Na cultura p6s-modema. Na cultura p6s-modema norte americana. Evale bern apena, especialmenteporcontinuarinedito no Brasil, de uma leituraalgoperfunct6ria. ]adeinicioelesepreocupaemexplicar0 quepoderiahaverdeinteressante emurnestudosobreatelevisaodosEstadosUnidosparaumacompreensaomaisefetiva dafic~aodequalidadequeosautoresmaisnovosvinhamproduzindo. Vaidemorarurn pouco [0 ensaio, em suaforma publicadaem livro,ternmaisde60paginas],maseuvouprovarparavoceque opontodearticula~ao emque atelevisaoeafic~aoconversam e e e econvergem aironiaauto-consciente.Aironia, claro, urn campo em que os ficcionistas se exercitam aplicadamente hi muitotempo.(p.35) Essee0 primeiromomentadeumatrajet6riaque quasesepodechamarde umacruzadacontraaironia. Ou, maisespecificamente,contraasformas adotadaspelo discursoironicoprevalentenacultura(altaebaixa:eeparaissoqueserveacompara~ao daliteraturapasPynchoneGaddiscom atelevisao pasM*A*S*H) norte-americanado finaldoseculovinte.Essainquiri~ao provou,posteriormente,terconteudoefetivamente a programaticono queserefere produ~aodomesmoFoster\v.lllacee, comoparteque eradeumareavalia~ao crfticageralporquepassavaaquelacultura3,acabouporencon trar recep~6esinclusive entusiasticas, cUjo melhor exemplo (atingindo ate uma cecta posturabeligerante,condizentecomaqueveremosnofinaldoensaiodeWallace) seria certamente0prefacioqueDaveEggersapresentaaseuUmaobracomoventedeespan tosotalento,queprecisamenteportrafegardeformabastanteoriginalnafronteiraentre confissaoautobiografica, que e, eromance, que parece, fomece campoadequadopara discuss6esdessaespecie. DaveEggerstinha30anosem2000,quandopublicaseulivro.Eportantofaz partedamesmagera~ao (Wallaceeoitoanosmaisvelhoqueele)que,dopontodevista deWallace (assimcomodePynchon,porexemplo) poucolucrariaemtentardisfar~ar 0 fato detersidoprimordialmentemoldadaporhorasehorasde televisao. Umasitua~ao 3 NaopretendoproporqueWallacetenhasldo0fundadordessalinhadepensamento,quenaverdadeelemesmo e apontajaemoutrosensaistas.Sintomatico 0casonarradoporLindaHutcheon(quemefoiapontadopelaprofes soraSandraM.Stroparo)emseuIrony,Nostalgiaandthepostmodern,de1998,emquenarracomo,emurnpasseio quedavalogoaposentregaraseuseditoresurnliveosobre0limdaironia,encontraemumalivrariaumarevista inglesacomamanchete"0limdaironia?". Aestaaltura0mesmopassarocantavaemv:irioslugares. 127 outrarr'ravessia agudamentedescritaporurnoutrotrechodoensaiodeWallace. Euqueroteconvencerdequeaironia,0 silencioimperturbavel dojogadordepoquere0 medodoridiculosaotra~osdistintivos doselementosdaculturacontempocineados EVA(dosquaisa fic~aomaisrefinadafazparte) queternqualquerrela~ao signifi cativacomatelevisao, cujamaozinhalindaeestranhaseguraa minhagera~ao pelagarganta. (p.49) o que incomodaWallace, 0 que move toda sua diatribe contra este modo espedfico da ironia nao e, no entanto, suaexistencia, mas 0 fato de que ela, por sua mesma existencia, parece acarretar uma postura etica de uma determinada natureza. Naomaisinstrumento(lembre-seaquelaafirma\ao:aliteraturahaviamuitoseexercitava noscamposdaironia),elaagorasetransformaemumaimposi\aoe,dai,emumaferra mentaquenaoapenasdelimitaleiturasmas,diretamente,limitaleiturase, noextremo, impossibilitacontesta\oes. Aironianaculturadopas-guerracome~ou como come~a are beliao juvenil. Eraalgo dificiledoloroso, eprodutivo-urndi agnasticosombriodeumadoen~a negadapormuitotempo.As premissaspor tras da ironia do come~o do pas-modemismo, poroutrolado,eramaindafrancamente idealistas: presumia-se queaetiologiae0 diagnasticoapontavamparaumacura,quea revela~odoaprisionamentolevavaaliberdade. Mas enta~ agora n6svemosque aironia, airreverenciaeare beliao se revelaram nao liberadoras, mas fragilizadoras na cuI turasabreaqualavanguardadehojetentaescrever?(p. 67) Nas palavras de Lewis Hyde, citado no mesmo ensaio de Wallace, a ironia tende efetivamente ase transformar no canto do prisioneiro que passou agostar das grades da prisao. Eeessafalta de saida, esse irremediavel conformismo disfar\ado de ennui, essa aceita~ao passiva movida por urn desprezo sequer pela possibilidade do desejodamudan\a,possibilidadeimediatamentetintadearesdeingenuidadedatada,0 querealmentevaimover futuroprojetoficcionaldeWallace. 0 Porqueestediscursoprevalentetern, alemdetOOososefeitospositivos(por viapositiva, efetivamente provocados porele), umaserie de efeitos negativos (trata-se afinal de urn modo discursivo basicamente caracterizado pela nega~ao, inclusive pela nega~ao direta da materialidade de sua propriaenuncia~ao). Eesses efeitos, comovi mos,setransformamnaimpossibilita~ao deoutrosdiscursos,emumaespeciedeargu mentumadhominem que se dirige atodo urn universo discursivo acusando-o, sumo pecado,de ingenuidade. Enao se iluda: aironia nos tiraniza. 0 motivo de nossa ironia culturaltao difundidasersimultaneamente tao poderosaetao e e insatisfataria que urn ironista inimputtlvel. Toda a ironia norte·americanasebaseiaemurnimplicito"eunaoquerodizer e exatamente 0 que eudisse". Entao 0 que que aironiacomo e normaculturalefetivamentequerdizer?Que impossiveldizer efetivamente? Que talvez sejaruim ser impassivel, mas acorde e eseligue, est:!nahora?0 mais provavel, euacho, que airo niade hoje acabe dizendo: "ai, que coisa mais simpl6riavoce 128 l{liadeSanta Catarina querersaber0 queeurealmentequerfadizer."Qualquerpessoa dotadadavervehereticanecess:iriaparaperguntaraurnironista oqueeleefetivamentedefendeacabaparecendohistericaoupu ritana.Eaquiestaaopressividadedaironiainstitucionalizada,0 rebeldeexcessivamentebem-sucedido:aeapacidadedeproibira perguntasemdaraten~ao aseutemae,quandoexercitada,uma tirania. EanovaJunta, empregando amesma ferramenta que desmascarouseuinimigoparaseproteger. (pp.67-8) Eessa postura efetivamente limita as possibilidades da fic~ao. E, segundo Wallace,efetivamentelimita0 universodeefeitosdafic~ao. Emurnmundoemquequalquerensaistaqueseprezetratadeescreverentre aspas umapalavracomo "sinceridade", ou urn conteudo "emocional", dado 0 cinismo elegantemente dominante, nao eapenas urn investimento pessoal por parte do autor (outra no~ao "datada") que corre0 risco de irporaguaabaixo. Mas, acreditaele, tam bernboapartedaspossibilidadesdopactocelebradoentreautoreleitor. Boapartedos a possiveispropositosdalinguagemliteciria, curiosamenterelegada (essaparte) litera turadesegundaqualidade,especialmentealiteraturadesegundaqualidadequedomina osroteirosdecinemae, novamente, detelevisao. Ecomissoseabremaotalvezdealgoexcessivamenteimportante,pois o e fato que0re-empregodaposturapos-modemacoolpelatele visaoefetivamentesedesenvolveucomoumainspiradasolm;ao para manter-o-Joao-simuitaneamente-alienado-do-e-parte-do probiema-da-muitidao-de-um-milhao-de-olhos. Asolu~ao acar retou uma mudan~a gradual dahipersinceridade para urn tipo de irreverenciade meninomau no Grande Rosto queaTVnos exibe. Isso, porsuavez, refletiu uma mudan~a mais ampla na percep~6es dos EVAde como seesperaque aarteopere,uma transi~ao de umaposi~ao em que aarte erauma manifesta~ao criativa de valores efetivos para uma outra, em que ela euma rejei~ao criativade valoresfalsos. Eessa mudan~a mais ampIa, por sua vez, ecoou tanto 0 desenvolvimento da estetica pos modernaquantaeertas mudan~as seriaseprofundasemcomo os americanos escolhem coneebereonceitos como autoridade, sineeridadeepassionalidadecomreIa~ao anossadisposi~ao em sermossatisfeitos. Naoapenasasineeridadeeapassionalidade estao"forademoda",noqueserefereIiTV,masapropriaideia deprazerfoiminada. (p.59) E0 que David Foster Wallace parece ter vontade de "reabilitar" e precisa mente umaliteratura triste, emocional, sincera em sua rela~ao ficcional com 0 leitor. Evitando os cutucoesdo cotovelodo ironistaeas artimanhasdos narradores indignos de confian~a, especialmente dedicados atentar passar aperna nesse leitor. Urn leitor queterncomoprincipalfinalidadesejuntaraosorrisoacredoautorquedetudodescre equeapenasreafirmaessefato. Ounao. Ounemisso. Elenaodissenada. 129 outrartravessia * Emchaveteorica,asafirma~oes deWallacepodemparecerexageradas.Pode seficarcomaimpressao de queeleestejadando importanciademasiadaamoinhos de vento. Pois,afinal,acensuraativanuncafigurounomesmoidecirioironicocontra0 qual elese posiciona. Suapostura, pelocontrano, seriaapenasade dardeombros, sorrire dizerquesepodedizer0 quesequeira,com0 desdemqueelemesmotantoseesfor~a pordiagnosticar. o e problema que dentro dos meandrosdos sistemasde produ~o cultural as discussoes nao se dao necessariamente emtermos teoricos plenoselimpos.Abern daverdade,elasefetivamentenaosedao.Eapenas contrasteentrediscursosquepode 0 serlido,extra-muros,comotal. Escritores de fic~ao, quando escrevem fic~o, nao sao teoricos deferidendo urn projeto. Isso pode apenas se dar em outros ambientes. Em suaarte as discussoes e secio sempreveladas. E no ambiente do travado embate travado entre as manifesta ~oes dafi~ao contemporaneaquesedevecolocaraposturadeWallace. e E0 fato quesuaprodu~ao, desdeaquelefimdosanos90,parecerealmente virsetornando maisemaisestranha. Maisalheiaaqueleestablishmentde que ele, ao mesmotempo, setornape~acadavezmaisfundamental. Minal,comoelemesmoapontavaemmaisurntrechodomesmoensaio: Eplenamentepossivelquemeusplangentesresmungoscontraa impossibilidadedeserebelarcontraumaauraquepromoveevi ciatodaequalquerrebelliiodigamaissobremeupertencimento aessaaura,minhapr6priafaltadevisao,doquesobrequalquer possibilidadede exaustao dosrecursos dafic~ao americana. Os pr6ximos "rebeldes"verdadeiros deste pais podemmuito bem surgircomoumgrupoesquisitodeanti-rebeldes,voyeursnatos quedealgumamaneiraousamseafastardeumpontodeobser va~ao ironico,quetemaaudaciarealmenteinfantildeendossar emanifestarprindpiosdeums6sentido. Quetratamdevelhos esimplesproblemashumanoseemo~6esnadachiquesdavida dos EUAcom reverenciaeconvic~ao. Que se afastam da auto consciencia e do redio elegante. Esses anti-rebeldes estariam datados,eclaro,antesmesmodecome~arem. Mortosnopapel. Sincerosdemais. Claramentereprimidos. Retr6grados,ex6ticos, naif, anacronicos. Talvezsejaistoque elesqueiram. Talvezseja porissoqueelesvenhamaserospr6ximosrebeldesdeverdade. Rebeldes deverdade, ateondeeu possover, correm0 riscode niio contar com uma aprov~iio. Os antigos insurgentes p6s modernos corriam 0 risco do pasmo edo chio: choque, nojo, ultraje,censura,acusa~6es desocialismo,anarquismo, niilismo. Osriscos de hojesiiodiferentes. Os novos rebeldes podemser artistasdispostosacorrer0 riscodobocejo, dorolardosolhos, dosorrisocool,doscutuc6esnascostelas,dapar6diadosironis tas, do "ai, que simpI6rio". Correr0 risco de ser acusados de sentimentalidade, de melodrama. Deexcessivacredulidade. De cora~6es-de-manteiga. Deumadisposi~iio emseremenganados a porummundo de gente espreitaealertaqueteme 0 olhare oridiculo mais que uma prisiio sem lei. Gente que sabe. (pp. 81-2) 130 I{liadeSanta Catarina Com apublical.;ao deBrevesentrevistaseom homenshediondos, em 1999, essa nova postura demonstrava claramente ter se instalado, mas ainda convivia com experienciastipieamentepos-modemascomaformadanarrativaedanarratividade.~a verdade, ebornquese diga que mesmo nos momentos em que se pode detectaruma real.;aoaoestereotipopos-modernonaosepodedeixar,aomenosaindanao,deencon trar urn interesse pelaestruturanarrativa, pelaspossibilidadesda narratividade, que 0 mantern distantedaquelamesmaliteraturadesegundaqualidadequepareciaantesser otinieorepositoriodaspossibilidadesqueelepretendemanifestar. E,comoveremos, talvezestejanesteembateachavequeeleparecebuscar. o livroseabrecomurncontode apenasdoispacigrafos, quevaleapenade a sercitado, precisamenteporque, porsuabrevidadeepelanudezque imp6e situal.;ao que descreve, representamuitobernessemeiode caminhoentre0 pos-modemomais tipicoea"novadentil.;ao"dessepos-modemismonorte-amerieano4,meiocaminhoentre odiscursoironicoeasinceridadecomovida. Vmahistoriaradicalmentecondensadadavida pos.industrial Quandoelesforamapresentados, elefezurncomentanoespiri tuoso, na esperan~a de que elagostasse dele. Ela riu extrema mente alto, esperando que ele gostasse dela. Entao cada urn delesfoisozinhodecarroparacasa,olhandoretoparaafrente, comexatamenteamesmacontorsaoemseuscostos. osujeitoqueapresentouosdoisnaogostavamuitodenenhum deles, apesarde agircomo segostasse, ansioso que estavapor preservarboasrela~6es 0 tempotodo.Nuncasesabia,afinalde e e e contas,nao mesmonao mesmonao mesmo. Masaindaoscilaentreretratos mais condizentescom0 iddrio manifestado nostextosteorieoseoutrostextosaindamaispresos(conquantonuncacompletamente a presos) cartilhapos-modema.0 propriofatodesetratardeurnHvrodecontosrigida menteorganizadoedispostoemestritasimetria,todoelecosturadopelasbrevesentre vistasque0 titulomenciona,podeservistocomomanifestal.;aodessapreocupal.;aocom asuper/ieiedanarrativaquecaracterizaaprodul.;aomaistipicamenteposmodema(com propositadaomissaodohifen). Osleitoreseoscriticosnaopoderiamargumentaramesmacoisa,noentanto, diantedoproximolanl.;amentodeWallaceque,desdeseutitulo,pareceaindamaisdedi cadoanegaraespertezaeavervedaficl.;ao mais tipieadaaltaliteraturaamericana. Se Brevesentrevistasaindapodiarepresentar umatransil.;ao, seradificlldizer-se amesma coisadeOblivion (2004). Naverdade,0 primeirocontodestelivro,MisterSquishy,poderealmenteser tornadocomourntermometrodoprojetowallaceanoateaquelemomentoporsetratar deumaanatomiadeclaradaprecisamentedoquepossahaverdemaiscaraceristieamente cinieodentrodasociedadede consumo. Estamesmasociedadede consumo, represen- 4 Nafelizdefini~aodeJocaReinersTerronemseuposrncioaDedonegrocomunhadeDanielPellizzari. 131 _------_._------------- .... outrartravessia tada aqui pelo departamento de marketingde uma empresa que pretende lan~ar urn novo dace hipercal6rico, neste momento sujeito atestes com grupos controlados de pesquisa,enquanto0 moderadordeurndessesgrupossonheacordadosobreapossibil idadedeinjetarpequenasquantidadesdetoxinasletaisnasembalagensdosboloseurn misterioso homem mascarado sobe, apoiado emventosas, pelas paredes envidra~adas doedifkio,aparentementesepreparandoparaalgumaespeciedeatentado. E,comoWallacecontinuatendoemmentesuasdiretrizes,econtinuaatento asimetrias, 0 livro se fecha com outro longo conto (praticamente uma novela) sobre, entre outras coisas, urn homem que consegue defecaresculturas perfeitas (sed arte?) eurn6rgaode imprensadedicadoadivulgarcomexclusividadeessahist6ria, tudo isso as vesperasdo 11desetembro,queseabatedsobreosescrit6riosemquetrabalhamos jornalistas. o caos. Paramim,estesUltimosanosdaerap6s-modernaforamurnpou coparecidoscomasensal;ioquevocetemquandoestanocole· gialeosseuspaisvanviajar,evoced:iumafesta. Voceconvida todos osseusamigos ed:iessafesta louea, nojenta efabulosa. e Durante um certo tempo sensacional, livre eliberante, aau toridadepaternadistanteederrubada, urnfestimdionisiacodo tipoo-gato-saiu-vamos·brincar.Masenta~0tempopassaeafesta ficacadavezmaisbarulhentaeasdrogasacabam,eninguemtem mais dinheiro paracomprarmais drogas, ecoisas se quebram esaoderramadas, etem umaqueimadurade cigarronosofae vocee0 anfitriaoeeasuacasatambem,evoce poucoapouco eome91adesejarqueosseuspaisvoltassemerestaurassemurn poueo da merda da ordem na sua easa. Nao e uma analogia perfeita, mas aSenSal;aO que aminha gera~ao de escritores e e inteleetuaisousei13.0 quemecausa quesaotresdamanhae0 sofaescieheiodeburacosealguemvomitounosuportedeguar da-chuvasen6s estamosesperandoque 0 festim acabe. Aobra parricida dos fundadores do pos-modemismo foi genial, mas parricfdiogeraomos enao hafestim que compense 0 fato de queosescritoresdaminhaidadeforamorfaosliteciriosdurante seus anos de fonna~ao. Nos estamos meio que esperando que uns paisvoltassem. Eeclaroque nossentimosdesconfortaveis com0 fato de que desejamosque elesvoltem... ou seja, quale onossoproblema?Seraquenossomostotalmenteboiolas?Sera que existealgumacoisa na ideiade autoridadeede limitesde queagenterealmenteprecisa?E,asensa~aomaisdesconfortavel detodas, namedidaemquecome9lffiosgradualmenteaperce berquenaverdadeospaisnaovanvoltarmais...0quevaledizer que"nos"vamosterqueserospais5 • * 5 EmentrevistapublicadonositedaDa/keyArchivePress,depoisdeoriglnalmenteveiculadana"Reviewofcontem· poraryfiction"dovedode1993. 132 l[liadeSanta Catarina Janaquelemomento, asensa~aoparecia,paraele, serprecisamenteesta. Ha uma pilha de restos do grande festim inconseqiiente promovido pelos desdobramentos do pos-modernismo e ela tern de ser devidamente carregada e reci dada. Essa situa~ao que sevi: bastante bern sistematizadaem urn outro texto recente, de Charles Foran, no periodicoonline "TheWalrus". Urn textode que roubo inclusive otitulodesteensaio. E,emmaisumaclarademonstra~ao (comosenecessariaselasfossem)deque naofalamos aquide urnfen6meno-de-um-homem-s6, 0 textode Forantratade quatro escritores simultaneamente6 paradiscutir isso que ele percebe comouma novacor na literatura americana produzidaporescritores simultaneamente jovens 0 bastante para gerar0 novopararepresentaranovidadeeestabelecidos0 suficienteparafornecermais pesoaestasposturas. Atristeza americana poderia, claro esteja, estar articuladade inumeras ma a neiras asentimentos da derrocada iminente doImperium, culpado dominador, ao anti-americanismo cada vez mais instaurado mesmo em certas camadas da sociedade americana.Masaqui0 queprocuroeapenas,comomeparecetersido0 casoinclusive da propria teoriza~ao de wallace, localizarliterariamente esta rea~ao, esta tomada de posi~ao. Franzen, eseu grande sucesso The corrections, pode inclusive ilustrar me lhorqueWallaceadefinitivaatitudedecoreer0 riscodarejei~aodnica.Elesimabandona quasequeporcompletoacartilhadeespertezasdaquiloque0 criticoJamesWoodcon sagrou como 0 "realismohisterico" pos-pynchonian07 parase dedicar aumadescons tru~ao plena eunicamente baseada nos modelosdo mais classico realismo americano (aescoladeSaulBellow, porexemplo) dos modelosfamiliaresesociaisdaAmericade finsdos anosnoventa. Tornou-se mesmofamoso 0 desenrolardesse caso, quando aapresentadora Oprah Winfreydecidiu incluir0 livro de Franzen em suas recomenda~6es pessoais e, diantedainforma~io de queeleteriadeaceitarainclusiodeurnseloespecialnacapa dasfuturas edi~6es doromance, Franzendeclinoude tal "honra".Epoucasvezesficou tao clara atensio existente nessa gera~io que talvez nao pretenda renegar 0 publico atraves de modelos hermeticos e excludentes (apesar de 0 proprio Wallace ser tudo a menosurnescritoracessivel),masqueaindaniosesenteplenamente vontadediante domainstreamcultural. a Paradarprosseguimento metaforadeWallace, ecomoseFranzenestivesse indo muitobern em suatarefade ocupar0 lugardos pais, ate 0 momentaemque, do outro lado da cerquinha branca de madeira, 0 vizinho 0 cumprimenta por suas boas atitudes,eelesesenteinclinadoaestender0 dedomedio. Masissoehojeontem. 2006,porsuavez,viu0 lan~amento, maisqueaguardado,donovoromance do homem que, mais que qualquer outro, representaas possibilidades desse pos-mo- 6 AlemdeWallace,e1econsidera]onathanFranzen,amigopessoalecomoquecontraparteestilisticadeDFW,]onathan LethemeRickMoody. 7 VmacategoriaespecialmenteforjadaparatratardeWhiteteeth,dainglesaZadieSmith,masqueincluiuosprimeiros romancesdeWallace. 133 outra<{ravessia dernismo histerico. Depois de dez anos de silencio, Thomas Pynchon lan9l seu mais extensoromanceatehoje,0 belissimoAgainsttheday. BeHssimo, sim, e, por mais que certa critica tenha encontrado dificuldade emreconhecerestefato, tristissimo. Urnlivrotremendamentedoloroso.Aindamaishu mano que seu antecessor, 0 celebradoMason &Dixon, celebrado momento em que Pynchon pareceu ter come~ado aabrir mao de certoscacoetes emnome do desenvol vimento dos personagens. Em nome do que de certa forma pode servisto como urn resgateaomundodev, seuprimeiroromance. Se aqui amultiplica~o de personagens impede 0 aprofundamento que se podia encontrar no muito mais centrado romance anterior (especie de road-book do seculoXVIII,comotalestruturadoemtornodaduplacentraldepersonagensviajantes, oastronomoe0 topografoquetra~am afamosalinhaquehojelevaseusnomes),pouca coisafica nocaminhodaconstata~ao de que 0 ThomasPynchondequasesetentaanos de idadeemmuitodiferedoautordadecadade 70, edapercep~ao dequeemmaisde urnquesitoelesetornoumaiscinzentocomaidade. Mas se Franzen opta pela forma tradicional da narrativa realista americana ePynchonconsegue, neste livro mais do que emqualqueroutro (com talvezacuriosa exce~o deVineland, 0 romancemaisrenegadoporseusfas), umafusao desuacaotica desorganiza~ao comaquelemesmopathosidentificadoporForan,aindanoentantode terminadamuitomais(oudeformamuitomaisnitida) poraqueladoqueporeste,todo ocaminhoesbo~ado pelareflexaoensaisticaepelodesenvolvimentodesuaobraficcio naldesdeasegundametadedosanos90pareceapontarparaDavidFosterWallacecomo oprincipalresponsavelpelapossibilidadedefinalmentealiteraturaamericanalidarcom aressaca de marijuana e com sua propria autoconsciencia formada precisamente no ambientedacontracultura,quealevaaterdificuldadeemconciliarospapeis. Eem fevereiro de 2007 (pouco mais de dois meses depois do lan~amento da obra de Pynchon), Wallace publicou na prestigiada revista "The NewYorker" seu primeirocontodesde0 lan~amentodeOblivion. Oconto, Goodpeople, pode muito bern representar (conquanto tenhamos de reconhecer0 risco de sequerse ousar preyerdesenvolvimentosfuturos daobrade urnescritoraindataonovoejataodadoase"reformar"B) 0 pontoatuale0 pontomais altodaempresapos-pos-modernadeWallaceetalii.Desdeseutema(adescri~ao deurn longodialogo-monologo mudo entreurn casalde namorados, devotos religiosos, logo antesde elasedirigiraumacHnicade abortos) 0 contojaseafastadocaosjocosoem briagadodeinforma~ao que,noprimeiroThomasPynchon,conseguiaenformarmesmo aprodu~ao detextos menosextensos. Maisdoque isso, 0 tratamentodado apersona genseformanarrativaevitaconsideravelmenteasusuaismarcasdevirtuosismoeenge nhosidade, aquidevidamentereinstaladasemsuasposi~6es hierarquicaspre-joyceanas. Nisso, aberndaverdade, pode-se dizerque Goodpeople tern inclusive urn predecessornojaconsideraveldillonwallaceano.Brevesencarnafoesdecrianfasquei madas, 0 menorconto deOblivion davacontadessamesmaconfusasitua~ao que, do ponto devista daestrutura da narativa, parece corporificaredefiniressa manifesta~ao do tipo de tristeza americana aque Foran se definia: como tratar de temas essencial 8 Deixoassimessafrase,comodocumentodoqueseesperava,afinaL 134

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