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Tolstoi – Ana Karenina v1 e 2 PDF

801 Pages·2014·13.43 MB·Portuguese
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Preview Tolstoi – Ana Karenina v1 e 2

Liev Tolstói Ana Karênina Tradução de João Netto Formatação de LeYtor EUROPA-AMÉRICA Coleção Livros de bolso (Vol. I e II) Ana Karênina Liev Tolstói Publicações Europa-América Tradução: João Netto Capa: Estúdios P. E. A. Direitos reservados por Publicações Europa‑América, Lda. Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida ou transmitida na presente forma por qualquer processo, electrónico, mecânico ou fotográfico, incluindo fotocópia, xerocópia ou gravação, sem autorização prévia e escrita do editor. Exceptua‑se naturalmente a transcrição de pequenos textos ou passagens para apresentação ou crítica do livro. Esta excepção não deve de modo nenhum ser interpretada como sendo extensiva à transcrição de textos em recolhas ontológicas ou similares donde resulte prejuízo para o interesse pela obra. Os transgressores são passíveis de procedimento judicial. Editor: Francisco Lyon de Castro PUBLICAÇÕES EUROPA‑AMÉRICA, LDA. Apartado 8 2726 MEM MARTINS CODEX Edição n. 40 702/2561 Execução técnica: Gráfica Europa, Lda., Mira‑Sintra — Mem Martins NOTA BIOGRÁFICA O conde Nicolaevich Tolstoi nasceu em 1828, na propriedade de sua família, pertencente à aristocracia rural. Órfão muito cedo, foi educado por parentes e preceptores franceses. Em 1844 matricula-se na Universidade de Cazã, que era um centro social para os jovens aristocratas. Aí pouco se dedica ao estudo, passando o tempo em descuidada felicidade. Depois de alguns anos de dissipação e prazer, passados em Moscovo alista-se como oficial numa unidade de artilharia. Nela integrado, percorre o país. A sua primeira narrativa, intitulada Infância (1852), e publicada numa importante revista da época. Em 1857 demite-se do e xército e viaja pelo estrangeiro. Casa, em 1862, com Sofia Bers, uma jovem inteligente, filha dum médico de Moscovo que lhe clara treze filhos. Estabelecido na grande propriedade familiar, dedica se a gestão das suas propriedades, mas dilacera o a situação deplorável da classe camponesa e decide modificar a sua forma de viver, comendo e vestindo pobremente, enquanto distribui avultadas esmolas. Na seqüência desta crise interior abandona a família deixando uma carta onde se confessa incapaz de levar uma existência de grande senhor (da qual aliás já abandonara a pose). A viajem que empreendeu duraria apenas quatro dias, tendo como desfecho a morte do escritor no quarto do chefe da estação de Astapovo, onde foi acometido por congestão pulmonar. Era o dia 14/11/1910. O mundo foi abalado pela notícia da sua morte tendo se apercebido de imediato que perdera um dos grandes da inteligência. Das numerosas obras do autor sobressaem Guerra e Paz (1864/ 66), Memórias de Um Louco (1874) Ana Karenina (1875/77) Confissão (1882) Sonata a Kreutzer (1889). Ressaltam de todas as suas obras a análise psicológica, a densidade de sentimentos, a riqueza de caracteres, o inconfundível estilo, que o colocam entre os grandes da literatura universal. PRIMEIRA PARTE CAPÍTULO I Todas as famílias felizes se parecem, as infelizes não. Havia grande confusão em casa dos Oblonski. A esposa acabava de saber das relações do marido com a preceptora francesa, e comunicara-lhe que não podiam continuar a viver juntos. Durava já há três dias a situação, para tormento não só do casal mas também dos demais membros da família e da criadagem. Todos em casa se apercebiam de que já não havia razão alguma para manter aquele convívio, e que as pessoas que por acaso se encontrassem numa estalagem teriam talvez mais afinidades entre si. A esposa não saía dos seus aposentos, havia três dias que o marido não parava em casa; as crianças corriam de um lado para o outro, como que perdidas; a preceptora inglesa indispusera se com a governanta e escrevera a uma amiga pedindo que lhe arranjasse outra colocação; na véspera, o cozinheiro abandonara a casa à hora do jantar; o cocheiro e a copeira tinham pedido que lhes fizessem as contas. No terceiro dia após a altercação, o príncipe Stepane Arkadievitch Oblonski — Stiva, como lhe chamavam os íntimos — acordou à hora do costume, ou seja, às oito da manhã, não no quarto conjugal, mas no escritório, deitado no divã de couro. Revolveu o corpo, gordo e bem tratado, sobre as molas do divã, como se quisesse adormecer de novo, e abraçou se ao travesseiro, apertando o contra a face. De repente, porém, sentou se e abriu os olhos “Como? Como era?”, pensou, lembrando se do sonho que tivera “Como era aquilo? Ah, já sei! Alabine dava um jantar em Darmstadt, não, não era em Darmstadt; era na América. Sim, no sonho Darmstadt ficava na América. Alabine oferecia um jantar servido em mesas de cristal e as mesas cantavam Il Mio Tessoro! Talvez não fosse Il Mio Tesoro, mas qualquer coisa melhor, e havia umas garrafinhas, que afinal eram mulheres.” Os olhos de Stepane Arkadievitch brilharam alegremente, e, sorrindo, ficou se a cismar. “Sim, era muito bonito, estava muito bem. E havia muito mais coisas magníficas, mas não podia descrevê-las nem por palavras nem por pensamentos, nem mesmo desperto como estava.” Ao perceber um raio de luz que penetrava por um dos lados da cortina, retirou alegremente os pés do divã, procurando com eles, no chão, as chinelas de couro dourado que a mulher lhe oferecera no ano anterior (presente de aniversário) e, costume seu de há nove anos, sem se levantar estendeu o braço para o roupão, geralmente dependurado à cabeceira da cama. Então lembrou-se subitamente do motivo por que não dormira no quarto conjugal; o sorriso desapareceu-lhe do rosto, e franziu as sobrancelhas. — Ai, ai, ai! — queixou-se, ao lembrar-se do que sucedera. De novo se lhe representavam na memória todos os pormenores da altercação com a mulher, a posição insolúvel em que se encontrava e as culpas que tinha, e isto era o que mais o atormentava. “Não! Não me perdoará, não pode perdoar-me. E o pior é que sou o causador de tudo, embora não seja culpado. Essa a tragédia”, pensava. — Ai, ai, ai! —repetia, desesperado, ao recordar os momentos mais dolorosos da discussão. O momento mais desagradável fora aquele em que, ao regressar do teatro, alegre e satisfeito, com uma bonita pêra para a mulher, não a encontrou nem no salão nem no escritório, coisa que o surpreendeu, mas no quarto de dormir, na mão o maldito bilhete que tudo lhe revelara. Dolly, a mulher sempre diligente, cheia de preocupações e tão limitada, segundo pensava Oblonski, sentara-se com o bilhete na mão e olhava-o num misto de cólera, horror e desalento. — Que é isto? Que é isto? — perguntou-lhe, mostrando o bilhete. Ao lembrar o ocorrido, o que mais lhe doía, como sempre acontece, não era tanto pelo facto em si, mas o modo como respondera à mulher. Naquele momento sucedeu-lhe o que sucede a qualquer pessoa obrigada a confessar algo vergonhoso. Não soube encontrar expressão adequada à situação. Em vez de ofender-se, negar, justificar-se, pedir perdão ou mesmo mostrar indiferença — qualquer coisa teria sido melhor —, apareceu-lhe de súbito, na fisionomia, involuntariamente (“Reflexos cerebrais” pensou Stepane Arkadievitch, que era dado à fisiologia), o sorriso habitual, bondoso e estúpido. Não podia perdoar-se sorriso tão absurdo. Diante desse sorriso, Dolly estremeceu, como se sentisse uma dor física, e, com o seu arrebatamento peculiar, rompeu numa torrente de palavras duras, acabando por sair, correndo, do quarto em que estava. Desde então não mais quisera ver o marido. “Aquele estúpido sorriso é que teve a culpa de tudo. Mas que fazer? Que fazer?”, perguntava-se Stepane Arkadievitch, sem encontrar Resposta. CAPÍTULO II Oblonski era sincero consigo mesmo: não se sentia arrependido e não tinha remorso disso. Aquele homem bem parecido, de trinta e quatro anos, de temperamento amoroso, não podia, realmente, arrepender-se de não estar enamorado da mulher, um ano apenas mais nova do que ele, e mãe de sete filhos, dos quais cinco vivos e sãos. A única coisa que lamentava era não ter sabido esconder melhor os seus sentimentos. Mas compreendia a gravidade da situação e deplorava o que acontecera, tanto por Dolly e pelos filhos como por ele próprio. Talvez tivesse conseguido ocultar melhor as suas faltas, se pudesse adivinhar que causariam tamanho efeito sobre Dolly. Nunca pensara claramente no problema, embora imaginasse, um tanto vagamente, já há algum tempo, que a mulher desconfiava da sua infidelidade, sem no entanto atribuir grande importância ao facto. Era, inclusive, de opinião que a esposa, esgotada, envelhecida, sem beleza nem atributos, conquanto simples e boa mãe de família, devia ser condescendente por espírito de justiça. Ora, acontecera exactamente o contrário. “Oh, é terrível, terrível!”, exclamou Stepane Arkadievitch, sem descobrir uma solução para o caso. “E que bem vivíamos até aí! Dolly sentia-se feliz e contente com os filhos, eu não a incomodava em coisa alguma, deixava-a inteiramente à vontade com as crianças e a casa. Evidentemente, não estava certo que “ela” fosse a preceptora dos nossos filhos. Não estava certo! É grosseiro e vulgar fazer a corte à preceptora que nos educa os filhos. Mas, que mulher!” E recordou vivamente os astutos olhos pretos e o sorriso de Mademoiselle Roland. “Enquanto esteve em nossa casa, no entanto, não houve nada, nada. E o pior é que ela já... Parece que tudo aconteceu de propósito! Ai!” Resposta, só aquela, que a vida costuma dar a todas as questões complexas e insolúveis: viver o dia a dia, isto é, divertir-se. Já não podia fazê-lo através do sonho, pelo menos enquanto a noite não voltasse; já não podia tornar a ouvir a música que as mulheres garrafinhas cantavam. Só lhe restava distrair-se com o sonho da própria vida. “Veremos isso mais tarde”, disse consigo mesmo Stepane Arkadievitch; e, levantando-se, enfiou o roupão cinzento forrado de seda azul e deu um nó no cinto de bolas. Depois, respirando a plenos pulmões, encheu-os de ar, aproximando-se da janela com o habitual andar resoluto das suas pernas tortas, que com tanta ligeireza lhe transportavam a vigorosa figura, afastou a cortina e tocou a campainha. A chamada acudiu imediatamente o velho escudeiro Matvei, que lhe trazia a roupa, os sapatos e um telegrama. Atrás dele vinha o barbeiro com os respectivos apetrechos. — Trouxeram os processos do tribunal? — perguntou Stepane Arkadievitch, pegando no telegrama e sentando-se diante do espelho. — Estão em cima da mesa — respondeu Matvei, mirando o amo com uma expressão entre interrogativa e solícita, e daí a pouco acrescentou, com um sorriso malicioso: — Vieram umas pessoas da parte do cocheiro. Stepane Arkadievitch não respondeu, limitando-se a encarar Matvei através do espelho; pelo olhar que trocaram percebia-se que se entendiam. O olhar de Stepane Arkadievitch parecia perguntar: “Para que me falas nisso? Porventura não sabes?” Matvei enfiou as mãos nos bolsos da jaqueta e avançou um pé, fitando o amo em silêncio, com um imperceptível sorriso bondoso. — Disse-lhes que voltassem no domingo e até lá não incomodassem o senhor nem se preocupassem sem necessidade — articulou o criado, que, ao que parecia, preparara a frase. Stepane Arkadievitch percebeu que Matvei quisera brincar e também que lhe prestassem atenção. Rasgando o telegrama, leu-o, corrigindo com sagacidade os diversos erros de palavras, e o seu rosto iluminou-se. — Matvei, amanhã chega a minha irmã Ana Arkadievna — disse ele, detendo, por momentos, a gorda mão reluzente do barbeiro que lhe abria uma risca rosada nas longas suíças frisadas. — Graças a Deus — exclamou Matvei, dando a entender, com esta resposta, que compreendia tão bem como o patrão o significado daquela notícia, isto é, que Ana Arkadievna, a irmã querida de Stepane Arkadievitch, podia cooperar na reconciliação do casal. — Vem só ou com o marido? — perguntou. Stepane Arkadievitch, que não podia falar porque o barbeiro lhe escanhoava o lábio superior, ergueu um dedo. Matvei olhou para o espelho e moveu afirmativamente a cabeça. — Sozinha. Preparam-se-lhe os aposentos do andar de cima? — Comunica a Daria Alexandrovna e prepara os aposentos que ela mandar. — A Daria Alexandrovna? — repetiu Matvei, como que hesitante. — Sim. E pega no telegrama. Mostra-lho. “Quer experimentar!”, pensou Matvei, compreendendo. E limitou-se a dizer: — Muito bem. Stepane Arkadievitch, lavado e penteado, começou a vestir-se quando Matvei penetrou de novo no gabinete, em passo vagaroso, as botas rangendo um pouco, e o telegrama na mão. O barbeiro entretanto saíra. — Daria Alexandrovna manda-lhe dizer que se vai embora. Que o patrão faça o que quiser, isto é, o que quisermos — disse, rindo-se apenas com os olhos. E, enfiando as mãos nos bolsos, inclinou a cabeça para um lado, de olhos fitos no chão. Stepane Arkadievitch conservou-se calado durante um momento. Depois aflorou-lhe ao belo rosto um sorriso bondoso e um tanto compassivo. — Então, Matvei? — disse, movendo a cabeça. — Não se preocupe, meu senhor; tudo se “arrumará” — respondeu o criado. — Se “arrumará”? — Sim, senhor. — Achas? Quem está aí? — perguntou Stepane Arkadievitch, ao ouvir o frufru de um vestido atrás da porta. — Sou eu — retrucou uma voz feminina, fina e agradável. E o rosto marcado de bexigas de Matriona Filimonovna, a aia, assomou à entrada. — Que há, Matriona? — inquiriu Oblonski, aproximando-se da porta. Apesar de Stepane Arkadievitch ser considerado culpado perante a mulher e ter consciência disso, quase todos em casa, inclusive a aia, a melhor amiga da Daria Alexandrovna, estavam do lado dele. — Que há? — repetiu com uma expressão triste. — Vá pedir perdão à senhora outra vez. Talvez ela lhe perdoe. Sofre muito; faz dó. Além disso, tudo anda transtornado nesta casa. É preciso ter pena das crianças. Que havemos de fazer? Quem corre por gosto... — Não me receberá... — Seja como for, tente. Deus é misericordioso. Reze, meu senhor, peça a Deus. — Está bem, vai-te embora — exclamou Stepane Arkadievitch, corando repentinamente. — Deixa ver a minha roupa — acrescentou, dirigindo-se a Matvei, enquanto despia o roupão, decidido. Matvei já tinha na mão a camisa, aberta em forma de coleira, e soprava-lhe ciscos invisíveis. Com manifesto prazer enfiou-a no bem cuidado corpo do patrão.

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Um Louco (1874) Ana Karenina (1875/77) Confissão (1882) Sonata a onde fizera serenatas e conhecera uma espanhola que tocava guitarra. Na.
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