leção Antlopologi• ... Polftica Mariza Peirano Organizadora O DITO E O FEITO Ensaios de Antropologia dos Rituais fim Núcleo de r.tr.l Antropologia ~da Política RELU ME DUMARÁ s Ciências soc1a1s uma dMsêo de trabalho VIncula diferentes diSCiplinas a ob1etos espec1ftcos de 1nvest1gacao O Nucleo de Antropologia da Polltlca procura suplantar essas d1v1s0es dtSClpllnares e concertos pre-estabelecidos. cruzando barretras e questionando a politlca nas suas concepçOes natwas. Deftn1dos por sua opçao etnograf1ca. os pesqUisadores do Nucleo de Antropologta da Politlca (NuAP) mostram os resultados de suas 1nvesttgaçOes nos livros dessa Coleção sobre temas tão d1versos como perda de mandato por decoro parlamentar. ele1çOes, p1stolagem e band1ttsmo. dtsputas pelo orçamento da Un1tlo, reun10es de trabalhadores. marchas do MST. r1tua1s da pollttca. dtrettos humanos e c1dadama Justamente porque recortam rigorosamente eventos etnográftcos. os pesquisadores seguem as tr1lhas dos atores envolvidos. das açOes VIVIdas e das tnterpretaçOes nativas daqueles que pensam, fazem e/ ou viVem a política A propr1a nocao de polittca é repensada e redef1n1da. tnciUtndo sua arttculaçtlo com o contexto soc1al ma1s amplo A Colecao Antropologia da Pollttca teve tnícto em 1 998 e publica os resultados das 1nvest1gacoes realizadas no ãmb1to do NuAP Coordenados por Moac1r Palmetra, Manza Petrano. César Barre1ra e Jose Sérgto Le1te Lopes, e com sede no Museu Nactonai/UFRJ. fazem parte Integrante do Núcleo pesquisadores da Umvers1dade de Brasília e da Unrvers1dade Federal do Ceará. ass1m como de outras unrvers1dades (IFCS/UFRJ. UFPR. UFF. UFAGS) MARIZA PEIRANO é professora titular do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília. Pesquisadora do CNPq e do Núcleo de Antropologia da Política (NuAP). coordena a linha de pesqu1sa "Artua1s da Política·. É autora de Uma Antropologia no Plural. Três Expenênctas Contempor~neas (Editora da UnB. 1992) e A Favor da Etnografia (Relume Dumará. 1995). O dito e o feito © Copyright 2002, dos autores Direitos cedidos para esta edição à DUMARÁ DtSTRIIJUIIX>RA l>h PUIJI.ICAÇOES L TI>A. www.relumedumara.com.br Travessa Juraci, 37- Penha Circular 21020-220- Rio de Janeiro, RJ Tel.: (21) 2564 6869 Fax: (21) 2590 0135 E-mail: [email protected] Preparação de originais e copidesq11e Tema Pechman Revisão MariOor Rocha Editoração Dilmo Milheiros Capa Simone Villas Boas CIP-Brasil. Catalogação-na-fome. Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ. O dito c o feito: ensaios de antropologia dos rituais I Mari1.a Peirano 0643 (org.). - Rio de Janeiro : Rclumc Dumará : Núcleo de Antropologia da Política!UFRJ, 2002 . - (Coleção Antropologia da polftica; 12) Inclui bibliografia ISBN 85-7316-268-6 I. Ritos c cerimônias. 2. Usos c costumes. 3. Antropologia. I. Peirano, Mari1.a G. S. (Mariza Gomes e Sou~.a). li. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Núcleo de Antropologia da Política. 111. Série. CDD 306 02-0095 CDU316.7 Todos os direitos reservados. A reprodução não-autori~.ada desta publicação, por qualquer meio, seja ela total ou parcial, constitui violação da Lei n" 5.988. SUMÁRIO PREFÁCIO Rituais como estratégia analftica e abordagem ctnográfica . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 Mariza C. S. Peirano Parte I - RITUAIS E EVENTOS CAPITULO I A análise antropológica de rituais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 Mariza C. S. Peirano Parte TI - ENSAIOS ANALfTICOs CAPITULO 2 Peirce c O Beijo no Asfalto .......................................... 43 Ana Flávia Moreira Santos CAPITULO 3 Jakobson a bordo da sonda espacial Voyager ............. .............. . 59 Jayme Moraes Aranha Filho Parte Il1 - G~NEROS DF. EVENTOS COMUNICATIVOS CAPITULO 4 A nação na web: rumores de identidade na Guiné-Bissau ................... 85 Wilson Trajano Filho CAPITULO 5 Das Bravatas. Mentira ritual e retórica da desculpa na cassação de Sérgio Naya ........................................... 113 Carla Costa Teixeira 6 0 DITO E O FEITO CAPITULO 6 A Marcha Nacional dos Sem-terra: estudo de um ritual político .. ..... .... . . 133 Christine de Alencar Chaves CAI>ITULO 7 Reuniões camponesas, sociabilidade c lutas simbólicas .................... 149 John Comerford Parte IV - CLIMA DE TEMPOS CAPITULO 8 Política c tempo: nota exploratória .................................... 171 Moacir Palmeira CAPITULO 9 As nações vão às umas: eleições na Assembléia Geral da ONU ............. 179 Paulo de Góes Filho CAPITULO 10 Política, etnia e ritual- o Rio das Rãs como remanescente de quilombos ....... 197 Carlos Alberto Steil REFER~NCIAS BIBLIOGRÁFICAS . . . . .... . ... . .... . .... . ........ . ... . ... . . 211 COLABORADORES .... .. ... .. •.•.....••...•...... . ........•........• 227 PREFÁCIO Rituais como estratégia analítica e abordagem etnográfica Mariza Peirano m ais de um século depois do reconhecimento da antropologia como disciplina no LlLJ Ocidente, por que manter um debate sobre tema tão clássico como o dos ri tuais? O que significa propor, no momento atual, a abordagem dos rituais como estra tégia para se analisar eventos etnográficos? Em que sentido a concepção de ritual nos auxilia na pesquisa antropológica? Décadas de discussão sobre uma definição de ritual (de Ourkheim a Victor Tumer, por exemplo), sobre a diferença entre ritual e cerimonial (preocupação central de Max Gluckman), ou ainda sobre a primazia entre ritos c mitos (disputa de Lévi-Strauss) não teriam esgotado o tema? De que nos serve, enfim, a idéia de ritual hoje? Estas são as perguntas que esta coletânea procura responder. Todos os trabalhos foram apresentados no Seminário "Uma Análise Antropológica de Rituais", realiza do na Universidade de Brasflia de 26 a 28 de junho de 2000, que reuniu, quase todos c em um momento ou outro, pesquisadores que haviam participado de cursos sobre o tema oferecidos nas últimas duas décadas na UnB c no Museu Nacionai/UFRJ. Por sua vez, a matriz desses cursos teve como inspiração seminário ofertado por Stanley Tambiah na Universidade de Harvard, em 1977, época em que o autor redigia "A Pcrformativc Approach to Ritual" (Tambiah 1985)1• Os ensaios deste livro abordam temas variados, c neles encontramos a idéia de ritual como um modelo para analisar eventos sociais em sentido lato (ver itens iii a v abaixo), ampliando assim o foco desse fenômeno tão familiar aos antropólogos. An tes de o leitor iniciar seu percurso, contudo, neste prefácio procuro explicitar de for ma resumida alguns pontos centrais que estarão presentes implfcita ou explicitamen te nos diversos capítulos. Vejamos. (i) Primeiro, creio que todos os autores do livro comungam da idéia de que a antropologia se desenvolve pela constante renovação teórica que se reali za quando dados etnográficos dialogam, contestam ou expandem teorias anteriores. Esses confrontos essenciais resultam, à primeira vista de forma paradoxal, em novos refinamentos e ampliação de perspectivas - essa é a 8 0 DITO E O FEITO base da posição wcbcriana sobre a "eterna juventude" das ciências sociais c, na antropologia, vem sendo desenvolvida desde que Malinowski estabe leceu o kula como uma nova agência no mundo ocidental em contraste com as teorias então vigentes sobre "economia primitiva". Em decorrência des sa perspectiva, autores/obras clássicos são sempre atuais, porque atuam como referência no movimento espiralado mediante o qual o refinamento da dis ciplina se dá. (ii) Em segundo lugar, se a antropologia se desenvolve por meio do diálogo entre teoria e etnografia, esse procedimento tem como base a surpresa com que o antropólogo se depara com novos dados de pesquisa que são revela dos, geralmente, nos tipos de eventos de que participa ou que reconhece como significativos para aqueles que observa - de Mauss e Malinowski a Gecrtz, passando por Lévi-Strauss, essa tem sido a base do entendimento sobre o que é etnografia. Eventos consistem no acontecimento "then anti there" (Peirce 1955: 75). Sempre tangíveis, às vezes esperados, outras ve zes meros acasos, produzindo revelações ou perplexidades, sua atualidade depende de suas relações com outros elementos cxistcntes2. (iii) Nesse sentido, entendemos que rituais são tipos especiais de eventos, mais formalizados c c tereotipados e, portanto, mais suscetíveis à análise porque já recortados em termos nativos. Em outras palavras, tanto eventos ordinários, quanto eventos críticos c rituais partilham de uma natureza simi lar, mas os últimos são mais estáveis, há uma ordem que os estrutura, um sentido de acontecimento cujo propósito é coletivo, c uma percepção de que eles são diferentes. Eventos em geral são por princfpio mais vulneráveis ao acaso e ao impondcrávcl, mas não totalmente desprovidos de estrutura c pro pósito se o olhar do observador foi previamente treinado nos rituais. (i v) Um quarto ponto pode ser explicitado: rituais c eventos críticos de uma sociedade ampliam, focalizam, põem em relevo e justificam o que já é usual nela; se há uma coerência na vida social como antropólogos acreditamos, então o tipo de análise que se aplica a rituais também serve a eventos. (Esta perspectiva não é exclusiva da antropologia, naturalmente, e foi utilizada anteriormente por Jakobson, por exemplo, ao estudar a afasia e perceber nes se distúrbio lingüístico princípios básicos da linguagem em geral.) Estamos, portanto, lidando com fenômenos semelhantes em graus divcrsos3. (v) Em razão da ênfase na perspectiva etnográfica é preciso salientar que não compete aos antropólogos definir o que são rituais. "Rituais", "eventos RITUAIS COMO ESTRATÉGIA ANAÚTICA E ABORDAGEM ETNOGRÁACA 9 especiais", "eventos comunicativos" ou "eventos críticos" são demarcados em termos ctnográficos e sua definição só pode ser relativa- nunca absolu ta ou a priori; ao pesquisador cabe apenas a sensibilidade de detectar o que são, c quais são, os eventos especiais para os nativos (sejam "nativos" polí ticos, o cidadão comum, até cientistas sociais)4. (vi) Focalizar rituais é tratar da ação social. Se esta ação se realiza no con texto de visões de mundo partilhadas, então a comunicação entre indiví duos deixa entrever classificações implícitas entre seres humanos, huma nos e natureza, humanos e deuses (ou demônios), por exemplo. Quer a co municação se faça por intermédio de palavras ou de atos, ela difere quanto ao meio, mas não minimizao objetivo da ação nem sua eficácia. A lingua gem é parte da cultura; também é possível agir c fazer pelo uso de palavras. Em outros termos, a fala é um ato de sociedade tanto quanto o ritual5. Há uma conseqüência fundamental dessa constatação: a antropologia sempre incorpora, de forma explícita ou implícita, uma teoria da linguagem. (vii) Até pouco mais de duas décadas, a teoria lingüística dominante na antropologia provinha de Ferdinand de Saussurc. A definição de signo como a relação entre conceitos e imagens acústicas, se por um lado destacou a dimensão psíquica da língua, por outro deu ênfase à estrutura e à arbitrarieda de como definidoras da lingüística (que seria parte da semiologia) na ciên cia que se afirmava (Saussure s/d). O caráter social da língua estava estabe lecido c permitia analogias com outros códigos. Ao focalizar rituais, no entanto, o paradigma saussureiano mostrou-se restrito, já que nos rituais a ação é tão ou mais importante que o pensamcnto6. (vi i i) Com Pcirce c Jakobson devolve-se a dimensão da ação à linguagem pela presença fundamental do Objeto em suas abordagens teóricas - os doi autores (um, filósofo; outro, lingüista) iluminam a performance dos signos e enfatizam a linguagem em uso. Em Peircc, "o signo representa alguma coisa, seu objeto" ( 1955: 99), o que permite, sem se tornar uma unidade monolítica, tomar a forma de um {cone ("um signo que se refere ao Objeto que denota meramente em virtude de características próprias"), um índice ("um signo que se refere ao Objeto que denota em virtude de ser realmente afetado por esse Objeto") ou um símbolo ("um signo que se refere ao Objeto que denota em virtude de uma lei, usualmente em asso ciação a idéias gerais"; c f. Peirce 1955: I 02). Já para Jakobson, o "con texto da situação" renete-se nas diferentes funções da linguagem, que influenciam e/ou informam o significado dos signos. Quando dirigida de
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