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Redalyc.Gravidez adolescente, maternidade adolescente e bebés adolescentes PDF

52 Pages·2015·0.3 MB·Portuguese
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Revista Portuguesa de Psicossomática ISSN: 0874-4696 [email protected] Sociedade Portuguesa de Psicossomática Portugal Justo, João Gravidez adolescente, maternidade adolescente e bebés adolescentes: Causas, consequências, intervenção preventiva e não só Revista Portuguesa de Psicossomática, vol. 2, núm. 2, jul/dez, 2000, pp. 97-147 Sociedade Portuguesa de Psicossomática Porto, Portugal Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=28720210 Como citar este artigo Número completo Sistema de Informação Científica Mais artigos Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Home da revista no Redalyc Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto Revista Portuguesa 9P7ortuPgsRuiecesovaisssdtoaemática Gravidez adolescente, maternidade adolescente e bebés adolescentes de Psicossomática Gravidez adolescente, maternidade adolescente e bebés adolescentes: Causas, consequências, intervenção preventiva e não só1 João Justo* Resumo ABREVIATURAS Neste artigo empreende-se uma dis- (o significado das siglas é singular ou cussão sistemática acerca da gravidez na plural de acordo com o texto): adolescência, das suas causas e das suas ACEP – adolescentes com escolaridade pri- consequências. Entre outras, são aponta- mária; AG – adolescentes grávidas; ANG – ado- das as circunstâncias psicológicas, psicos- lescentes não grávidas; ASA - adolescentes se- sociais e familiares que parecem favore- xualmente activas; ASEP – adolescentes sem cer o aparecimento da gravidez durante a escolaridade primária; ASFEP – adolescentes adolescência. Além disso, são referidas as do sexo feminino envolvidas no programa; características da interacção precoce que ASMEP – adolescentes do sexo masculino en- volvidos no programa; BE – baixa escolarida- ocorre entre a mãe adolescente e o seu bebé. de; CAG – casadas antes da gravidez; CBE – São também discutidos diversos exemplos clínicas baseadas na escola; CPN – consultas de intervenção. Entre estes, destacam-se pré-natais; ERS – experiência de relacionamen- os que visam uma diminuição da frequên- to sexual; FMAdo – filhos de mães adolescen- cia de gravidezes na adolescência, assim tes; FMAdu – filhos de mães adultas; GA – como aqueles que buscam uma melhoria grávidas adolescentes; IF – informação factual; interactiva entre as mães adolescentes e ISF10-19AI – número de indivíduos do sexo fe- os seus bebés. Finalmente, é discutida a minino entre os 10 e os 19 anos de idade (in- pertinência da prevenção nos vários âm- clusive); IVG – interrupção voluntária da gra- bitos psicossociais em causa. videz; IVGA – interrupção voluntária da gra- videz em adolescentes; JSA – jovens sexualmen- te activos; MAdo – mães adolescentes; MAdu – mães adultas; NM<20AI – número de filhos 1 Este artigo é dedicado ao Dr. João Dória nascidos de mães com menos de vinte anos de Nóbrega que durante tantos anos se ba- idade; NDNPG – não desejaram nem planea- teu pela humanização dos cuidados de ram a gravidez; PD – parto distócico; PG – pla- saúde em obstetrícia. A criação da Con- nearam a gravidez; PTD – processo de tomada sulta de Obstetrícia para Adolescentes de decisão; QI – quociente de inteligência; RCSP – rede dos cuidados de saúde primários; na Maternidade Dr. Alfredo da Costa é REBS – rede do ensino básico e secundário; apenas um dos muitos frutos do seu RECP – risco de engravidar a curto prazo; RN combate discreto mas eficaz. – recém-nascido; RNMAdo – recém-nascidos de mães adolescentes; RNMAdu – recém-nas- * Professor Auxiliar na Faculdade de Psi- cidos de mães adultas; TN – total de nascimen- cologia e de Ciências da Educação da tos; TP – trabalho de parto. Universidade de Lisboa. Vol. 2, nº 2, Jul/Dez 2000 João Justo 98 A gravidez na adolescência cons- reflexão aturada dos vários elemen- titui uma circunstância obstétrica tos em causa. Não só das causas (se é preocupante. A atenção que os médi- que existem, são várias), não só das cos sempre dispensaram a estes casos consequências (que só podem ser gra- aponta-lhes complicações clínicas de ves), mas também das formas de in- todo o tipo. Infelizmente, esta preo- tervenção, pois que falamos de uma cupação não termina com o trabalho população que está a crescer e, por- de parto respectivo. Findo este, e nas- tanto, em crise. É, então, a esta refle- cido o bebé, começa a preocupação xão dos vários elementos em causa relacionada com a qualidade da inte- que vamos dedicar as próximas li- racção precoce. É que, nalguns aspec- nhas. tos a mãe adolescente parece ser sufi- cientemente competente. Nalguns INCIDÊNCIA DA GRAVIDEZ outros, diz a experiência, só com mui- NA ADOLESCÊNCIA tas ajudas e muita dedicação se con- segue que a mãe adolescente resista e A incidência da gravidez na ado- amadureça face a tantas exigências lescência varia consoante os países e, impostas pela natureza e pelo desti- também, consoante as épocas. Além no. A prova de que é difícil lidar com disso, torna-se de difícil discussão por essas exigências reside no facto de al- não haver estatísticas que nos falem gumas adolescentes engravidarem directamente da sua dimensão. Em várias vezes antes de atingida a ida- muitos países, a forma mais corrente de adulta. Não podendo descurar por de apreciar este problema consiste na mais tempo as causas e as consequên- relação entre o NM<20AI e o TN. A cias deste fenómeno, a nossa socieda- fim de estudar a realidade portugue- de tenta arquitectar uma resposta ade- sa, decidimos usar os dados publica- quada. Faz parte da realidade dos dos pelo Instituto Nacional de Esta- nossos dias que, nas maternidades tística, referentes a nascimentos ocor- nascem consultas especializadas para ridos em mães de todas as idades, grávidas adolescentes, nos centros de bem como referentes a nascimentos saúde os médicos de família discutem ocorridos em mães com menos de a especificidade dos cuidados primá- vinte anos de idade, posteriores a 1945 rios de saúde nestas utentes, e nos (I.N.E., 1946-1966; I.N.E., 1967-1972, programas do ensino secundário já 1973-a, 1974-1983, 1984-a, 1985, 1986, existem módulos de educação para a 1987-a, 1988-a, 1989, 1990-a, 1991, saúde vocacionados para a prevenção 1992-a, 1993-a, 1994-a, 1995-a, 1996- deste problema. No entanto, esta res- a, 1997; 1998-a). Observando as esta- posta está ainda a erguer-se. Por isso, tísticas referentes até ao ano de 1997, tem as suas fragilidades e hesitações. notamos algumas variações na natu- O desenvolvimento futuro da nossa reza dos dados apurados. Estas varia- capacidade de intervir neste domínio ções dizem respeito à possibilidade de passa, em nosso entender, por uma discriminar em simultâneo várias Revista Portuguesa de Psicossomática Revista Portuguesa 99 de Gravidez adolescente, maternidade adolescente e bebés adolescentes Psicossomática condições relativas ao RN. Entre es- na casa dos 8.000 (1946/1947), no fim tas condições temos a vitalidade dos anos quarenta e princípio dos (nado-vivo/nado-morto), a legitimi- anos cinquenta os NM<20AI atingem dade (nascimentos dentro e fora do valores superiores a 9.000. Na segun- casamento) e a idade de gestação (su- da metade da década de cinquenta es- perior ou inferior a 28 semanas). De tamos acima dos 10.000, fazendo pre- forma a harmonizar as estatísticas do nunciar que na década de sessenta a intervalo escolhido, e pensando que fertilidade adolescente vai atingir os a melhor aproximação ao total de gra- 11.000. Nos anos seguintes os valores videzes corresponde ao conjunto de crescem com mais facilidade: em 1971 todos os casos que resultam de uma estamos já acima dos 12.000; em 1974 gravidez, decidimos optar pelo TN, ultrapassamos os 13.000 e, em 1975 isto é: todos os nados-vivos e todos situamo-nos além dos 15.000. Em os nados-mortos, quer tenham nasci- 1976 e 1977 atingimos o máximo ab- do dentro ou fora do casamento, e em soluto, uma vez que não voltaremos qualquer idade de gestação. Infeliz- a estar acima dos 20.000. Nos anos mente, após 1970 a estatística dos fe- seguintes a descida é ligeira mas cons- tos-mortos não quantifica os de ges- tante. Duas ligeiras excepções (1980 e tação inferior a 28 semanas. De 1946 1990) não são suficientes para inver- a 1970, o TN e o NM<20AI incluem ter uma tendência descendente que os fetos-mortos com menos de 28 se- nos coloca em 1997 num valor abso- manas de gestação. De 1971 a 1996, o luto inferior ao valor de que partimos TN e o NM<20AI só incluem os fe- (n=8.974 em 1946). Passando agora tos-mortos com 28 ou mais semanas aos valores relativos, podemos ter de gestação. Tendo em conta os da- uma visão mais apurada da evolução dos de 1969 e de 1970, em que a ida- do NM<20AI face ao TN. Partindo de de gestação dos fetos-mortos é de valores próximos dos 4% nos anos discriminável, podemos afirmar que quarenta, os NM<20AI oscilam em a variação introduzida nos dados ron- torno dos 4,5% durante toda a déca- da os 0,5% no TN, enquanto que no da de cinquenta. No entanto, duran- NM<20AI a variação se aproxima de te a década de sessenta encontramos 0,3%. aumentos anuais que fazem ultrapas- Tendo presente a limitação referi- sar os 5% em 1966, e os 6% em 1969. da anteriormente, a tabela 1 permite- Os primeiros anos da década de se- -nos acompanhar a evolução absolu- tenta confirmam a tendência ascen- ta e relativa dos NM<20AI, nas últi- dente, uma vez que em 1972 estamos mas cinco décadas. Em termos abso- já acima dos 7% e em 1975 ultrapas- lutos, a evolução dos NM<20AI é samos os 8%. Apesar disso, o salto composta por dois grandes vectores: mais importante é observado nos úl- um vector ascendente entre 1946 e timos anos desta década, em que 1975 1977, e um vector descendente entre significa o ultrapassar dos 8% (pela 1977 e 1996. Começando com valores primeira vez o salto anual é superior Vol. 2, nº 2, Jul/Dez 2000 João Justo 100 Tabela 1. Nascimentos em que a mãe tem menos de 20 anos de idade (NM<20AI), total de todos os nascimentos (TN) e percentagem dos primeiros em relação aos segundos, desde 1946 a 1997. Ano NM<20AI TN NM<20AIx100/TN 1946 8.974 212.659 4,22 1947 8.818 207.197 4,26 1948 9.459 228.382 4,14 1949 9.424 218.932 4.31 1950 9.266 211.683 4,38 1951 9.407 214.297 4,39 1952 9.617 217.902 4,41 1953 9.319 208.202 4,48 1954 9.107 203.429 4,48 1955 9.966 215.610 4,62 1956 9.563 208.331 4,59 1957 10.290 217.168 4,74 1958 10.261 218.135 4,70 1959 10.029 218.271 4,60 1960 10.150 219.164 4,63 1961 10.279 222.734 4,62 1962 10.870 225.351 4,82 1963 10.736 217.216 4,94 1964 11.027 221.736 4,97 1965 10.640 214.824 4,95 1966 11.057 211.452 5,23 1967 11.774 206.262 5,71 1968 11.888 198.686 5,98 1969 11.808 195.577 6,04 1970 11.318 177.854 6,36 1971 12.563 193.241 6,50 1972 12.553 178.363 7,04 1973 12.653 175.643 7,20 1974 13.672 174.942 7,82 1975 15.741 182.409 8,63 1976 20.292 189.447 10,71 1977 20.711 183.746 11,27 1978 19.151 169.789 11,28 1979 17.829 162.467 10,97 1980 18.139 160.238 11,32 1981 17.084 153.803 11,11 1982 16.953 152.650 11,11 1983 16.151 145.844 11,07 1984 15.760 144.210 10,93 1985 13.790 131.762 10,47 1986 12.756 127.917 9,97 1987 11.873 124.263 9,56 1988 11.242 123.091 9,13 1989 8.686 119.506 7,27 1990 10.051 117.195 8,58 1991 9.916 117.204 8,46 1992 9.521 115.745 8,23 1993 9.331 114.730 8,13 1994 8.623 109.929 7,84 1995 8.072 107.771 7,45 1996 7.908 110.957 7,13 1997 7.715 113.739 6,78 Revista Portuguesa de Psicossomática Revista Portuguesa 101 de Gravidez adolescente, maternidade adolescente e bebés adolescentes Psicossomática a 2%), e onde 1976 representa a pro- rar a possibilidade de discutir a gra- ximidade de um patamar de estabili- videz na adolescência com base em zação caracterizado por valores supe- outros indicadores. riores a 11% entre 1977 e 1983 (1979 é Outra forma de apreciar a evolu- uma excepção muito próxima). É no ção da gravidez na adolescência du- centro deste patamar de estabilização rante as últimas décadas, consiste na que atingimos o valor relativo máxi- relação entre o número de grávidas mo, que corresponde a 11,32%, e é re- adolescentes e o número total de ado- ferente ao ano de 1980. A partir de lescentes. No estudo desta relação, 1984 os valores situam-se definitiva- utilizaremos o número de NM<20AI mente abaixo dos 11%, apresentando como aproximação do número de gra- um decréscimo ligeiro mas constan- videzes na adolescência. Com respei- te. Este decréscimo é interrompido em to ao número total de adolescentes, 1990, mas retomado logo a seguir, escolhemos o ISF10-19AI. Esta esco- uma vez que os valores baixam até lha tem por base, não só, a necessida- que em 1997 se situam nos 6,78%, va- de de abranger o universo "teenager", lor muito próximo dos ocorridos no mas também o facto de na estatística princípio dos anos setenta. dos nascimentos algumas mães apre- Se bem que a relação entre o TN e sentarem uma idade extremamente o NM<20AI permita observar a im- jovem (casos com 11 anos de idade portância da fertilidade adolescente estão referidos nas estatísticas do no contexto da fertilidade nacional, I.N.E. relativas aos anos de 1964, 1980, algumas reservas devem ser coloca- 1982, 1983 e 1991). Para o cálculo do das. Entre estas temos a considerar número de ISF10-19AI usámos os da- que, aquela relação pode ser grave- dos referentes aos recenseamentos mente afectada se no período em es- dos seguintes anos: 1950, 1960, 1970, tudo acontecerem variações impor- 1981 e 1991 (I.N.E., 1963, 1973-b, 1984- tantes no número de nascimentos b, 1996-b). No que respeita aos anos ocorridos em MAdu. Esta suspeita é entre os recenseamentos utilizámos as aceitável, uma vez que a partir de estimativas publicadas pelo Instituto 1965 se observam menos partos de Nacional de Estatística (I.N.E., 1952, ano para ano (só em 1971, 1975, 1976, 1969, 1970, 1971, 1972, 1973, 1974, 1991, 1996 e 1997 acontece o contrá- 1975, 1976, 1983, 1987-b, 1987-c, 1988- rio). Tendo em conta que entre 1966 e b, 1990-b, 1992-b, 1993-b, 1994-b, 1995- 1977 a tendência numérica da fertili- b, 1996-c, 1998-b, 1998-c). Para os anos dade adolescente é fortemente cres- entre 1946 e 1949, bem como para os cente (excepções ocorrem em 1969, anos de 1980, 1982, 1983, 1984 e 1988, 1970 e 1972), pode acontecer que a usámos os dados do Gabinete de Es- relação entre o TN e o NM<20AI apre- tudos da Área Demográfica e Social, sente valores exageradamente eleva- do I.N.E.. dos em alguns momentos da nossa Na tabela 2 podemos constatar análise. Por isso, deveríamos conside- que a relação entre o NM<20AI e o Vol. 2, nº 2, Jul/Dez 2000 João Justo 102 ISF10-19AI cresce, embora de forma tos de filhos de MAdo representam hesitante, desde os meados dos anos 6,78% do total de nascimentos, o que quarenta até aos meados dos anos nos coloca num nível semelhante ao setenta. Os valores mais elevados si- que existia entre 1971 e 1972. Na ta- tuam-se entre 1976 e 1981, período em bela 2, em 1997, o número de que esta relação se encontra na casa "teenagers" que deu à luz é 1,19% do dos 2%. A partir de 1982, os valores total de "teenagers", o que nos coloca vão descer fortemente, até se encon- num nível próximo do que existia no trarem perto de 1% no fim da década início da década de cinquenta. de noventa. Pormenorizando a evo- De acordo com os dados que te- lução destes valores, podemos obser- mos vindo a referir, pensamos poder var dois períodos de incremento. O concluir que a gravidez na adolescên- primeiro é o que podemos conside- cia é um fenómeno em remissão es- rar como fruto das profundas altera- pontânea. Possivelmente esta remis- ções psicossociais que os anos sessen- são não será absoluta nem definitiva. ta provocaram na sociedade ociden- Além disso, temos presente que em tal. De facto, só a partir de 1962 é que certos contextos a adolescência é o os valores sobem acima de 1,30%; só momento culturalmente mais apro- a partir de 1967 é que os valores ul- priado para o casamento e a consti- trapassam 1,40%; e, após 1971 esta- tuição da família. No entanto, os con- mos claramente acima de 1,60%. Su- teúdos que vamos referir nas próxi- bidas muito fortes, sobretudo se com- mas linhas fazem crer que há proble- paradas com a estabilidade dos resul- mas médicos, psicológicos e relacio- tados que caracterizavam os anos nais que poderiam ser minimizados quarenta e cinquenta. O segundo pe- se pudéssemos reduzir a incidência ríodo de incremento decorre entre da gravidez na adolescência. 1974 e 1977, e coincide no tempo com um período de amplas e profundas FACTORES BIOLÓGICOS E transformações psicossociais ocorri- SOCIAIS EM DESENVOLVI- das na sociedade portuguesa. É neste MENTO período que se situa o máximo abso- luto do NM<20AI (em 1977 atinge Um dos aspectos mais inespera- 20.711), bem como a percentagem dos na discussão da fertilidade ado- máxima do NM<20AI face ao núme- lescente é a coincidência, porventura ro de ISF10-19AI (em 1977 alcança negativa, de os vários factores que 2,36%). influenciam o desenvolvimento dos Se bem que, numa avaliação glo- adolescentes serem, eles próprios, bal, a evolução dos dados das duas protagonistas de desenvolvimento. tabelas pareça semelhante, a verdade Alguns destes aspectos dizem respei- é que os dados percentuais em causa to ao desenvolvimento psicológico apontam para duas realidades distin- das adolescentes, outros relacionam- tas. Na tabela 1, em 1997 os nascimen- -se com o seu desenvolvimento orgâ- Revista Portuguesa de Psicossomática Revista Portuguesa 103 de Gravidez adolescente, maternidade adolescente e bebés adolescentes Psicossomática Tabela 2. Total dos nascimentos em que a mãe tem menos de 20 anos de idade (NM<20AI), total de indivíduos do sexo feminino entre 10 e 19 anos de idade (ISF10-19AI), e percentagem dos primeiros em relação aos segundos, desde 1946 a 1997. Ano NM<20AI ISF10-19AI NM<20AIx100/ISF10-19AI 1946 8.974 797.230 1,13 1947 8.818 804.500 1,10 1948 9.459 801.990 1,18 1949 9.424 802.460 1,17 1950 9.266 800.259 1,16 1951 9.407 799.500 1,18 1952 9.617 798.500 1,20 1953 9.319 797.700 1,17 1954 9.107 796.700 1,14 1955 9.966 796.200 1,25 1956 9.563 795.200 1,20 1957 10.290 793.700 1,30 1958 10.261 793.400 1,29 1959 10.029 793.300 1,26 1960 10.150 796.908 1,27 1961 10.279 798.600 1,29 1962 10.870 800.900 1,36 1963 10.736 801.200 1,34 1964 11.027 801.800 1,38 1965 10.640 802.700 1,33 1966 11.057 804.500 1,37 1967 11.774 805.700 1,46 1968 11.888 805.500 1,48 1969 11.808 806.600 1,46 1970 11.318 777.255 1,46 1971 12.563 759.000 1,66 1972 12.553 770.900 1,63 1973 12.653 777.700 1,63 1974 13.672 787.900 1,74 1975 15.741 864.300 1,82 1976 20.292 871.900 2,33 1977 20.711 876.100 2,36 1978 19.151 877.300 2,18 1979 17.829 878.200 2,03 1980 18.139 844.200 2,15 1981 17.084 845.562 2,02 1982 16.953 848.700 1,99 1983 16.151 848.200 1,90 1984 15.760 847.000 1,86 1985 13.790 847.800 1,63 1986 12.756 847.500 1,51 1987 11.873 843.700 1,41 1988 11.242 834.800 1,35 1989 8.686 828.800 1,05 1990 10.051 791.300 1,27 1991 9.916 800.661 1,24 1992 9.521 768.430 1,24 1993 9.331 749.760 1,25 1994 8.623 726.090 1,19 1995 8.072 698.420 1,16 1996 7.908 669.890 1,18 1997 7.715 643.980 1,19 Vol. 2, nº 2, Jul/Dez 2000 João Justo 104 nico e, finalmente, ainda outros dizem tanto, e recordando os dados do I.N.E. respeito ao desenvolvimento da socie- sobre a fertilidade adolescente, temos dade. de concluir que o limite inferior da Tal como é reconhecido, os adoles- idade da menarca pode situar-se abai- centes encontram-se a crescer xo dos doze anos de idade. (adolecere = crescer) e, é esperado, as Feliz ou infelizmente, o contexto oportunidades sociais e culturais ao social em que os adolescentes crescem seu alcance fazem com que cresçam também é palco de inúmeras modifi- cada vez mais depressa. Ora, devido cações ligadas directamente ao fenó- a essas oportunidades, a passagem meno da reprodução. Uma das facetas pela adolescência é cada vez mais que mais se desenvolveu na nossa demorada. À medida que se prolon- sociedade é a sexualização da cultu- gam os estudos, ou as fases de prepa- ra. Sobretudo na produção artística ração profissional, a idade com que dos nossos tempos, a divulgação da se chega a adulto é cada vez mais tar- sexualidade e do erotismo atingiu dia. O mesmo é dizer, a dependência uma dimensão insuspeitada há ape- económica e familiar arrasta-se no nas um século atrás, quando se avan- tempo e faz pensar que o crescimen- çava timidamente uma etiologia se- to mais rápido dentro da adolescên- xual para as perturbações psicológi- cia acarreta um crescimento mais len- cas do tipo histérico. Paralelamente, to na passagem da infância para a a democratização do acesso à cultura vida adulta. (cinema, rádio, televisão, jornais, etc.) Outro factor que cresce depressa vem massificar muito rapidamente a na adolescência é o corpo. Mas, ge- difusão da vida sexual como fonte de ralmente não nos damos conta de que inspiração artística. Acontece, talvez há mais um aspecto a crescer depres- por ironia do destino, que o desenvol- sa: a própria velocidade de crescimen- vimento social subjacente a estas mo- to do corpo. Fruto das inúmeras alte- dificações conduziu a nossa socieda- rações alimentares e educativas des- de a um tipo de organização familiar te século, os jovens da sociedade oci- cada vez mais restritivo: vivemos em dental apresentam alterações impor- apartamentos cada vez mais peque- tantíssimas no seu desenvolvimento nos; as nossas famílias são menos orgânico. Uma das mais discutidas no numerosas (geralmente de tipo nu- sexo feminino é a idade da menarca. clear); as fratrias resumem-se a um ou De acordo com os estudiosos da ques- dois irmãos, etc. A consequência re- tão (May, 1978), nos finais do século levante é que, este tipo de organiza- XIX, a idade mais provável para o ção familiar e social nos afastou fisi- primeiro fluxo menstrual situar-se-ia camente do fenómeno da maternida- entre os dezasseis e os dezassete anos. de. Os nossos jovens já não observam Nos dias de hoje, a idade apontada nascimentos nem óbitos em casa, para este fenómeno situa-se entre os além de que têm cada vez menos nas- doze e os treze anos de idade. No en- cimentos, e cada vez menos óbitos na Revista Portuguesa de Psicossomática Revista Portuguesa 105 de Gravidez adolescente, maternidade adolescente e bebés adolescentes Psicossomática sua família próxima. E aqui se gera des fratrias e vários níveis familiares uma contradição difícil de ultrapas- no mesmo agregado familiar); nível sar: na vida dos adolescentes de hoje de escolaridade baixo ou nulo (tanto há cada vez mais sexo (por via cultu- para a adolescente que engravidou, ral), mas há cada vez menos vida a como para os que a rodeiam); forma- acontecer (por via familiar). ção profissional inexistente (tanto Associando a precocidade da para a adolescente como para os seus menarca com a progressiva lentidão progenitores); desemprego crónico, que caracteriza a passagem da infân- etc. Tal como é de esperar, a estas ca- cia para a vida adulta, e não esque- racterísticas associam-se alguns as- cendo a libidinização cultural do sé- pectos de saúde particularmente ne- culo XX, é forçoso concluir: I – na vida gativos: doenças crónicas na família dos jovens existe um período em que próxima; falta de consumo de cuida- a fertilidade é biologicamente possí- dos de saúde; prevenção de saúde vel e socialmente indesejável (já se inexistente e, durante a gravidez da pode ser mãe, ou pai, mas ainda não adolescente, ausência de consultas se conquistaram os atributos adequa- médicas regulares. dos); II – esse período é cada vez mais Estas características são repetida- longo (à medida que o desenvolvi- mente encontradas nas investigações mento social estimula e prolonga o que tentam elucidar as condições que desenvolvimento dos factores que aumentam o risco de gravidez nesta envolvem o adolescente) e; III – se a faixa etária da população. No nosso adolescência é o palco desse período país, foram desenvolvidas algumas biologicamente favorável e social- investigações sobre este problema mente desfavorável então, a adoles- (Silva, 1983; Almeida, 1987). Devido cência constitui uma das fases mais à pertinência que assumem acerca da intensamente conflituosas na vida maternidade adolescente que entre dos jovens. nós se verifica, passamos a expôr as conclusões mais pertinentes. A CARACTERIZAÇÃO PSI- Silva (1983) usa uma amostra de COSSOCIAL DA GRÁVIDA 100 puérperas adolescentes e realça ADOLESCENTE alguns dados extremamente elucida- tivos: a média da fratria é de 4,7 (55% Se bem que em todos os estratos têm 4 irmãos ou mais); 68% da amos- sociais existam adolescentes que tra reside em bairros de lata; 54% têm engravidam, a experiência diz-nos 4 anos ou menos de escolaridade (8% que é mais provável encontrar uma são analfabetas); 65% não estuda nem adolescente grávida nas famílias trabalha; 56% são solteiras; 41% vive oriundas de meios fortemente com a família de origem; 19% vive desfavorecidos. O mesmo é dizer: com a família do companheiro; ape- habitação carenciada ou de tipo "so- nas 23% tiveram consultas médicas cial"; famílias muito numerosas (gran- no primeiro trimestre da gravidez Vol. 2, nº 2, Jul/Dez 2000

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para a generalidade das grávidas ado- lescentes. Entre as mães com menos .. Osbourne et al., 1981; Ward e Biggs,. 1981; Viseu e Nóbrega, 1983;.
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