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Psicanálise e Política: Uma Nova Leitura do Populismo PDF

61 Pages·2018·21.78 MB·Portuguese
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Psicanálise e política: UMA NOVA LEITURA DO POPULISMO Christian Hoffmann Joel Birman 1 ~ edição 2018 São Paulo Instituto Langage / Université Paris Diderot Copyright© da 1' Edição, 2018, Instituto Langage Todos os direitos reservados. A reprodução não-autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação de direitos autorais. 1' Edição 2018 Editores A fascinação coletiva generalizada pelo ultra-liberalismo 11 Sergio Lopes Oliveira Christian Hoffmann Erika Parlato-Oliveira Editor Técnico Psicanálise e filosofia política na contemporaneidade Celso Riquena Sobre as categorias de povo, de populismo e de identidade na Conselho Editorial atualidade 21 Alfredo Jerusalinsky Ana Paula Ramos de Souza Joel Birman Bahia Guellai Benedicto A. D. Vitoriano Catherine Saint-Georges Christian Hoffmann David Cohen Eric Bidaud Fedem, Kelsen, Laclau e a dimensão anti-institucional Erika Parlato-Oliveira Inês Catào da democracia 51 José Carlos Cavalheiro Joel Birman Vladimir Safatle Maria Cristina Kupfer Marie Christine Laznik Marie-Claire Busnel Maya Gratier Populismo, política e subjetividade 65 Myriam Szejer Severina Silvia Ferreira Roland Chemama Terezinha Rocha Almeida Thats Cristófaro Silva Vera Blondina Zimmermann Identidade, gozo e as potencialidades democráticas do populismo 77 Projeto Gráfico Thiago Pagin Thomás Zicman de Barros Capa Thiago Pagin sobre obra de Ginette Hoffmann "!st.hmes" O povo como identidade sem substância e as variações Revisão do populismo 115 Celso Riquena Felipe Rafael Linden Tradução Entrevista de Yannis Stavrakakis com Dimitra Athanassopoulou 133 Regina Macêna Marilande Martins Abreu Discória, dívida e populismo 143 Dimitra Athanasopoulou Dados Internacionais de Catagolaçào na Publicação (CIP) Entre afeto sem representação e afetos compartilhados e orientados Christia~ Hoffmann e_ Joel Birman (Orgs.) Psicanálise e Política: uma nova leitura dopo (com ou sem líder): sujeito do social e povo do populismo, pulismo / Chnstlan Hoffmann e Joel Birman (Orgs.) -1 '. Ed. -São Paulo: Instituto Langage/Université Paris Diderot, 2018. dupla leitura entre Nuit Debout e populismo à esquerda 159 192 p. 21 cm Ade/e Clément ISBN 978-85-62686-27-6 Governamentalidade e subjetivação política: 1. Psicanálise 2. Política 3. Filosofia 4. Populismo 5. Cultura 6. Psicologia das Massas Foucault e o populismo 175 Luiz Paulo Leitão Martins CDD 18.928982 A predação 194 Marie-Jean Sauret Impresso no Brasil INSTITUTO LANGAGE Crítica psicanalista do populismo no Brasil: massa, grupo e cl~sse 203 Alameda Santos, 1398 -conj. 67 -São Paulo, SP Christian Ingo Lenz Dunker Telefone: (11) 3473 5458 www.institutolangage.com.br Algumas considerações sobre o populismo no contexto da crise na i nsti [email protected]. br lnstituto facebook.com/Instituto-Langage Langage Grécia do ponto de vista psicanalítico 225 Yorgos Dimitriadis # APRESENTAÇAO O AVESSO DO POPULISMO A finalidade deste livro é tentar pensar a problemática da política com a psicanálise. Como sabemos, a questão da política sempre foi pro blemática na tradição psicanalítica. De fato, os psicanalistas sempre se sentiram desconfortáveis em pensar política, como se as questões éticas levantadas pela psicanálise desde Freud nada tivessem a ver com polí tica. O que é uma coisa surpreendente que mostra como o pensamento psicanalítico se perdeu após o percurso freudiano da psicanálise. Bem sabemos que a pretenção de Freud sempre foi a leitura da singularidade do sujeito em conjunção com os problemas maoires da sociedade e da cultura. Há em Freud uma preocupação com o futuro da civilização moderna, na qual a problemática da política é bastante presente. Podemos evocar várias obras onde Freud relatou a problemática da política, a saber, Totem e Tabu, Psicologia das massas e análise do eu, Mal-estar na civilização, Moisés e o monoteísmo. No entanto, a tradição psicanalítica pós-freudiana rechaçou a preocupação legítima de Freud, o que resultou que as ciências sociais e a filosofia política não levaram em conta as contribuições da psicanálise para pensar a política, como uma espécie de eco dos psicanalistas em relação à política. Nesse sentido, levar em consideração a psicanálise no tempo como ferramenta teórica para pensar a política veio primeiramente da teoria crítica freudo-marxista e posteriormente, da retomada de Althusser das contribuições de Freud e Lacan para pensar a política. O desafio disso foi a problemática da ideologia como uma prática de dominação política em que o sujeito estava totalmente em questão. É a partir daí que alguns autores contemporâneos tentam extrair uma reflexão renovada sobre a política a partir de uma retomada da psi- 8 9 1 fi J> 1J lll 1111,1 • \ lt i u .1 1.lo p• 1 11 canálise. Este é o caso de Ernesto Laclau, Slavoj Zizek e Judith Butler. par com um possível deslize rumo ao totalitarismo, a menos que consi Deve ser lembrado que eles fizeram uma discussão muito densa em um deremos com Lacan que a psicanálise é um trabalho de desconstrução livro intitulado Após a emancipação', onde podemos notar as diferentes do grande Outro até o reconhecimento de sua inexistência. Nesta pers leituras para pensar a Esquerda hoje. Para esses autores, a questão do pectiva, podemos retomar a tese de Butler sobre a precariedade onde a sujeito na psicanálise é absolutamente fundamental para pensar o su sociedade seria uma composição do precário. Daí a questão do sujeito jeito político. Pode-se dizer que a psicanálise se tornou o interlocutor definido por uma falta-de-ser como matéria-prima para pensar o sujei privilegiado daqueles autores que ocupam a atualidade do pensamento to político e a questão da identificação no lugar da identidade. político hoje. O mesmo vale para o universal que não abrange qualquer totali É preciso reconhecer que esse renascimento do pensamento polí dade, portanto o universal deve ser tomado de maneira contextual e tico atual gira em torno do trabalho de Laclau, embora Butler e Zizek contingente. Isso supõe uma abertura do universal que deve reconhecer sejam importantes e reconhecidos nesse campo. os particularismos, relativizando-os em relação a qualquer essencial is O ponto de partida da teoria de Laclau é muito polêmico do ponto mo de identidade. É desse modo que a hegemonia poderia ser pensada de vista da tradição da ciência política. De fato, Laclau tenta retomar em uma perspectiva tropológica. o conceito de populismo que sempre foi marcado à direita, desenvol Esta reflexão converge para uma nova concepção da noção de povo. vendo a idéia de um populismo de esquerda. Ele se baseia em Freud e Este último sempre foi tomado pelo pensamento político de direita Lacan para pensar o conceito de hegemonia em Gramsci, além de ten como defensor dos valores da tradição, enquanto Laclau desenvolve tar pensar essa hegemonia a partir das práticas de discurso no campo uma perspectiva da esquerda propondo a nova ideia da produção do social e para elaborar a categoria de povo a partir dessa hegemonia. povo da hegemonia tal como ela se organiza em torno de um signifi Ele quer criticar a noção de identidade para sair dos particularismos e cante vazio. chegar à construção de um contingente universal. Todos os autores deste livro estão convencidos de que o desafio Existem algumas questões que são amplamente desenvolvidas neste maior da psicanálise hoje é pensar o sujeito da política a partir da psi livro entre psicanalistas, filósofos e pesquisadores em ciência políti canálise, do mesmo modo que Lacan pensa o sujeito da psicanálise em ca, a saber, o desamparo, o universal, a identidade, o povo e o sujeito relação ao discurso da ciência. político como sendo as principais coordenadas para repensar o campo político hoje. Christian Hoffmann O desamparo em Freud que assumiu hoje a forma de vulnerabilidade Joel Birman e precariedade dão origem em Butler à um pensamento ético e políti co no contemporâneo colocando o afeto no centro do debate político. Enfatizamos a problemática psicanalítica e política que poderia gerar a utilização do desamparo tanto quanto ela instaura o Outro em uma posição de tudo-poder, tese de Butler sobre o sujeito freudiano como marca para o assujeitamento e norma. A partir disso, pode-se preocu- 1 Aprés l'émancipation -Trais voix pour penser la gauche. Paris: Seuil. 2017- ,., A FASCINAÇAO COLETIVA GENERALIZADA PELO ULTRA-LIBERALISMO Christian Hoffmann1 Definir o inconsciente, como fez Lacan, através de sua proposição celebre que "o in consciente é a política", supõe que nós consi deramos que o sujeito político é o sujeito da psicanálise2• Vou desenvolver essa hipótese a partir da Psicologia das massas de Freud, tal como ela foi retomada por Lacan ao fim de seu seminário sobre Os quatro conceitos fundamentais da psica nálise3. Lacan acabara de ser excluído da IPA, por seus colegas, e ele viu neste ato uma re sistência a isso que ele estava abordando para além do Édipo. Esta reação de seus colegas psi canalistas pode ser compreendida, como isso que vamos encontrar no coração do populis mo, a saber, um medo de um colapso dos valores. A reação foi fiel a análise de Max Weber sobre 1. Psicanalista. Professor e director da Ecole Doctorale de Estudos Psicanalíticos da Universidade Paris Diderot (Paris 7). Professor emérito da Universidade de Shangai. Membro da Association Espace Analytique. ·o 2. J. Lacan, tempo lógico·. Écrits. Seuil. 1966, p. 213 : ·o · coletivo não é nada mais que o sujeito do individual'. 3. J. Lacan, Les quatre concepts fondamentaux de la psychanalyse, Seuil. 1973- 12 13 Ili t: 11 Ir H. 1 um 1 110,,1 lcirur., do populhmo as instituições que passam mais tempo a se proteger que a procura de A partir desse esquema, Lacan se interessará pela conjunção entre novidades. Ideal do eu, I (A) e o objeto causa do desejo (onde se significa a falta 0 Mais do que nunca, Lacan vai se identificar com Spinoza e a sua no ser). Essa conjunção constitui a fascinação pelo hipnotizador e a da definição do desejo como sendo a essência do homem. Isso que vem massa pelo seu líder. a definir o sujeito do desejo como o sujeito político na cidade. Após Pode-se dizer, em seguida, que a psicanálise visa exatamente o con ter desenvolvido sua teoria do desejo, Lacan termina seu seminário do trário, a saber, sua distancia máxima. modo mais analítico, fazendo entrar, na linha de Freud, a psicologia Efetivamente, pode-se compreender facilmente que quando o ob coletiva e a psicologia individual. jeto narcísico, i'(a) leu como a imagem que envolve o objeto pulsional, O sujeito do desejo, o falaser, que é atravessado por uma falta, na que fornece sua unidade ao corpo e então ao eu, que é sempre narci medida em que nenhum objeto do mercado é capaz de satisfazer suas sista, que este objeto aponta para um x "extime': como o chama Lacan, pulsões, como diz R. Gary "se pode morrer de sede ao lado de uma que é a falta que faz do objeto a causa do desejo, que Lacan designa pelo fonte", esse sujeito é de uma essência extremamente diferente do sujei objeto a. Este objeto a, causa do desejo, é produzido pela experiência to narcisista que sai do seu individualismo, que é galopante hoje, pela de gozos que deixa sempre a desejar, pelo fato que há relação entre o fascinação coletiva. gozo que é encontrado e este que é procurado, ce n'est pas ça! não é isso! Como sabemos, após a Psicologia das massas e análise do eu, de Freud, a hipnose e o amor dão a formula da fascinação coletiva. O que já é uma E quando este objeto i'(a) se associa resposta ao por que da servidão voluntária de La Boétie, não esqueça aos ideais que o líder encarna através mos que o subtítulo do seu famoso livro é "Contra Um" ("Contr'Un"). da massa como, por exemplo, a Apoiarei meu desenvolvimento sobre o esquema freudiano da cons autoridade, então se produz uma tituição da massa: fusão entre a economia política e a economia libidinal em que o resultado é a fascinação. Basta assistir O ditador de Chaplin para se perceber este fenômeno onde Hitler fascina a Objeto externo massa por uma vociferação, uma voz sem enunciado. O que é uma massa fascinada por um líder que encarna fsquema de Freud valores em colapso, sem um verdadeiro discurso de razão, isso não é a própria Fonte: Lacan. Seminário, livro 11( 1964/1989, p. 257). definição de populismo? 14 15 A análise, por sua vez, visa o retorno da demanda de reconheci O populismo de qualquer forma é uma encarnação desse desejo mento de seu ser de gozo narcísico (economia pulsional) em reconhe puro, o fascismo é a inclinação natural do populismo\ que demanda cimento de seu desejo (de sua falta a ser como causa de sua economia o sacrifício daquilo que o ameaça, esta ameaça hoje é encarnada pelos pulsional). É por este ato que o objeto a se distancia de I(A), do Ideal do imigrantes na Europa, num chamado a uma "personalidade autoritária" eu. Por isto, o analista vem encarnar o hipnotizado, numa hipnose ao e a uma política autoritária encarregada em manter "a integridade da contrário, pela separação da pulsão com o Ideal. ordem moral" aqui onde os sujeitos sustentam uma ameaça de decom posição de seu pertencimento a um "nós", como indica Ivan Krastev em A identificação ao ideal cai graças ao encontro da fantasia funda "O Destino da Europa"5• Basta pensar no movimento "la manif pour mental. A história entre Alcebíades, Sócrates e Agatão no Banquete de tous", (a manifestação para todos) para ser convencido, se necessário. Platão, é exemplo desse sujeito, Alcebíades endereça seu amor a Sócra Uma obra de 2005 de Karen Stenner, A Dinâmica Autoritária teste tes, que indica que o verdadeiro objeto de sua pulsão é Agatão. Temos munha aqui, muito utilmente, a pertinência da aproximação psicológi aqui um exemplo da separação entre I(A) e o objeto a. Isso que faz a per ca desta demanda de governo autoritário. Ele se movimenta nos traba da da identificação deixa o sujeito com a realidade de seu inconsciente, lhos de Adorno que ficou encarregado de iniciar, em 1950, um grande ou seja, com a pulsão. programa sobre este ponto. Daí o sentimento freudiano de Déjà vu. Ninguém vai contradizer Lacan sobre a invasão atual pelos dois ob E. Balibar faz uma correlação entre a formação do "eu" e esta dos jetos que são o olhar e a voz. Nas mídias, ressaltemos que é mais nosso grupos chamando-os, "o momento do transindividual na obra de Freud" olhar que nossa visão (do mundo), que é solicitado. num capítulo sobre Spinoza, Marx e Freud de seu último livro6, no qual Lacan abriu sua política do inconsciente, em seguida ao drama ele faz corresponder a possibilidade de uma individualidade (em Spino do nazismo. Encontraremos aqui o sacrifício e a morte do objeto do za) que seria um excesso em relação a transindividualidade da pulsão de amor "na ternura humana", onde pouco do sujeito pode resistir a morte. Isso nos leva a um retorno a Spinoza e a isso que se chama hoje esta "monstruosa captura", exceto ser animado de Amor intellectualis uma "política dos afetos"7 • Dei de Spinoza, em resumo, o Amor da razão. Este sacrifício é o do Spinoza construiu uma verdadeira alternativa a tirania do UM afeto onde se significa o desejo do Outro, como exige a razão prática (do poder) fundando o "comum" (o coletivo) no desejo que afeta de Kant por deixar subsistir um desejo no estado puro. Este sacrifício não somente nossos pensamentos, mas igualmente nosso corpo. abre a porta, pela morte, da destruição do desejo, no qual o sujeito "O desejo é o apetite e a consciência do apetite" e é isso que é a encontra seu limite como falta à ser. Encontraremos assim o Kant essência do homem que nos coloca em movimento para a políti com Sade de Lacan. Em contrapartida, o desejo do analista não é um ca: "O desejo é a essência mesmo do homem, na medida em que desejo puro, ele resta contaminado para além da identificação ao é concebida como determinada a fazer qualquer coisa por uma ideal, contaminado pela pulsão. É neste espaço que se abre um lugar afeição qualquer dada a ela"8• Se pensa, com certeza, primeiro para a tragédia, sinônimo de ética, e por consequência da política, no afeto da angústia, não se esquecendo que Freud já falava "do um lugar para um amor para além das leis da Cidade, pensamos cer 4. U. Eco. Reconnaitre le fascisme. Grasset. 2017. tamente em Antígona. 5. 1. Krastev. Le destin de l'Europe. Premier Paralléle. 2017 6. E Balibar. Spinoza politique. Le transindividuel. Puf. 2018. 7. F. London. Les atfects de la politique. Seuil. 2016 8. Spinoza. Éthique. Ili · 16 17 1 rn.d se 1r. ml1th. 1 11111110,.1h:11u1.td1 poptli o afeto do real", e ao desamparo. Daí nossa questão sobre a arti é resultante dos efeitos constituintes do que faz a essência do homem culação entre o afeto e o desejo. É aqui que se pode se referir a para Lacan após Spinoza, ou seja, o desejo. uma citação de Lacan extraída de seu seminário O desejo e sua É assim que se encontra atualizada a ideia de Hegel que não interpretação, que é particularmente clara sobre este ponto: "A se pode fazer filosofia sem Spinoza, que encontra um uso pós relação do desejo do sujeito ao desejo do Outro é dramática, con moderno11, até nas teses recentes de J. Butler12, que tenta fornecer tanto que o desejo do sujeito seja situado antes do desejo do Ou uma ética da vulnerabilidade que afeta o sujeito e a política. Estando tro, o qual, contudo, o aspira literalmente e o deixa sem recurso. afetado, o sujeito se torna um sujeito político, ou seja, um sujeito É neste drama que se constitui a estrutura"9• É necessário, sobre responsável de sua posição subjetiva13 a respeito do real de seu esta esta questão, retornar ao seminário sobre A Angústia para chegar tuto de falaser e vivente. O limite do vivente e o impossível do sim a precisar esta tragédia do desejo. É aqui que a leitura gramatical bólico tornando possível de certo modo a política, como o sublinha que Lacan faz da proposição: o desejo do homem é o desejo do a seu modo E. Laclau14 • Outro, nos é de grande utilidade. Ele distingue nesta proposição o genitivo objetivo do genitivo subjetivo, a saber, o primeiro conduz Isso que nos Leva a pensar o o sujeito a fazer de seu desejo o objeto do desejo do Outro; en sujeito político como sujeito tão que, no sentido do genitivo subjetivo, o desejo do sujeito é o da psicanálise no nosso mundo desejo do Outro. contemporâneo, onde a questão A angústia se inscreve na relação do 11comum" em relação ao do sujeito ao desejo do Outro, individualismo pode se resumir o que comporta o risco de se tornar o a uma definição da identidade objeto de gozo do Outro e desaparecer como individuo ou como jogo de como sujeito. Em resumo, é necessário pura diferença, num conjunto distinguir a identificação ao onde o significante-unário em objeto de gozo do Outro da Lugar e posição do discurso do identificação ao seu desejo. mestre se torna um significante zero, ou seja, um significante da Por exemplo, nós estamos afetados pelos imigrantes10 reduzidos a falta. espectros, seja por que nós temos um desejo "comum" ("commun"), isso que outros chamam hoje um amor da democracia (da política). Em resumo, uma política de afetos, livres da paixão (do gozo) do Um, 11. A Negri. Spinoza el naus. Galilée. 2010 12. J. Lacan Écrits. Seuil. 1966. p. 858. 9-J. Lacan. Le désir et son interprélalion. La Marliniére. 2013, p. 502 13 J. Butler. Rassemblement. 2016. Fayard. Cf. également: J. Butler. E. Laclau et S. S. Zizek. 10. S. Smith. La ruée vers l'Europe. Grassei. 2018. G. Didi-Huberman et N. Giannari. Passer. Aprés l'émancipation. 2017, Seuil. quoi qu'il en coüte. Éditions de Minuit. 2017. E. Jelinek. Les Suppliants. L'Arche. 2016. 14. E. Laclau. La guerre des identités. La découverte. 2015. p. 105 18 19 P,u.:,u1.tl1',(.' e pol11 iL,I" u111.1 no,.1 lciu11,1 do pupuli,mo O que é um modo de colocar o universal de forma diferente como da sublimação (a ciência e a arte) e a quem à cultura é imposta, daí o faz Étienne Balibar. No seu livro Universais15, 2016, Balibar ;ala do ressentimento contra a elite. O que faz, na minha opinião, nossa 0 "conflitos dos universais" em Hegel que não avança sem fato da atualidade política, através da ascensão do populismo. É aqui que O "enunciação do universal" (numa proximidade de Spinoza, sub specie intervém a religião como forma sublimada das pulsões pela trans aetemitatis16 e de Foucault, a parrêsia) que deixa sempre um resto posição do desejo infantil na modalidade de esperanças messiânicas , que faz o objeto do conflito como, por exemplo, este de Creonte e coletivas, o que Freud qualifica de ilusão e que Balibar reconhece Antígona ou o da fé e da razão. Basta compreender que univer como "o universal freudiano". O sal se particulariza em se anunciando. A lembrança de Benveniste Esta dialética, retomada por Freud e discutida por Balibar, entre é judiciosa para interpretar Hegel mostrando que a apropriação da a fé e a razão (saber), é atravessado por seu pessimismo, ligado a sua linguagem passa pela enunciação do sujeito. percepção do declínio do universal da fé17, que perdeu no Ocidente Balibar trata em seguida, da relação entre o universal e a ideolo sua capacidade de cultura próxima das massas, e a impotência dos gia, entre Hegel e Marx, para melhor fazer surgir a parte da incons universais da razão se substituem por mecanismos de identificação ciência (a dominação e a violência) repelida por Hegel. Não se pode coletiva para cimentar e fazer evoluir o laço social. mais que subscrever, a evocação de Barthes para quem "toda ideolo É por Psicologia das massas de Freud que ele vai esclarecer esta gia é dominante" e leva a questão da enunciação do universal (da lei) tese freudiana e, notadamente por sua descrição dos mecanismos na modalidade do universal, e não do privilégio. O desenvolvimento de obediência a autoridade, a referência ao carisma dos chefes e a que segue sobre a relação entre os dominados e os dominantes abre universalidade das ideias (ideologia), com benefício para o sujeito a interrogação para Freud. do poder renunciar a sua capacidade de julgamento, entregando-a Ele toma os últimos textos de Freud sobre a cultura que vão de nas mãos de um Outro. Se reconhece nesta identificação a servidão O futuro de uma ilusão (1927), a Mal-estar na Cultura (1936), passando voluntária, na qual a autoridade prevalece sobre a igualdade e faz por Psicologia da Massas e Análise do eu (1921). A hipótese de Balibar desaparecer a ideia de emancipação. é que Freud enuncia sob o nome de cultura (então, do universal) um Balibar chega a conclusão que Freud concebeu uma característi dos paradoxos da universalidade em situando sua enunciação ao ní ca das enunciações do universal que causa o conflito (Hegel) e a do vel do inconsciente. Assim, na sua leitura de O futuro de uma ilusão minação (Marx) nessa formação de um "ideal do nós" ("a comunida Freud toma suas distancias com a ideologia germanizante da oposi~ de") que implica recalque e sublimação das pulsões de vida e morte. ção entre cultura e civilização. Como já sabia Rousseau, o universal não é a simples representação A leitura política que faz Balibar permiti-lhe colocar às claras de uma unidade, mas ele representa a idealização que institui um que para Freud a cultura compensa o renunciamento aos desejos laço entre estes que assim se unem. infantis e inspira o amor do trabalho aos homens que mergulham no É interessante notar que os nomes do universal, como lembra o princípio de prazer. Mas essas duas necessidades são mais difíceis autor, são equívocos e não basta substituir um universal por outro, de realizar nas classes populares que não participam dos prazeres por exemplo, o mercado pela comunidade ... para criar um conflito. 15. E. Balibar. Des Universels. Galilée. 2016. 17. Se terá na leitura que faz Lacan da religião em Le triomphe de la religion. Seuil. 2005: "Sim. 16. L. W(llgenstein retoma esta questão nos seus Cadernos de 1914-1916. para situar O ponto ela (a religião> não trinfurá somente sob a psicanálise. ela triunfará sob outras coisas ainda. de Junçao entre a estética e a ética. Não se pode mesmo imaginar quão poderosa é a religião· p. 79. (Lacan. 1974). 20 , PSICANALISE E Observemos a pertinência de Balibar ao destacar que na mundia lização, "o universal é sempre já dito". Basta evocar o famoso "TINA" FILOSOFIA POLÍTICA NA ("There is no alternative") que é o discurso político da ausência de es colha que atravessa a Europa e a mundialização18• CONTEMPORANEIDADE1 SOBRE AS CATEGORIAS DE POVO, DE POPULISMO E DE IDENTIDADE NA ATUALIDADE1 Joel Birman2 I. Preâmbulo A leitura das publicações teóricas recen tes indica claramente que existe uma novidade teórica evidente em alguns discursos filosóficos da atualidade, nos quais se enunciou de forma eloquente teses interessantes e sugestivas para pensar nos "destinos políticos da esquerda no 1. Este texto foi escrito à partir das notas que me orientaram na conferencia realizada no colóquio intitulado "Psychologie des foules et populisme li Peuple et identité", realizado em 22 de fevereiro na Université Paris Diderot, que foi organizado pela École Doctoral de Psychanalyse da Université Paris Diderot e o Institui de Science Politique de Paris. 2 Psicanalista. Membro do Espaço Brasileiro de Estudos Psicanalíticos e do Espace Analytique. Professor Titular do Instituto de Psicologia da UFRJ, Diretor de Estudos em Letras e Ciéncias Humanas da Universidade Paris Diderot. Pesquisador associado do Laboratório· Psicanálise e Medicina e Sociedade" e Professor associado da École 18. 1. Krastev. Le destin de l'Europe. Premier Paralléle. 2017, p. 95. J. Stiglitz. L'euro. Como uma Doctoralle de Psychanalyse da Université Paris Diderot moeda única ameaça o futuro da Europa. Babel. 2018. .Pesquisador e Consultor Ad-hoc do CNPq.

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