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Por que ler Roman Jakobson ainda hoje PDF

24 Pages·2015·0.15 MB·Portuguese
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Por que ler Roman Jakobson na atualidade Bethania Mariani POR QUE LER ROMAN JAKOBSON NA ATUALIDADE Bethania Mariani (UFF/CNPq) RESUMO: Um dos objetivos desse trabalho é retomar vários aspectos do pensamento de Roman Jakobson, sobretudo aqueles que reveem e fazem avançar conceitos saussureanos ligados à ideia de língua como sistema de signos. Dentre eles destacamos: sincronia dinâmica, metáfora e metonímia e poesia. Roman Jakobson é um dos pensadores mais relevantes da ciência da linguagem, um autor clássico, ponto incontornável na formação de estudantes que almejam estudar a Linguística. No entanto, com o imediatismo e o pragmatismo que invadem os estudos acadêmicos, atualmente observamos muitos cursos de Letras que simplesmente eliminam a discussão de determinados textos seminais por considerarem que somente leitura de manuais de Linguística é suficiente para alunos de graduação. Assim, outro objetivo do artigo em tela é reavivar as ideias linguísticas de Jakobson. PALAVRAS-CHAVE: Roman Jakobson, língua, sincronia, metáfora, metonímia WHY READING ROMAN JAKOBSON NOWADAYS? ABSTRACT: One of the objectives of this study is to resume several aspects of Roman Jakobson's ideas, mainly those that carry on and advance Saussurean concepts related to the notion of language as a system of signs. Thus, we highlight: dynamic synchrony, metaphor and metonymy, and poetry. Roman Jakobson is one of the most relevant theorists in the science of language, a classical author, a scholar whose work is essential for the education of students who intend to study Linguistics. However, owing to the trends that favor immediate and pragmatic results in academic studies, today we observe many Arts and Letters programs that simply eliminate the discussion of certain seminal texts because they consider that reading Linguistics handbooks is enough for the education of undergraduate students. Therefore, another objective of this article is to revive Jakobson’s linguistic ideas. KEYWORDS: Roman Jakobson, language, synchrony, metaphor, metonymy 407 Polifonia, Cuiabá, MT, v. 22, n. 31, p. 407-430, janeiro-junho, 2015 Linguista sum: linguistici nihil a me alienum puto. (R. Jakobson) Introdução O título desse trabalho poderia apontar apenas para uma pergunta retórica. Afinal, para muitos linguistas, Roman Jakobson é um dos pensadores mais relevantes da ciência da linguagem, um autor clássico, ponto incontornável na formação de estudantes que almejam estudar a Linguística. No entanto, com o imediatismo e o pragmatismo que invadem os estudos acadêmicos, atualmente observamos muitos cursos de Letras que simplesmente eliminam a discussão de determinados textos seminais por considerarem que somente leitura de manuais de Linguística é suficiente para alunos de graduação. Seria esse o caso do linguista russo Roman Jakobson, nascido em 1896, em Moscou, um dos fundadores do Círculo Linguístico de Moscou, em 1915, aos 19 anos? Se não temos dados empíricos atualizados que nos permitam afirmar um forte desconhecimento do pensamento de Jakobson em cursos de Letras, pelo menos podemos argumentar, com base na sua obra, sobre a necessidade e a relevância de seu pensamento para a constituição do campo da Linguística bem como sua influência na organização das bases do estruturalismo e em outras áreas do saber, como a Antropologia e a Psicanálise lacaniana. Não ler Jakobson é desconhecer o papel fundamental desempenhado por ele até hoje. Ler a biografia e as reflexões de Jakobson, portanto, é acompanhar a história da Linguística, desde sua institucionalização como disciplina científica, em Praga, Copenhague e Haia, seguindo, também, suas viradas teóricas na Europa e nos Estados Unidos. Em toda essa trajetória, pode-se observar uma ética presidindo o discurso teórico de Jakobson, uma vez que ele não exclui a linguagem infantil, a significação, a falha, o político e o poético do estudo da língua. Uma ética movida por um amor à língua, materializada na própria máxima com a qual ele se auto-representa: Linguista sum: linguistici 408 Por que ler Roman Jakobson na atualidade Bethania Mariani nihil a me alienum puto. 1 A Linguística jakobsoniana não reduz a linguagem, “não exclui nem a significação em favor da sintaxe, nem a diacronia em favor da sincronia, nem a linguagem corrente em favor das linguagens formalizadas das ciências exatas, nem a linguagem interior em favor da linguagem que pode ser observada do exterior tal como aquela da comunicação intersubjetiva.” (HOLENSTEIN, 1978, p. 13). Essa concepção não monolítica do objeto, constitutiva da fundação do estruturalismo em Praga, é o que assinala a singularidade do pensamento e da trajetória jakobsoniana, uma trajetória marcada, desde o início, pelo encontro do linguístico com o poético. 1. Moscou, Praga, Nova York Lembremos, de imediato, que o Círculo de Moscou, uma reunião de linguistas, filósofos e escritores, deu origem ao que ficou conhecido como formalismo russo, uma metodologia de trabalho fundada em um conjunto de procedimentos teóricos e metodológicos contrários às ideias vigentes durante o século XIX sobre literatura e análise de textos literários. De acordo com o historiador do estruturalismo François Dosse, o “homem-orquestra” Jakobson “defende a ideia da imanência do estudo do texto literário [...] quer conseguir a junção entre a criação e a ciência, graças à linguística [...]” (DOSSE, 1993, p. 77). Com o recrudescimento da política stalinista, Jakobson afasta-se de Moscou, seguindo para a Tchecoslováquia “como intérprete da missão da Cruz Vermelha em Praga.” (DOSSE, 1993, p. 77). Em Praga, encontra-se com poetas, faz traduções e depara-se com as proximidades e diferenças de tonalidade e de musicalidade entre as línguas russa e tcheca. Ao participar da fundação do 1 Jakobson, ao afirmar “Sou um linguista e julgo que nada da linguística me seja estranho”, parafraseia a máxima de Terêncio  Homo sum: humani nihil a me alienum puto (JAKOBSON, 1969, [1952]). Jakobson retoma essa máxima ao final de seu artigo “Linguística e poética”, publicado em 1960. Cabe esclarecer que em meu artigo, além da consulta a textos de Jakobson, recorri a informações e comentários biográficos formulados em Holenstein (1978 [1974]), Kristeva (1999 [1969]), Dosse (1993 [1991]) e Pêcheux (1981 [2004]). 409 Polifonia, Cuiabá, MT, v. 22, n. 31, p. 407-430, janeiro-junho, 2015 Círculo Linguístico de Praga junto com os tchecos Mathesius, Havranek, Mukarovsky, os franceses Bruo, Tesnière, Vendryes, Benveniste e Martinet e os também imigrantes russos Troubetzkoy e Karcevskij, em 1926, traz algumas reflexões do Círculo de Moscou, sobretudo as que desenvolve sobre a fonologia e a poética. Pode-se atribuir a Jakobson, portanto, o desenvolvimento da ideia de que “não há dimensão na língua que escape a priori ao poético” (PÊCHEUX, 2004, p.109). Em entrevista a Krystyna Pomorska,publicada em francês em 1980, relembrando sua passagem por Moscou e Praga, Jakobson afirma: As constantes e estimulantes discussões do Círculo Linguístico de Moscou sobre a estrutura dos versos constituíram uma etapa ainda mais importante na passagem da fonética antiga à fonologia com suas bases inovadoras. Deixei Moscou em 1920, imediatamente após os debates do Círculo, e fui para Praga, onde logo me apaixonei pelas questões relativas ao verso tcheco contemporâneo e medieval. (...) Ocorreu-me, assim, que era necessário tratar cientificamente dos sons da fala, levando em consideração a problemática da ligação recíproca entre o som e o sentido. Em outras palavras, estava aí o esboço de uma nova disciplina linguística, à qual os tratados científicos faziam apenas algumas alusões preliminares isoladas. Em meu livro sobre o verso tcheco (1923), pareceu-me, pela primeira vez, apropriado empregar o termo ‘fonologia’ com essa finalidade, apesar de toda a polissemia de aplicações na literatura científica anterior. (JAKOBSON e POMORSKA, 1993, p.31) Ampliando seus trabalhos sobre o significante, entre 1928 e 1929, Jakobson elabora a história da fonologia russa, “provando que as leis estruturais e funcionais constitutivas do sistema sincrônico são igualmente válidas para o desenvolvimento diacrônico e que a sincronia e a diacronia constituem uma unidade dinâmica indivisível.” (HOLENSTEIN, 1978, p. 17). E é a partir de 1933, como professor universitário em Brno, que formula para a fonologia a teoria dos traços distintivos, teoria retomada e desenvolvida com Hall, em 1955, nos Estados Unidos, país para onde emigrou após a invasão nazista de Praga, durante a segunda guerra mundial. Como sinalizam os historiadores das ideias linguísticas, Jakobson chega à ciência linguística a partir da poética, fato que vai caracterizar uma diferença significativa no modo como irá teorizar sobre a língua. Esse traço distintivo é 410 Por que ler Roman Jakobson na atualidade Bethania Mariani responsável também pelas divergências com Hjelmslev e Brondal, do Círculo de Copenhague, linguistas zelosos do desenvolvimento da máxima saussuriana “Língua é forma e não substância”, e que, em função disso, privilegiam de modo absoluto a forma linguística em detrimento da substância fônica e semântica. Nas reflexões de Jakobson, por outro lado, só é possível pensar a língua a partir do momento em que ela integra a possibilidade da poesia. Como ele reafirma em Linguística e poética, texto escrito em 1960, “a Poética pode ser encarada como parte integrante da Linguística.” (JAKOBSON, 1969, p. 119). Além disso, vale ressaltar que Jakobson não silencia sobre as experiências anagramáticas de Saussure, dizendo: “é a obra mais importante de Saussure.” (apud PÊCHEUX, 2004, p. 109). Entretanto, nesses momentos iniciais de institucionalização da linguística, com o Saussure do Curso de linguística geral se produz uma relação contraditória: tanto é modelo a partir do qual se desenvolvem concepções teóricas quanto é referência a ser contestada face às próprias ideias linguísticas em circulação e em desenvolvimento. Jakobson e seus companheiros do Círculo de Praga, por exemplo, apoiam-se em um conceito de estrutura que se define como conjunto de relações, e dessa maneira conferem um dinamismo ao conceito. Há que se considerar, para compreender essa tensão teórica que aproxima e afasta Saussure, as condições de produção desse período entre guerras, ou seja, no campo das ciências, em geral, na Psicologia da Gestalt, na Matemática e na Filosofia, por exemplo, busca-se um conceito de estrutura que não elimine nem a ideia de variação, nem a de relação entre os elementos e nem a de função dos elementos partícipes da estrutura. Assim considerando, é possível compreender que os linguistas de Praga, estivessem conectados e atentos às discussões de seu tempo ao se afastarem e se envolverem, ao mesmo tempo, com o pensamento de Saussure. A primeira das teses do CLP2, relacionada à discussão dos “problemas de método decorrentes da concepção de língua como sistema”, expõe as diretrizes 2 Os trabalhos do Círculo Lingúístico de Praga (CLP) foram editados entre 1929 e 1938. Para o presente artigo estamos nos valendo da edição brasileira organizada por J. Guinzburg. 411 Polifonia, Cuiabá, MT, v. 22, n. 31, p. 407-430, janeiro-junho, 2015 de um pensamento linguístico que concebe a língua como um sistema funcional, “um sistema de meios de expressão apropriados a um fim” (CLP, 1978 p. 17), cuja finalidade maior é a “expressão ou comunicação”. Assim, as teses, definindo língua como sistema funcional, trazem um certo dinamismo ausente na concepção saussuriana de sistema. Dois outros aspectos chamam a atenção no CLP. O primeiro deles refere- se à segunda tese, que expõe uma proposta de análise para o estudo do som como elemento do sistema funcional e uma teoria para o “sistema particular de denominações” de cada língua em particular. (CLP, 1978, p. 26 e 27) Caracterizar uma língua dada a partir de suas denominações linguísticas é “determinar as zonas de ideias que estão representadas com força de expressão particular no vocabulário considerado (...) isto é, ocupar-se de fatos que ressaltam comumente da semântica.” (CLP, 1978, p. 26 e 27). A terceira tese estuda as funções linguísticas e propõe distinguir a lingua(gem) intelectual (com seu papel social e sua função de comunicação), a linguag(gem) literária (com seu papel conservador, exprimindo a cultura e a civilização em seus aspectos científicos, filosóficos, religiosos, políticos, jurídicos e administrativos) e a lingua(gem) poética (resultado de um ato criador individual). Nessa tese, ressalta-se que “é inconstestável que os valores fônicos da linguagem poética estejam em relação com a fonologia da linguagem de comunicação, e o ponto de vista fonológico é o único em condição de descobrir os princípios das estruturas fônicas poéticas.” (CLP, 1978, p. 39). Mais adiante, ainda sobre esse tema, afirmam os linguistas de Praga: “[...] é preciso estudar a língua poética em si mesma.” (CLP, 1978, p. 43). Ainda com relação ao tenso jogo de aproximação com Saussure, cabe a Jakobson deslocar a dicotomia sincronia/diacronia, propondo uma sincronia dinâmica, conceito que objetiva mostrar que sincronia não é estática, ou melhor, que se pode pensar em termos de uma totalidade sincrônica que se movimenta. Outro aspecto contestado do Curso é a linearidade da cadeia significante, tema que Jakobson desenvolve mais tarde ao discutir os eixos metafórico e metonímico. 412 Por que ler Roman Jakobson na atualidade Bethania Mariani Para Jakobson, em sua leitura de Saussure contrapondo-o a seus antecessores: O volume [o Curso de linguística geral ] situa-se na convergência de duas épocas e de dois métodos; um livro desse tipo, por mais genial que seja, nunca pode estar isento de contradições. Seria, entretanto, perigoso e errôneo julgar que esse Curso de linguística  como infelizmente muitas vezes acontece  é um compêndio, uma doutrina acabada, e procurar disfarçar-lhe as contradições ou, ao contrário, subestimar os aspectos essenciais desse livro por causa das contradições que contém. (JAKOBSON, 1939, apud HOLENSTEIN, 1978, p. 28) Em seus comentários sobre o pensamento jakobsoniano e a atuação do Círculo Linguístico de Praga relativamente aos ensinamentos saussurianos, Pêcheux dirá que: [...] a contribuição do Círculo Linguístico de Praga pode ser considerada como essencialmente contraditória. Por um lado, será uma tentativa de aplicação prática do que havia ficado no plano teórico com Saussure: a reflexão privilegiada sobre o domínio dos sons baseia-se na apreensão da maneira pela qual nasce o sentido na poesia, o que significa que a língua, objeto do linguista, nunca é separada da língua, objeto da literatura. Por outro lado, ela será uma primeira etapa para a instalação da ordem do sério na linguística, uma retomada da ideologia da comunicação, à qual ele traz uma garantia científica. (PÊCHEUX, 2004, p. 106) Desde o início de seus trabalhos, o grupo dos linguistas de Praga buscou integrar nas análises linguísticas uma análise estrutural e uma análise funcional. Considerando uma teoria da comunicação humana na qual se pressupõe a dissolução de indeterminações, ou seja, uma comunicação cujo suporte linguístico se encontra organizado na forma de oposições binárias, a noção de fonema, como elemento participante dessas oposições, só pode ser compreendida em termos funcionais. Em outras palavras, uma variação fonológica tem como função distinguir sentidos (dissolver indeterminações) e é essa função que a torna diferenciada de uma variação fônica outra. Afirma Jakobson em 1929: 413 Polifonia, Cuiabá, MT, v. 22, n. 31, p. 407-430, janeiro-junho, 2015 Chamamos sistema fonológico de uma língua ao repertório, próprio dessa língua, das ‘diferenças significativas’ que existem entre as ideias das unidades acústico-motrizes, isto é, ao repertório das oposições às quais pode estar ligada, numa determinada língua, uma diferenciação das significações (repertório das oposições fonológicas). Todos os termos de oposição fonológica não susceptíveis de serem dissociados em sub-oposições fonológicas menores se chamam fonemas.”(JAKOBSON, 1929, apud KRISTEVA, 1999, p. 262] Se é em Praga que Jakobson toma contato com a obra saussuriana através de Karcevskij, divulgador de Saussure, é também em Praga que aprofunda seus estudos dos escritos lógico-filosóficos de Husserl, autor que ele havia começado a ler em 1917. A influência de Husserl3 faz do estruturalismo do Círculo, um estruturalismo fenomenológico. Conforme Holenstein (1978, p. 10), “se seguirmos as citações explícitas [feitas por Jakobson em seus textos], constataremos uma influência direta de Husserl, sobretudo em três domínios, na definição da relação entre Linguística e Psicologia, no programa de uma gramática universal e na defesa da semântica como parte integrante da Linguística.”. A fenomenologia e o estruturalismo desta época buscam compreender as estruturas estáticas, afastando-se das explicações mecanicistas de fatos tomados isoladamente (HOLENSTEIN, 1978, p. 10). Essa aproximação entre a linguística e a filosofia não impede que fortes diferenças mantenham os dois domínios em separado: na fenomenologia de Husserl, ao tentar descrever os modos de operar da consciência, constituindo-se em uma forma de idealismo, apresentando um irracionalismo místico; no estruturalismo, um formalismo descritivo e positivista que não segue o monismo metodológico husserliano. Apesar das 3 Edmond Husserl (1859-1938) funda a fenomenologia, “visando estabelecer um método de fundamentação da ciência e de constituição da filosofia como uma ciência rigorosa. O projeto fenomenológico se define como uma ‘volta às coisas mesmas’, isto é, aos fenômenos, aquilo que aparece à consciência, que se dá como seu objeto intencional.”. (JAPIASSÚ e MARCONDES FILHO, 2001, p. 102) De acordo com Kristeva (1999, p. 256), há uma “dívida inconfessada do estruturalismo para com a fenomenologia” e tal dívida está relacionada, dentre outros aspectos, ao modo como Husserl buscou conceituar signo A “dívida inconfessada do estruturalismo para com a fenomenologia” (Kristeva, 1999, p. 256) 414 Por que ler Roman Jakobson na atualidade Bethania Mariani diferenças, entretanto, para Holenstein, Jakobson deve a Husserl “a primeira formulação das leis gerais válidas para a unidade estrutural.” (HOLENSTEIN, 1978, p. 11 e 12). Como afirma Jakobson: Se quiséssemos caracterizar sucintamente o pensamento diretivo da ciência atual nas suas mais variadas manifestações, não encontraríamos expressão mais adequada que estruturalismo. Cada conjunto de fenômenos examinado pela ciência atual é considerado não uma reunião mecânica, mas uma unidade estrutural, um sistema, e a tarefa fundamental é descobrir as suas leis intrínsecas  tanto estáticas como dinâmicas. Não é a impulsão externa, mas as condições internas da evolução, não é a gênese sob a sua aparência mecânica, mas a função, que estão no centro do interesse científico atual. (JAKOBSON, 1929, semanário Cin, “A Ação”, de Praga, apud HOLENSTEIN, 1978, p. 9) Entre 1939 e 1941, durante a segunda guerra mundial, tem lugar a grande fuga de intelectuais através da Dinamarca, da Noruega e da Suécia até os Estados Unidos. Essa fuga foi empreendida por Jakobson e outros notáveis de sua época que deixaram para trás a barbárie nazista e constituíram novas polêmicas, novos paradoxos em torno da noção de língua e da nova ordem político-econômica mundial que então se organizava. A “grande diáspora” provocada pela segunda guerra mundial, que materializa “a figura do intelectual imigrante”, nos dizeres de Pêcheux (2004, p. 121), marca essa entrada de intelectuais eslavos, germânicos, austríacos e franceses na corrente do liberalismo anglo-saxão, o qual, opondo-se ao fascismo e ao stalinismo, “parecia ignorar os controles minuciosos das opiniões e a regulamentação patrulhadora do pensamento…” (PÊCHEUX, 2004, p. 121). Jakobson se estabelece em Nova York em junho de 1941, vai dar aulas na École Libre des Hautes Études e, posteriormente, na Universidade de Columbia. Em pouco tempo vai se juntar ao grupo de intelectuais que funda, em 1943, o Círculo Linguístico de Nova York. Na École, Jakobson deu aulas sobre linguística geral e, em Colúmbia, pronuncia suas famosas conferências sobre “o som e o sentido” (texto publicado anos mais tarde, em 1976). Tais conferências foram proferidas “no último trimestre de 1943 e no primeiro de 1944” e atraíram 415 Polifonia, Cuiabá, MT, v. 22, n. 31, p. 407-430, janeiro-junho, 2015 e influenciaram numerosos scholars, dentre eles, Lévi-Strauss e Mattoso Câmara (ALTMAN, 2004). A partir de 1945, o Círculo passa a publicar a revista Word e Jakobson faz parte do núcleo editorial. “O primeiro número é, aliás, uma condensação do programa estruturalista, pois trata das aplicações da análise estrutural em Linguística e em Antropologia.” (DOSSE, 1993, p. 79). Alguns anos mais tarde ele leciona em Harvard e, dezesseis anos após sua entrada nos Estados Unidos, se estabelece como primeiro cientista no M.I.T. Nessa permanência em terras americanas podem ser assinalados alguns fatos notáveis. Um deles, como já se mencionou, foi o contato que se estabeleceu inicialmente entre Jakobson e Lévi-Strauss, e posteriormente com Lacan (em 1950). Também chama atenção o fato de Jakobson ter sido professor de Chomsky e Halle em Harvard. Embora Chomsky tenha sido um crítico feroz do estruturalismo pós-bloomfieldiano, sua postura foi mais respeitosa relativamente à vertente europeia. São suas as palavras: Pessoalmente aprendi muito com esse estruturalismo europeu, particularmente com Roman Jakobson, que foi meu mestre e é um amigo muito dileto; não preciso lembrar quanto essas contribuições permanecem essenciais. (CHOMSKY, 1972, p. 64, apud HOLENSTEIN, 1978) Os anos americanos foram marcados também por encontros interdisciplinares como, por exemplo, com Luria, um neurologista pesquisador de afasias. No campo filosófico, os biógrafos de Jakobson destacam Peirce e Quine como interlocutores privilegiados. A influência do pensamento de Jakobson se mantém presente ainda hoje, como veremos a seguir. 2. Deslocamentos teóricos Destacaremos, particularmente, a investigação de Jakobson sobre as noções de ato linguístico e funções da linguagem, sincronia dinâmica e variabilidade do sistema significante, bem como sobre o eixo metaforonímico. 416

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Seria esse o caso do linguista russo Roman Jakobson, nascido em 1896, em Moscou, um .. em 1919, escrevi, num artigo dedicado ao futurismo: “a.
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