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Pessoa e Direito, Corpo e Ciência PDF

180 Pages·2008·12.45 MB·Portuguese
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Universidade de Brasília Instituto de Ciências Sociais Departamento de Antropologia Social Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social Pessoa e Direito, Corpo e Ciência: negociando significados e preceitos cosmológicos em torno da legalização do aborto Dissertação apresentada como requisito para a obtenção do grau de mestre em Antropologia Social ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS) da Universidade de Brasília (UnB), sob orientação da Profª Drª Lia Zanotta Machado Anna Lúcia Santos da Cunha Brasília, 2007 Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade de Brasília (PPGAS-UnB). Dissertação defendida em 10 de setembro de 2007. Banca Examinadora: Profª Drª Lia Zanotta Machado, DAN/UnB (orientadora) Profª Drª Carla Costa Teixeira, DAN/UnB Profª Drª Debora Diniz, SER/UnB Profª Drª Lourdes Maria Bandeira, SOL/UnB (suplente) 1 Resumo Nesta dissertação, acompanho o processo de formulação de um anteprojeto de lei relativo à legalização do aborto, o seu encaminhamento ao Congresso Nacional brasileiro e incorporação ao PL 1135/91 nos anos de 2005 e 2006. A partir da etnografia das duas principais fases desse processo – a) as reuniões da Comissão Tripartite de Revisão da Legislação Punitiva do Aborto e b) a arena de discussão do projeto na Câmara dos Deputados – examino como foram mobilizados os discursos científicos e jurídicos nas deliberações públicas sobre os significados de corpo e pessoa, categorias que participaram ativamente nas construções simbólicas tecidas em torno da interrupção da gravidez. Palavras-chave: aborto; corpo; pessoa; gênero; revisão legislativa; Congresso Nacional. Abstract In this dissertation it was analyzed a bill project related to the legalization of abortion, its conduction in the Brazilian Federal Congress and incorporation to the 1135/91 Legislative Project in 2005 - 2006. Based on the ethnographic research of the two phases of this process – a) public hearings of the Comissão Tripartite de Revisão da Legislação Punitiva do Aborto and b) the arena of discussions of the bill in the House of Representatives – it was examined how the scientific and juridical discourses were mobilized in public deliberations and the meanings given to the categories of body and personhood, which actively participated in the symbolic constructions made about the voluntary interruption of pregnancy. Keywords: abortion; body; personhood; gender; legal revision; Brazilian Federal Congress. 2 A Inácia e Murilo, meus pais, dedico. Por terem acompanhado meus caminhos. 3 Agradecimentos Aos meus pais, pelo carinho e apoio, e ao meu pai, em particular, também pelos preciosos recortes de jornais sobre temas relacionados à pesquisa. Ao Bruno e à Carolina, por nossa querida convivência, desde sempre, e à Ju Pagul, a mais nova adepta da confraria e parceira de risadas. Ao Guilherme, companheiro terno e amoroso, por me surpreender a cada dia. A ele devo também grandes contribuições ao registro visual deste estudo. À Fátima e ao Oswaldo e às pequenas Luísa e Sara, pelos intensos momentos de alegria. Aos amigos queridos, Juliana e Raphael, pela presença carinhosa e colaboração “material” para este trabalho. A todos os companheiros do “nosotros y mayor” por todas as aventuras e, em especial, a Gustavo, Mariana(s) e Anne. Aos amigos da Katacumba, Sônia, Sílvia, Priscila, André, Róder, Dideus, Marcel, João Marcelo, Moisés, Carmela, Letícia, Rosana, Odilon, Cristina, Luís, Carlos Alexandre, Bárbara, Marianna, Rogério, sou grata pelo convívio e amizade durante todo este percurso. Ao Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher (NEPeM), fundamental à minha formação em Antropologia do Gênero e Antropologia da Saúde. Ao Grupo de Estudos de Gênero Florbela Espanca e ao coletivo Corpus Crisis, por lançarem dúvidas sobre certezas e fomentarem descaminhos contínuos. Aos integrantes do projeto RLA5P201 do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), pela valiosa experiência na trilha dos direitos humanos e, em particular, a Ralph Hakkert, pelo grande aprendizado. À professora Lia Zanotta Machado, minha orientadora, por seu rigor intelectual, por suas leituras agudas e pela generosidade e confiança dispensadas. Às professoras Carla Costa Teixeira e Debora Diniz, por aceitarem compor a banca, na busca de uma reflexão dialógica. Aos professores do Departamento de Antropologia e, em especial, a Antonádia Borges, Ellen Woortmann, Luís R. Cardoso de Oliveira, Paul E. Little, Rita Segato e Wilson Trajano Filho, pelos ricos ensinamentos e referências. À Adriana e Rosa, pela competência exemplar e atenção. Ao CNPq, pelo apoio financeiro. Aos participantes desta pesquisa e a todos aqueles que, de forma direta ou indireta, contribuíram para a sua realização. 4 Sumário Introdução ...................................................................................................................................8 Capítulo 1 Socionaturezas e corporalidades ..............................................................................................20 1.1. Sobre o dualismo natureza/cultura..................................................................................21 1.2. Antropologia, corporalidades e gênero ..........................................................................29 Capítulo 2 O aborto no Brasil: percursos históricos e a formação da Comissão Tripartite..................32 2.1. Aborto e contracepção na virada do século XX .............................................................32 2.2. Do Estado Novo à Nova República ...............................................................................37 2.3. A emergência da Comissão Tripartite e a busca de incidência política .........................45 Capítulo 3 “No sentido molecular, essa lei não vale a pena”: guerra de biociências, guerra de imagens....55 3.1. O cenário da audiência pública ......................................................................................58 3.2. A expertise e a Ciência ..................................................................................................63 3.3. A natureza como árbitro .................................................................................................68 3.4. Guerra de imagens .........................................................................................................75 3.5. Dissidências ...................................................................................................................91 3.6. Geradores de verdades ...................................................................................................97 Capítulo 4 Jogos hermenêuticos: a participação do corpo jurídico ......................................................102 4.1. O Direito e a escritura ..................................................................................................105 4.2. Os direitos individuais e a família como um bem jurídico...........................................118 Capítulo 5 Corpo e Pessoa: deslizes semânticos ......................................................................................130 5.1. A noção de pessoa na Antropologia .............................................................................131 5.1.1. Corpo e pessoa na Amazônia indígena .....................................................................133 5.1.2. Indivíduo-em-relação-com-Deus: a noção de corpo e pessoa no Cristianismo.........135 5.1.3. Corpo, alma e os novos discursos científicos sobre o DNA..................................... 137 5 5.2. O debate no parlamento ...............................................................................................140 5.2.1. Perspectivas contrárias ao projeto de lei....................................................................140 5.2.2. Perspectivas favoráveis ao projeto de lei...................................................................154 5.2.3. A Comissão Tripartite ...............................................................................................158 Considerações Finais ...............................................................................................................164 Referências Bibliográficas ......................................................................................................169 Glossário de Siglas ...................................................................................................................178 6 Não há mundo pronto para ser visto, um mundo antes da visão, ou antes, da divisão entre o visível (ou pensável) e o invisível (ou pressuposto) que institui o horizonte de um pensamento. Eduardo Viveiros de Castro 7 Introdução “Nós estamos tratando de um assunto nobre. Talvez o mais nobre desta Casa”. As palavras do deputado Osmânio Pereira (PTB-MG)1 nos convidam a imergir e embrenhar nas práticas discursivas que rondam o tema do aborto no poder público brasileiro, incitando-nos a apreender os significados envolvidos no domínio da reprodução e as construções simbólicas sobre o corpo tecidas no fazer político. O presente estudo dedica-se a acompanhar a elaboração e condução ao parlamento de um projeto de lei sobre a interrupção da gravidez, seguindo basicamente o recorte temporal dos anos de 2005 e 2006. Os debates travados nesse período foram marcados por enérgicas movimentações e congregaram deputados de orientações partidárias diversas, técnicos especialistas e atores da sociedade civil. A análise aqui empreendida parte fundamentalmente da etnografia das duas principais fases desse processo: as reuniões da Comissão Tripartite de Revisão da Legislação Punitiva do Aborto e as plenárias de discussão na Câmara dos Deputados. Embora a temática do aborto não fosse inédita a esta instância – haja vista que o pré-projeto formulado pela Comissão Tripartite foi incorporado ao PL 1135/912, que à época tramitava há quase 15 anos – buscou-se apreender os termos e as condições atuais do debate. A moderna configuração das discussões evidenciou, em verdade, caracteres singulares. Com efeito, se a biopolítica da qual já nos falava Foucault (1991, 1999a, 1999b) tornou-se um traço geral incorporado pelas instâncias governistas, uma aproximação cada vez mais acirrada entre o domínio jurídico-normativo e as Biociências e a Bioteconologia passou a ser verificada também nos projetos de lei sobre o aborto. Em tal contexto, categorias e argumentos novos ou antigos foram trazidos segundo a roupagem dos saberes técnicos, assistindo-se a uma relação peculiar entre os congressistas e a expertise e que remeteu a uma “arte de governar” caracterizada pela acentuada oscilação entre Medicina, Direito e política, entre determinação médica e resolução legal. A vida pública incorporou, assim, uma delimitação de campos autorizados à fala, os quais se fizeram representar, para além de parlamentares e ativistas sociais, pelos sistemas de técnicos e peritos. Por outro lado, discursos 1 Em 22/11/2005, na Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF) da Câmara dos Deputados. 2 O PL 1135/91 foi apresentado pelos deputados Eduardo Jorge (PT-SP) e Sandra Starling (PT-MG), em 28/05/91, e propunha a descriminalização do aborto. 8 tradicionais foram mobilizados nas estratégias de incidência legislativa, ajustando-se às prescrições dos saberes disciplinares ou, ainda, desordenando suas fronteiras discursivas. A acirrada disputa pelo estabelecimento dos sentidos relativos ao corpo e à interrupção da gravidez configurou-se como um terreno perpassado por linhas de força que se chocaram e se penetraram nas mais diversas coordenadas, confirmando, pois, que conceitos técnico-científicos são igualmente conceitos políticos. Em convergências e intensidades dispersivas, preceitos cosmológicos3 particulares foram contrapostos de acordo com um cenário que de certa forma obrigou à interlocução e negociação. Nesse sentido, grande parte da pesquisa realizada, especialmente no que tange aos debates oficiais no Congresso Nacional, apresentou um enfoque na participação dos especialistas – um traço sinalizado, por sua vez, pelo campo etnográfico. Mais do que a perspectiva de uma “lei acabada”, que pode sugerir contornos sólidos e organizados, privilegia-se aqui a perspectiva de uma “lei em construção”, um processo caracterizado por irresoluções, indeterminações e impasses. Ao se enfatizar esse caráter processual, procura-se considerar os esforços incidentais de ambos os lados, sem a prerrogativa dos desfechos últimos e desenlaces retrospectivos. Volta-se a atenção justamente para o curso de realização dos empreendimentos, vivenciado pelos atores envolvidos como uma trajetória de movimentos incertos em um espaço aberto ao porvir. Nesse jogo, as disposições de força não se apresentaram claramente definidas, nem demarcadas por posições estáveis e permanentes, caracterizando-se, em contrapartida, por escolhas obscuras e riscos que deveriam ser laboriosamente coordenados na definição dos caminhos a serem traçados. O estudo não trata, portanto, de discorrer sobre os motivos pelos quais o projeto de lei foi ou não aprovado ou as razões pelas quais um grupo converteu-se em “vencedor” ou “perdedor” no conflito legislativo, mas de compreender quais eram as categorias em jogo e as formas pelas quais tais categorias foram interpretadas e estrategicamente acionadas na questão do aborto. O interesse recai, assim, sobre os recursos discursivos movimentados tanto por aqueles que se opunham à legalização da 3 Os termos cosmologia e ontologia, embora estejam fortemente associados ao campo filosófico e à metafísica, são aqui empregados no sentido antropológico proposto por Philippe Descola (2005). Nesse quadro teórico, as ontologias referem-se a sistemas de distribuição de propriedades auferidas aos “existentes”; as cosmologias, por sua vez, integram essa distribuição de propriedades em uma organização do mundo – sem que se suponha uma sistematização plena – no seio da qual “existentes” estabelecem certos tipos de relação. Parte-se do princípio de que qualquer fala cultural/social sobre os atributos dos seres e organismos está inserida em cosmologias nativas. 9

Description:
minha formação em Antropologia do Gênero e Antropologia da Saúde. Antropologia Social, as mobilizações em torno da legalização do aborto
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