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Pensamento eurocêntrico, modernidade e periferia PDF

221 Pages·2009·1.13 MB·Portuguese
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA SOCIAL JOSÉ HENRIQUE BORTOLUCI Pensamento Eurocêntrico, Modernidade e Periferia: Reflexões sobre o Brasil e o Mundo Muçulmano São Paulo 2009 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA SOCIAL Pensamento Eurocêntrico, Modernidade e Periferia: Reflexões sobre o Brasil e o Mundo Muçulmano José Henrique Bortoluci Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História Social do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, para a obtenção do título de Mestre em História. Orientador: Prof. Dr. Peter R. Demant São Paulo 2009 2 BORTOLUCI, José Henrique. Pensamento Eurocêntrico, Modernidade e Periferia: Reflexões sobre o Brasil e o Mundo Muçulmano. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História Social do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, para a obtenção do título de Mestre em História. E-mail: [email protected] Aprovado em: Banca Examinadora Prof. Dr. ____________________________ Instituição:_______________________ Julgamento: _________________________ Assinatura: ______________________ Prof. Dr. ____________________________ Instituição:_______________________ Julgamento: _________________________ Assinatura: ______________________ Prof. Dr. ____________________________ Instituição:_______________________ Julgamento: _________________________ Assinatura: ______________________ 3 O Haiti é aqui O Haiti não é aqui Caetano Veloso e Gilberto Gil A partir das margens ou das periferias, as estruturas de poder e de saber são mais visíveis. Boaventura de Sousa Santos 4 Resumo BORTOLUCI, J. H. Pensamento Eurocêntrico, Modernidade e Periferia: Reflexões sobre o Brasil e o Mundo Muçulmano. 2009. 221 f. Dissertação (Mestrado). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. Na recente literatura em Ciências Sociais, o paradigma eurocêntrico da modernidade vem sofrendo ataques de diferentes naturezas. Entretanto, esse paradigma ainda fornece as categorias e formas de pensar hegemônicas para a análise sobre a modernidade e os obstáculos a ela, em sociedades periféricas. Este trabalho busca analisar o “setor sociológico” de uma estrutura de atitudes e referências eurocêntricas e as apropriações deste para a reflexão sobre os dilemas da modernidade, no Brasil e nas sociedades muçulmanas. A partir disso, busca-se avançar na crítica a esse paradigma eurocêntrico, por meio de um diálogo interparadigmática pós-colonial – este entendida como um programa de estudos críticos à modernidade, elaborado a partir de um ponto de vista periférico. Por fim, pretende-se mostrar que uma série de elementos dessas abordagens anti- eurocêntricas estão presentes em análises históricas e sociológicas acerca da modernidade no Brasil e nas sociedades árabes e muçulmanas. Palavras-Chave: Modernidade. Eurocentrismo. Periferia. Brasil. Mundo Muçulmano. Abstract BORTOLUCI, J. H. Eurocentric Thought, Modernity and Periphery: Reflections on Brazil and the Muslim World. 2009. 221 f. Dissertação (Mestrado). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. The Eurocentric paradigm of modernity has been suffering several kinds of attacks in the recent literature of Social Sciences. Nevertheless, such paradigm still provides the hegemonic categories and structures of thought for the reflection about modernity and the obstacles imposed to it in peripheral societies. This work intends to analyze the “sociological sector” of a eurocentric structure of attitudes and references, and the appropriations of such structure for reflections about the dilemmas of modernity, in Brazil and in Muslim societies. Furthermore, it intends to advance a criticism about that eurocentric paradigm, by means of an inter- paradigmatic postcolonial dialogue – such a dialogue understood as a programme of critical studies on modernity, formulated from a peripheral point of view. Finally, this work tries to demonstrate that many elements of those anti-eurocentric approaches are present in historical and sociological analysis about modernity in Brazil and in Arab and Muslim societies. Keywords: Modernity. Eurocentrism. Periphery. Brazil. Muslim World. 5 SUMÁRIO Agradecimentos...................................................................................................7 Introdução..........................................................................................................10 1. Formas e categorias do pensar eurocêntrico................................................15 Orientalismo e Eurocentrismo......................................................................15 Uma teoria do poder: a tradição do “Despotismo Oriental” ...........................31 Racionalização e conduta de vida metódica ................................................41 Internalismo culturalista e “história imóvel”...................................................46 2. Pensamento Eurocêntrico e os dilemas da modernidade no Brasil e nas sociedades árabes e muçulmanas.....................................................................52 Eurocentrismo e o Mundo Árabe e Muçulmano............................................56 Discursos eurocêntricos e o desafio do moderno no Brasil............................80 Eurocentrismo e periferia ..........................................................................103 3. Modernidade, crítica ao eurocentrismo e o problema da modernidade periférica...........................................................................................................107 Elementos da razão eurocêntrica...............................................................107 Modernidade e Ocidente............................................................................115 Uma tentativa de inserir a diversidade: a abordagem das múltiplas modernidades...........................................................................................123 Para além das Múltiplas Modernidades: diálogos teóricos por uma teoria crítica da modernidade a partir da periferia.................................................135 4. As sociedades árabes e muçulmanas: modernidade periférica como simbiose do arcaico e do moderno..................................................................158 5. Marxismo dialético brasileiro e a busca da especificidade da modernidade periférica...........................................................................................................176 Considerações Finais.......................................................................................204 Bibliografia.......................................................................................................210 6 Agradecimentos A imagem mais corriqueira que se tem de um pesquisador na área de Ciências Humanas – mesmo daquele que apenas começa e engatinhar por essa vida – é uma imagem de solidão: as longas horas em frente a um amontoado de livros, textos e notas, em uma biblioteca ou gabinete, com a companhia discreta da quinta ou sexta xícara de café do dia. Essa imagem, reveladora de um comportamento comumente entendido como adequado, parece ser o índice de validade do trabalho desse pesquisador: uma vez que não dispomos de laboratórios onde podemos aplicar e replicar nossos experimentos, o trabalho constante e solitário aparece como um dos únicos garantidores de que aquela pesquisa é algo sério e não um desperdício de tempo com diletantismo vazio. Esse sentimento de mergulho solitário deve marcar, creio eu, a experiência da maioria dos que se iniciam pelas bandas da pesquisa. Aprendemos desde o início que os prazos devem ser cumpridos, que só se dá conta da bibliografia com trabalho obstinado, que temos que delimitar nossos objetos (que terror...) e que a dissertação não se escreve da noite pro dia. Vamos aprendendo, como dizia o mestre Florestan Fernandes, que ciência é trabalho – e trabalho duro. Contudo, essa imagem do aprendiz de pesquisador solitário, mergulhado em seus livros, esconde uma realidade fundamental: só é possível pensar, produzir e crescer coletivamente. Se o trabalho individual e constante tem uma importância crucial – e é evidente que ele tem –, estou muito seguro de que ele só ganha sentido quando serve como maneira de sintetizar vivências e aprendizados que são coletivos. Entendo este trabalho como a síntese dessas muitas experiências coletivas de que tive a felicidade de fazer parte, sobretudo nos últimos seis anos de minha vida, desde que ingressei no curso de Relações Internacionais, na Universidade de São Paulo. Ali, pude conhecer pessoas excepcionais e participar de inúmeros espaços de formação. Com essas pessoas e nesses espaços, aprendi, entre tantas outras coisas, que a vida intelectual só vale a pena se ela aponta para um processo de humanização que vá muito além de uma aquisição individual de habilidades, conhecimentos ou títulos. Uma humanização que parte de uma insatisfação brutal com o estado de coisas e com a mais do que comum passividade acadêmica frente 7 a elas; mas que entende que apenas com uma prática política e dialógica constante pode-se tentar chegar – coletivamente, mais uma vez – a um mundo em que todos tenham a chance de transpor a fronteira entre o “ser e o ser mais”, nas palavras de Paulo Freire. Muitos me acompanharam neste breve percurso, até aqui. Agradeço, inicialmente, ao Professor Peter Demant – meu orientador desde 2003, quando comecei meu primeiro projeto de iniciação científica. Sua dedicação ao meu desenvolvimento acadêmico foi de importância fundamental. Além disso, agradeço pelo seu humanismo e sua capacidade de discordar respeitosamente, sem nunca ter expressado nenhuma exigência de que seus pontos de vista e opiniões determinassem, por menos que fosse, minhas conclusões. Os professores Paulo Daniel Farah e Gildo Marçal Brandão, membros de minha banca de qualificação, desempenharam um papel muito importante para a elaboração deste trabalho. Também tive o prazer e a oportunidade de cursar, no meu primeiro semestre de mestrado, uma disciplina sobre o pensamento político brasileiro com o professor Gildo, fundamental em uma fase em que os problemas aqui apresentados estavam ainda em uma primeira etapa de maturação. Agradeço também aos professores Bernardo Ricupero, Jessé Souza e Sérgio Costa, com quem tive a oportunidade de discutir alguns dos temas aqui apresentados, em diferentes ocasiões. Agradeço à Fapesp pelo financiamento desta pesquisa, entre março de 2007 e fevereiro de 2009. Aproveito para agradecer imensamente a cada uma das pessoas que me auxiliaram ao longo destes anos, para que minha formação universitária fosse possível ou menos penosa – em particular ao meu primo Geraldo, ao meu tio Carlos, aos Srs. Baltazar S. Parra e Durval Mangilli, e à família Watanabe. Agradeço a cada aluno com quem dividi uma sala de aula na Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP), onde tive a satisfação de lecionar ao longo destes dois anos e meio, principalmente no Bacharelado em Relações Internacionais. Agradeço igualmente aos meus colegas naquela instituição, em particular aos coordenadores do Bacharelado, Cláudia e Glauco, pelas oportunidades e pelo companheirismo. 8 A lista de amigos que me acompanharam até aqui é muito grande, e certamente há um pouco de cada um deles neste trabalho. Não irei nomeá-los um a um – já que com isso corro o sério risco de me esquecer de pessoas fundamentais –, mas apenas lembrar de algumas pessoas que estiveram comigo em momentos e espaços fundamentais. Agradeço aos meus colegas da turma de 2006 do Bacharelado em Relações Internacionais: são tantas as pessoas entre estas por quem sinto carinho e gratidão, que tenho apenas a lamentar que nossos encontros sejam cada vez mais raros. Aos grandes amigos de Jaú, meu recanto, responsáveis por muito do que sou – e por continuarem sendo pessoas tão especiais. Sou eternamente grato aos meus grandes amigos da “Veredas” – em particular aos muito queridos Tassia, Ernesto, Fatah, Talita e Sarah –, companheiros de gestão Centro Acadêmico de Relações Internacionais no ano de 2004, com quem pude ir vivenciando um “sentimento do mundo”, desde então. Sentimento esse que foi explorado, aprofundado e recriado pelos amigos da “Terceira Margem” – é uma felicidade conviver com pessoas brilhantes e especiais como o Gabriel, a Andreza, o Léo, o Thiago, o Sérgio, a Cris, a Nádia, a Lu e, de forma especial, o Jonas e o Caio – amigos sinceros, a quem tanto devo. Participei, com muitos desses e outros amigos e companheiros, de um grupo de estudos sobre teorias do imperialismo e sociologia paulista, ao longo dos últimos dois anos. Talvez não seja preciso dizer que este trabalho tem uma dívida imensa com todos esses “imperialistas” – sobretudo o capítulo 5, que é fruto direto de nossas discussões conjuntas. Ao João Paulo, responsável por momentos quase diários de alegria – um amigo precioso, de quem tenho a imensa sorte de ser irmão. À Melina, por me tornar alguém melhor e renovar minhas esperanças a cada dia – vamos de mãos dadas. Aos meus pais, meus grandes mestres, Dirce e José (Didi) – a quem humildemente dedico este trabalho. A eles, devo absolutamente tudo. 9 Introdução Na capa da edição 2047 da revista Veja, de 13 de fevereiro de 2008, somos confrontados com uma imagem que, a princípio, deixa pouco espaço para dúvidas e exige poucos esforços de raciocínio. Vemos ali uma espécie de gênio da lâmpada, ou um sultão brasileiro. O membro da “elite burocrática” do governo federal – como indica a manchete – flutua em seu tapete voador, este estampado como um cartão de crédito. Em sua cabeça, um turbante: 10

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