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Pensadores Que Inventaram O Brasil PDF

234 Pages·2013·4.44 MB·Portuguese
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Sumário Apresentação Joaquim Nabuco Uma síntese Um olhar sul-americano Joaquim Nabuco democrata Euclides da Cunha Canudos: o outro Brasil Paulo Prado Fotógrafo amador Gilberto Freyre Casa-grande & senzala, clássico Gilberto Freyre, perene Sérgio Buarque de Holanda Brasil: as raízes e o futuro Caio Prado Jr. A história e seu sentido Antonio Candido Um ex-aluno A fome e a crença: sobre Os parceiros do Rio Bonito Florestan Fernandes A paixão pelo saber Florestan, cientista Uma pesquisa impactante Celso Furtado O descobrimento da economia A propósito de Formação econômica do Brasil Raymundo Faoro Um crítico do Estado: Raymundo Faoro Epílogo Livros que inventaram o Brasil Posfácio, José Murilo de Carvalho Notas Cronologia de obras citadas Créditos das imagens Apresentação Este livro contém ensaios e pequenos esboços que escrevi sobre autores que se dedicaram a explicar a “formação do Brasil”. Alguns destes escritos datam de 35 anos atrás. Nesta categoria estão os perfis publicados na revista Senhor Vogue, em 1978. Outros, mais recentes, são inéditos na forma em que os publico agora. Entre estes estão ensaios sobre Joaquim Nabuco, Gilberto Freyre e Raymundo Faoro. Este último foi escrito especialmente para este volume; os outros dois são textos que serviram de base para conferências que fiz, respectivamente, na Academia Brasileira de Letras em março de 2010 e na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) em agosto do mesmo ano. Os demais capítulos compõem-se de introduções para a edição de livros de alguns autores ou de homenagens prestadas a outros que foram posteriormente enfeixadas em livros. O “Epílogo” é a transcrição revista de aula, que dei em novembro de 1993, aos alunos do Instituto Rio Branco, quando era ministro das Relações Exteriores. O leitor perceberá que aqui e ali há repetição de argumentos e que a extensão e a cadência dos diversos capítulos não é a mesma. Não me servi de texto previamente escrito quando se tratava de prestar homenagem a pessoas com as quais convivi e que me influenciaram. Os textos ora publicados são transcrições de exposições orais, revistos e aprimorados. Por isso, o tom é mais coloquial, mais familiar, notadamente nos capítulos sobre Antonio Candido (“Um ex- aluno”) e Florestan Fernandes (“A paixão pelo saber”). Sobre estes mesmos autores há outros capítulos relativos a suas contribuições acadêmicas. Nestes adoto um estilo mais convencional. Os ensaios sobre Nabuco, Freyre e Faoro têm o tom acadêmico habitual neste tipo de trabalho. Daí por que ao proferir as conferências sobre os dois primeiros não os tenha lido. São maçudos e longos, portanto cansariam os ouvintes. Mesmo alguns textos que foram lidos (as circunstâncias de ser presidente da República dificultavam, por exemplo, digressões orais nas comemorações do sesquicentenário de Nabuco), não garanto que os haja pronunciado na forma em que ora são publicados. Sou mau “ledor” e gosto de entremear as leituras com observações mais espontâneas. Sempre tive inveja de quem tem a capacidade de escrever textos e de os ler como se fossem peças de teatro representadas por atores. Mais de uma vez me referi às experiências que tive no ano que passei como visiting professor em Cambridge, uk, quando ouvi magníficaslectures, como a de um professor do King’s College, Edmund Leach, intitulada “Once a knight, is quite enough”, que tive a oportunidade de escutar novamente quando ele a repetiu em Princeton. Não tenho talento para tanto, daí que escreva uma coisa, diga outra e, ao rever, publique uma terceira versão do mesmo texto de base. Por circunstâncias geracionais e entrecruzamento de vida me beneficiei do contato direto com vários dos autores cujas obras comento neste livro. É o que ocorre com Florestan Fernandes, meu professor e de quem fui assistente antes de sermos colegas e vizinhos de rua, assim como com Antonio Candido, também professor e mais tarde colega. Nos capítulos em que os homenageio tento transmitir algo das impressões que ambos me causaram. Tive a ventura de estar com Celso Furtado nos breves meses em que ele trabalhou na Cepal depois do golpe de 1964, quando moramos na mesma casa em Santiago e, mais tarde, de conviver com ele nos períodos em que coincidiu estarmos juntos em Paris no final dos anos 1960 e na década de 1970. Continuamos a manter relações próximas na década de 1980, quando Celso foi ministro da Cultura do governo Sarney e eu era senador. Com Caio Prado convivi no final dos anos 1950 e inícios da década seguinte, quando ele era o inspirador da Revista Brasiliense, na qual eu colaborava, sem falar em nossas desventuras de militância ao redor do Partidão. Já com Sérgio Buarque de Holanda, embora tivesse menos convivência, conheci- o o suficiente para admirá-lo e para me ter beneficiado de suas críticas nas duas vezes em que formou parte da banca que me examinou no doutorado e no concurso de cátedra. Aliás, também Florestan foi, além de incentivador, meu examinador em teses acadêmicas, e o mesmo posso dizer de Caio Prado, que, como Sérgio, fez parte da banca de meu doutorado. Com muito menor familiaridade posso também dizer que vi de perto o jeito, mais do que o pensamento, de Gilberto Freyre e de Raymundo Faoro, do primeiro nas poucas vezes que fui a Recife ou nas ocasiões em que, estando ele em São Paulo, pudemos conversar, e do segundo quando da militância contra o regime autoritário. Apesar da relativa familiaridade com os autores que comento neste livro, não posso dizer que pertenço à mesma geração deles. Antes fui beneficiário das suas descobertas, intuições e análises. Euclides da Cunha, assim como Paulo Prado, sem falar de Nabuco, deram suas contribuições em épocas anteriores, mas não deixam de formar parte da mesma “tradição cultural” dos demais autores mencionados. Em que sentido eles formariam parte da mesma tradição e até que ponto minha geração participa de outro momento cultural? Basicamente o que une os autores referidos é a preocupação em analisar a “formação do Brasil”. Esta obsessão vem de longe, ela data do período da Independência. Aparece nitidamente em José Bonifácio quando, em vez de se considerar “português” ou “paulista” — assim como aconteceu com frei Caneca, “pernambucano” —, passou a se considerar brasileiro e tentou compreender o que nós, brasileiros, somos; ou melhor, como fazer de todos, inclusive dos escravos, parte da mesma nação. E acaso Nabuco não estava lutando para que se desse ao liberto e ao escravo a condição de cidadãos da mesma nação? A questão nacional daí por diante ocupa a cena central nas reflexões dos pensadores que inventaram o Brasil, embora, a bem dizer, tenha sido o povo quem o criou. Os intelectuais passaram a refletir no que consistia esta nação, como ela se situava no mundo, como se dividia em classes, etnias e culturas, como seria possível argamassá-las no mesmo conjunto histórico, e no futuro que teria o Brasil no contexto das demais nações. Foi no horizonte cultural da questão nacional que os demais temas se foram afirmando. Ora a questão da sociedade nacional é vista pelo seu revés, quando, por exemplo, Euclides descobre o sertanejo, que é “um forte”, mesmo que refratário ao Estado nacional, à República, ou quando Antonio Candido desenha os mínimos de sociabilidade dos caipiras que quase se esfumam do conjunto nacional; ora são outras as vertentes que compõem o quadro do país. Por exemplo, quando Florestan se esforça por entender a “desagregação da ordem escravocrata” e a formação da sociedade livre e da economia competitiva, ou quando Freyre esboça seus murais que vão da casa-grande e senzala até aos sobrados e mocambos, sempre na procura de dar sentido à nossa ordem e ao nosso progresso. Por certo, no contexto da formação nacional o tema Estado-burocracia- corporação versus sociedade civil e mercado se destaca como uma das preocupações centrais dos que querem entender como se forma a nação. Uns creem que a alavanca é o Estado, outros, que são as classes. Os dois lados, entretanto, convergem para um ponto: trata-se de afirmar um país, uma nação. Afirmar pelo que há de genuinamente nosso ou foi assimilado por nós e nos diferencia como povo e como cultura; afirmar-nos em contraposição aos “outros”. O perigo vem de fora, seja sob o manto da exploração econômica e mesmo do imperialismo, seja pelos riscos do cosmopolitismo e da ocidentalização cultural. Caio Prado, escrevendo sobre o período colonial, colocara uma questão fundamental: a Colônia existiu em conexão com a expansão do capitalismo comercial e mesmo como consequência desta. Não se deve pensá-la, portanto, à margem de condicionantes que ultrapassam suas fronteiras. O latifúndio e a escravidão marcam as características do período, mas o sentido da colonização não se esgota nas bases sociais locais da exploração econômica, na escravidão e na concentração da propriedade. Ele só se completa e ganha inteligibilidade quando remetido à questão mais geral das relações com a Metrópole. Celso Furtado, muito mais tarde, no período de obsessão nacional-desenvolvimentista, quando a nação já existia, vai dar sequência a esta visão: se quisermos romper os laços da dominação internacional e se quisermos superar o “atraso”, teremos de entender a dinâmica dos mercados internos, suas possibilidades de superação do status quo e suas limitações, mas no quadro internacional. Ao analisar estes aspectos, Celso vai reafirmar o que outros haviam indicado: as bases econômicas e sociais do condicionante local eram estreitas para aceder ao capitalismo dos “grandes”. A referência ao local não se esgota em si mesma, requer o rebatimento no outro polo, o externo. De toda maneira, a temática continua girando ao redor da questão nacional, consistindo em ver como criar no polo negativo da relação externo-interno, isto é, no interno, força suficiente para alavancar, catapultar mesmo, o país para o “Centro”. Essas eram as grandes questões dos pensadores que inventaram o Brasil. Ocorre que o Brasil desses pensadores já fora “inventado”, prática e intelectualmente, quando minha geração começou a se debruçar sobre as formas da sociedade brasileira, suas conexões internacionais e seus novos desafios. O horizonte intelectual-ideológico da “questão nacional”, de certa maneira, se havia esgotado. Pusemo-nos a escarafunchar e a detalhar a classe operária, a urbanização, os empreendedores capitalistas (burgueses?), a cultura de massas, os “marginais” — os excluídos — no campo e na cidade, os militares, as corporações multinacionais, enfim, o novo panorama do país. Mais ainda, com o autoritarismo militar não só o tema da sociedade civil com suas ongs, igrejas renovadas e opinião pública reprimida, mas a própria questão democrática (que aparece escassamente nos autores anteriores, sendo Sérgio Buarque a mais notável exceção, embora não a única) passam a competir com a paixão preexistente por entender a questão nacional. Já não bastava repetir o mote do subdesenvolvimento econômico, havia que olhar para a incompletude institucional, a falta da democracia. A questão do Estado como alavanca do crescimento econômico e de sua alternativa, a do mercado como polo propulsor dele, misturava-se com a questão democrática e esta com a da justiça, sobretudo a social, com o tema da desigualdade. Quando começaram a produzir intelectualmente, as gerações posteriores às dos pensadores que “inventaram” o Brasil se encontraram com uma nação já formada, embora diferente daquela do sonho de seus precursores. As classes e seus segmentos (as “classes médias emergentes”, a diminuição relativa do peso do “campesinato” etc.) já tinham face mais clara, o Estado se dinamizara e começava a ser contemporâneo, quer dizer, a entrar em contato com outros Estados, sem temê-los nem ameaçá-los, para assegurar pactos que permitissem maior expansão dos nossos interesses. O dinamismo do mercado provinha, ao mesmo tempo, de forças internas e externas. O papel atribuído pela ideologia nacional-desenvolvimentista aos “empresários nacionais” ficara embaçado pela associação destes com as multinacionais* e, mais recentemente, a partir dos anos 1990, pela presença de multinacionais “brasileiras”, fenômeno que seria impensável no passado. Sem que tivéssemos muita consciência do processo em curso, minha geração teve que lidar com outro momento do desenvolvimento mundial do capitalismo, chamado de globalização. No livro que escrevi com Enzo Faletto, Dependência e desenvolvimento na América Latina, tateávamos o tema sem muita clareza. Nós nos apercebêramos de que um “projeto nacional” nos termos propostos pela ideologia nacional-desenvolvimentista tinha escassas possibilidades de êxito, embora progresso econômico e mesmo aumento de bem-estar coletivo pudessem existir. Ainda assim, ao retornar ao Brasil no final da década de 1960 e talvez ainda durante a década de 1980, eu não me havia dado conta da magnitude das modificações no panorama mundial. Foi preciso sentir as consequências práticas e ideológicas da queda do Muro de Berlim, do fim da União Soviética e, portanto, da Guerra Fria, bem como, mais tarde, da forma chinesa de socialismo “harmonioso”, isto é, da economia sob o controle do Estado chinês em associação com as multinacionais e demais forças de mercado, para entender que o sonho que eu acalentava de escrever um Grande indústria e favela não tinha mais sentido. O mundo era outro e a dispersão produtiva global suscitada por novas tecnologias tornou as classes locais e o Estado nacional agentes que competem com outros agentes (as corporações multinacionais e os organismos internacionais) e com redes globais que ligam pessoas e grupos pelo universo afora. Neste novo contexto, é preciso inventar outro futuro para o Brasil que, sem negar a importância das temáticas do passado e os feitos concretos que delas resultaram, nem a identidade nacional que eles produziram, abra caminhos para compatibilizar os interesses nacional-populares com a inserção econômica global. Nesta os clusters produtivos e as redes sociais interconectadas poderão (ou não...) servir aos interesses nacionais, mas em novos patamares e de novas maneiras. A questão nacional não poderá ser pensada apenas do ângulo econômico e estatal, nem de modo isolado, como se o país fosse, em si, uma unidade autônoma para a reflexão. As novas percepções ideológico-culturais terão de englobar as reivindicações democráticas, os anseios de maior inclusão social e as novas formas de participação cidadã para serem contemporâneas do futuro. ** A lupa que permite ver quem somos e como somos precisa do complemento de telescópios que nos situem no universo mais amplo, sem cujo desvendar a visão de nossa identidade fica pouco nítida. * Eu antevi esta tendência em 1964 emEmpresário industrial e desenvolvimento econômico no Brasil (São Paulo: Difel, 1964. 196 pp. Coleção Corpo e Alma do Brasil, 13); mais tarde, falei de “desenvolvimento dependente-associado” para qualificá-la. ** Em artigo recente Marcos Nobre apresenta uma abordagem e uma periodização da história das ideias que merecem reflexão. Ver Marcos Nobre, “Depois da ‘formação’”, revista piauí, n. 74, nov. 2012, pp. 74-7.

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Antes de assumir uma cadeira no Senado Federal, em 1983, e assim efetivamente iniciar uma trajetória política culminada por dois mandatos presidenciais consecutivos, o sociólogo e professor Fernando Henrique Cardoso militou no debate público sobretudo por meio de intervenções na imprensa escri
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