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O Retrato PDF

385 Pages·2015·5.025 MB·Portuguese
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BIBLIOTECA VIRTUAL DE CIÊNCIAS HUMANAS O RETRATO Osvaldo Peralva Osvaldo Peralva O Retrato Rio de Janeiro 2009 Esta publicação é parte da Biblioteca Virtual de Ciências Humanas do Centro Edelstein de Pesquisas Sociais – www.bvce.org Copyright © 2009, Osvaldo Peralva Copyright © 2009 desta edição on-line: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais Ano da última edição: 1960 Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer meio de comunicação para uso comercial sem a permissão escrita dos proprietários dos direitos autorais. A publicação ou partes dela podem ser reproduzidas para propósito não-comercial na medida em que a origem da publicação, assim como seus autores, seja reconhecida. ISBN 978-85-7982-015-1 Centro Edelstein de Pesquisas Sociais www.centroedelstein.org.br Rua Visconde de Pirajá, 330/1205 Ipanema – Rio de Janeiro – RJ CEP: 22410-000. Brasil Contato: [email protected] 2 SUMÁRIO: Prefácio ................................................................................................ 4 Introdução 1. Trajetória do PCB ........................................................................ 6 2. O homem do aparelho ............................................................... 13 I — A Escola da Revolução 1. Missão em Moscou .................................................................... 18 Nel mezzo del cammin di nostra vita 2. Koriônov, o príncipe soviético .................................................. 28 Mi ritrovai per una selva oscura, 3. O chefe (russo) do PCB ............................................................. 39 4. Revolucionários sob medida ...................................................... 51 Chè la diritta via era smarrita. 5. Bajuladores do poder soviético ................................................. 58 Ahi quanto a dir qual era è cosa dura 6. A batalha contra o claustro ........................................................ 64 7. Enjaulados através da Rússia ..................................................... 69 Questa selva selvaggia e aspra e forte, 8. O amor desafia a Sibéria ............................................................ 75 Che nel pensier rinova la paura! ............................... II — O Kominform por dentro 1. Voando para Bucareste .............................................................. 78 I’non so ben ridir com’io’ v’entrai; 2. A nova internacional .................................................................. 82 Tant’era pien di sonno in su quel punto! 3. A direção colegiada ................................................................... 87 Dante, INFERNO, canto primo. 4. Geografia do Kominform ........................................................ 102 5. Sob o comando russo ............................................................... 113 6. Espionagem ............................................................................. 122 7. O ritual hierárquico .................................................................. 130 8. Gente importante ..................................................................... 140 9. URSS versus China duas revoluções diferentes ...................... 157 10. Partidos não-comunistas ........................................................ 173 11. Os cinco pecados de Malienkov ............................................ 178 12. O PC e o 11 de novembro ...................................................... 184 13. O relatório secreto ................................................................. 193 14. Morte e ressurreição do Kominform ..................................... 206 I II SUMÁRIO: Prefácio ................................................................................................ 4 Introdução 1. Trajetória do PCB ........................................................................ 6 2. O homem do aparelho ............................................................... 13 I — A Escola da Revolução 1. Missão em Moscou .................................................................... 18 Nel mezzo del cammin di nostra vita 2. Koriônov, o príncipe soviético .................................................. 28 Mi ritrovai per una selva oscura, 3. O chefe (russo) do PCB ............................................................. 39 4. Revolucionários sob medida ...................................................... 51 Chè la diritta via era smarrita. 5. Bajuladores do poder soviético ................................................. 58 Ahi quanto a dir qual era è cosa dura 6. A batalha contra o claustro ........................................................ 64 7. Enjaulados através da Rússia ..................................................... 69 Questa selva selvaggia e aspra e forte, 8. O amor desafia a Sibéria ............................................................ 75 Che nel pensier rinova la paura! ............................... II — O Kominform por dentro 1. Voando para Bucareste .............................................................. 78 I’non so ben ridir com’io’ v’entrai; 2. A nova internacional .................................................................. 82 Tant’era pien di sonno in su quel punto! 3. A direção colegiada ................................................................... 87 Dante, INFERNO, canto primo. 4. Geografia do Kominform ........................................................ 102 5. Sob o comando russo ............................................................... 113 6. Espionagem ............................................................................. 122 7. O ritual hierárquico .................................................................. 130 8. Gente importante ..................................................................... 140 9. URSS versus China duas revoluções diferentes ...................... 157 10. Partidos não-comunistas ........................................................ 173 11. Os cinco pecados de Malienkov ............................................ 178 12. O PC e o 11 de novembro ...................................................... 184 13. O relatório secreto ................................................................. 193 14. Morte e ressurreição do Kominform ..................................... 206 I II 15. Peripécias do regressso ......................................................... 218 PREFÁCIO III – A máquina infernal 1. O sinédrio ................................................................................ 235 Este livro é fruto do testemunho e da vivência do autor, através de três 2. Luiz Carlos Prestes .................................................................. 243 lustros de intensa participação num dos movimentos políticos mais dramáticos de 3. O “núcleo dirigente” ............................................................... 258 nossa época. Aqui registro fatos e impressões; por vezes afloro alguns problemas. 4. Agildo Barata .......................................................................... 269 Relato a experiência de um jovem que, sob a ditadura do Estado Novo, saiu em busca da liberdade e caiu nas malhas de uma organização totalitária. 5. Uma reunião democrática ....................................................... 273 6. No palco (e nos bastidores) da discussão ................................ 286 Falo do que vi na URSS e do que sei sobre o bolchevismo, sobretudo do 7. Operários e intelectuais ........................................................... 302 que vi de decepcionante e injustificável. É que, embora o atual regime tenha dado 8. O pântano triunfante ................................................................ 313 aos povos soviéticos o progresso material e cultural de um grande país industrial, 9. O retrato .................................................................................. 334 conservou alguns dos mais hediondos aspectos do tsarismo: a submissão dos povos que formavam o antigo império russo e a negação dessas liberdades democráticas, que constituem ainda o maior patrimônio político da humanidade. Posfácio Para onde vamos? ........................................................................ 348 Do povo mesmo, pouco tenho a dizer, já que não me foi dado privar com Apêndice ..................................................................................... 351 ele. De todo modo, não o confundo com os grão-senhores do Kremlin. Sei que se trata de uma gente brava e generosa, simpática e inteligente. Sem ter experimentado jamais as vantagens de uma democracia política, salvo no turbulento e fugaz período entre as duas revoluções do ano 1917, o povo soviético possui, contudo, um poderoso instinto de liberdade. Estou certo, pois, de que ele saberá, num futuro talvez próximo, acabar de vez com sistema das autocracias e impor seus direitos a uma vida livre. Em todo caso, esse é um problema interno dos soviéticos. Acho, pois, que o Brasil deve manter com seu governo (e com os governos de todos os países do bloco comunista) as melhores relações diplomáticas, comerciais e culturais; que deve ser tão amigo da URSS como dos EUA, mas defendendo sempre, diante de um como de outro, a dignidade, a independência e os interesses econômicos da nação brasileira. Qualquer outra atitude só favorecerá a guerra fria, que não nos pode interessar. Este mundo intermediário dos povos subdesenvolvidos, de que faz parte nosso país, move-se notadamente em três direções: desenvolvimento econômico, sobretudo através da industrialização, como meio de liquidar o atraso e a miséria; conquista ou reafirmação da independência, como meio de impor respeito à sua personalidade nacional; e liberdades democráticas. E a guerra fria não ajuda, senão que restringe e dificulta a conquista desses objetivos. É a guerra fria que justifica militarmente III 4 15. Peripécias do regressso ......................................................... 218 PREFÁCIO III – A máquina infernal 1. O sinédrio ................................................................................ 235 Este livro é fruto do testemunho e da vivência do autor, através de três 2. Luiz Carlos Prestes .................................................................. 243 lustros de intensa participação num dos movimentos políticos mais dramáticos de 3. O “núcleo dirigente” ............................................................... 258 nossa época. Aqui registro fatos e impressões; por vezes afloro alguns problemas. 4. Agildo Barata .......................................................................... 269 Relato a experiência de um jovem que, sob a ditadura do Estado Novo, saiu em busca da liberdade e caiu nas malhas de uma organização totalitária. 5. Uma reunião democrática ....................................................... 273 6. No palco (e nos bastidores) da discussão ................................ 286 Falo do que vi na URSS e do que sei sobre o bolchevismo, sobretudo do 7. Operários e intelectuais ........................................................... 302 que vi de decepcionante e injustificável. É que, embora o atual regime tenha dado 8. O pântano triunfante ................................................................ 313 aos povos soviéticos o progresso material e cultural de um grande país industrial, 9. O retrato .................................................................................. 334 conservou alguns dos mais hediondos aspectos do tsarismo: a submissão dos povos que formavam o antigo império russo e a negação dessas liberdades democráticas, que constituem ainda o maior patrimônio político da humanidade. Posfácio Para onde vamos? ........................................................................ 348 Do povo mesmo, pouco tenho a dizer, já que não me foi dado privar com Apêndice ..................................................................................... 351 ele. De todo modo, não o confundo com os grão-senhores do Kremlin. Sei que se trata de uma gente brava e generosa, simpática e inteligente. Sem ter experimentado jamais as vantagens de uma democracia política, salvo no turbulento e fugaz período entre as duas revoluções do ano 1917, o povo soviético possui, contudo, um poderoso instinto de liberdade. Estou certo, pois, de que ele saberá, num futuro talvez próximo, acabar de vez com sistema das autocracias e impor seus direitos a uma vida livre. Em todo caso, esse é um problema interno dos soviéticos. Acho, pois, que o Brasil deve manter com seu governo (e com os governos de todos os países do bloco comunista) as melhores relações diplomáticas, comerciais e culturais; que deve ser tão amigo da URSS como dos EUA, mas defendendo sempre, diante de um como de outro, a dignidade, a independência e os interesses econômicos da nação brasileira. Qualquer outra atitude só favorecerá a guerra fria, que não nos pode interessar. Este mundo intermediário dos povos subdesenvolvidos, de que faz parte nosso país, move-se notadamente em três direções: desenvolvimento econômico, sobretudo através da industrialização, como meio de liquidar o atraso e a miséria; conquista ou reafirmação da independência, como meio de impor respeito à sua personalidade nacional; e liberdades democráticas. E a guerra fria não ajuda, senão que restringe e dificulta a conquista desses objetivos. É a guerra fria que justifica militarmente III 4 o apoio norte-americano às ditaduras de Franco e Salazar; é a guerra fria que INTRODUÇÃO justifica também militarmente a presença de tropas soviéticas na Polônia e na Hungria, golpeando-lhes a independência nacional. *** 1. Trajetória do PCB Os fatos expostos mais adiante abrangem o espaço de quatro anos, de 1953 a 1957. Começarei pelo curso na Escola do Partido Comunista da União Soviética, em vista de que foi aí, pela primeira vez em minha vida de O PCB foi fundado em 25 de março de 1922, num congresso de comunista, que cheguei a vislumbrar um pouco da verdade sobre a contrafação representantes dos diversos grupos comunistas existentes no País. Mal saíra do movimento em que me engajara. Daí parti para minha posição de agora, desse congresso, caiu na clandestinidade, devido ao estado de sítio que se inconciliável com um sistema partidário e estatal de tipo absolutista, como é o abateu sobre o País, após o fracasso da chamada revolta dos tenentes do bolchevismo, e convencido de que presentemente reside no socialismo Exército, no Rio, e que se prolongou, com breves intervalos, até 1926. Em democrático a grande esperança dos que aspiram a um mundo melhor que o 1930, quando as Forças Armadas e os líderes políticos liberais atual. Encaro, por isso; com a maior simpatia o reformismo socialista dos desencadearam a insurreição que depôs o Presidente Washington Luiz e suecos, bem como as tendências liberalizantes e descentralizadoras que o conduziu Getúlio Vargas ao Palácio do Catete, o Partido Comunista se socialismo apresenta na Iugoslávia e na Polônia. Apesar de certos aspectos absteve de participar desse movimento, considerando-o simples resultado totalitários que ainda se notam nos regimes desses dois países, é claro que os do entrechoque de interesses ingleses e norte-americanos no Brasil. Luiz governos de Tito e Gomulka se esforçam por construir um sistema de Carlos Prestes, ex-capitão do Exército e então a figura política mais popular progressiva restauração das liberdades individuais, inclusive a de expressão do Brasil, ainda não pertencia ao PCB, mas já afinava por ele as suas pela imprensa; em que a direção das empresas, fazendas e instituições seja dos atitudes. Assim, recusou o convite que lhe foi oferecido para assumir a representantes diretos dos trabalhadores, por estes eleitos em cada caso, e não chefia militar daquele movimento. por burocratas nomeados pelo governo; e em que a independência nacional se Em 1934, achando-se em Moscou, Prestes ingressou no Partido afirme também em face da União Soviética. Comunista. No ano seguinte, em agosto, a Internacional Comunista Cito os nomes verdadeiros apenas de uma minoria dos personagens que (Komintern) lançou a palavra-de-ordem de formação das frentes populares. transitam por estas páginas, via de regra intelectuais, que tomaram parte Precisamente uma organização desse tipo formou-se no Brasil, a Aliança publicamente nos episódios que descrevo; comunistas que, achando-se no Nacional Libertadora (ANL), por iniciativa dos comunistas, sendo Prestes poder estatal ou por outra razão equivalente, se encontrem ao abrigo de eleito seu presidente de honra. Nos poucos meses que teve de atuação legal, perseguições; de alguns dos antigos dirigentes brasileiros e de Luiz Carlos a ANL desenvolveu por todo o território nacional uma campanha Prestes, por demais conhecidos. Aos demais trato por pseudônimos. É uma agitacionista que teve funda penetração nos meios pequeno-burgueses, entre questão de ética, mas também de política, pois entendo que o comunismo, na estudantes, escritores e jornalistas, bem como entre a tropa e a oficialidade forma totalitária de que se revestiu, deve ser combatido, mas no terreno das das Forças Armadas. Assim, em 24 de novembro de 1935 desencadeou-se, ideias e da exibição dos fatos, visando ao esclarecimento da opinião pública, e em nome da ANL, a insurreição armada nos Estados do Rio Grande do não pela repressão policial, nem por medidas que cerceiem aos seus partidários Norte e Pernambuco, circunscrita quase exclusivamente às suas respectivas o gozo das franquias democráticas. capitais — Natal e Recife; três dias depois, sublevaram-se no Rio de Janeiro o 3º Regimento de Infantaria e a Escola de Aviação Militar. Mas em poucos A democracia deve correr certos riscos, se quiser ser digna desse nome. dias a insurreição foi dominada. O. P . 5 6 o apoio norte-americano às ditaduras de Franco e Salazar; é a guerra fria que INTRODUÇÃO justifica também militarmente a presença de tropas soviéticas na Polônia e na Hungria, golpeando-lhes a independência nacional. *** 1. Trajetória do PCB Os fatos expostos mais adiante abrangem o espaço de quatro anos, de 1953 a 1957. Começarei pelo curso na Escola do Partido Comunista da União Soviética, em vista de que foi aí, pela primeira vez em minha vida de O PCB foi fundado em 25 de março de 1922, num congresso de comunista, que cheguei a vislumbrar um pouco da verdade sobre a contrafação representantes dos diversos grupos comunistas existentes no País. Mal saíra do movimento em que me engajara. Daí parti para minha posição de agora, desse congresso, caiu na clandestinidade, devido ao estado de sítio que se inconciliável com um sistema partidário e estatal de tipo absolutista, como é o abateu sobre o País, após o fracasso da chamada revolta dos tenentes do bolchevismo, e convencido de que presentemente reside no socialismo Exército, no Rio, e que se prolongou, com breves intervalos, até 1926. Em democrático a grande esperança dos que aspiram a um mundo melhor que o 1930, quando as Forças Armadas e os líderes políticos liberais atual. Encaro, por isso; com a maior simpatia o reformismo socialista dos desencadearam a insurreição que depôs o Presidente Washington Luiz e suecos, bem como as tendências liberalizantes e descentralizadoras que o conduziu Getúlio Vargas ao Palácio do Catete, o Partido Comunista se socialismo apresenta na Iugoslávia e na Polônia. Apesar de certos aspectos absteve de participar desse movimento, considerando-o simples resultado totalitários que ainda se notam nos regimes desses dois países, é claro que os do entrechoque de interesses ingleses e norte-americanos no Brasil. Luiz governos de Tito e Gomulka se esforçam por construir um sistema de Carlos Prestes, ex-capitão do Exército e então a figura política mais popular progressiva restauração das liberdades individuais, inclusive a de expressão do Brasil, ainda não pertencia ao PCB, mas já afinava por ele as suas pela imprensa; em que a direção das empresas, fazendas e instituições seja dos atitudes. Assim, recusou o convite que lhe foi oferecido para assumir a representantes diretos dos trabalhadores, por estes eleitos em cada caso, e não chefia militar daquele movimento. por burocratas nomeados pelo governo; e em que a independência nacional se Em 1934, achando-se em Moscou, Prestes ingressou no Partido afirme também em face da União Soviética. Comunista. No ano seguinte, em agosto, a Internacional Comunista Cito os nomes verdadeiros apenas de uma minoria dos personagens que (Komintern) lançou a palavra-de-ordem de formação das frentes populares. transitam por estas páginas, via de regra intelectuais, que tomaram parte Precisamente uma organização desse tipo formou-se no Brasil, a Aliança publicamente nos episódios que descrevo; comunistas que, achando-se no Nacional Libertadora (ANL), por iniciativa dos comunistas, sendo Prestes poder estatal ou por outra razão equivalente, se encontrem ao abrigo de eleito seu presidente de honra. Nos poucos meses que teve de atuação legal, perseguições; de alguns dos antigos dirigentes brasileiros e de Luiz Carlos a ANL desenvolveu por todo o território nacional uma campanha Prestes, por demais conhecidos. Aos demais trato por pseudônimos. É uma agitacionista que teve funda penetração nos meios pequeno-burgueses, entre questão de ética, mas também de política, pois entendo que o comunismo, na estudantes, escritores e jornalistas, bem como entre a tropa e a oficialidade forma totalitária de que se revestiu, deve ser combatido, mas no terreno das das Forças Armadas. Assim, em 24 de novembro de 1935 desencadeou-se, ideias e da exibição dos fatos, visando ao esclarecimento da opinião pública, e em nome da ANL, a insurreição armada nos Estados do Rio Grande do não pela repressão policial, nem por medidas que cerceiem aos seus partidários Norte e Pernambuco, circunscrita quase exclusivamente às suas respectivas o gozo das franquias democráticas. capitais — Natal e Recife; três dias depois, sublevaram-se no Rio de Janeiro o 3º Regimento de Infantaria e a Escola de Aviação Militar. Mas em poucos A democracia deve correr certos riscos, se quiser ser digna desse nome. dias a insurreição foi dominada. O. P . 5 6 O PCB pagou caro essa aventura. Seus chefes principais, juntamente Em 1940 caiu nas mãos da Polícia a nova direção do Partido, que por com numerosos políticos de esquerda e com oficiais, soldados e algum tempo ficou acéfalo e quase totalmente destroçado; perdi então o marinheiros implicados na revolta foram presos, processados e condenados contato que tinha com o PCB. O ambiente ditatorial era cada vez mais a longas penas de cárcere, e muitos deles sofreram torturas físicas as mais irrespirável, com os policiais onipresentes, espionando, fazendo terríveis nas mãos dos policiais. A malograda insurreição comunista abriu provocações, censurando boçalmente na imprensa as notícias mais simples. caminho para a implantação, dois anos depois, em 10 de novembro de 1937, Eu trabalhava então como radiotelegrafista em algumas agências noticiosas, do regime parafascista do Estado Novo, que vigorou até 1945. Durante esse fazia traduções e escrevia coisas literárias para jornais e revistas, e passei a período, restaram apenas minúsculas organizações comunistas, dispersas sentir um nojo insuportável da ditadura. Tomei um navio misto, fui parar no pelo País, com funcionamento precário. E quando, em maio de 1945, o PCB Chile, onde vivi um ano, seguindo depois para a Argentina, onde estive se converteu num partido legal, havia em suas fileiras menos de 4.000 poucos meses, e regressando ao Rio em meados de 1941, com o propósito membros. Eu era um deles. de seguir com destino à Colômbia, onde já tinha emprego esperando-me. Entrementes, a Alemanha atacou a União Soviética, na qual eu via um símbolo de libertação do homem da opressão e da miséria, e a garantia de Em Busca do Sonho uma vida digna e feliz para toda a humanidade. Desisti da Colômbia, Numerosos e vários são os caminhos que levam ao comunismo. permaneci no Brasil, buscando aproximação com o PCB. Queria participar Quando nasci, em agosto de 1918, existia algo de novo no mundo, mas se da luta contra o nazismo, em defesa dos povos soviéticos. Em 1942 passaram ainda uns três lustros antes que eu tomasse consciência dessa ingressei voluntariamente na Força Aérea Brasileira como sargento novidade: a Revolução Soviética. No ambiente social acanhado das cidades radiotelegrafista; pedi para ser enviado à Europa, integrando a tropa do interior da Bahia, onde passei minha infância de menino pobre, a palavra expedicionária brasileira, mas, em vez disso, mandaram-me para a Base comunismo tinha uma acepção vaga e sem atrativos. E, sem sabê-lo, eu ia Aérea de Salvador, na Bahia. sendo preparado para receber sua mensagem, ao testemunhar cenas de Foi lá que estabeleci ligação com os dirigentes da organização miséria e opressão tão chocantes que se gravaram para sempre em minha comunista regional, e formei na Base um grupo comunista, passando ao retina: bandos de camponeses famintos, tangidos pela seca, esmolando de mesmo tempo a escrever crônicas políticas num matutino de tendência porta em porta; um homem indefeso vomitando golfadas de sangue, sob os liberal, O Imparcial. golpes de sabre que lhe vibravam nas costas e no peito dois soldados do destacamento policial... Isso me valeu a antipatia e a perseguição sistemática do comandante da Base e uma severa advertência do General Dermeval Peixoto, que Aos 15 anos de idade eu me sentia plenamente realizado em minha comandava a Região Militar. Desprezando imprudentemente essa cidade compunha e publicava sonetos, tocava pistom, era datilógrafo e advertência, continuei a publicar crônicas esquerdistas até que fui trabalhava como telegrafista-auxiliar na repartição dos Telégrafos. Partindo convocado ao Quartel-General da Região, onde compareci à paisana e onde em busca de horizontes mais amplos, cheguei à capital de meu Estado e ali o general — que ignorava minha condição de militar, porquanto, servindo comecei logo a sentir a efervescência do movimento esquerdista e a sonhar na Aviação, não me encontrava sob seu comando — verberou o os mais belos sonhos de felicidade humana. E quando rebentou no Nordeste esquerdismo de meus artigos e ameaçou-me de processo e prisão. Obtive do Brasil a insurreição comunista, em novembro de 1935, e o soldado então transferência para a Base Aérea de Fortaleza e depois para a de amarelo, de rosto chupado e bigode ralo, me falou sobre Prestes e sobre os Recife, continuando nessas duas capitais a escrever artigos esquerdistas, a objetivos da Revolução, encontrou em mim plena receptividade. Daí por recrutar e organizar em células os militares que mostravam simpatias por diante, na Bahia e depois no Rio, para onde me transferi em setembro de Prestes ou pela URSS. 1937, mantive contatos com o PCB na qualidade de simpatizante. 7 8

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