Uma das tarefas principais da filosofia é examinar as nossas crenças mais fundamentais, buscando esclarecê-las por meio de análises conceituais, determinar o seu valor e avaliar a sua coerência e a sua racionalidade. A crença teísta de que há um Deus totalmente bom, onipotente, onisciente e eterno, criador do céu, da terra e de todos os seres que a habitam, é uma dessas crenças fundamentais. E também há um problema filosófico autêntico, no qual estão envolvidas questões conceituais e sobre o valor, a coerência e a racionalidade da crença teísta, conhecido como o problema do mal. Esse problema é o tema desta antologia, que reúne textos de alguns dos filósofos contemporâneos que mais contribuíram para a sua formulação precisa e para a sua solução.
Nos últimos tempos, as discussões sobre o problema do mal foram intensas nos departamentos de filosofia e teologia das universidades britânicas e norte-americanas, porém entre nós elas são pouco conhecidas pelo grande público e mesmo no meio acadêmico não receberam a devida atenção. Sem dúvida, um grande obstáculo para a divulgação dessas discussões é uma falsa expectativa em relação aos problemas filosóficos. É comum a opinião de que todos os problemas filosóficos tradicionais foram respondidos de maneira totalmente satisfatória por algum filósofo do passado e, portanto, que agora só nos restaria reproduzi-las, preferencialmente com observações sobre a sua época, o seu estilo e o seu brilhantismo, ou então opinar sobre algum outro tema da moda.
Definitivamente, esse modo de encarar os problemas filosóficos não é adequado, pois ele apenas empobrece o pensamento, promove o apego a frases feitas, leva ao dogmatismo e ao total esvaziamento da filosofia. Além disso, pensar que os problemas filosóficos tradicionais já foram resolvidos ou superados é uma má compreensão do que seja um problema filosófico autêntico: questões filosóficas são questões que podem receber algumas respostas mais plausíveis do que outras, porém nunca respostas definitivas. Portanto, o problema do mal, enquanto um problema filosófico autêntico, é um problema em aberto, tão forte e atual para nós quanto o foi para Agostinho, Tomás de Aquino ou David Hume.
Nenhum dos textos desta antologia formula perguntas fundamentalmente diferentes das questões tradicionais, nenhum deles trata os temas abordados frivolamente e tampouco oferece respostas definitivas. Mas eles não se limitam a reproduzir o passado, havendo progresso tanto em relação à formulação do problema quanto em relação à sua solução: o problema recebe formulações mais precisas, algumas vias de resposta são abandonadas porque não levam a lugar nenhum e vias inéditas são exploradas.
Uma característica notável desses textos é o facto de que eles incorporam muitas inovações técnicas de disciplinas como a lógica e avanços teóricos de áreas da filosofia como a metafísica e a epistemologia. Somada à força intrínseca do principal problema que discutem, essa característica os torna textos bons para discutir vários tópicos filosóficos e adequados como introdução geral à filosofia. Contudo, isso não significa que eles sejam textos elementares, pois, na verdade, todos eles são muito sofisticados. Eles podem servir como introdução à filosofia porque forçam o leitor a constantemente pensar como um filósofo.