JOÃO FELIPE GUIMARÃES DE MACEDO SALES DOMICIANO O mito e sua estrutura: contribuições da antropologia lévi-straussiana para a formalização da clínica psicanalítica Dissertação apresentada ao Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, como parte dos requisitos para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia Área de concentração: Psicologia Clínica Orientador: Prof. Livre-Docente Christian Ingo Lenz Dunker SÃO PAULO 2014 AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE. Catalogação na publicação Biblioteca Dante Moreira Leite Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo Domiciano, João Felipe Guimarães de Macedo Sales. O mito e sua estrutura: contribuições da antropologia lévi-straussiana para a formalização da clínica psicanalítica / João Felipe Guimarães de Macedo Sales Domiciano; orientador Christian Ingo Lenz Dunker. -- São Paulo, 2014. 290 f. Dissertação (Mestrado – Programa de Pós-Graduação em Psicologia. Área de Concentração: Psicologia Clínica) – Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. 1. Mito 2. Antropologia 3. Estrutura 4. Psicanálise I. Título. RC504 2 DOMICIANO, J. F. G. M. S. O mito e sua estrutura: contribuições da antropologia lévi-straussiana para a formalização da clínica psicanalítica. Dissertação apresentada ao Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo para obtenção do grau de Mestre em Psicologia. Aprovado em: Banca examinadora Prof. Dr.: ____________________________________________________________ Instituição: ______________________ Assinatura: __________________________ Prof. Dr.: ____________________________________________________________ Instituição: ______________________ Assinatura: __________________________ Prof. Dr.: ____________________________________________________________ Instituição: ______________________ Assinatura: __________________________ 3 A José e Vanessa, passado e presente. 4 AGRADECIMENTOS Ao Christian Dunker, pela infinita generosidade, coragem e companheirismo nesta aventura de promover encontros improváveis. Sua entrega à atividade de pesquisa e disposição a deslocar-se dos lugares comuns serviram de inspiração desde os primeiros passos desta jornada. Ao Renato Sztutman e José Miguel Bairrão, pelas preciosas contribuições no exame de qualificação. À Capes, pelo financiamento que tornou possível a concretização deste trabalho. Ao Paulo Endo, por ter me acolhido na grata experiência do Estágio Supervisionado em Docência do Programa de Aperfeiçoamento de Ensino (ESD-PAE). Ao Daniel Kupermann, Nelson da Silva Jr., Miriam Debieux, Sidi Askofaré, Sandra Berta e Conrado Ramos, que em contextos mais ou menos formais contribuíram para a produção de novos questionamentos. Especialmente a César Ades (in memorian), grande incentivador deste mestrado e com quem iniciei a atividade de pesquisa acadêmica. Ao Raul Pacheco, pela escuta precisa e intervenções decisivas nos mais diversos momentos desta jornada. Aos colegas de orientação, interlocutores privilegiados e determinantes no percurso de escrita: Maria Letícia Reis, Daniele Sanchez, Luciana Salum, Cris Mathias, Hugo Lana, Rafael Lima, Marcelo Checchia, Rafael Cossi, Roberto Propheta, Karen Alves, Ligia Borba, Clovis Zanetti, Ronaldo Torres, Abenon Menegassi, Paulo Rona, Jonas Boni, Fuad Kyrillos, Tatiana Assadi, Pedro Castilho, Dulce Coppedê, Leandro dos Santos, Stella Ferraretto, Madalena Becker e Valesca Bertanha. Mais que parceiros em inúmeros projetos paralelos, encontrei aí amigos para compartilhar grandes momentos. 5 Aos colegas de consultório: Anna Turriani, Maíra Marques, Roberto Marques, Luiz Bruder, Lilian Andrade, Clarice Paulon e Lucas Bulamah. Pelos cafés e conversas na cozinha. Aos colegas de Latesfip, em especial ao grupo “Narcisismo”, no qual trabalhei diretamente, mesmo que nem sempre presente: Ronaldo Manzi, Rafael Gargano, Hélgis Cristófaro, Maria Nakasu, Silvio Carneiro e Roberto Marques. Aos colegas do grupo de estudos dos Seminários: Bia Waldvogel, Esperança Moraes, Débora Cardillo, Sávia Emrich, Fernanda Sato, André Nader, Renata Brandstatter, Mayra Xavier e Patrícia Brandstatter. Em especial a Michele Faria, por sustentar aí um espaço de franca interlocução e debate dos meandros da obra lacaniana. Aos amigos e colegas que estiveram presentes em tantos momentos deste percurso: Michelle Araújo, Ingrid Zia, Camila Oliveira, Cibele Yamamoto, Denise Synthes, Heloísa Ramirez, Pedro Ambra, Paulo Beer, Ludu Vasconcelos, Chris Haritçalde, Luiz Botto, Eveline Araújo, Aline Martins, Francisco Capoulade, Viviana Venosa, Débora Moraes, Ypuan Garcia. Agradeço ainda ao Luiz Moreno pelo grande auxílio na língua grega, e ao Ael Salebian pela amizade de todas as horas. Aos colegas psicanalistas do ABC, que me mostraram que a política da psicanálise se faz pela e através da ação, do movimento: Leo Pereti, Renata Rampim, Karla Xavier, Brendali Dias, João Ezequiel, Leandro dos Santos, Daniel Vitorello, Conceição Sperini, Flávia Reigado, Angélica Hoffler e Paulo Perez. Agradeço ainda a Tiago Sanchez (UMESP), Heliane Silva (Uniban) e Sandra Magri (Faculdade de Medicina do ABC) pelos convites a dar os primeiros passos na atividade de docência. À Cícera e Cláudia, da secretaria do Departamento de Psicologia Clínica, por tornarem menos penosa a assombrosa burocracia universitária. À Aurélia e Marco, que nos últimos tempos deram um suporte essencial. Aos meus tios e primos, mais ou menos distantes, que apoiaram este trabalho. Aos meus avós José (in memoriam) e Antônia, que mesmo à distância sempre se fizeram presentes pelo exemplo e pelo carinho. À minha avó Neuza, pela companhia sempre acolhedora e cuidadosa. 6 Ao meu avô José (in memoriam), a quem dedico este trabalho, por me introduzir ao sabor das narrativas e da mitologia. À minha irmã, Amanda, pelo senso de humor e companheirismo nas melhores horas. À minha mãe, Vania, e ao meu pai, Aguinaldo, pela paciência, apoio e confiança sem limites. Agradeço não apenas pelo investimento emocional e material, mas principalmente pelo exemplo de dedicação ao trabalho e às letras. À Vanessa, pelo amor e por ter sido, ao longo destes três anos, um porto seguro. Sua sensível presença foi essencial para a superação de inúmeros momentos de incerteza e angústia. Mais que este trabalho, destino-lhe minha admiração e meu amor. 7 RESUMO DOMICIANO, J. F. G. M. S. (2014) O mito e sua estrutura: contribuições da antropologia lévi-straussiana para a formalização da clínica psicanalítica. Dissertação de Mestrado, Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo Inserida no intercâmbio teórico entre a psicanálise e a antropologia estrutural, a presente pesquisa busca analisar os papéis e implicações da noção de mito para a constituição de um projeto de formalização da experiência psicanalítica. Em pesquisa anterior, constatamos como na conferência O mito individual do neurótico (1953), Jacques Lacan realizou a aplicação do modelo lógico através da qual o antropólogo Claude Lévi-Strauss tratou da estrutura mítica – a “fórmula canônica do mito” (1955) – ao caso freudiano do Homem dos Ratos. Desta premissa, uma questão se impôs: em que medida o modelo da estrutura inerente ao fenômeno mítico foi condição necessária para a apropriação lacaniana do ideário estrutural e quais os efeitos de tal momento constitutivo sobre seu futuro projeto de formalização da clínica psicanalítica. Com tal objetivo em vista, mapeamos inicialmente na obra de Freud as dimensões do tema do mito. Vimos como sua aparição é contemporânea à emergência da psicanálise como uma prática clínica, e como está ligado a um programa antropológico de universalização das descobertas psicanalíticas, cuja maior expressão é a publicação de Totem e Tabu (1912-13) e sua ampliação do valor metodológico da lógica mítica para a apreensão da origem da cultura. A partir de uma revisão das leituras e críticas à psicanálise pelas principais vertentes da antropologia no início do século XX, observamos como o valor epistêmico-metodológico da obra freudiana apenas será plenamente reconhecido com o advento do projeto estrutural de antropologia engendrado por Lévi-Strauss e responsável por inscrever o mito como objeto privilegiado de estudo. Acompanhamos os principais movimentos de Lévi-Strauss pela análise mítica (1949; 1955; 1964; 1985), ressaltando o papel central do modelo da fórmula canônica do mito. A análise das derivações matemáticas de seus termos fundamentais levou-nos a reconhecer seu valor para a psicanálise lacaniana. Neste modelo, Lacan encontrará (a) uma noção de estrutura que assimila a dimensão da dialética e do impossível em seus termos, (b) a base de sua teoria do significante, (c) um meta-modelo de formalização que o acompanhará por toda 8 sua obra. A partir desta revisão analisaremos se os desvios conceituais da assimilação lacaniana do modelo de Lévi-Strauss, poderiam retroativamente contribuir para uma revisão do valor da análise mitológica para além dos limites psicanalíticos. Para tal, nos valeremos de uma releitura das análises estruturais do mito de Édipo e do Homem dos Ratos. Cientes dos limites de nosso recorte, indicamos ao fim possíveis desdobramentos deste percurso para pesquisas futuras. Palavras-chave: Psicanálise; Antropologia; Mito; Estrutura; Clínica . 9 ABSTRACT DOMICIANO, J. F. G. M. S. (2014) The myth and its structure: contributions of lévi-straussian anthropology to the formalization of psychoanalytical clinics, Master’s Dissertation, Institute of Psychology, University of Sao Paulo, Sao Paulo. Situated in the theoretical debate between psychoanalysis and structural anthropology, this research aims to analyse the roles and implications of the concept of myth for the establishment of formalization’s project of psychoanalytical experience. In previous research, we found that in the conference The neurotic 's individual myth (1953), Jacques Lacan applied the logical model by which the anthropologist Claude Lévi-Strauss read the mythic structure – the “canonical formula of myth” (1955) – to revised the Freudian case of the Rat Man. From this premise, a question remained: to what extent the model of the structure inherent of the mythical phenomenon was necessary for the appropriation of Lacanian ideas structural condition and what the effects of such constitutive moment on his future formalizations of the psychoanalytic practice. With this aim in view, we initially mapped in Freud's work the dimensions of the theme of the myth. We saw how its appearance is contemporary to the emergence of psychoanalysis as a clinical practice, and how it is connected to an anthropological program of universalization of the psychoanalytic discoveries, whose highest expression is the publication of Totem and Taboo (1912-13) and its expansion of the methodological value the mythical logic to apprehend the origin of culture. From a review of the readings and critiques of psychoanalysis by the anthropologists in the early twentieth century, we saw how the epistemic and methodological value of Freud's work will be fully recognized with the advent of structural anthropology introduced by Lévi-Strauss, and responsible for signing the myth as a privileged object of study. We followed the Lévi-Strauss’s main movements in mythical analysis (1949, 1955, 1964, 1985), highlighting the central role of canonical formula of myth. The analysis of the mathematical derivations of its fundamental terms led us to recognize its value to Lacanian psychoanalysis. In this model, Lacan find (a) a type of structure that assimilates the dimension of the dialectic and the theme of impossible in its terms, (b) the basis of his theory of the signifier, (c) a meta-model for formalizing remains 10
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