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O Feudalismo PDF

52 Pages·1986·42.135 MB·Portuguese
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lllTORAS =lill~m~-~. " Hilário Franco Jr. r:;.\;0 ni": \ , I L..\ •..: I' '..' • Histomapa de História .John B. Sparks Coleção Primeiros Passos • Oque é História . Vavy Pacheco Borges o FEUDALISMO Coleção Tudo é História • A Inquisição •Anita Novinskí 1~edição 1983 • As Cruzadas· Hilário Franco Jr. 4~ edição Coleção Primeiros Vôos '< • Sociedade Feudal • Guerreiros, sacerdotes etrabalhadores • Francisco C. T. da Silva • Uma Introdução à História • Ciro Flamarion Cardoso ':) "/1111111I11111111111I11111111111111 20657'36113 .....•.. ) ~ •• 111 J I 198 6 i i ~L, _ I J. r Hílârio Franco Jr. .-1.+ 11"'I , ' v....I'_ 123(antigo 1./, Artistas gráficos Revisão: JoséW. S.Moraes Hercílio deLourenzi INDICE Introdução ' ' . 7 -A gênese ~ . 9 O~te12t~) A estrutura .~ , . 29 fi IBL I TC,,,!I,c, A dinâmica ..-..- , . 62 , A crise ;'.., , . 78 1, ;:,(:);,'_::'~J,?~,tO Conclusão . 94 Indicações para leitura . 100 "~(p ~.. g .a Editora Brasiliense S.A. B. General Jardim, 160 01223 - São Paulo - SP' Fone (011l231-1422 lt L_ ..~I INTRODUÇÃO Aspalavras, para o historiador, são sempre proble- máticas. Como explicar o passado com palavras que não soemestranhas epedantes aos não especialistas, e que, ao mesmo tempo, sendo simples ede uso comum, não desvir- tuem asrealidades históricas? Essa éuma questão concre- ta quando pretendemos estudar o "feudalismo", termo . aparecido apenas no século XVII, muito tempo depois do momento histórico. que ele devia designar. Melhor que essaexpressão tornada clássica, seria então empregar "re- gime feudal"; "sistema feudal", "modo de produção feu- dai", "civilização feudal", "sociedade feudal" ou alguma outra que se propusesse? Possivelmente, mas isso impli- caria justificar a escolha, nos afastando assim dos objeti- vosdesta Coleção. Aqui e agora, mais importante do que discutir metodologias esuas diferentes visõessobre esteou aquele ponto é tentar compreender o que havia de fun- damental naquela realidade histórica conhecida por Feu- dalismo. Portanto, nosso primeiro passo deveser delimitar o L que queremos estudar. Noespaço: Europa Ocidental, dei- I JL .'r 8 Hilário Franco Ir. xando de lado a discussão sobre a analogia com outras regiões. No tempo: séculos X-XIII, retrocedendo e avan- çando um' pouco para vermos a formação e desestrutu- ração do Feudalismo. Assim, temos pela frente uma vas- tidão territorial (dois milhões de kmê) e temporal (400 anos) nas quais não se pode logicamente pensar em en- contrar algo idêntico e imutável. Levando-se esse aspecto em consideração, seria talvez mais correto que os rótulos estivessem no plural ("sociedades feudais", "modos de produção feudais" etc.). Por outro lado, não sepode negar A aBNESE que naqueles limites geográficos e cronológicos houvesse, no essencial, uma unidade de estruturas e uma evolução semelhante. Desta forma, preocupando-nos pouco com específi- o cidades regionais, examinaremos oFeudalismo no que ele processo de gestação do Feudalismo foi bas- apresentava de mais profundo, de mais estrutural. Procu- tante longo, remontando à crise romana do século raremos vê-locomo uma formação social surgida das no- Hl, passando pela constituição dos reinos germâ- vascondições decorrentes do desaparecimento do Império nicos nos séculos V-VI e pelos problemas do Império Romano e da penetração de tribos germânicas, ou seja, Carolingio no século IX, para finalmente se concluir como uma sociedade saída das ruínas da anterior mas em fins desse século ou princípios do X. Para poder- melhor adequada às novas circunstâncias de então. Logo, mos acompanhar mais claramente esse processo, o Feudalismo - como aliás qualquer outro fenômeno histórico - não deveser objeto de nenhum juizo de valor, examinaremos sucessivamente sete de seus aspectos como ocorre frequentemente. No uso popular; no senso mais importantes: a ruralização da sociedade, o enri- comum, oFeudalismo ésinônimo de anarquia política, de jecimento da hierarquia social, a fragmentação do exploração pura e simples de camponeses por c1éricose poder central, o desenvolvimento das relações de guerreiros, de barbarismo e ignorância generalisadas. dependência pessoal, a privatização da defesa, a ele- Nossa pretensão é tão somente amenizar esta visão sim- ricalização da sociedade, as transformações na men- plista sobre o Feudalismo, tentando mostrâ-lo como uma talidade. sociedade histórica, isto é, a única possível para o seu O primeiro desses aspectos tinha raizes muito tempo, herdeira do passado romano-germânico e prepa- antigas. A civilização romana na sua fase inicial radora deuma novasociedade, acapitalista. estivera baseada na agricultura, porém, em função' das dificuldades que esta apresentava naquele solo ) 10 HilárioFrancoJr. .O Feudalismo 11 ~ pouco favorável, .aos poucos o comércio passou a ser que os mais ricos se retirassem para suas grandes o setor mais dinâmico. Estruturalmente ligada a isso propriedades rurais (vil/ae), onde estariam mais se- . estava apolítica imperialista que tornou o mar Medi- guros e onde poderiam obter praticamente todo o terrâneo um lago romano. Contudo, as imensas con- necessário. Émuito significativo que o Estado tenha quistas territoriais e o conseqüente afluxode rique- precisado, através de legislação específica, impedir zas provocaram profundas alterações, cheias de con-... que os próprios elementos encarregados da adminis- seqüências, na sociedade e na economia latinas. Por \ tração municipal icuriales) abandonassem as ci- exemplo, um grande crescimento do número de es- \1:: dades. cravos, o enfraquecimento da camada de pequenos ej Colocava-se, então, a questão da mão-de-obra médios proprietários rurais e a concentração de ter- rural, que foi solucionada por um regime de tripla ras nas mãos de poucos indivíduos. ""- origem, que atendia ao interesse dos proprietários Ora, aquela situação apresentava claras contra- em ter mais trabalhadores, ao interesse do Estado em dições, pois o estoque de mão-de-obra escrava, base garantir suas rendas fiscais e ao interesse dos mais da economia, precisava ser constantemente renovado humildes por segurança e estabilidade. Desse encon- por novas conquistas. O Estado, dominado pelos ci- tro nasceu a importante instituição do colonato. dadãos mais ricos, via seus rendimentos decrescerem, '.De fato, as crescentes dificuldades em se obter porque os poderosos escapavam aos impostos e os tanto mão-de-obra escrava (devido aos problemas de pobres não tinham condições de pagâ-los. Ademais, abastecimento) quanto livre (devido ao retrocesso era preciso fornecer pão ediversão àplebe urbana - populacional) punham em xeque as possibilidades de sem propriedades devido à concentração fundiária e o grande 'proprietário explorar suas terras proveito- sem emprego devido à concorrência do trabalho es- samente. Buscou-se então um novo sistema. Por este, cravo - para se camuflar o problema social. Assim, a terra ficava dividida em duas partes: a reserva não havia condições econômicas e sociais de prosse- senhorial e os lotes camponeses. Estes lotes eram r"i guirem as conquistas. Em outros termos, o sistema entregues a indivíduos em troca de uma parcela do escravista e imperialista não podia mais continuar a .que eles aí produzissem e da obrigação de trabalha- se auto-reproduzir. Era a crise. rem na reserva senhorial sem qualquer tipo de remu- Como aquela era uma sociedade urbana, natu- neração. Tudo que era produzido na reserva cabia ao ralmente a crise se manifestava mais claramente nas proprietário. , cidades, com as lutas sociais, a contração do comér- Para o Estado, vincular cada trabalhador a um cio e do artesanato, a retração demográfica, a pres- lote de terra representava melhor controle do fisco são do banditismo e dos bárbaros. Assim, entende-se imperial sobre os camponeses e urna forma de incen- ~J I I I o 12 Hilário Franco Ir. Feudalismo 13 tivar a produção. Para os marginalizados sem bens mica e a participação nos quadros diretivos do Es- ou ocupação e para os camponeses livres, trabalhar tado eram decisivas. Mais ainda, desde o século IV nas terras de um grande proprietário significava estabeleceu-se a vitaliciedade e hereditariedade das casa, comida e proteção naquela época de dificul- funções, quebrando a relativa mobilidade anterior e dades e incertezas. Para osescravos, receber um lote levando mesmo alguns historiadores (como Ferdi- de terra era uma considerável melhoria de condição. nand Lot) a falarem em "regime de castas". Da Para oseu proprietário, era uma forma de aumentar mesma forma que sevincula.ra oscamponeses àterra, a produtividade daquela mão-de-obra e ao mesmo também se vinculou os artesãos de cada especiali- i tempo baixar seu custo de manutenção, pois os es- dade a uma corporacão (collegia) submetida ao con- , ' cravos estabelecidos num lote de terra (servi casati) trole estatal. deixavam de ser alimentados evestidos por seu amo, Ora, como as camadas médias urbanas e rurais sustentando-se a sipróprios. tendiam a desaparecer, crescia a distância social en- Assim, por um aviltamento da condição do tra- tre a aristocracia latifundiária e/ou burocrática e a balhador livre e por uma melhoria da do escravo, massa dependente em diversos graus. É sintomática surgia ocolono. Sua situação jurídica, já definida no a reforma monetária do século IV, que criava um século IV, expressava nitidamente a ruralização da padrão-ouro para uso do Estado e da aristocracia e sociedade romana. Ele estava vinculado ao lote que um padrão-cobre que atendia melhor as necessidades ocupava, não podendo jamais abandonâ-lo, mas dos pobres, sem haver escala de correspondência também não podendo ser privado dele pelo proprie- entre ambos: eram quase dois sistemas monetários tário. A terra não poderia ser vendida sem ele, nem paralelos refletindo a'polarização social. elesem aterra. Asobrigações que ele devia não eram .~.Apenetração dosbárbaros germânicosnão alte- leves, mas estavam claramente fixadas e não pode- rou esse quadro, pelo contrário. De fato, a quebra da riam ser modificadas arbitrariamente pelo latifun- unidade política romana acentuava as tendências re- di.ário. Em suma, o cotonus era juridicamente um gionalistas daquela aristocracia e reforçava seus pri- homem livre, mas verdadeiro escravo da terra. vilégios. Avida e a população urbanas, em decadên- Naturalmente o colonato não era um fenômeno cia desde o século IH, continuaram a evoluir nesse isolado, mas fazia parte deum processo mais amplo sentido, mesmo sem ter esse processo sido acelerado - segundo aspecto a considerar - de enrijecimento pelas invasões do século V, como seria pelas do sé- . da hierarquia social. Enquanto na Roma clássica o culo IX. As camadas humildes também não tiveram critério fundamental de diferenciação social era a sua sorte alterada, pois osinvasores de maneira geral liberdade, a partir do século lU a condição econô- mantiveram asestruturas anteriores. l 14 Hilârio Franco Ir. oFeudalismo 15 Mais ainda, a própria sociedade germânica logo vastos territórios. Mais do que isso, os próprios lati- após sua instalação no Ocidente começou a passar fundiários foram ganhando atribuições anterior- por transformações profundas. Nem poderia ser dife- mente da alçada doEstado. Por exemplo, em princí- rente, devido à sua inferioridade cultural e numérica pios do século V os colonos foram desligados da frente aomundo romano dominado: por volta do ano autoridade fiscal do Estado, que era delegada ao 500, nos limites do antigo Império Romano do Oci- proprietário da terra. dente, havia um milhão de bárbaros numa popu- Asinvasões germânicas, por sua vez, quebraram lação total de 30 milhões. Em função disso, aquelas definitivamente a frágilunidade política do Ocidente transformações sociais germânicas convergiam para do século V. Estabelecia-se assim o pluralismo que a mesma polarização que a sociedade romana vinha desde então jamais deixaria de caracterizar a vida conhecendo há tempos. Oprocesso teve início quan- política européia. Porém, mais importante que isso é do os conquistadores impuseram a velha instituição o fato de que em cada reino germânico continuavam da hospitalitas aos proprietários romanos, expro- a se manifestar as mesmas tendências centrífugas da priando parte de suas terras (geralmente um terço). época romana. A formação de uma aristocracia fun- Na maioria das vezes aquelas áreas caíram em diária germânica, comovimos,contribuía para tanto. mãos de membros da aristocracia germânica, que Isso era reforçado ainda pela decadência da eco- nelas estabeleciam, além de escravos, homens livres nomia comercial e monetária, que levavaos reis bár- de sua tribo como rendeiros ou mesmo pequenos baros a remunerarem seuscolaboradores comaúnica ; ,!í proprietários. Contudo, com otempo, seguindo a ló- verdadeira riqueza da época, terras. Contudo, desta i gica da evolução social da época, aqueles homens forma os reis iam pouco a pouco se empobrecendo e "r livres acabavam por entrar em algum tipo de depen- seenfraquecendo. Falando domonarca franco da di- dência. Portanto, as sociedades romana egermânica, nastia dos merovíngios, um. cronista afirmava que . passando a ter estruturas semelhantes e identidade "exceto esse inútil título de rei, (...) elenada possuía de interesses ao nível das aristocracias, puderam aos de seu além de uma única terra de baixo rendimento, poucos ir sefundindo numa novasociedade. que lhe proporcionava uma habitação e um pequeno O terceiro aspecto da gênese feudal, a fragmen- número de servidores". tação do poder central, resultava daquele estado de De fato, os reis merovíngios remuneravam seus coisas. Com a ruralização, a tendência à auto-sufi- servidores entregando a cada um deles uma extensão ciência de cada latifúndio e as crescentes dificul- de terra a título debeneficium: Ou seja, concedia-se dades nas comunicações, os representantes do poder o usufruto (e não a plena propriedade) de um bem imperial foram perdendo capacidade de ação sobre imóvel em troca de determinados serviços prestados. , rr 16 Hilário Franco Jr. oFeudalismo 17 Tal concessão era feita vitaliciamente, mas como lI'\ grande imperador. Cada vez mais, então, mesmo as quase sempre era renovada em favor do herdeiro do ): funções públicas passaram a ser vistas como bene- concessionário falecido, com o tempo tendia a se fícios. Assim, os reis perdiam sua faculdade de no- tornar hereditária. Desta forma, o concessor perdia i mear e destituir seus representantes provinciais (con- . aos poucos o controle sobre os benefícios cedidos e 11 des, duques, marqueses), cujos cargos tornavam-se portanto sobre os próprios servidores assim remune- e bens pessoais hereditários. Em suma, ocorria um . rados. Não muito diferente foi o destino de um tipo recuo das instituições públicas, ou melhor, sua apro- de beneficium (o mais comum, aliás, na época mero- priação por parte de indivíduos que detinham gran- "'1 vingia) que implicava certo pagamento ao concessor: des extensões de terra e nelas exerciam em proveito precaria . próprio atribuições anteriormente da alçada do Es- Muitas vezes, o detentor de um benefício recebia tado. um importante privilégio, que esvaziava ainda mais o o quarto aspecto - o desenvolvimento das rela- poder real, a imunidade (immunitas). Por ela, deter- ções de dependência pessoal-era o resultado lógico minados territórios ficavam isentos da presença de daquele quadro de isolamento dos grupos humanos funcionários reais, que ali não poderiam exercer ne- (devido ruralização), de crescimento da distância nhuma de suas funções. Assim, o imunista tornava- à social e da fraqueza do Estado. Aliás, é próprio dos se detentor de poderes regalianos, isto é, inerentes ao momentos de insuficiência das relações sociais dentro rei, podendo nos seus domínios exercer as correspon- do Estado, da tribo ou da linhagem, que alguns bus- dentes funções administrativasv.aplicar justiça, reali .. quem segurança e sustento junto a indivíduos mais zar recrutamente militar, cobrar impostos e multas. poderosos, e outros busquem prestígio e poder junto Apesar de mais antiga, essa instituição foi melhor a um grupo de dependentes, Mesmo na Roma clás- definida e generalizou-se no tempo de Carlos Magno, sica, apesar da existência de um Estado forte - ou quando foi estendida a uma significativa parcela dos exatamente para fugir a ele -indivíduos de origem territórios.de seu império. humilde colocavam-se sob o patronato de um pode- Contudo, apesar do grande número de benefí- roso, tornando-se seus clientes. Em troca de ajuda cios de imunidades concedidos, o poder de Carlos f: econômica e proteção judiciária, os clientes apoia- Magno era inquestionável. Mas ele baseava-se 'em vam seus protetores nas assembléias políticas e pres- seu prestígio pessoal, de maneira que após sua morte tavam diversos pequenos serviços. , os efeitos desagregadores daquela política se fizeram Apesar de derivado da instituição da clientela, sentir. E sobretudo após meados do século IX, quan- o patrocinium potentiorum dos últimos tempos do do oImpério Carolíngio foi dividido entre os netos do Império Romano criava laços de dependência muito l o 18 Hilário Franco Jr. Feudalismo 19 mais fortes. Esses laços eram essencialmente econô- Como naquele momento as demais expressões que micos, enquanto oscriados pela clientela tinham um significavam "homem dependente" ganhavam senti- caráter sobretudo político. Para fugir ao Estado dos diversos, recorreu-se para tanto ao céltico gwas opressor e ao fisco insaciável, muitos camponeses ("rapaz", "servidor"). Da latinização deste termo livresentregavam sua terra aum indivíduo poderoso, surgiu vassus, e da do desdobramento gwassawl colocando-se sob o seu patronato. Assim, ao retirar ("aquele que serve"), vassalus. lristitucionalmente, aqueles homens da órbita do Estado, os latifundiá- foientão que à recomendação se acrescentou ojura- rios tendiam a transformá-Ios em colonos e a dimi- mento de fidelidade como reforço religioso, ou seja, nuir a soberania do Estado. Por isso, desde meados da combinação dos dois atos nasciam as relações do século IV, inúmeras leis tentaram inutilmente vassálicas. Concretamente, foientão que vassatidade proibir o estabelecimento desse tipo de relação. Por ebenefício seuniram, com o primeiro destes elemen- fim, a insegurança provocada pela penetração dos tos tornando-se condição indispensável para a con- germânicos generalizou orecurso a esse tipo de rela- cessão dosegundo. Em outros termos, obenefícioera ção social conhecida por patrocinium ou, na sua a remuneração do vassalo (servidor fieI)e sóum vas- forma germanizada, mundeburdis . O ato jurídico salo receberia um benefício (termo mais tarde subs- pelo qual uma pessoa secolocava assim sob a prote- tituído por "íeudo"). ção e a autoridade de outra era a recomendação Éverdade que inicialmente, no século VI, "vas- (commendatio). salo" apresentava uma conotação servil, mas desde Todavia, a instituição que mais sucesso teria princípios do século VII otermo passou a ser empre- nesse desenvolvimento das relações de dependência gado também em relação a homens livres, ainda que pessoal foi a vassalagem. Sua larga difusão deu-se de condição inferior. Por fim, como desde princípios desde Carlos Magno, pois como na verdade a autori- do século VIII elementos da. aristocracia entravam dade do imperador dependia mais da fidelidade de nas relações vassálicas, estas acabaram por se eno- seusservidores pessoais do que de sua soberania teó- brecer e mesmo, mais tarde, por se tornarem exclu- rica, ele procurou estabelecer e reforçar esses laços sividade daquela camada social. Os monarcas caro- pessoais. A origem da vassalagem é difícil de ser língios, ao incentivarem a difusão dos laços vassáli- determinada, mas sua importância data de meados cos, pensavam reforçar seu poder: como eles tinham doséculoVIII. muitos vassalos, que por sua vez estabeleciam seus Terminologicamente, foientão que vassalus su- próprios vassalos, esta parecia ao rei uma forma de plantou outras palavras quetambém designavam um estender seu controle a todos os escalões da socie- homem livre que se havia recomendado a outro. dade. 20 Hilário Franco Ir. o Feudalismo 21 Contudo, o resultado foi oposto, pois muitas leramento do processo de privatização da defesa fo- vezes os vínculos de um vassalo para com seu senhor ram os ataques vikings, sarracenos ehúngaros. Como levavam-no a defender os interesses deste e não os do sua fase aguda ocorreu após a divisão do Império rei. Como observou Ganshof, "a difusão das relações Carolíngio e num contexto de crescente fraqueza dos vassálicas acabou por subtrair, em larga medida, um poderes públicos, a resistência aos invasores só pode- grande número de homens livres à autoridade ime- ria ser feita pelos condes e outros efetivos detentores diata do Estado". Mas, por outro lado, lembra o de poder em cada região. Além disso, os ataques de mesmo autor, aquelas relações mantinham um vín- surpresa e a rapidez da retirada dos invasores impe- culo entre os grandes senhoresterritoriais eo rei, for- diam que a lenta mobilização dos exércitos reais necendo "um elemento, e até elemento capital, de conseguisse sucesso. Para sobreviver, a Europa cató- resistência àcompleta dissolução do Estado" . lica cobriu-se de castelos e fortalezas. A fragmenta- Quinto aspecto das origens do Feudalismo: a ção política completou-se, pois a regionalização da privatização da defesa. Naturalmente, ele decorria defesa era uma necessidade. de todos os aspectos anteriores, e tanto entre os Outro aspecto a considerarmos é a clericalização romanos quanto entre os germanos havia anteceden- da sociedade, uma das mais profundas transforma- tes institucionais: milícias particulares com laços de ções ocorridas no Baixo Império Romano. Esse fenô- devotamento pessoal ligando os guerreiros a. seu meno acompanhava os progressos do cristianismo, chefe. De fato, desde o século IV, diante da fraqueza acentuando-se a partir do século IV com a vitória do Estado, os latifundiários romanos contavam com definitiva dessa religião. Êverdade que o velho paga- grupos armados, os bucellarii, para preservar a or- nismo greco-romano possuíra uma camada sacerdo- dem dentro de seus domínios eprotegê-los do bandi- tal, mas jamais ela chegou a se organizar institu- tismo e de incursões bárbaras. Entre os germanos, cionalmente, a constituir uma Igreja. Daí sua limi- coerentemente com sua civilização tribal e bélica) .tada importância social, Pode-se assim falar, a partir havia o companheirismo ou comitatus . Tratava-se da cristianização do império, em clericalização da aqui de um bando de guerreiros ligados por um sociedade em dois sentidos: quantitativamente, por- juramento ao chefe, ao lado de quem deviam lutar que a proporção de clérigos em relação ao conjunto até a morte, em troca de seu comando e de uma parte da população torna-se muito superior à que existira do saque. Derivados desta instituição surgiram na no paganismo ou mesmo que viria a existir em outras época merovíngia os antrustiones, guardas pessoais sociedades; qualitativamente, porque oclero torna-se do rei. No um grupo social diferenciado dos demais, possuidor entanto, o grande fator responsável pelo ace- de privilégios especiais e de grande poderio político-

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