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O espelho do mundo: Juquery, a história de um asilo PDF

338 Pages·2022·20.253 MB·Portuguese
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O ESPELHO DO MUNDO JUQUERY, A HISTÓRIA DE UM ASILO MARIA CLEMENTINA PEREIRA CUNHA maria Clementina pereira Cunha o espelho do mundo juquery, a história de um asilo IFCH/UNICAMP - CECULT/PUBLICAÇÕES 3ª EDIÇÃO / CAMPINAS - 2022 Universidade Estadual de Campinas Reitor: Antonio José de Almeida Meirelles Instituto de Filosofia e Ciências Humanas Diretora: Andréia Galvão Diretor Associado: Michel Nicolau Netto Comissão de Publicações Coordenação Geral: Michel Nicolau Netto Centro de Pesquisa em História Social da Cultura Diretora: Lucilene Reginaldo Coleção Sebo Eletrônico Comissão Editorial: Silvia Hunold Lara (coordenadora) Angela de Castro Gomes Jean Hébrard José Maurício Paiva A. Arruti Maria Clementina Pereira Cunha Esta publicação foi realizada com apoio parcial da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior Brasil (Capes). Código de Financiamento 001. Copyright © 2022 by Maria Clementina Pereira Cunha Este e-book está licenciado por Creative Commons Atribuição-Não-Comercial-Sem Derivadas 4.0 Internacional Para Mariana (foi por ela que sonhei, há muito tempo, um mundo sem manicômios) Não me leias se buscas flamante novidade ou sopro de Camões. Aquilo que revelo e o mais que segue oculto em vítreos alçapões são notícias humanas, simples estar-no-mundo. Carlos Drummond de Andrade, “Poema-orelha” em A Vida Passada a Limpo, 1959. sumÁrio Prefácio à terceira edição ........................................................ 07 introdução ............................................................................................. 19 caPÍtuLo 1 Os mil rostos da desordem .......................................................................... 31 caPÍtuLo 2 Da “casa de loucos” à ordem terapêutica: o hospício do Juquery ......... 94 caPÍtuLo 3 O outro lado do espelho ............................................................................. 167 caPÍtuLo 4 Higiene mental e ordem social ................................................................ 246 concLuSÕe S: De volta ao começo ...................................................................................... 316 fonteS e bibLiografia .................................................................... 323 Sobre a autora .................................................................................. 337 prefÁCio à terCeira edição A decisão de reeditar um livro que chegou às prateleiras das livrarias há mais de 30 anos não é simples. Livros costu- mam envelhecer, assim como as pessoas. Seguir a tentação de atualizar os argumentos, renovar marcos teóricos e mes- mo complementar a investigação quase equivaleria a produ- zir outro volume, diferente do primeiro mas destituído do seu frescor e novidade. Assim, quase sempre os autores op- tam, quando se veem nesta situação, por manter quase in- tocadas as páginas originais e acrescentar uma explicação prévia sobre a oportunidade ou o significado do reapareci- mento daquilo que foi produzido com décadas de distancia- mento. É o que farei – e não apenas por mero dever de ofício. Publiquei este texto, resultado de minha tese de doutorado na USP, em 1986. Ainda hoje, interessados me procuram para saber mais sobre um ou outro ponto discutido em suas pági- nas ou sobre os arquivos e a documentação utilizada. Alguns dizem que o livro se tornou uma referência para estudiosos da história da saúde mental no país – o que, evidentemente, me deixa envaidecida e satisfeita pelo trabalho realizado, em- bora sua intenção primordial fosse apenas desvendar alguns dos significados da República que foi construída no Brasil, cujos mecanismos de exclusão social adotaram a linguagem ditada pelos saberes e técnicas de controle do século XX. O espelho do mundo / Maria Clementina Pereira Cunha / 7 sumário Como mencionei, se fosse escrevê-lo agora ele não seria o mesmo, com a análise matizada pelo amadurecimento inte- lectual e pelos muitos anos decorridos. Mas manteria sem dúvida sua perspectiva central, ainda que hoje menos es- perançosa quanto ao futuro e um tanto amargurada pelas circunstâncias em que o livro, em sua forma atual, é reapre- sentado ao público leitor. Foram justamente as tais circuns- tâncias que me levaram a decidir lançar esta nova edição gratuita e eletrônica, certa de que o livro ainda pode ser útil mais de três décadas depois de ter sido escrito. É que o Bra- sil, como nos mostram os jornais todos os dias nos últimos anos, parece conformado em realizar o aforismo de Millôr Fernandes, que sintetizou como ninguém sua trajetória. “Te- mos um grande passado pela frente”, sim. Explico: naqueles muitos meses, na década de 1980, em que ia semanalmente ao Hospital do Juquery para realizar a pes- quisa que deu origem a este livro, muita coisa estava aconte- cendo em seus corredores e também no país como um todo. A historiografia que brotava da minha geração universitá- ria era, ao mesmo tempo, um sintoma e um anúncio dos no- vos tempos: temas e sujeitos históricos, antes ignorados ou relegados ao silêncio, gritavam com força naquelas páginas abrindo caminho para um entendimento renovado do pas- sado. Primeiro foi o interesse pelo movimento operário que despertou quase simultaneamente às greves do ABC, nos O espelho do mundo / Maria Clementina Pereira Cunha / 8 sumário cenários da política e da produção acadêmica. Uma profun- da reavaliação dos significados e dimensões da escravidão e do racismo na história brasileira teve um impulso inédito nos anos 1980 e abriu caminhos de investigação nunca ex- plorados. Outros personagens passaram a ter protagonismo nessa nova intelecção da história – como as mulheres e as mi- norias esmagadas por séculos de opressão e silêncio. Havia E. P. Thompson e também havia Michel Foucault, entre ou- tras referências importantes, mas sobretudo surgiam novas perguntas a serem feitas ao passado, novas fontes a serem trazidas à luz, diferentes perspectivas para a compreensão da história e a construção do futuro. Os “loucos” de que me ocupei nesse período tinham muitas companhias em meio a este forte movimento de renovação intelectual e política. A ditadura militar se esgotava, embora eventualmente ain- da mostrasse os dentes – que se mantiveram afiados, como o tempo acabou por nos mostrar. Em São Paulo, o primeiro governo estadual eleito em muitos anos expressava a cres- cente oposição ao regime. Mesmo que fosse alguém da ala mais moderada, pela primeira vez uma eleição direta insta- lava um de seus representantes no Palácio dos Bandeiran- tes, contra a vontade dos generais. O governador era André Franco Montoro e suas possibilidades de ação estavam, sem dúvida, limitadas pela condição política do país. Se não po- dia atuar diretamente sobre áreas mais sensíveis no cam- po da política, Montoro não abdicou de deixar sua marca. O espelho do mundo / Maria Clementina Pereira Cunha / 9 sumário Acima de tudo, explicitou as diferenças com o regime mili- tar no trato com questões cujo potencial era forte o suficien- te para o campo da oposição que, nas ruas, ensaiava o coro das “diretas já”: o apreço pelos direitos humanos. O Juquery foi escolhido naquele momento, ao que parece, como uma espécie de espaço simbólico para demonstrar essa diferen- ça básica entre a ditadura e a democracia. Foi graças a isso que consegui, em contato pessoal com o dr. João Yunes, Secretário de Saúde na época, uma autorização para ter acesso aos arquivos médicos do velho hospício, se- pultados em uma imensa sala úmida, em condições tecnica- mente pouco adequadas. A direção do hospital havia negado anteriormente, sem discussão, a possibilidade da pesqui- sa. O novo governo foi capaz de vislumbrar sua relevância e deu o suporte necessário àquela pequena invasão acadêmi- ca dos sagrados arquivos dos alienistas e seus sucessores. Havia condições para a pesquisa, que deviam ser respeita- das: uma data limite para os prontuários a serem consulta- dos, a garantia do anonimato dos internos, além de outros fatores capazes de proteger os pacientes e preservar a inti- midade de suas famílias – coisas que, na primeira tentativa frustrada, eu mesma já tinha proposto ao diretor em exercí- cio, em respeito aos princípios éticos que devem guiar qual- quer pesquisador deste e de outros assuntos delicados para os indivíduos envolvidos. O espelho do mundo / Maria Clementina Pereira Cunha / 10 sumário

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