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O demônio do meio-dia - Uma anatomia da depressão PDF

664 Pages·2014·3.43 MB·Portuguese
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A meu pai, que por duas vezes me deu a vida. Sumário Uma nota sobre método 1. Depressão 2. Colapsos 3. Tratamentos 4. Alternativas 5. Populações 6. Vício 7. Suicídio 8. História 9. Pobreza 10. Política 11. Evolução 12. Esperança Epílogo Notas Bibliografia Agradecimentos Sobre o autor Tudo passa — sofrimento, dor, sangue, fome, peste. A espada também passará, mas as estrelas ainda permanecerão quando as sombras de nossa presença e nossos feitos se tiverem desvanecido da Terra. Não há homem que não saiba disso. Por que então não voltamos nossos olhos para as estrelas? Por quê? MIKHAIL BULGAKOV, O exército branco1 Uma nota sobre método Escrever este livro foi tudo que fiz nos últimos cinco anos, e às vezes encontro dificuldades para ligar minhas próprias ideias a suas várias fontes. Tentei dar crédito a todas as influências nas notas no final do livro e não distrair os leitores com jargões e uma infinidade de nomes técnicos obscuros no texto principal. Pedi àqueles cujos casos são utilizados neste livro que me permitissem usar seus nomes verdadeiros, já que nomes reais emprestam credibilidade a histórias reais. Num livro que tem como um dos principais objetivos remover o estigma da doença mental, é importante não reforçar esse estigma escondendo a identidade de pessoas deprimidas. No entanto, incluí as histórias de sete pessoas que desejaram ser mencionadas por pseudônimos, e que me convenceram de que tinham um motivo importante para tal. Elas aparecem neste texto como Sheila Hernandez, Frank Rusakoff, Bill Stein, Danquille Stetson, Lolly Washington, Claudia Weaver e Fred Wilson. Nenhum deles é uma combinação de diferentes pessoas, e me esforcei para não mudar nenhum detalhe. Os membros dos Grupos de Apoio às Pessoas com Transtornos de Humor (Mood Disorders Support Groups, MDSG) usam apenas o primeiro nome; eles foram alterados para manter a privacidade dos encontros. Todos os outros nomes são verdadeiros. Deixei que os homens e mulheres cujas batalhas são o tema central deste livro contassem suas histórias. Fiz o melhor que pude para obter deles histórias coerentes, mas em geral não verifiquei os fatos em seus relatos. Não insisti para que toda narrativa pessoal fosse estritamente linear. Perguntam-me frequentemente como encontrei essas pessoas. Alguns profissionais me ajudaram com acesso a seus pacientes, conforme assinalado nos agradecimentos. Conheci um enorme número de pessoas no dia a dia que ofereceram voluntariamente, após tomar conhecimento de meu assunto, suas próprias copiosas histórias, algumas extremamente fascinantes e que se tornaram por fim fonte daquelas histórias que narro. Publiquei um artigo sobre depressão na revista The New Yorker em 1998 e recebi mais de mil cartas nos meses seguintes.1 Graham Greene certa vez disse: “Às vezes cogito como é que todos os que não escrevem, não compõem ou não pintam conseguem escapar da loucura, da melancolia, do pânico inerente à condição humana”.2 Acho que ele subestimou amplamente o número de pessoas que escrevem de um modo ou de outro para aliviar a melancolia e o pânico. Respondendo ao meu dilúvio de correspondência, perguntei a certas pessoas, cujas cartas achei especialmente comoventes, se estariam interessadas em dar entrevistas para este livro. Além disso, fiz muitas palestras e assisti a inúmeras conferências onde conheci pessoas que recebem assistência médica. Nunca havia escrito sobre um assunto a respeito do qual tantos tivessem tanto a dizer, ou sobre o qual tantos tivessem decidido me falar a respeito. É assustadoramente fácil acumular material sobre depressão. No final, senti que o que faltava no campo dos estudos da depressão era síntese. Ciência, filosofia, lei, psicologia, literatura, arte, história e muitas outras disciplinas têm se voltado independentemente para a causa da depressão. Muitas coisas interessantes estão acontecendo a muitas pessoas interessantes, e muitas coisas interessantes estão sendo ditas e publicadas — portanto, o caos reina. O primeiro objetivo deste livro é a empatia. O segundo, que para mim tem sido muito mais difícil de atingir, é a ordem: uma ordem baseada, tão estritamente quanto possível, no empirismo, e não nas generalizações impetuosas extraídas de histórias escolhidas ao acaso. Preciso enfatizar que não sou médico, psicólogo ou mesmo filósofo. Este é um livro extremamente pessoal e não deve ser encarado como nada além disso. Embora eu ofereça explicações e interpretações de ideias complexas, este livro não pretende substituir o tratamento apropriado. Em prol da legibilidade, não usei reticências ou parênteses em citações de fontes orais ou escritas onde senti que as palavras omitidas ou acrescentadas não mudavam o significado; qualquer pessoa que deseje se remeter a essas fontes deve voltar aos originais, todos catalogados no final deste livro. Citações sem referências pertencem a entrevistas pessoais, a maior parte realizada entre 1995 e 2001. Usei estatísticas de estudos sólidos, sentindo-me muito à vontade com aquelas extensamente reproduzidas ou frequentemente citadas. Minha descoberta, de um modo geral, é que as estatísticas neste campo são inconsistentes e que muitos autores as selecionam para construir um conjunto atraente que apoie teorias preexistentes. Por exemplo, encontrei um estudo importante mostrando que pessoas deprimidas que usam drogas quase sempre escolhem estimulantes; e outro, igualmente convincente, demonstrando que os deprimidos que usam drogas usam invariavelmente opiáceos. Muitos autores assumem um ar nauseante de invencibilidade ao utilizar estatísticas: como se algo que ocorre 82,37% das vezes fosse mais palpável e verdadeiro do que algo que ocorre três em cada quatro vezes. Minha experiência diz que os números são os que mentem. As questões que descrevem não podem ser definidas com clareza. A declaração mais precisa a ser feita sobre a periodicidade da depressão é que ela ocorre com frequência e em geral afeta a vida de todos, direta ou indiretamente. É difícil para mim escrever sem preconceito sobre as empresas farmacêuticas, porque meu pai trabalhou nesse mercado durante a maior parte de minha vida adulta. Em consequência disso, conheci muitas pessoas dessa área. Hoje em dia, é moda execrar a indústria farmacêutica, afirmando que ela tira vantagem do doente. Minha experiência diz que as pessoas na indústria são tão capitalistas quanto idealistas — gente interessada em lucro, mas também otimista quanto ao fato de seu trabalho poder beneficiar o mundo, de poder realizar importantes descobertas que levarão algumas doenças à erradicação. Sem as empresas que patrocinaram a pesquisa, não teríamos os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), antidepressivos que salvaram muitas vidas. Esforcei-me para escrever claramente sobre a indústria, já que ela é parte da história deste livro. Depois de sua experiência com minha depressão, meu pai estendeu o escopo de sua companhia para o campo dos antidepressivos. Sua empresa, a Forest Laboratories, é agora o distribuidor norte-americano do Celexa [mais conhecido no Brasil como Citalopram].3 Para evitar qualquer conflito explícito de interesses, não mencionei o produto exceto onde sua omissão seria evidente ou prejudicial. Enquanto eu escrevia este livro, perguntavam-me frequentemente se a escrita era catártica. Não era. Minha experiência está de acordo com a de outros que escreveram sobre esse campo. Escrever sobre depressão é doloroso, triste, solitário e estressante.4 Contudo, a ideia de que eu estava fazendo algo que poderia ser útil a outros era gratificante; e o aumento de conhecimento me tem sido útil. Espero que fique claro que o prazer primordial deste livro é mais de comunicação literária do que libertação terapêutica da expressão pessoal. Comecei escrevendo sobre minha depressão; depois, sobre depressão similar em outros; em seguida, sobre diferentes tipos de depressão em outros; e finalmente sobre a depressão em contextos completamente diferentes. Incluí três histórias de fora dos países desenvolvidos neste livro. As narrativas de meus encontros com gente do Camboja, Senegal e Groenlândia foram inclusas numa tentativa de contrabalançar ideias de depressão específicas a uma só cultura que têm circunscrito muitos estudos na área. Minhas viagens a lugares desconhecidos foram aventuras tingidas de um certo exotismo, e não suprimi a qualidade de conto de fadas desses encontros. Sob vários nomes e disfarces, a depressão é e sempre foi onipresente por motivos bioquímicos e sociais. Este livro se esforça para abarcar a extensão do alcance temporal e geográfico da depressão. Se às vezes parece que a depressão é uma aflição própria da classe média do Ocidente moderno, isso se deve ao fato de que é nessa comunidade que repentinamente estamos ganhando uma nova sofisticação no reconhecimento, nomeação, tratamento e aceitação da depressão — e não porque temos quaisquer direitos especiais sobre a doença em si. Nenhum livro pode abarcar a extensão do sofrimento humano, mas espero que indicar tal extensão ajude a liberar algumas pessoas que sofrem de depressão. Jamais poderemos eliminar toda a infelicidade, e aliviar a depressão não assegura a felicidade, mas espero que o conhecimento contido neste livro ajude a eliminar parte da dor para algumas pessoas. 1. Depressão A depressão é a imperfeição no amor.1 Para poder amar, temos que ser capazes de nos desesperarmos ante as perdas, e a depressão é o mecanismo desse desespero. Quando ela chega, destrói o indivíduo e finalmente ofusca sua capacidade de dar ou receber afeição. Ela é a solidão dentro de nós que se torna manifesta e destrói não apenas a conexão com outros, mas também a capacidade de estar em paz consigo mesmo. Embora não previna contra a depressão, o amor é o que tranquiliza a mente e a protege de si mesma. Medicamentos e psicoterapia podem renovar essa proteção, tornando mais fácil amar e ser amado, e é por isso que funcionam. Quando estão bem, certas pessoas amam a si mesmas, algumas amam a outros, há quem ame o trabalho e quem ame Deus: qualquer uma dessas paixões pode oferecer o sentido vital de propósito, que é o oposto da depressão. O amor nos abandona de tempos em tempos, e nós abandonamos o amor. Na depressão, a falta de significado de cada empreendimento e de cada emoção, a falta de significado da própria vida se tornam evidentes. O único sentimento que resta nesse estado despido de amor é a insignificância. A vida é repleta de tristezas: pouco importa o que fazemos, no final todos vamos morrer; cada um de nós está preso à solidão de um corpo independente; o tempo passa, e o que passou nunca voltará. A dor é a nossa primeira experiência de desamparo no mundo, e ela nunca nos deixa. Ficamos com raiva de sermos arrancados do ventre confortável e, assim que a raiva se dissipa, a depressão chega para assumir seu lugar. Mesmo as pessoas que se apoiam em uma fé que lhes promete uma existência diferente no além não podem evitar a angústia neste mundo; o próprio Cristo foi o homem dos sofrimentos. Contudo, vivemos numa época de paliativos crescentes. Nunca foi tão fácil decidir o que sentir e o que não sentir. Há cada vez menos desconfortos inevitáveis para os que têm como evitá-los. Entretanto, apesar

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Lançado em 2000, O demônio do meio-dia continua sendo uma referência sobre a depressão, para leigos e especialistas. Com rara humanidade, sabedoria e erudição, o premiado autor Andrew Solomon convida o leitor a uma jornada sem precedentes pelos meandros de um dos temas mais espinhosos e comple
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