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o ajuste neoliberal PDF

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O AJUSTE NEOLIBERAL: IMPACTOS NA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL Cleide Ana Rodrigues Mendes 1 Patrícia Jobim Santos2 RESUMO O presente artigo visa refletir acerca do Ajuste Neoliberal e seus impactos na política de saúde, já que os mesmos atingem visivelmente esta área. A metodologia utilizada foi pesquisa bibliográfica, sendo examinadas literaturas condizentes ao tema proposto. Diante da constatação das dificuldades de uma saúde “doente”, faz-se necessário refletir a origem dessa problemática e, a partir daí, analisar os impactos que recaem sobre ela. Entendemos que a saúde foi fortemente influenciada pelo ajuste neoliberal implementado no Brasil, principalmente a partir da década de 1990. Sendo assim objetiva-se adquirir embasamento teórico-metodológico do processo histórico de constituição desta política social, bem como apreender suas determinações no presente, para que possamos instrumentalizar os profissionais, movimentos sociais, usuários e demais atores vinculados à saúde. Palavras-chave: Ajuste Neoliberal; Capitalismo; Políticas de Saúde. 1 - Assistente Social - Pós Graduação em Instrumentalidade do Serviço Social com Ênfase em saúde, Assistência, Previdência e Poder Judiciário (UNESAV) – CRESS – 18.505. 2 - Assistente Social – Mestre em Serviço Social (UFJF) – Analista Executivo de Defesa Social (SEDS)/MG. 2 1. INTRODUÇÃO Este artigo busca apreender as premissas sob as quais o pensamento liberal reaparece na contemporaneidade apresentando novas configurações a partir de 1970, e os impactos desse processo para a política social de saúde, com um especial interesse na situação brasileira. O neoliberalismo promove um novo reordenamento político, econômico e social que irradiou pelo mundo, iniciando pela Europa e os Estados Unidos e influenciando todos os países de forma geral. Emerge como resposta à crise de superacumulação do capital, questionando o Estado de Bem-Estar Social presente até então vigente. O último quartel do século XX foi marcado em termos econômico-socias por altos índices de inflação, dificuldade de recuperação dos superlucros, derrotas sindicais, aumento considerável do desemprego e a uma desigualdade social crescente. Observa-se com clareza o elo entre o neoliberalismo e acumulação capitalista, onde um justifica o outro. São os países subdesenvolvidos que mais sentem os impactos provocados pelos ajustes neoliberais e sofrem, por exemplo, com o desemprego, o aumento da desigualdade social, a privatização e a dependência de capital estrangeiro, o que causa uma devastadora privação de direitos e benefícios àquela população mais atingida e carente de um olhar mais apurado por parte das autoridades políticas e do poder vigente. Atualmente convivemos com as consequências de uma política que se sobrepõe ao coletivo, ao social em função da variável econômica. O neoliberalismo promove impactos na sociedade de maneira decisiva, já que prejudica as políticas públicas, como: a educação, a previdência social e a saúde, que são áreas bases da vida do cidadão construtor da sociedade. Neste sentido, o presente artigo visa demonstrar a importância do entendimento do impacto da política neoliberal, principalmente na área da saúde no âmbito brasileiro, a qual é vital tanto para a população como para o país e seu desenvolvimento econômico. Porque entendemos que a saúde é o bem maior dos seres humanos e é do sistema político vigente a responsabilidade pela promoção de uma devida e justa redistribuição dos bens socialmente produzidos, sejam estes financeiros, tecnológicos ou humanos. Para tanto, a metodologia utilizada no desenvolvimento deste estudo foi a pesquisa bibliográfica, sendo examinados livros, periódicos e artigos científicos para criação de um referencial téorico crítico, que nos possilibitou uma leitura da realidade para além de sua 3 pseudoconcreticidade. Dentre os autores que contribuíram para a elucidação da temática, citamos Vargas (2008), Soares (2002), Pereira (2000), Silva (2007), Behring e Boschetti (2007), Cohn (2001), dentre outros. 1. POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Faz-se necessário descrevermos os fatos históricos ocorridos no decorrer da trajetória das políticas públicas da saúde no Brasil a partir do século XX, por entendermos que esse setor está intrinsecamente atrelado ao contexto político, social e econômico do país, sendo esses setores e suas evoluções complexas e indissociáveis uns dos outros. Enfatiza Vargas (2008) que no início o século XX, nossa economia era primordialmente agrícola, com dependência da exportação do café e do açúcar. Mesmo com o crescimento econômico, este período foi de crise econômica, social e sanitária, devido às epidemias que assolaram a população, como a febre amarela, que provocou temor e impediu a estadia de navios estrangeiros que precisavam atracar nos portos brasileiros, o que prejudicou a exportação cafeeira e também a imigração de mão de obra. As medidas do governo focaram-se em estradas e portos, que eram os espaços que as mercadorias circulavam. O autor ressalta que no ano de 1902, o Rio de Janeiro não possuía saneamento básico e doenças como a varíola, a malária, a febre amarela e a peste espalhavam-se de forma vertiginosa. Portanto, para solucionar essa questão, o médico sanitarista Oswaldo Cruz foi nomeado para diretor do Departamento Federal de Saúde Pública. Com auxílio policial, o sanitarista invadiu as casas e queimou roupas e colchões sem, contudo, promover ações educativas. Também foi declarada a obrigatoriedade da vacinação contra a varíola. Esses acontecimentos fizeram com que a população se revoltasse, foi a chamada Revolta da Vacina e culminou no afastamento de Oswaldo Cruz. Essa ação do sanitarista ficou conhecida como campanhista. Mesmo sob arbitrariedades e abusos, esse modelo sanitário concebeu vitórias no combate às doenças epidêmicas, tornando-se uma proposta hegemônica na intervenção da saúde coletiva durante muitos anos. Ressalta o autor que devido ao sucesso do controle das epidemias urbanas, o modelo campanhista se enveredou na área rural. 4 Assim, com a crescente urbanização, a utilização de mão de obra imigrante europeia – italianos e portugueses – o país apresentou desenvolvimento. Entretanto, os operários não possuíam garantias trabalhistas, e dessa forma, os imigrantes iniciam um processo de mobilização da classe operária no Brasil, ocorrendo duas greves gerais (1917 e 1919) na luta por seus direitos. Esses movimentos deram margem para a conquista de direitos sociais (VARGAS, 2008). A partir do declínio da cultura cafeeira (VARGAS, 2008), mudou-se o modelo econômico para um de enfoque industrial. Dessa maneira, a necessidade de saneamento passa dos espaços de circulação de mercadorias para a manutenção do corpo do trabalhador. Em 1930, com a ascensão de Getúlio Vargas e a queda das oligarquias do poder, ocorre uma extensa reforma, tanto administrativa como política, que embasa a Constituição de 1934 e, em 1937, a ditadura do Estado Novo. Essa fase marca uma participação estatal maior nas políticas públicas, com vistas populistas. Também nesse período, ocorrem movimentos trabalhistas que resultam em medidas no âmbito das políticas sociais. Assim, foi criado o Ministério do Trabalho, para que, também, se estabelecesse medidas de regulação da atividade sindical (VARGAS, 2008). Ao final da década de 1950, começou-se novamente a discussão acerca da saúde pública, no que tange às suas práticas e os limites financeiros do Estado perante os problemas sanitários. “[...] delineando-se assim, pouco a pouco, um outro padrão de atendimento à saúde, mais hospitalar e curativo [...]” (VASCONCELLOS, 1995 apud VARGAS, 2008, p. 16). Em 1960, os Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs – criados em 1930), se unificaram regidos pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), através do surgimento da Lei Orgânica da Previdência Social (Lei Nº 3.807, de 26 e agosto de 1960). É a primeira vez que se define uma contribuição efetiva do Erário Público, além da contribuição já ofertada pelos trabalhadores e as empresas. Somente em 1967, essas medidas foram efetivadas pelos militares que unificaram as IAPs e criaram o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS). Assim, o governo militar obrigou-se a incorporar outros benefícios como a assistência médica, antes oferecida pelos IAPs (VARGAS, 2008). Segundo Vargas (2008) o aumento expressivo dos contribuintes e beneficiários provocou mudanças e o governo militar precisou alocar seus recursos para ampliar o sistema e, dessa forma, optou por direcioná-los para a iniciativa privada. Também ocorreram 5 mudanças estruturais, que culminaram na criação do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), no ano de 1978, com a finalidade de intermediar os repasses para a iniciativa privada. Cabe ressaltar que no ano de 1974 foi criado o Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social (FAS), promovendo a remodelação e ampliação de hospitais privados através de empréstimos com juros subsidiados, o que ocasionou um boom na rede privada. Afirma o autor que “[...] Este modelo criado pelo governo pautava-se no pensamento da medicina curativa, com poucas medidas preventivas e sanitaristas” (INDRIUNA, 2008 apud VARGAS, 2008, p. 17). Para Vargas (2008), no início da década de 1980, esse sistema apresentou sinais de esgotamento por conta dos recursos distribuídos em aposentadorias e pensões. A partir daí, buscou-se reestruturar movimentos em defesa de uma política de saúde ampla e que favorecesse a todos. O I Simpósio Nacional de Política de Saúde, realizado pela comissão de saúde da Câmara dos Deputados, em 1979, foi o primeiro marco da Reforma Sanitária brasileira. Foi o início das discussões acerca do Sistema Único de Saúde, que visava a universalização do direito à saúde, racionalização e integralidade das ações, democratização e participação popular, e também experiências de atenção primária e de cobertura extensa a nível nacional. O autor enfatiza que outro marco da questão saúde ocorreu em Brasília, no ano de 1986, a VIII Conferência Nacional de Saúde, da qual contou com aproximadamente cinco mil pessoas, entre as quais profissionais de saúde, usuários, políticos, lideranças populares e sindicais, para discutirem uma nova proposta e estrutura de política de saúde. A Constituição de 1988 incorporou uma grande parte das propostas da Conferência e incluiu em seu texto sobre a Seguridade Social, a saúde como direito de todos e dever do Estado. No entanto, a regulamentação do SUS só veio mais tarde, em 1990, através da Lei 8.080. Fleury (2006) apud Behring e Almeida (2010, p. 195) considera que a Constituição de 1988 intentou gerar mecanismos mais solidários com nova redistribuição a fim de que não ocorresse uma cobertura restrita no mercado formal de trabalho, bem como flexibilização de contribuição e benefícios. Assim, a seguridade social passou a ocupar espaço relevante no debate constitucional, sendo compreendida como “um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social” (Título VIII, Capítulo II, Seção I, art. 194 da CF) (BEHRING e ALMEIDA, 2010, p. 195). 6 Nos anos 1990, o ajuste e a reforma do Estado ganham destaque e são estimuladas pelo ideário neoliberal internacional, que incluía privatização, reforma administrativa, redução dos gastos públicos e saída do Estado da provisão de serviços. “[...] É, portanto, na esteira do discurso reformista, de cunho marcadamente neoliberal, que se desenvolveram os debates acerca da necessidade de reorganização do modelo de seguridade social brasileiro” (BEHRING e ALMEIDA, 2010, p. 198). Ao chegarmos ao período de 1991 a 1994, com a eleição de Collor e sua política neoliberal-privatizante, o que se pretendeu foi reduzir ao mínimo as ações do Estado. “[...] Tal discurso fundamentava-se na redução dos gastos públicos pela privatização das empresas estatais, porém na prática, essa redução de gastos atingiu a todos os setores do governo, inclusive o da saúde” (VARGAS, 2008, p. 22). Behring e Almeida (2010) afirmam que o governo Collor foi bastante conservador e patrimonialista, o que foi um contraponto às diretrizes das reformas sociais que tentavam se consolidar. Vargas (2008) ressalta que em 1995, o presidente Fernando Henrique Cardoso manteve e intensificou a implementação do modelo neoliberal e fortaleceu a ideologia da globalização. “[...] É importante mencionar que o imposto teria uma duração definida de vigência que seria por um período de dois anos, e que os recursos arrecadados somente poderiam ser aplicados na área de saúde” (VARGAS, 2008, p. 23). Cabe ressaltar, também, que aconteceram muitas denúncias de desvio de verbas da CPMF por parte do governo. Em 1996, editou-se a NOB-SUS 01/96 (Normas Operacionais Básicas de 1996), que têm o objetivo de simplificar a forma de operacionalizar o sistema. Essa NOB-SUS foi um avanço porque propôs aos municípios que se encaixassem nos modelos de Gestão Plena de Atenção Básica e Gestão Plena do Sistema Municipal. Em crise, a saúde pública não cumpria suas propostas de atendimento universal e equânime devido ao seu orçamento, que não era compatível com a demanda da população. Por isso, a EC 29 foi um relevante avanço com o intuito de amenizar a instabilidade no financiamento do setor, sendo uma conquista da sociedade (VARGAS, 2008). Para o autor, o novo governo seguiu os moldes do anterior. A CPMF (extinta em 2008) foi utilizada, enquanto estava em vigor, para outros fins, como cobrir parte das despesas financeiras anuais do governo. No entanto, mesmo com a continuidade da política neoliberal, ocorreram conquistas de suma importância para a saúde pública. Foi aprovado o Projeto de Lei complementar 01/2003, que regulamentou a EC 29. 7 Segundo Vargas (2008, p. 26) “A aprovação desse projeto aponta para o fortalecimento do controle social e ampliação do acesso à saúde à medida que impede que os recursos migrem para outras áreas ou projetos.” Também se destaca, nesse período, a instituição do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), prevendo a unificação do sistema e partilhando responsabilidades entre os entes federados e as instâncias do sistema descentralizado e participativo, bem como recomendando uma lógica orçamentária. Cabe ressaltar que o SUS representou um avanço, pois suas diretrizes – descentralização, integralidade da atenção e participação social – têm remontado o aspecto da atenção à saúde, proporcionando alterações de organização significativas, mas em contexto de confrontos e conflitos de interesses. A consolidação do SUS, entretanto, acotovelou-se com medidas de ajuste estrutural da economia e foi acompanhada por uma expansão do mercado de seguros e planos de saúde destinados à parcela da sociedade que possuía condições de adquirir este tipo de produto e podendo deduzir no imposto de renda (BEHRING e ALMEIDA, 2010). Como fica evidente neste texto apresentado sobre a saúde no Brasil, este é um setor permeado por decisões e ações de interesse governamental e nem sempre pautadas no coletivo, no cidadão enquanto provedor dos recursos públicos. Segundo Bravo (1996), à saúde na Constituição, é pensada sob influência do movimento da reforma sanitária (1970), como movimento social e batalha institucional, o que culmina na VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986, que propõe o Sistema Único e Descentralizado de Saúde (SUDS) e o conceito de saúde integral. Os ajustes que recaíram sobre as políticas sociais no Brasil incitaram reformas administrativas nas áreas do setor público e ficaram conhecidas como “Modernização do Setor Público” ou de “Reforma do Estado”. No entanto, essas reformas se limitavam a cortes quantitativos do funcionalismo público e mudanças de gestão, o que segundo Soares (2008) vem provocando modificações importantes no caráter público dos serviços sociais. Segundo Soares (2008) a concepção neoliberal de política social preconiza que o bem estar social é do âmbito privado. No caso do Brasil, jamais construímos efetivamente um Estado de Bem Estar Social, um conceito de política social constitutiva do direito de cidadania, ao invés disso a concepção vigente é emergencial, focalista, parcial, tornando a população pobre como única responsável pela resolução de seus problemas. Cohn (2001, p. 42) esclarece que, 8 [...] não cabe setorializar a política de saúde em programas estanques, mas formulá- la articuladamente às demais, para formarem um todo integrado. Não se trata de diminuir o peso do setor de saúde no conjunto das políticas públicas, mas sim de se ter consciência de que, tomadas de per si, as políticas de saúde têm claros limites impostos pela realidade de nossa sociedade. No governo de Luiz Inácio Lula da Silva, segundo Menicucci (2011) o tema da saúde não foi essencialmente valorizado e difundido na primeira campanha de Lula à presidência (2003-2007). No entanto, a autora avalia positivamente o primeiro mandato do presidente, a despeito de todas as limitações ocorridas e das críticas contrárias. [...] no plano de governo havia referência a propostas que seriam implantadas posteriormente e que seriam as principais inovações setoriais do primeiro mandato. Tratam-se das propostas relativas a uma política de saúde bucal, à questão das urgências/emergências, ao acesso a medicamentos com a proposta de criação da farmácia popular. O Plano incluía ainda outras propostas com caráter de continuidade, mas nem de longe menos importantes dado tratar-se de questões não equacionadas, como a ampliação do Programa de Saúde da Família (PSF), o reforço da atenção básica, o aprimoramento das relações intergovernamentais, a ampliação do acesso e a garantia da integralidade da assistência - esses dois últimos, embora integrem os princípios do SUS expressos na CF-1988, continuam sendo os grandes desafios da política de assistência à saúde no longo e difícil processo de sua construção (MENICUCCI, 2011). Para Cohn (2005, p. 394-395) a focalização na saúde brasileira não é restrita aos pobres “[...] refere-se a focos específicos a serem atingidos para a solução de um determinado problema e envolve grupos sociais a partir de determinadas características particulares. Nessa perspectiva, a focalização na saúde emerge no interior de uma concepção universalista, como estratégia de implantação da universalização como um direito. Em seu segundo mandato, Lula não inovou e pouco fez pela saúde, somente deu continuidade aos programas do primeiro mandato. Também alguns projetos sofreram derrotas parlamentares e foram abandonados (MENICUCCI, 2011). Segundo Tristão (2011) a inflexão do Partido dos Trabalhadores (PT) para o neoliberalismo foi paulatinamente construída no decorrer dos anos. Para a autora, a justificativa, num primeiro momento do mandato de Lula para determinadas posições foi a necessidade de conquistar a confiança do mercado, assim, não houve qualquer regulação do mesmo. Essa foi, segundo a autora, uma clara demonstração do neoliberalismo nas decisões desse governo. Andrioli (2006) considera que a alta de juros com a intenção de proteger o país da retirada de capitais, estrangulou o mercado interno. Em 2003, ainda havia poucos e baixos 9 investimentos, uma taxa de desemprego alta e perdas reais de renda para grande parte da população. Em 2004 foi possível retirar o país da recessão em que se encontrava devido a decorrência do volumoso aumento nas exportações, sendo viável um crescimento econômico significativo. Borlini (2010) ressalta que a partir de 2003, no governo Lula, havia muita ansiedade por medidas que dessem por fim o projeto privatizante e mercadológico das políticas econômicas e sociais, principalmente devido à trajetória progressista de Lula e seu partido. No entanto, outros autores confirmam que: o governo Lula manteve e deu continuidade às medidas neoliberais, imperantes no governo anterior, pois [...] no lugar de implementar uma transição para um novo modelo, defendida durante a campanha eleitoral, não só havia mantido a política macroeconômica do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso – FHC, como havia aprofundado, o que fica evidente com a manutenção do compromisso de promover o superávit fiscal primário [...] (MENDES e MARQUES, 2005, p. 259 apud BORLINI, 2010, p. 328). Visando os interesses do capital, algumas ações desse governo que se relacionam ao financiamento da saúde se destacam, como a Desvinculação de Receitas da União (DRU), a Emenda Constitucional 29 (EC-29) e a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Todas essas medidas seguem a lógica de desvio de recursos da saúde para outros fins econômicos (MENDES e MARQUES, 2005; 2007; 2009 apud BORLINI, 2010, p. 329). A autora ressalta a neutralidade do crescimento econômico no que tange à distribuição orçamentária, que aumenta ou diminui as desigualdades, de acordo com os interesses oficiais advindos de uma economia global. Por isso, para compreendermos a saúde no Brasil, precisamos conhecer qual o projeto político do país, como os recursos são distribuídos, quais decisões convergem para esse projeto e esses recursos. tal manipulação vem não somente prejudicar os valores a serem transferidos para os fundos de saúde, mas também dar suporte ao discurso de que a saúde pública não mais atende às demandas a ela repassadas e, que a única, ou quem sabe a mais plausível saída seria a entrega desse campo ao mercado. Nasce a ideia de que a “mão invisível” do mercado se torna mais eficiente na gestão do legado estatal (BORLINI, 2010, p. 331). Borlini (2010) aponta ainda que é mantido, nesse contexto, um discurso de crise na saúde, onde a ausência de recursos humanos, financiamento, gestão e estrutura física representam alvos das investidas neoliberais em demonstrar os obstáculos para a efetivação de um sistema de saúde público e universal. Entretanto, fica escamoteado o fato de que a crise na saúde não ocorre em função do modelo de sistema, mas ao contrário, é fruto dos 10 fatores “extrasaúde”, relacionados às políticas macroeconômicas (UGÁ; MARQUES, 2005 apud BORLINI, 2010, p. 331). Para Alves (2013) a herança neoliberal herdada pelos governos Lula e Dilma permanece entranhada em programas e projetos. A presidenta e seu governo adotam políticas de privatização do patrimônio público visando operar a lógica da governabilidade do Estado capitalista, políticas estas que vem sendo contestadas por muitos. [...] observamos, ao mesmo tempo, que os governos pós-neoliberais de Lula e Dilma não alteraram essencialmente o metabolismo político do Estado neoliberal instaurado na década de 1990 no Brasil, seja em sua dimensão restrita, como sociedade política e estrutura burocrática; seja em sua dimensão ampliada: a sociedade civil e seu sociometabolismo. Enfim, os governos pós-neoliberais, imbuídos do espírito do lulismo e em nome da governabilidade, optaram pragmaticamente por reproduzir o Estado neoliberal herdado da década de 1990; e pior, preservar essencialmente o Estado brasileiro de feição oligárquico-burguesa oriundo da ditadura militar. Soares (2002, p. 106) mostra-se otimista ao considerar que não se pode negar a “existência daquilo que poderíamos chamar de espaços de resistência ao neoliberalismo, não apenas no plano intelectual, mas também no plano da ação política e, sobretudo, da luta social”. E continua: assim, torna-se imperativo registrar, também como espaço de esperança, a enorme riqueza da realidade brasileira, suficientemente ampla e variada em termos de elaboração e implementação de políticas sociais públicas alternativas e opostas ao modelo dominante, na busca de uma maior justiça social. Nesse sentido, tem sido decisiva a eleição de governos democráticos populares, liderados por partidos de esquerda, tanto em prefeituras como em estados brasileiros, contradizendo, na prática, aqueles que afirmam que a esquerda não tem mais “alternativas” (SOARES, 2002, p. 106). Conclui a autora que se não há como fugir dos ajustes neoliberais, das suas consequências inevitáveis, também não há como fugir à luta social por um mundo mais justo, com menor disparidade social no que se refere à saúde no Brasil. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS A consolidação do neoliberalismo mundial se concretizou com o desmonte das políticas sociais dos Estados e suas economias. Ao liberar o mercado para que o mesmo fixe suas próprias regras, o capitalismo sempre foi, aos olhos das grandes potências econômicas, a única alternativa global de desenvolvimento. Alguns estudiosos afirmam que não existe um só 11

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