Departamento de Ciências da Vida Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra Dissertação para obtenção de grau de Mestre em Antropologia Médica Ano lectivo 2010/2011 Corpos em Pânico: Narrativas, Trajectórias e contribuições para uma Antropologia Médica da Perturbação de Pânico Marta Isabel da Silva Roriz de Matos Agosto de 2011 Orientação Científica: Professor Doutor Luís Quintais, Departamento de Ciências da Vida, FCTUC Aos meus pais Isabel e Joaquim Roriz. E à memória do avô João. i Agradecimentos Os meus agradecimentos, vão primeiro de tudo, para os informantes, não só os aqui contemplados, mas todas as pessoas com quem falei ao longo deste projecto, que me contaram as suas histórias íntimas, os seus momentos de desespero silenciado, e os medos que diariamente lutam para ultrapassar. A todos eles o meu muito obrigado, por toda a partilha e dinâmica que as nossas conversas criaram, enriquecendo o meu conhecimento e curiosidade sobre este fenómeno que vai muito além do que é possível narrar. Sem eles, este trabalho não teria sido possível. Quero agradecer também ao Doutor Pinto Gouveia, médico psiquiatra e Professor da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, que durante o período do meu trabalho de campo na Unidade de Psiquiatria dos Hospitais da Universidade de Coimbra, era o responsável pelas consultas de Psicoterapia Cognitivo- Comportamental. A ele devo o acesso que tive aos pacientes seguidos naquela unidade. O meu muito obrigado, por ter proposto em reunião aos profissionais que acompanhassem pacientes com perturbação de pânico, o meu projecto de estudo. Obrigada a todos eles por terem concordado e aprovado as minhas deambulações naquele serviço e acreditado no meu projecto. Sem as suas colaborações, jamais teria acedido aos pacientes. Ao Doutor Luís Quintais, o meu orientador, pelas conversas e orientações, pela amizade e por todo o conhecimento que me transmitiu ao longo do meu percurso académico. Será sempre para mim uma referência e uma inspiração. O meu muito obrigado. Ao Doutor João Arriscado Nunes, com quem tenho o prazer de trabalhar e aprender diariamente, que representa para mim a cristalização de um cientista social, e que me inspira a ser todos os dias uma investigadora competente e curiosa. Quero agradecer-lhe, para além de ser um homem de Ciência, toda a fé que me deposita. Não posso deixar de mencionar a Doutora Rita Serra, Ângela Marques Filipe, Carlos Barradas, Daniel Neves, Mayren Alavez, Filipa Queirós e Nelson Matos, por serem excelentes amigos e profissionais com quem tenho o prazer de trabalhar colaborativamente, e aprender diariamente. Quero agradecer aos amigos e amigas, eles sentem quem são. Estou-vos grata por terem estado presentes, e pelo apoio ao longo dos anos. Por último, e porque os últimos são sempre os primeiros, quero agradecer à minha família. Aos meus pais Isabel e Joaquim, ao meu irmão Paulo, e os meus avós, pelo apoio e amor incondicional. ii Resumo A crescente manifestação de ansiedade nos indivíduos das sociedades modernas contemporâneas, e sua crescente manifestação em episódios agudos, os ataques de pânico, são uma preocupação de saúde que requer a reflexão e investigação aqui proposta. A antropologia médica crítica, que explora as questões mais vastas de economia política de saúde actuais, relacionando-as com o nível micro das manifestações locais de doença (aqui tratadas como narrativas de doença), foi a abordagem usada para o presente estudo da perturbação de pânico. Analisou-se a transversalidade histórica da ansiedade e pânico, a influência da teoria cibernética e da história social para emergência desta categoria nosológica, assim como as próprias transformações da psiquiatria do século XX. Foram objecto de reflexão a abordagem evolutiva das emoções características da perturbação de pânico, e os contributos desta abordagem para um conhecimento mais amplo desta perturbação e das psicopatologias em geral; e perspectiva da teoria cognitiva, que tornou explícita a importância do papel das cognições catastróficas na fenomenologia do pânico. Através das histórias e narrativas recolhidas de sujeitos com perturbação de pânico, foi feita uma reflexão teórica sobre o corpo, na sua fragmentação e multiplicação contemporâneas, os processos de incorporação, e a interpretação da experiência subjectiva de doença espelhada em noções como self, agência, sensações, trauma e identidade. Palavras-chave: perturbação de pânico, cognições catastróficas, corpo, emoções, modernidade pós-moderna. iii Abstract The anxiety manifestations crescendo in individuals of contemporary modern societies, and its growing manifestations of acute episodes - the panic attacks - is a matter of health concern that requires the reflection, inquiries and research proposed here. The critical medical anthropology approach, which explores wider contemporary factors in health political economy putting them in relation to micro level analysis of local illness manifestations (used here in the form of illness narratives), was used to engage the present study of panic disorder. An analysis of the transversal history of anxiety and panic was undertaken, reflecting on the influence of cybernetic theory and social history to the emergence of this nosological category, as well as on psychiatry transformations during the 20th century. As objects of reflection undertaken in the present study were: the evolutionary approach to the characteristic emotions of panic disorder, and its contributions to a wider knowledge and comprehension on panic disorder and other psychiatric disorders in general; and the perspective of cognitive theory that clarified the importance of the role of catastrophic cognitions in the phenomenology of panic. Through the collected stories and illness narratives of panic disorder informants, a theoretical reflection was made on the concept of body, and its contemporary characteristics of fragmentation and multiplication; on incorporation processes and the interpretation of subjective illness experience mirrored in notions as self, agency, sensations, trauma and identity. Key-words: panic disorder, catastrophic cognitions, body, emotions, post-modern modernity iv Índice Prólogo, ix Introdução 1. Contexto, argumento e abordagem, 1 2. Nota metodológica, 6 Capitulo I Pânico num caleidoscópio histórico de teorias científicas 1. A transversalidade temporal da ansiedade e pânico, 8 2. A psicologia em torno do indivíduo: uma história social de pânico, 10 2.1 A psique cibernética, 11 3. A emergência do pânico como psicopatologia distinta, 12 3.1 A Conferência Sterling Foster e a mudança paradigmática na Psiquiatria, 13 4. Uma abordagem cognitiva do pânico, 15 4.1. As origens cognitivas e a importância das cognições catastróficas, 16 Capítulo II Perspectivas Evolutivas sobre o Pânico 1. Porquê uma perspectiva evolutiva?, 19 2. Emoções numa perspectiva evolutiva, 21 3. Ansiedade, medo e evolução, 22 4. Benefícios desta perspectiva para a compreensão da perturbação de pânico, 24 5. Limitações da perspectiva evolutiva, 25 Capítulo III Método Etnográfico e Trabalho de Campo 1. O método, 26 2. O Trabalho de Campo, 27 3. As narrativas, 28 4. Expressando Experiências, 30 5. Empregar a narrativa, 31 v Capitulo IV Pânico Narrado: Os estudos de caso 1. Estudo de Caso X, 33 1.1.Os primeiros episódios, 33 1.2.Trajectória e itinerário terapêutico, 34 1.3.Cognições catastróficas, comportamentos de evitação, sintomas e sensações, 35 1.4.Interpretações e percepções da experiência, 37 1.5.O tratamento e a actualidade, 40 2. Estudo de Caso S, 41 2.1.Os primeiros episódios, 41 2.2.Trajectória e itinerário terapêutico, 41 2.3.Cognições catastróficas, comportamentos de evitação, sintomas e sensações, 42 2.4.Interpretações e percepções da Experiência, 43 2.5.O tratamento e a actualidade, 47 3. Estudo de Caso N, 49 3.1. Os primeiros episódios, 49 3.2. Trajectória e itinerário terapêutico, 50 3.3.Cognições catastróficas, comportamentos de evitação, sintomas e sensações, 51 3.4.Interpretações e percepções da experiência, 53 3.5.O tratamento e a actualidade, 56 4. Estudo de caso A, 57 4.1.Os primeiros episódios, 58 4.2.Cognições catastróficas, comportamentos de evitação, sintomas e sensações, 63 4.3.Interpretações e reflexões sobre o mundo moral e interno de A, 65 4.4.Trajectória e Itinerário terapêutico, 65 Capitulo V Corpo e self seccionados 1. Corpo e self contemporâneos, 67 2. A experiência do corpo em sofrimento, 68 3. A cultura, as emoções e os processos de incorporação, 69 4. Pânico: emoções e interpretações de mundos sociais, 71 vi 5. Corpo e agência, 72 6. Interpretar as sensações de pânico, 72 7. Corpo e trauma, 74 8. Cognições catastróficas e o impacto no corpo, 75 9. Corpo e identidade, 77 Capítulo VI Fragmentação, Multiplicação e Vulnerabilidade na Sociedade Contemporânea 1. Os múltiplos selves e a cultura terapêutica,79 Considerações finais, 83 Anexos, 85 Bibliografia, 109 vii viii
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