QUEM é QUEM na Indústria Farmacêutica em Portugal 2018 Índice 8 | Entrevista Rosa Valente Matos, Secretária de Estado da Saúde com a tutela do medicamento, afirma que uma das prioridades do atual Gover- no tem sido a promoção de uma política sustentável na área do medicamento, que se traduziu num aumento do número de medica- mentos inovadores aprovados. 12 | Entrevista Em entrevista, João Almeida Lopes afirma que não existe nenhuma área da atividade económica tão transparente e em que as decla- rações de interesses sejam tão fundamentadas e expostas ao público como a da Saúde no seu todo e a dos medicamentos em particular. 05 Revista distribuída com O Jornal Económico 18 | Entrevista Propriedade: Megafin, Sociedade Editora SA Diretor: Filipe Alves Maria do Céu Machado, presidente da auto- Diretor adjunto: Shrikesh Laxmidas ridade reguladora do setor, diz que apesar de Subdiretor: Ricardo Santos Ferreira haver acesso à inovação terapêutica, esta está Coordenação: Miguel Múrias Mauritti a um preço inexplicavelmente oneroso que não Área Comercial: Cláudia Sousa (Diretora), 06 | Análise se acredita que resulta do custo da investigação. Elsa Soares, Isabel Silva, Ana Catarino, Numa análise ao setor Aranda da Silva, que 22 | Fórum Cristina Marques e Luís Araújo presidiu à Fundação do Infarmed e é hoje Fotografia: Ludgero Zorro presidente do conselho de administração da O Jornal Económico ouviu as opiniões de Paginação: Fábio Gomes Fundação SNS, defende ser necessário que alguns gestores de topo da indústria farma- e Rute Marcelino os serviços públicos de saúde têm de investir cêutica a operar em Portugal sobre os grandes Rua Vieira da Silva 45, 1350-342 Lisboa na investigação clínica e tecnológica não desafios que o setor enfrenta no médio prazo. só como forma de formar os seus recursos Os conteúdos dos parceiros tecnológicos e do Guia dos humanos, mas de produzirem riqueza. 28 | Diretório das mais importantes Seguradores e Corretores são da inteira responsabilida- empresas farmacêuticas de dos mesmos. a operar em Portugal 3 Editorial Por Miguel Múrias Mauritti Como enfrentar o desafio de mais de 7000 novos medicamentos em desenvolvimento possível – ou será muito difícil – respon- pectativas da Saúde, oferendo acordos sabilizar os gestores hospitalares pelas vantajosos para o Estado. Foi o que sucessivas derrapagens com consequen- aconteceu, entre muitos outros casos, te aumento da dívida, particularmente a com os tratamentos para a Hepatite C, vencida – com mais de 90 dias – que no que vieram alterar a história natural da final do ano ascendia a cerca de 1400 mi- doença, que de crónica, passou a poder lhões de euros. ser curada. A estratégia para fazer face ao deficit Pesem os pequenos passos que têm é sempre a mesma: no final do exercício permitido ganhos avultados em saúde, e no seu início, procedem-se a injeções, se nada for feito para resolver a suborça- ora de capital, ora de dotações extraor- mentação crónica da Saúde o espetro de dinárias, para limpar os passivos. O que mais de 7000 novos medicamentos en- om mais de 7000 medicamentos acontece é também de uma regularidade sombra o futuro do SNS. em desenvolvimento, dos quais confrangedora. Na posse das verbas ex- De acordo com o Country Report C quase 2000 para o tratamento do traordinárias para liquidar dívida venci- relativo a Portugal, produzido pela Co- cancro, uma nova onda de inovação pro- da à industria farmacêutica, as adminis- missão Europeia e distribuído em mar- mete vir a desempenhar um papel funda- trações hospitalares, confiantes de que o ço último, o nosso país deixou de estar mental na resposta aos desafios enfrentados problema há-de ser resolvido – tem-no classificado como tendo desequilíbrios pelos doentes e pelos sistemas de saúde. sido sempre – utilizam as dotações para macroeconómicos excessivos. Já no que Em Portugal, estes desafios assumem fazer face a outras despesas sem respaldo respeita à área da Saúde o relatório refere contornos pouco vulgares, com a inova- orçamental. que a sustentabilidade a curto prazo do ção a entrar a conta-gotas no Serviço Na- O ritmo de crescimento médio da dí- sistema de saúde não está garantida. Os cional de Saúde e os portugueses a serem vida situou-se em cerca de 46 milhões atrasos nos hospitais continuaram a au- dos europeus que mais tarde acedem aos de euros por mês durante o ano de 2017, mentar em 2017. De acordo com os pe- novos medicamentos. duplicando a partir de dezembro de 2018, ritos da Comissão, as injeções de capital A alguns nem chegam a aceder, por de acordo com dados da Direção Geral do anunciadas, tanto no final de 2017 como não ter sido possível que a entidade regu- Orçamento. De facto, O ritmo de cres- no início de 2018, deverão ajudar a dimi- ladora, o Infarmed, e a empresa detentora cimento nos últimos dois meses avança nuir os atrasos nos próximos meses, no do novo fármaco chegassem a acordo re- para 93 milhões de euros por mês. entanto, não parece resolver os proble- lativamente ao preço. Os milhões prometidos, que poderiam mas subjacentes de gestão hospitalar. O Mas o maior desafio que enfrenta o sanar a totalidade do passivo, foram cati- acumular contínuo de dívida evidência SNS e as empresas farmacêuticas é outro, vados pelas Finanças, que é quem de facto problemas com orçamentos insuficientes, identificado há mais de uma década e que governa a pasta de que é titular Adalberto práticas de gestão e fiscalização, além de permanece por sanar: a suborçamentação Campos Fernandes. despesas com pessoal e crescentes pres- crónica do Setor da Saúde, que invaria- A nova vaga de inovação que se anun- sões da procura. No mesmo documento, velmente recebe menos dinheiro do orça- cia, coloca outros desafios, difíceis de ul- pode-se ler que os gastos com saúde são mento do Estado do que o que se sabe que trapassar, o mais problemático dos quais agora responsáveis pela maior parcela irá gastar no exercício. a conjugação da evolução demográfica, dos custos do envelhecimento, trazendo Este ano, não foi diferente. Muito em- com um aumento de esperança de vida as correspondentes implicações para a bora em valor tenha sido o maior de sem- não saudável. Vivemos mais, mas os anos sustentabilidade a longo prazo. E conclui: pre, o montante inscrito no orçamento ganhos são marcado por multipatologia, apesar das medidas que estão a ser imple- do estado para 2018 é inferior ao gasto no pobreza e exclusão social. mentadas para tentar conter as despesas exercício de 2017. Neste ambiente, a Indústria Farma- hospitalares, e seu impacto continua por Face à desorçamentação crónica, não é cêutica tem procurado acomodar as es- se traduzir em resultados. 4 5 hoje um fato universalmente Análise constatado nos países mais de- É senvolvidos que o crescimento Por José Aranda da Silva económico das sociedades tem valores Presidente do Conselho de Administração da Fundação para a Saúde - Serviço Nacional de Saúde inferiores ao crescimento das despesas com saúde. O crescimento da oferta de serviços Temos de saber por parte dos Sistemas de Saúde e em particular pelos sistemas Públicos como é o caso do Serviço Nacional de saúde criou escolher e analisar as um importante mercado de bens e servi- ços que era impensável há quarenta anos. diferentes realidades A construção de milhares de infraes- truturas como hospitais e centos de saú- de, o aumento exponencial de profissio- nais qualificados como sejam enfermeiros (ainda insuficientes), médicos, farmacêu- ticos, psicólogos, nutricionistas e muitos A inovação tecnológica é fundamental outros, aumentaram a procura dos servi- para os Doentes e Sistemas de Saúde. ços de saúde públicos e privados. 6 dos, não tem sido feita através da quanti- a incidência de diversas patologias, hoje ficação e valorização dos resultados obti- prevalentes, como a diabetes, doenças dos, do seu impacto no desenvolvimento cardiovasculares, cancro e doenças respi- económico, mas simplesmente através da ratórias. avaliação dos seus custos financeiros nos Nem toda a inovação é custo efetiva, orçamentos públicos. mas tem sempre um papel a desempenhar Os países têm de reavaliar quanto es- e um valor a atribuir. Os antirretrovirais tão dispostos a pagar para que a esperança para o HIV transformaram uma doença de vida continue a aumentar com quali- aguda numa doença crónica e hoje assis- dade de vida, se devemos continuar a ir- te-se somente a inovações incrementais radiar doenças de elevada mortalidade e nesses medicamentos. Alguns medica- a controlar outras, se pretendem manter mentos (caso da anfotericina, cimetidi- elevados níveis de saúde das populações na, ampicilina para dar exemplos de mo- ou pretendem regredir para meados do léculas já não patenteadas com mais de século XX. 40 anos) tornaram-se mais seguros e efi- Estas opções exigem, em especial dos cazes com inovações incrementais (novas poderes públicos, elevada capacidade formas de administração ou novas estru- para fazerem escolhas, seja nos inves- turas moleculares resultantes da evolução timentos a fazer em infraestruturas e das iniciais) recursos humanos, nos investimentos A maioria da inovação na saúde e em tecnologias da informação, novos noutros setores (comunicações, indústria modelos organizacionais dos serviços de automóvel por exemplo) é inovação in- saúde e na avaliação económica das tec- cremental. nologias da saúde. A inovação espetacular, como aconte- Os serviços públicos de saúde como ceu recentemente com os medicamentos o nosso SNS, tem de se modernizar-, para a hepatite C é rara em todas as áreas alterar as suas formas de organização e terapêuticas. integração dos cuidados, investir na qua- A própria indústria farmacêutica lificação dos recursos humanos, aumen- não é uniforme nos seus interesses. As tar a responsabilização dos vários níveis grandes companhias multinacionais são de decisão e aumentar a participação dos fundamentalmente fornecedoras de no- cidadãos no sistema. Têm de investir na vas tecnologias e a inovação permanen- investigação clínica e tecnológica não só te é fundamental para sobreviverem. como forma de formar os seus recursos As grandes empresas de medicamentos humanos, mas de produzirem riqueza. Genéricos pretendem manter preços Não é através do “politicamente corre- rentáveis dos medicamentos que forne- A prestação de cuidados de saúde por to “de diabolização” dos setores que for- cem. Outras empresas, como acontece parte dos Sistemas Públicos de Saúde, necem as tecnologias que os problemas se com a maioria das empresas Portugue- com vários formatos e sistemas de finan- resolvem. sas, são fundamentalmente fabricantes ciamento, são hoje, na Europa, não só um Não é possível substituir, em quaren- e exportadores para outras empresas e direito dos cidadãos consagrado consti- ta anos, esses fornecedores, que também mercados. tucionalmente, como também um fator estão dependentes das aquisições dos sis- Estamos perante problemas comple- de coesão social com elevado contributo temas públicos de saúde que dominam na xos que exigem soluções fundamentadas para o desenvolvimento económico e esmagadora maioria dos países desenvol- na evidência científica e no diálogo trans- científico de cada país. vidos (exceto nos EUA e alguns grandes parente entre todos os intervenientes. Naturalmente que para além dos in- países em vias de desenvolvimento). A interdependência económica no vestimentos em infraestruturas (de cons- O serviço público tem de ter instru- setor da saúde é um fato e têm de se en- trução privada) e recursos humanos, do- mentos credíveis, qualificados, com pro- contrar soluções que evitem o colapso minantemente públicos, foi aumentando cedimentos transparentes e auditáveis, dos sistemas públicos de saúde e retro- a oferta de tecnologias da saúde (medi- para regular e controlar a oferta de tec- cessos nos ganhos sociais obtidos. Os camentos e dispositivos médicos, por nologias de forma a poder em cada mo- fornecedores de tecnologias têm de se exemplo) por iniciativa do setor privado mento escolher as mais eficientes. adaptar aos novos tempos em que mais que aproveita o crescimento do denomi- Os sistemas públicos de saúde têm que o preço, tem de se apresentar resul- nado “mercado” da saúde. de apostar mais na prevenção e na edu- tados credíveis e socialmente úteis que Acontece, no entanto, que a avaliação cação para a saúde, estimulando hábitos justifiquem os investimentos de ambas dos sistemas de saúde, públicos e priva- de vida saudáveis que poderão diminuir as partes. 7 Entrevista por Miguel Múrias Mauritti Rosa Valente de Matos Secretária de Estado da Saúde É imprescindível uma política sustentável na área do medicamento Portugal tem condições excecionais para se tornar uma referência internacional na investigação e desenvolvimento de tecnologias inovadoras. O nível dos profissionais, das nossas universidades e dos centros de investigação biomédica permitem esta afirmação. articulação com vários parceiros. Desta Ganhos em Saúde articulação dinâmica, resulta sempre a e indústria farmacêutica O Serviço Nacional de Saúde está qua- preocupação de assegurar a equidade no se a celebrar 40 anos. Ao longo destas acesso, a qualidade dos cuidados e a efi- quase quatro décadas são inegáveis os ciência. Esses são sem dúvida os maio- ganhos em saúde em Portugal. Muitos res desafios com que nos confrontamos destes ganhos devem-se, naturalmente, quotidianamente. a evoluções noutros setores da socieda- Na área do medicamento e das tecnolo- de. Muitos devem-se também ao traba- gias de saúde temos assistido nos últi- lho direto do Serviço Nacional de Saúde mos anos à chegada ao mercado de um e dos seus profissionais, mas é inegável grande número de produtos. Uma das tentabilidade e o ganho efetivo para a que a indústria farmacêutica tem sido prioridades deste Governo tem sido a qualidade das respostas. um parceiro relevante neste caminho de promoção de uma política sustentável inovação e modernização. na área do medicamento, o que se tra- Contribuição da indústria Acredito que o trabalho de cooperação duziu num aumento do número de me- farmacêutica para a formação que estamos a desenvolver será positivo dicamentos inovadores aprovados. Em dos profissionais de Saúde quer para melhorar o acesso dos doentes 2016 foi aprovada a comparticipação do Este é um setor que exige de nós uma abor- aos medicamentos quer para valorizar maior número anual de medicamentos dagem dinâmica e inovadora. Mais do que perante a opinião pública o contributo até então (51 novas comparticipações) as metodologias seguidas, o fundamental é da indústria farmacêutica para os ganhos e em 2017 esse número aumentou para que todos os processos sejam transparentes em saúde. 60. Este aumento traduziu-se em mais e e auditáveis. A Plataforma de Comunicações melhor acesso para os doentes e em mais – Transparência e Publicidade, que está dis- qualidade de vida. Não considero que ponível no site do Infarmed, é um dos bons Os grandes desafios do mercado O Serviço Nacional de Saúde é uma or- haja excesso de inovação, mas a base da exemplos de manutenção do apoio da indús- ganização complexa e que depende da sua inserção tem que ser sempre a sus- tria, mas de forma clara e de fácil consulta. 8 introdução no mercado aprovada pela e partilha de experiências, onde estamos Os prazos de avaliação EMA com a decisão de comparticipar ou a trabalhar. Vivemos, e continuaremos de comparticipação Tem havido um esforço para melhorar não um medicamento, tendo em conta a viver nos próximos anos, um período a qualidade e os prazos de avaliação de que enquanto se aguarda uma decisão, caraterizado pela chegada ao mercado comparticipação de novos medicamen- existem as chamadas autorizações de de muitos medicamentos inovadores, tos através do funcionamento mais utilização especial (AUE) ou programas em diversas áreas terapêuticas, especial- eficiente da Comissão de Avaliação de de acesso precoce (PAP), que garantem mente na oncologia. Tecnologias de Saúde (CATS). Alguns o acesso dos utentes aos medicamentos. medicamentos podem demorar um tem- Valor “Justo” po considerado excessivo até à sua efeti- O Infarmed tem feito um trabalho com Equilíbrio entre inovação va comparticipação. Este é um indicador qualidade internacionalmente reconhe- e sustentabilidade que temos vindo a melhorar e a que va- O equilíbrio entre a inovação e a susten- cida e os portugueses confiam no seu mos continuar a dar a melhor atenção. tabilidade é um tema atual de discussão trabalho, sabendo que é feita a destrinça Ainda assim, convém salientar que não e interesse internacional que só poderá entre o que é realmente inovador e o que devemos confundir a autorização de ser resolvido num quadro de cooperação não evidencia mais-valias. 9 “ Portugal tem condições excecionais para se tornar uma referência internacional na investigação e desenvolvimento de tecnologias inovadoras. Todo o trabalho de análise é apoiado em metodologias reconhecidas inter- nacionalmente, que são aceites como as melhores práticas para avaliação de tecnologias de saúde e que, como nas autoridades de outros Estados membros da União Europeia responsáveis por esta avaliação, pretendem aproximar o valor atribuído a uma nova tecnologia do “va- lor justo”. Os desafios da regulação para os próximos anos Nos próximos anos, o sistema de com- participação, negociação e financiamen- to terá que integrar novas formas de gerir o acesso às novas terapêuticas. A mais recente legislação, o denominado SINATS, acrescenta um conjunto de no- vas formas de monitorização e financia- mento, como por exemplo o pagamento mitem esta afirmação. É necessário que A implementação das novas regras de por resultados. Este é um desafio inter- se continue e aprofunde o trabalho que proteção de dados resulta da obriga- nacional, que tem vindo a ser discutido tem vindo a ser desenvolvido, nomeada- toriedade de aplicar a nova legislação em iniciativas que envolvem responsá- mente com a criação dos centros acadé- europeia. Esta implementação levará a veis de HTA, as entidades pagadoras, micos de medicina e mais recentemente algumas alterações na forma como deve mas também a indústria farmacêutica e com a criação da agência de investigação ser implementada a proteção de dados, os doentes. biomédica, estimulando a organização e mas não me parece que vá constituir um a colaboração no sentido de criar con- entrave ao desenvolvimento da investi- dições para um aumento significativo da gação, e particularmente da investigação O potencial da indústria farmacêu- investigação biomédica em Portugal e biomédica, em Portugal. tica para a economia nacional Portugal tem condições excecionais para nomeadamente para o aumento do nú- se tornar uma referência internacional mero de ensaios clínicos desenvolvidos A mudança para o Porto na investigação e desenvolvimento de em Portugal. Finalmente, sobre a transferência do tecnologias inovadoras. O nível dos pro- Infarmed para o Porto, está um grupo fissionais, das nossas universidades e dos de trabalho a analisar todo o processo e As novas regras de proteção centros de investigação biomédica per- aguardamos as suas recomendações. de dados 10
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