ebook img

Memórias ecumênicas protestantes – Os protestantes e a Ditadura: Colaboração e Resistência PDF

195 Pages·1.764 MB·Portuguese
Save to my drive
Quick download
Download
Most books are stored in the elastic cloud where traffic is expensive. For this reason, we have a limit on daily download.

Preview Memórias ecumênicas protestantes – Os protestantes e a Ditadura: Colaboração e Resistência

MEMÓRIAS ECUMÊNICAS PROTESTANTES Os Protestantes e a Ditadura: Colaboração e Resistência Zwinglio M. Dias (Org.) Realização Parceria Marcas da Memória: Um projeto de memória e reparação coletiva para o Brasil Criada em 2001, por meio de medida provisória, a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça passou a integrar em definitivo a estrutura do Estado brasileiro no ano de 2002, com a aprovação de Lei n.º 10.559, que regulamentou o artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Tendo por objetivo promover a reparação de violações a direitos fundamentais praticadas entre 1946 e 1988, a Comissão configura-se em espaço de reencontro do Brasil com seu passado, subvertendo o senso comum da anistia enquanto esquecimento. A Anistia no Brasil significa, a contrário senso, memória. Em sua atuação, o órgão reuniu milhares de páginas de documentação oficial sobre a repressão no Brasil e, ainda, cen- tenas de depoimentos, escritos e orais, das vítimas de tal repressão. E é deste grande reencontro com a história que surgem não apenas os fundamentos para a reparação às violações como, também, a necessária reflexão sobre a importância da não repetição destes atos de arbítrio. Se a reparação individual é um meio de buscar reconciliar cidadãos cujos direitos foram violados, que têm então a oportunidade de verem o Estado reconhecer que errou, devolvendo-lhes a cidadania e, se for o caso, reparando-os financeiramente, por sua vez, as reparações coletivas, os projetos de memória e as ações para a não repetição têm o claro objetivo de permitir a toda a sociedade conhecer, compreender e, então, repudiar tais erros. A afronta aos direitos fundamentais de qualquer cidadão singular igualmente ofende a toda a humanidade que temos em comum, e é por isso que tais violações jamais podem ser esquecidas. Esquecer a barbárie equivaleria a nos desumanizarmos. Partindo destes pressupostos e, ainda, buscando valorizar a luta daqueles que resistiram – por todos os meios que entenderam cabíveis – a Comissão de Anistia passou, a partir de 2008, a realizar sessões de apreciação pública, em todo o território nacional, dos pedidos de anistia que recebe, de modo a tornar o passado recente acessível a todos. São as chamadas “Caravanas da Anistia”. Com isso, transferiu seu trabalho cotidiano das quatro paredes de mármore do Palácio da Justiça para a praça pública, para escolas e universidades, associações profissionais e sindicatos, bem como a todo e qualquer local onde perseguições ocorreram. Assim, passou a ativamente conscientizar as novas gerações, nascidas na democracia, da importância de hoje vivermos em um regime livre, que deve e precisa ser continuamente aprimorado. Com a ampliação do acesso público aos trabalhos da Comissão, cresceram exponencialmente o número de relatos de arbitrariedades, prisões, torturas, por outro lado, pôde-se romper o silêncio para ouvir centenas de depoimentos sobre resistência, coragem, bravura e luta. É neste contexto que surge o projeto “Marcas da Memória”, que expande ainda mais a reparação individual em um processo de reflexão e aprendizado coletivo, fomentando iniciativas locais, regionais e nacionais que permitam àqueles que viveram um passado sombrio, ou que a seu estudo se dedicaram, dividir leituras de mundo que permitam a reflexão crítica sobre um tempo que precisa ser lembrado e abordado sob auspícios democráticos. Para atender estes amplos e inovadores propósitos, as ações do projeto Marcas da Memória estão dividi- das em quatro campos: a) Audiências Públicas: atos e eventos para promover processos de escuta pública dos perseguidos políticos sobre o passado e suas relações com o presente. b) História oral: entrevistas com perseguidos políticos baseadas em critérios teórico-metodológicos próprios da História Oral. Todos os produtos ficam disponíveis no Memorial da Anistia e poderão ser disponibilizadas nas bibliotecas e centros de pesquisa das universidades participantes do projeto para acesso da juventude, sociedade e pesquisadores em geral; c) Chamadas Públicas de fomento a iniciativas da Sociedade Civil: por meio de Chamadas Públicas, a Comissão seleciona projetos de preservação, de memória, de divulgação e difusão advindos de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) e Entidades Privadas Sem Fins Lucrativos. Os projetos desenvolvidos envol- vem documentários, publicações, exposições artísticas e fotográficas, palestras, musicais, restauração de filmes, preservação de acervos, locais de memória, produções teatrais e materiais didáticos. d) Publicações: coleções de livros de memórias dos perseguidos políticos; dissertações e teses de doutorado sobre o período da ditadura e a anistia no Brasil; reimpressões ou republicações de outras obras e textos his- tóricos e relevantes; registros de anais de diferentes eventos sobre anistia política e justiça de transição. Sem fins comerciais ou lucrativos, todas as publicações são distribuídas gratuitamente, especialmente para escolas e universidades. O projeto “Marcas da Memória” reúne depoimentos, sistematiza informações e fomenta iniciativas cul- turais que permitem a toda sociedade conhecer o passado e dele extrair lições para o futuro. Reitera, portanto, a premissa que apenas conhecendo o passado podemos evitar sua repetição no futuro, fazendo da Anistia um caminho para a reflexão crítica e o aprimoramento das instituições democráticas. Mais ainda: o projeto investe em olhares plurais, selecionando iniciativas por meio de edital público, garantindo igual possibilidade de acesso a todos e evitando que uma única visão de mundo imponha-se como hegemônica ante as demais. Espera-se, com este projeto, permitir que todos conheçam um passado que temos em comum e que os olhares históricos anteriormente reprimidos adquiram espaço junto ao público para que, assim, o respeito ao livre pensamento e o direito à verdade histórica disseminem-se como valores imprescindíveis para um Estado plural e respeitador dos direitos humanos. Comissão de Anistia do Ministério da Justiça KoinoniA Presença Ecumênica e Serviço Fundada em 1994, KOINONIA Presença Ecumênica e Serviço é uma organização sediada no Rio de Janeiro (RJ), com atuação nacional e internacional. Somos uma entidade ecumênica de serviço composta por pessoas de diferentes tradições religiosas, reunidas em associação civil sem fins lucrativos. Integramos o movi- mento ecumênico e prestamos serviços ao movimento social. A missão de KOINONIA é mobilizar a solidariedade ecumênica e prestar serviços a grupos histórica e culturalmente vulneráveis e em processo de emancipação social e política; além de promover o movimento ecumênico e seus valores libertários. KOINONIA presta serviços e estabelece alianças com a população negra organizada em comunidades urbanas e rurais, trabalhadores rurais, mulheres, jovens, agentes de solidariedade com pessoas que vivem com HIV/AIDS, e lideranças intermediárias das igrejas. Outro dos nossos campos de atuação é o das organizações ecumênicas nacionais e internacionais, onde a instituição não só presta serviços como também é um agente político de mobilização e disseminação de valores. A palavra koinonia vem do grego e significa comunidade e comunhão. Sumário Apresentação / 13 Da Aventura Protestante... Apontamentos para Reflexão / 15 José Bittencourt Filho Perseguições, Denúncias, Sofrimentos e Resistência – Depoimentos e Entrevistas / 25 E Deus Responde... / 25 Jovelino Ramos Deputado Presbiteriano Lysâneas Maciel – Um Tribuno de Fé e Coragem / 36 Regina Maciel Da igreja e da Universidade para a Clandestinidade / 40 Zenaide Machado de Oliveira e Antonio Carlos de Oliveira Do Abandono da igreja à Luta Clandestina / 50 Roberto Chagas o Missionário que se fez Pastor dos Perseguidos e Torturados / 58 Anita Wright Torres Bispo Denuncia Fiel, Líder de Juventude / 65 Anivaldo Padilha A Militância Política de um Presbiteriano “Comunista”... / 74 Nilton Emmerick Paulo Wright, um Presbítero, Deputado e Metalúrgico “Desaparecido”... / 82 Carlos Gilberto Pereira - “Carlão” o itinerário de Vida de um Coração Ecumênico / 90 Waldo Lenz César Um Padre Protestante, Músico e Poeta... / 102 Carlos Alberto C. da Cunha Encarnando a Esperança Ecumênica... / 109 Jether Pereira Ramalho Um Bispo na Luta Popular / 117 Paulo Ayres Mattos o Povo Suruí e o Compromisso Missionário de Luteranos - Um Caso de Expulsão por Parte da FUnAi / 126 Lori Altmann e Roberto E. Zwetsch A Resistência Protestante/Ecumênica de Exilados em Genebra (Suíça) / 135 Charles R. Harper Depoimentos que Reafirmam a Esperança / 147 “A juventude não perdeu a esperança...” / 147 Mariana Zuccarello “A juventude é o retrato da sociedade que aí está...” / 153 João Pucinelli “A juventude compreende o Ecumenismo como o cuidado de uma mesma casa...” / 159 Edoarda Scherer “A juventude quer se protagonista da história...” / 164 Lucas De Francesco A Emergência de se Profanar Memórias: interpretações Sobre a Juventude Ecumênica e as Resistências à Ditadura Militar no Contexto Brasileiro / 169 Daniel de Souza os Evangélicos, o Golpe e a Ditadura: o irresistível Canto das Sereias Autoritárias / 177 Leonildo S. Campos (in)conclusão - A Memória Subversiva e o Protestantismo Libertário / 193 Jorge Atílio S. Iulianelli Apresentação “O veredito do passado é sempre um oráculo. Somente como arquitetos do futuro e como conhecedores do presente podereis entendê-lo” (F. Nietzsche) Estamos diante de um livro, para muitos, surpreendente. Trata-se de um volume que reúne depoimentos e entrevistas de alguns protestantes e ex-pro- testantes que, nas décadas de sessenta e setenta do século passado, juntamente com muitos outros, consagraram suas vidas à luta contra a ditadura civil-mili- tar imposta pelas armas à sociedade brasileira a partir de 1964. Jovens, à época, empolgados com as possibilidades abertas para a construção de um novo futuro para o país e, ao mesmo tempo, convencidos do retrocesso político, econômico e cultural sinalizado pela implantação de um regime autoritário, criaram as mais di- ferentes formas de resistência ao arbítrio e ao atropelo aos direitos inalienáveis da pessoa humana. Pagaram um preço inaudito por sua ousadia e destemor. Foram vítimas da tortura, da prisão e do exílio... e muitos tiveram suas vidas ceifadas nos porões da violência institucionalizada. Jovens que cresceram nos espaços das ainda, pouco numerosas igrejas protes- tantes, onde, desde cedo, aprenderam o significado de valores como fraternidade, justiça e solidariedade. Ao chegarem à idade adulta descobriram também que as instituições eclesiásticas quase sempre respondem muito mais aos interesses domi- nantes na sociedade do que aos valores humanos fundamentais exarados em suas confissões de fé e afirmações doutrinais. O autoritarismo, desde sempre presente na sociedade brasileira mas, ampliado e consagrado pelo novo regime, se fez presente de forma inequívoca nos espaços institucionais do universo protestante. Assim, o conflito político-ideológico que se instaura na sociedade a partir da década de cin- quenta também eclode no interior das igrejas. Os que detêm o poder eclesiástico aderem sem peias ao novo regime e dão início a um processo ao mesmo tempo de expurgo e de delação dos seus irmãos e irmãs dissidentes. Isso acontece, pratica- mente, em todas as igrejas do protestantismo com diferentes graus de radicalismo. Um dos casos mais notórios deu-se na Igreja Presbiteriana do Brasil que não apenas desligou pessoas, leigos/as e pastores, mas até regiões eclesiásticas inteiras com suas respectivas comunidades. Estas, mais tarde, vão se aglutinar e dar origem a mais uma denominação protestante no país, a Igreja Presbiteriana Unida do Brasil (IPU). Os depoimentos e entrevistas coligidos neste livro, ao lado de algumas aná- lises que procuram explicitar, teológica e sociologicamente, as motivações que geraram esse tipo de comportamento autoritário por parte das instituições ecle- siásticas, se inscrevem num esforço maior de resgate da memória histórica do protestantismo brasileiro. Por décadas a história do envolvimento de protestantes ou de pessoas advindas desse universo religioso foi ocultada e sonegada ao conhe- cimento da maioria das novas gerações de protestantes e da sociedade brasileira como um todo. De um modo geral se tem notícia do envolvimento de padres, bispos e leigos/as católico-romanos. Os setores progressistas dessa igreja majoritá- ria no Brasil tem o registro de seus irmãos e irmãs sacrificados no altar da ignóbil violência institucionalizada. Os filhos e filhas do protestantismo que sofreram os mesmos suplícios e foram também sacrificados nas masmorras do regime perma- necem, até hoje, desconhecidos/as pela sociedade e, o que é ainda mais trágico, pelas suas próprias comunidades de fé originais. Num esforço de recuperação desta memória, aparentemente perdida, em benefício das novas gerações, esta iniciativa quer ser também uma homenagem a todas aquelas pessoas que, oriundas das comunidades protestantes, se levantaram, com determinação e coragem, para protestarem contra a supressão da liberdade e dos direitos básicos do povo brasileiro, oferecendo suas vidas num gesto de solida- riedade e amor para a construção de um futuro marcado pelos valores da justiça, da paz e da fraternidade. A luta dos jovens protestantes de então também se derivou de um conjunto de experiências novas nascidas das aproximações ecumênicas desenvolvidas, prin- cipalmente, pelas estruturas organizacionais das juventudes das diferentes deno- minações. O movimento ecumênico internacional, empenho de aproximação das diferentes vertentes eclesiais do protestantismo já vinha, ainda que lentamente, ga- nhando corpo entre as igrejas brasileiras. Sua ênfase na cooperação inter-eclesiástica, seu chamamento a um testemunho evangélico comum frente a um mundo fratura- do por guerras e discórdias de todo tipo, sua preocupação com a crescente desigual- dade econômica e as injustas relações entre as nações sensibilizava profundamente a juventude sempre disposta à novas experiências e impaciente com as visões e for- mulações desatualizadas de suas instituições eclesiásticas. Quando estas começam a rechaçar essas “novidades”, temerosas de perder suas já conquistadas e confortáveis posições de acomodação ao status quo a bandeira do ecumenismo levantada pelos jovens se torna em mais um elemento de conflito no interior das denominações protestantes. No decorrer da história serão esses jovens os principais agentes que vão tornar possível a prática ecumênica entre nós. Por estas razões as iniciativas deste projeto de resgate da memória estão também dedicadas ao fortalecimento da já consolidada e atuante Rede Ecumênica de Juventude. Este livro é um resultado parcial do projeto “Memórias Ecumênicas Pro- testantes no Brasil: Dos porões da ditadura à Redemocratização”, que se comple- menta com a produção de dois documentários audiovisuais, um site de divulgação na Internet e a digitalização de um grande acervo de documentação relacionada ao tema. Executado por “KOINONIA Presença Ecumênica e Serviço”, este proje- to se tornou possível graças ao apoio solidário do programa “Marcas da Memória” da Comissão de Anistia, do Ministério da Justiça. Zwinglio M. Dias 14 Da aventura Protestante... Apontamentos para reflexão José Bittencourt Filho1 Prólogo O espírito protestante desmascara os ídolos religiosos e políticos e recusa-se a simplesmente legitimar o status quo. Tudo tem de entrar em processo de conversão e mudança, isto é, deve libertar-se de todo tipo de opressão para ampliar o espaço da liberdade para Deus e para a ação livre do ser humano. O princípio protestante vai ajudar os próprios protestantes a se libertarem de seu moralismo burguês para se apoiarem no radicalismo evangélico, como o fez Lutero. [Leonardo Boff] Entendo por oportuno que quando se fala de “protestantismo brasileiro”, faz-se necessário precisar qual ente cultural se está tentando designar. Para tanto, ao longo do século XX diversas tipologias foram elaboradas no intuito de situar quais seriam exatamente as agremiações religiosas efetivamente pertencentes a esse conjunto. A despeito da variedade dos critérios, a elaboração das tipologias geralmente focaliza as ênfases doutrinárias e suas respectivas ancestralidades, ou seja, partindo-se do pressuposto de que a referência ao movimento da Reforma e às Confissões que o seguiram seria uma “evidência” da natureza mais ou menos “protestante” das comunidades religiosas em estudo. Para efeito operacional en- tendo que essa criteriologia seja inevitável, mesmo se sabendo que os fatos históri- cos são muito mais complexos e comportam variados fatores em sua composição. É oportuno realçar que no Brasil, o protestantismo clássico, ou protestantismo histórico comumente apelidado de protestantismo de missão – uma vez que foi o resultado dos empreendimentos missionários norte-americanos efetuados a partir da segunda metade do século XIX –, foi o que se teve de mais próximo da Re- forma. Tal proximidade decorreria de alguns aspectos fundamentais, tais como: princípios teológicos e doutrinários, padrões litúrgicos, conteúdos catequéticos, valores ético-morais, e o discurso religioso. No caso do nosso protestantismo de missão existe uma peculiaridade importantíssima, a saber: o fator comum e o tra- ço principal dos grupamentos historicamente pioneiros que se deslocaram para e vieram a se implantar no Brasil e que se apresentaram como igrejas, na realidade se tratavam de denominações. Esse qualificativo não se reduz apenas a uma questão 1 Teólogo e Sociólogo da Religião com doutorado pela PUC-SP. Por muitos anos assessor do CEDI e colaborador de KOINONIA Presença Ecumênica e Serviço. Foi professor da Faculdade Unida de Vitória, ES e da UNB. Membro da Igreja Espiscopal-Anglicana do Brasil. conceitual, mas trata-se de um status e de uma condição com significativos efeitos e desdobramentos. Vale relembrar que as denominações são formas de organização religiosa cujo compromisso fundamental é com determinados segmentos ou camadas so- ciais, isto é, uma adaptação religiosa a um determinado arcabouço ideológico e dadas condições materiais. Esta condição seria decisiva não só no período da implantação – entre a segunda metade do século XIX e primeira metade do século XX –, no formato da concorrência entre elas em seu período de expansão; bem como nos embates e na concorrência pelo espaço no campo religioso nacional com os diferentes tipos de pentecostalismo, já na segunda metade do século XX. O mais importante é compreender que o liame entre as denominações e a socie- dade passa por determinados “projetos” que representam interesses específicos portadores de contornos ideológicos definidos. Constava do ideário das missões denominacionais que aportaram no Brasil o projeto expansionista norte-americano sob o influxo da ideologia do “destino manifesto”. Além da religiosidade pietista e do conservantismo em matéria de in- terpretação bíblica, havia uma afinidade com um projeto liberal a ser implantado num continente composto por países arcaicos, monarquistas, aristocráticos e ca- tólicos. Assim, a par dos militantes do liberalismo radical, dos espíritas kardecistas e tendo como substrato as ideias e a metodologia maçônicas, o protestantismo histórico, até onde se sabe, em todos os países da América do Sul, foi um coadju- vante no projeto de ruptura e de renovação com a cultura tradicional oriunda das metrópoles coloniais, por meio do anticatolicismo e da divulgação e mesmo da implantação das premissas básicas do modelo liberal de sociedade. A estrutura e o funcionamento das comunidades nos planos locais, regionais e nacionais, bem como o modelo pedagógico dos colégios que fundaram são exemplos nítidos da proposta de sociedade pelo qual lutavam. No caso do Brasil, esse projeto esgo- tou-se quando, na década de 1950, finalmente o Brasil ingressa no capitalismo industrial. I Quando cessou o período propriamente missionário, as denominações ha- viam obtido um crescimento numérico razoável das comunidades, entretanto, esse projeto eclesiológico não prosperou, posto que não levou em conta as profun- das contradições sociais, nem a natureza peculiar da formação cultural brasileira, e assim deixou de perceber as mudanças que começaram a abalar e transformar o País. O advento da industrialização e da urbanização do pós-guerra encontra um protestantismo congelado em sua mundividência e em sua proposta religiosa, e assim veio a se transformar numa espécie de subcultura de refúgio para segmentos das classes intermediárias. Nesse período, assim como a história do Brasil havia 16

See more

The list of books you might like

Most books are stored in the elastic cloud where traffic is expensive. For this reason, we have a limit on daily download.