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Manuscritos Econômico Filosóficos de 1844 PDF

62 Pages·1844·0.707 MB·Portuguese
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política etc, e tratarei, por último de expor em um trabalho particular a cone- KARL MARX xão de conjunto, a relação das distintas partes entre si, assim como a crítica da elaboração especulativa daquele material. Eis o motivo porque o estado, o direito, a moral, a vida civil etc, só será abordada na medida em que a economia política lida expressamente com estas questões. MANUSCRITOS ECONÔMICO- Para o leitor familiarizado com a economia política, não é necessário ga- FILOSÓFICOS DE 1844 rantir que meus resultados são produto de uma análise totalmente empírica, fundamentada em um estudo crítico e cuidadoso. [Pelo contrário, o crítico ignorante que, procura mascarar sua completa Tradução: Mônica Hallak Martins da Costa ignorância e pobreza de idéias jogando na cara do crítico positivo a fórmula Anexo à dissertação de Mestrado: A Diferença entre as categorias Lebensäusserung, Entäusserung, “Fraseologia utópica” ou das frases ocas como “a crítica absolutamente Entfremdung e Veräusserung nos Manuscritos Econômico-filosóficos de Karl Marx de 1844 pura, absolutamente decisiva, absolutamente crítica”, a “sociedade que não é somente {468} jurídica, mas social, totalmente social”, a “massa maciça e FAFICH - 1999 compacta”, os “porta vozes que se fazem de intérpretes da massa maciça”, custa ainda a este crítico fornecer a primeira prova de que, além dos teoló- Primeiro Manuscrito1 gicos negócios de família, também nos negócios profanos (Welteichen) tem algo a dizer.] {467}2 Prefácio É óbvio que além dos socialistas franceses e ingleses também utilizei Já anunciei nos Anais Franco-Alemães a crítica da ciência do direito e trabalhos de socialistas alemães. Os trabalhos alemães, “densos e origi- da ciência política sob a forma da filosofia do direito de Hegel. Enquanto nais” nesta ciência - à parte os escritos de Weitling - se reduzem aos artigos elaborava o manuscrito para impressão se evidenciou que a combinação de leis publicadas no 21 Folhas e o esforço para a crítica da economia polí- da crítica dirigida apenas contra a especulação com a crítica das várias tica dos Anais Franco Alemães nos quais já anunciei de maneira geral os matérias seria inadequada, impediria o desenvolvimento da discussão e primeiros elementos do presente estudo. dificultaria a compreensão. Além disso, a riqueza e diversidade dos as- [Tanto quanto estes autores que falam criticamente da economia política, suntos a tratar não permitem condensar em uma só obra senão sob a a crítica positiva em geral, portanto também a crítica positiva alemã da eco- forma de aforismas, e um tal procedimento de exposição teria aparência nomia política, deve seu verdadeiro fundamento às descobertas de Feuer- de uma sistematização arbitrária. Por conseguinte, farei sucessivamente bach, contra cuja Filosofia do Futuro e contra cujas Teses para Reforma da em brochuras distintas e independentes, a crítica do direito, da moral, da Filosofia nas Anekdota - por mais que as utilize tacitamente - a inveja mes- quinha de uns e a cólera real de outros parecem ter tramado uma autêntica conspiração de silêncio]. 1 O Manuscrito nº 1 consta de 9 fólios (18 folhas e 36 páginas) que foram unidos por Marx formando um caderno. As páginas foram divididas, antes da redação, em três colu- É somente de Feuerbach que data a crítica humanista e naturalista posi- nas, por meio de dois traços verticais. Cada uma das colunas leva, da esquerda para direi- tiva. Quanto menos ruidosos os escritos de Feuerbach, tanto mais certos, ta, o seguinte título: Salário, Lucro do Capital e Renda da terra (...) A determinada altura profundos, amplos e duradouros. Desde a Fenomenologia e a Lógica de do texto, Marx escreve sobre a totalidade das páginas, sem respeitar a divisão em colunas; Hegel são os únicos escritos que contém uma revolução teórica real. esta é a parte que, de acordo com o conteúdo, foi intitulado: O Trabalho Estranhado. Em oposição aos teólogos críticos de nossa época, considerei absoluta- O prólogo foi escrito ao final e está incluído nos fólios correspondentes ao 3º Manuscri- mente indispensável o capítulo final do presente escrito, a discussão da to. dialética hegeliana e da filosofia hegeliana em geral, pois tal trabalho nunca Extraído da edição espanhola da Alianza Editorial preparada por Francisco Rubio Llo- foi realizado - o que constitui uma inevitável falta de seriedade, pois inclusi- rente. ve o teólogo crítico continua sendo teólogo e, portanto, ou bem deve partir 2 Os números entre chaves correspondem a paginação da edição alemã. de determinados pressupostos da filosofia como de uma autoridade, ou se 1 no processo da crítica e graças às descobertas alheias, surgem suas dú- alçada desta exposição.] vidas sobre os pressupostos filosóficos, os abandona covarde e injustifi- cadamente, prescinde-se deles, se limita em expressar sua servidão em relação a eles, o desgosto por esta servidão na forma negativa e carente de consciência sofística. {471} PRIMEIRO MANUSCRITO [Não exprime senão de uma maneira negativa e privada de consciência, seja porque ele renova constantemente a segurança da pureza da própria crítica, seja porque,{469} a fim de desviar os olhos do observador, e seu Salário do Trabalho próprio olho do necessário acerto de contas da crítica com sua origem - a dialética de Hegel e a filosofia alemã em geral - esta necessidade da críti- O salário é determinado pela luta aberta entre o capitalista e o trabalha- ca moderna de se elevar acima de sua própria limitação e de sua natureza dor. A necessária vitória do capitalista. O capitalista pode viver mais tempo primitiva, busca acima de tudo dar a ilusão que fora dela a crítica não tem sem o trabalhador do que o trabalhador sem o capitalista. A união entre os mais ocupações que com uma forma limitada crítica - a do sec. XVIII e ao capitalistas é habitual e eficiente, ao passo que a união entre trabalhadores espírito limitado da massa. Enfim, são feitas as descobertas às cabeças é proibida e lhes traz as mais penosas conseqüências. Além disso, o pro- dos escrivãos ainda prisioneiros da filosofia, ou bem cria-se a consciência prietário fundiário e o capitalista podem completar os seus rendimentos com de sua elevação acima destas descobertas, não colocando ou tratando de os lucros da indústria, ao passo que o trabalhador não tem renda da terra colocar em sua justa relação os elementos da dialética hegeliana que ele nem juros sobre o capital para somar ao seu salário industrial. Daí a inten- lamenta não encontrar nesta crítica (a de Feuerbach) do qual não tem sidade da concorrência entre os trabalhadores. Por conseguinte, só para os ainda oferta ao gozo crítico, mas coloca-os misteriosamente adiante, con- trabalhadores é que a separação do capital, da propriedade fundiária e do tra esta crítica a dialética hegeliana de uma maneira disfarçada, dissimu- trabalho constitui uma separação necessária, vital e perniciosa. O capital e lada e cética, sob a forma particular que lhe é própria, também por exem- a propriedade de raiz não precisam persistir nos limites desta abstração, plo a categoria da prova mediata contra aquela da verdade positiva que mas o trabalho do operário não pode dela sair. tem sua origem nela mesma. O crítico teológico encontra-se com efeito, naturalmente ao lado da filosofia, tudo por fazer, para que esse possa se Para o trabalhador, portanto, a separação do capital, da renda da terra e mostrar indiscreto sobre a pureza, sobre a característica decisiva, sobre do trabalho é fatal. toda crítica, e dá impressão de ser o verdadeiro superador da filosofia, se A mais baixa e a única necessária tabela de salários é aquela que provê ele tem por acaso o sentimento que um elemento de Hegel falta em subsistência do trabalhador durante o trabalho e a um suplemento necessá- Feuerbach, pois nossa crítica teológica por mais que pratique a ideologia rio para nutrir uma família e para que a raça dos trabalhadores não se ex- espiritualista da autoconsciência e do espírito, não ultrapassa o sentimen- tinga. Segundo Smith, o salário normal é o mais baixo que for compatível to por se elevar a consciência.] com a “simple humanité”3, isto é, com uma existência bestial. Vista mais de perto, a crítica teológica - que no início do movimento era A procura de homens regula necessariamente a produção de homens um verdadeiro momento de progresso - não é em última análise outra como de qualquer outra mercadoria. Se a oferta excede por muito a procu- coisa senão o ponto e a conseqüência lógica levadas até a sua caricatura ra, então parte dos trabalhadores cai na penúria ou na fome. Assim, a exis- teológica da velha transcendência filosófica e em particular a de Hegel. tência do trabalhador encontra-se reduzida às mesmas condições que a Em outra ocasião mostrarei em detalhes esta interessante justiça históri- existência de qualquer outra mercadoria. O trabalhador tornou-se uma mer- ca, {470} nêmeses histórica, a que destina agora a teologia que foi sem- cadoria e terá muita sorte se puder encontrar um comprador. E a procura, pre o canto podre da filosofia, a representar também em si a decomposi- de que depende a vida do trabalhador, depende por sua vez do humor dos ção negativa da filosofia - ou seja seu processo de putrefação. [Por outro lado, na medida em que as descobertas de Feuerbach sobre a essência da filosofia tornam sempre necessário - ao menos para servir- 3 Adam Smith: Recherches sur la Nature et les Causes de la Richesse des Nations, lhes de prova - uma explicitação crítica com a dialética filosófica, isto é da traduzido por German Garnier, Paris 1802, Tomo I, p.138 (Todas indicações biblio- gráficas são da edição francesa). 2 ricos e dos capitalistas. Se a oferta excede a procura, {472} um dos ele- O trabalhador não tem apenas de lutar pelos meios físicos de subsistên- mentos que entram no preço - lucro, renda da terra, salários - será pago cia; deve ainda lutar para alcançar trabalho, isto é, pela possibilidade e pe- abaixo do seu preço. Uma parte desta determinações se subtrai então a los meios de realizar a sua atividade. Precisemos as três condições princi- esta utilização e também o preço do mercado gravita em torno de seu pais em que a sociedade pode vir a se encontrar e consideremos a situação centro, o preço natural. Mas (1) onde existe uma extensa divisão do traba- do trabalhador em cada uma delas. lho é extremamente difícil para o trabalhador orientar o seu trabalho para outras aplicações e (2) ele é o 1º atingido por este prejuízo, dada a sua relação de subordinação ao capitalista. 1) Se a riqueza da sociedade diminui, o trabalhador sofre mais, porque embora a classe operária não possa ganhar tanto como a classe dos O trabalhador, portanto, perde mais e perde inevitavelmente com a gra- proprietários num estado próspero da sociedade, ninguém sofre tão vitação do preço corrente para o preço natural. E precisamente a possibi- cruelmente com o seu declínio como a classe trabalhadora [Smith: lidade do capitalista dar uma outra orientação a seu capital tem por con- Ibid., Tomo II, p. 162]. seqüência ou privar o pão do operário, limitado a um ramo determinado de atividade, ou força-lo a se submeter a todas exigências deste capitalista. 2) Vejamos uma sociedade em que a riqueza está a crescer. Tal situa- As variações acidentais e súbitas no preço corrente afetam menos a ção é a única favorável ao trabalhador. Neste caso, há competição renda da terra que as partes do preço que incluam o lucro e os salários, entre capitalista e a procura de trabalhadores excede a oferta. Mas: mas afetam menos o lucro que os salários. Na maior parte dos casos, para todo o salário que sobe há um que permanece estacionado e outro Por um lado o aumento do salário impele ao excesso de trabalho entre que desce. os trabalhadores. Quanto mais querem ganhar, mais devem sacrificar seu O trabalhador não ganha necessariamente quando o capitalista ganha, tempo e se alienando (entäussernd) inteiramente de toda liberdade, realizar mas perde necessariamente com ele. Assim, o trabalhador não ganha se um trabalho escravo a serviço da avareza. E assim encurtam as suas vidas. o capitalista consegue manter o preço corrente acima do preço natural por Semelhante redução de tempo de vida é uma circunstância favorável para a meio de um segredo comercial, de um monopólio ou da situação favorável classe trabalhadora em seu conjunto, já que torna necessária uma oferta da sua propriedade. sempre renovada de trabalhadores. Esta classe tem sempre de sacrificar uma parte de si mesma, a fim de não perecer em seu conjunto. Ademais, os preços do trabalho são muito mais estáveis que os preços dos meios de subsistência. Muitas vezes, estão em relação inversa. Num De outro: quando determinada sociedade se encontra numa condição de ano caro, os salários descem, devido ao declínio na procura, mas sobem aumento de riqueza? Sempre que o capital e os rendimentos de um país em virtude do aumento no preço de provisões; assim se equilibram. De aumentam. Mas isso só é possível: qualquer maneira, muitos trabalhadores se encontram sem pão. Em anos baratos, os salários sobem por causa da intensificação da procura e des- cem em razão dos baixos preços de provisões; assim se contrabalançam. a) quando se acumula muito trabalho, porque o capital é trabalho acu- mulado; por conseguinte, quando ao trabalhador é retirado muito do Outra desvantagem para o trabalhador: O preço do trabalho dos dife- seu produto, quando o seu próprio trabalho a ele se opõe como pos- rentes tipos de trabalho variam muito mais que os lucros nos diversos sessão alheia e quando os seus meios de existência e a sua ativida- ramos em que o capital se investe. No trabalho, toda a diversidade natu- de se concentram cada vez mais nas mãos do capitalista. ral, intelectual e social da atividade individual aparece e é paga diferente- mente, enquanto que o capital inerte marcha sempre no mesmo passo e é indiferente à atividade individual real. b) A acumulação do capital aumenta a divisão do trabalho e a divisão do trabalho aumenta o número de trabalhadores; inversamente, o {473} Em geral, é preciso observar que onde o trabalhador e o capitalis- número crescente de trabalhadores incrementa a divisão do trabalho ta sofrem o trabalhador sofre na sua existência enquanto o capitalista e a divisão crescente do trabalho intensifica acumulação do capital. sofre no lucro sobre a sua mônada inerte. Como resultado da divisão do trabalho, por um lado, e da acumula- 3 ção do capital, por outro, o trabalhador torna-se mesmo mais com- corrência de outros homens, mas também das máquinas. Visto que o traba- pletamente dependente {474} do trabalho e de um tipo de trabalho lhador foi reduzido a máquina, a máquina pode se opor a ele e lhe fazer particular, extremamente unilateral, mecânico. Por conseqüência, concorrência. Por fim, assim como a acumulação do capital aumenta a assim como ele se vê reduzido espiritual e fisicamente à condição quantidade da indústria e desse modo, o número de trabalhadores, assim de uma máquina e se transforma de ser humano em simples ativi- também como resultado de tal {475} acumulação o mesmo volume de indús- dade abstrata e em apêndice (Bauch), também assim se torna tria produz uma maior quantidade de produtos que leva à superprodução e progressivamente dependente de todas as flutuações no preço culmina ou no desemprego de grande parte dos trabalhadores ou na redu- corrente, no emprego do capital e nos caprichos do rico. De igual ção dos seus salários ao mais miserável mínimo. modo, o crescimento da classe de homens que são inteiramente Tais são as conseqüências da situação da sociedade que é mais favorá- dependentes do trabalho aumenta a competição entre os trabalha- vel ao trabalhador, a saber, uma situação de riqueza crescente e progressi- dores e baixa o seu preço. No sistema industrial, esta situação dos va. trabalhadores atinge o seu ponto culminante. c) Numa sociedade onde a prosperidade aumenta, só quem é verda- Mas, por fim, esta situação de crescimento atinge a culminação. Qual é deiramente rico pode viver do juro sobre o dinheiro. Todos os ou- então a condição do trabalhador? tros têm de empregar o capital no negócio ou no comércio. Como conseqüência, intensifica-se a concorrência entre os capitalistas. Aumenta a acumulação do capital, os grandes capitalistas arrui- 3) “Num país que atingiu o último grau possível de riqueza [...] serão nam os menores e alguns dos já mencionados capitalistas mergu- provavelmente muito baixos os salários de trabalho e os lucros de ca- lham na classe operária que, em virtude desta subida de números, pital [...] A competição pelo emprego será forçosamente tão grande sofre mais uma baixa nos salários e torna-se ainda muito mais de- que reduz os salários de trabalho ao que dificilmente chega para man- pendente dos poucos grandes capitalistas. Ao mesmo tempo, uma ter o número de trabalhadores e, porque o país já se encontra intei- vez que o número dos capitalistas diminui, a sua competição por ramente povoado, semelhante número nunca poderia ser aumentado” trabalhadores dificilmente continua a existir, enquanto a competi- [Smith, Ibid. Tomo I, p.193]. ção entre trabalhadores, devido ao aumento do seu número, se tornou maior, mais anormal e mais violenta. Consequentemente, parte da classe trabalhadora cai numa condição de penúria ou de O excesso deverá morrer. fome, com a mesma necessidade com que uma seção dos capita- listas médios mergulha na classe trabalhadora. Por conseguinte, numa situação decrescente da sociedade, miséria pro- gressiva do trabalhador; numa situação em expansão, miséria complicada; Assim, mesmo no estado de sociedade que é mais favorável ao operá- e na situação final, miséria estacionária. rio, a conseqüência necessária para o trabalhador é o trabalho excessivo e a morte prematura, a degradação em máquina, a sujeição ao capital que Contudo, visto que, segundo Smith, “uma sociedade em que a maioria se acumula em ameaçadora oposição a ele, nova concorrência, a morte a sofre não é feliz” [Ibid., Tomo I, p.160], e já que a mais próspera situação da fome ou a mendicidade para uma parte dos trabalhadores. sociedade origina o sofrimento da maioria, enquanto o sistema econômico (em geral, uma sociedade de interesses privados) conduz a esta situação A alta de salários desperta no trabalhador o mesmo desejo de enrique- muito próspera, segue-se que a infelicidade social constitui o objetivo da cimento que no capitalista, mas só o pode satisfazer pelo sacrifício do seu economia. corpo e espírito. A alta dos salários pressupõe e provoca acumulação do capital; ela opõe então mais e mais estranhos (fremder) um ao outro, o É preciso ainda observar, quanto a relação entre trabalhador e capitalista produto do trabalho e o trabalhador. De igual modo, a divisão do trabalho que o aumento do salário é mais que compensado para o capitalista pela torna-o cada vez mais unilateral e dependente, e introduz não só a con- diminuição da quantidade de tempo de trabalho e que a alta de salários e a 4 alta dos lucros do capital operam sobre o preço da mercadoria como lucro da sociedade, porque a subida de salários é mais que compensada pela simples e lucro composto [Ibid., Tomo I, p.201]. redução do tempo de trabalho com as outras conseqüências discutidas aci- ma, e porque em relação à sociedade a totalidade do produto bruto é produ- Adotemos agora inteiramente o ponto de vista do economista e compa- to líquido e o produto líquido só tem significado para o indivíduo privado. remos nos seus termos as reivindicações teóricas e práticas dos trabalha- dores. Mas o trabalho em si não só nas condições atuais, mas em geral, en- quanto sua finalidade é simplesmente o incremento da riqueza; afirmo que o Afirma-nos ele que originalmente e em princípio “todo o produto do tra- trabalho em si é nocivo e funesto, é o que se deduz, sem que o economista, balho pertence ao trabalhador” [Ibid., Tomo I, p.129]. Mas imediatamente o perceba, de suas próprias exposições. acrescenta que, na realidade, o trabalhador recebe apenas a parte míni- ma e absolutamente indispensável do produto; precisamente tanto quanto necessita para existir como trabalhador, não como homem, e para gerar a *** classe escravizada dos trabalhadores, não a humanidade. {476} Diz-nos o economista que tudo é comprado com o trabalho e que {477} De acordo com seu conceito, a renda e o lucro são descontos que o capital não passa de trabalho acumulado, mas acrescenta logo a seguir os salários têm de suportar. Na realidade, porém, os salários constituem um que o trabalho, longe de ter possibilidade de comprar tudo, é obrigado a desconto que a terra e o capital permitem ao trabalhador, uma concessão se vender e a vender sua qualidade de humano. feita pelo produto do trabalho ao trabalhador, ao trabalho. Enquanto a renda da terra do indolente proprietário fundiário eqüivale Numa situação decrescente da sociedade, o trabalhador sofre mais. O habitualmente a um terço do rendimento da terra e o lucro do ativo capita- peso particular de sua opressão deve-se à sua situação como trabalhador, lista chega a duplicar a taxa de juro, o excedente que o trabalhador ganha mas a opressão em geral é devida à condição da sociedade. no melhor dos casos é tão pequeno que dois dos seus quatro filhos estão Na situação progressiva da sociedade, no entanto, o declínio e o empo- condenados a morrer de fome. Ao passo que, segundo os economistas, é brecimento do trabalhador são o produto do seu próprio trabalho e da rique- unicamente através do trabalho que o homem aumenta o valor dos produ- za por ele produzida. Por conseguinte, a miséria emerge espontaneamente tos naturais e o trabalho constitui a propriedade ativa do homem; além da essência do trabalho atual. disso, de acordo com a mesma economia política, o proprietário de terras e o capitalista, que enquanto tais são apenas deuses privilegiados e ocio- A mais próspera condição da sociedade, que surge como ideal, embora sos, em toda a parte estão acima do trabalhador e lhe impõe leis. como ideal que se atinge aproximadamente e pelo menos constitui o objeti- vo da economia política e da sociedade civil, é uma situação de miséria Enquanto segundo os economistas, o trabalho é o único preço imutável estacionária para os trabalhadores. das coisas; no entanto, nada é mais fortuito nem está sujeito a maiores flutuações de que o preço do trabalho. É de todo evidente que a economia política considera o proletário, isto é, aquele que vive, sem capital ou renda, apenas do trabalho e de um trabalho Enquanto a divisão do trabalho aumenta o poder produtivo do trabalho unilateral, abstrato, como simples trabalhador. Consequentemente, pode e a riqueza e o requinte da sociedade, empobrece o trabalhador e o trans- propor a tese de que ele, tal como um cavalo, deve receber tanto quanto forma em máquina. Enquanto o trabalho fomente a acumulação do capital precisa para ser capaz de trabalhar. A economia política não se ocupa dele e, deste modo, a crescente prosperidade da sociedade, torna o trabalha- no seu tempo livre como homem, mas deixa este aspecto para o direito pe- dor cada vez mais dependente do capitalista, o expõe a maior concorrên- nal os médicos, a religião, as tabelas estatísticas, a política e o funcionário cia e o arrasta para a corrida da superprodução seguida pelo marasmo de hospício. igualmente profundo. Enquanto, segundo os economistas, o interesse do trabalhador nunca se opõe ao interesse da sociedade, a sociedade é sempre e necessaria- Vamos agora além do nível da economia política e procuremos a partir do mente antagônica ao interesse do trabalhador. argumento anterior, que quase foi apresentado nas palavras dos economis- tas, respostas para as duas perguntas: Segundo os economistas, o interesse do trabalhador nunca se opõe ao 5 1. Qual o significado, no desenvolvimento da humanidade, da redução ção dos pobres pelos ricos, encontrar-se mais ou menos estabeleci- da maior parte dos homens ao trabalho abstrato? dos noutros lugares (Schulz: Movimento da Produção, p. 65)4. Mesmo se fosse tão verdade como na realidade é falso que os ren- 2. Que erros cometem os reformadores en détail, que ou desejam ele- dimentos médios de todas as classes da sociedade tivessem au- var os salários e por este meio melhorar a condição da classe traba- mentado, as diferenças e os desvios relativos dos rendimentos teria lhadora, ou (como Proudhon) consideram a igualdade de salários ainda crescido e, portanto, os contrastes entre a riqueza e a pobreza como objetivo da revolução social? se manifestariam com mais força. Porque precisamente do fato que a produção global aumenta e na mesma medida em que se produz, as necessidades, os desejos e os apetites também aumentam e a Na economia política, o trabalho aparece apenas sob a forma de ativi- pobreza relativa pode então aumentar, enquanto a pobreza absoluta dade em vista de um ganho. diminui. O samoiedo não é pobre com seu óleo de baleia e o peixe rançoso, porque na sua sociedade isolada todos têm as mesmas necessidades. Mas num estado progressivo que, no curso de dez Pode ser que se argumente que as profissões exigindo aptidões anos por exemplo, aumenta sua produção global em um terço em re- específicas ou maior instrução se tornaram em seu conjunto mais lação à sociedade [população], o trabalhador que ganha a mesma remuneradoras, enquanto os salários pela atividade mecânica, uni- quantia no fim de dez anos não permaneceu nem sequer tão aco- forme, baixaram e têm necessariamente de baixar {478} como re- modado como antes, mas empobreceu em um terço (Ibid., pp.65- sultado da maior concorrência. E é precisamente este tipo de tra- 66). balho que, no atual estado da organização do trabalho, é o mais comum. Se um trabalhador na primeira categoria ganha agora sete vezes mais e outro na segunda categoria tanto como há cinqüenta Mas a economia política só conhece o trabalhador como besta do traba- anos, então os salários médios dos dois são presentemente quatro lho, como um animal reduzido às necessidades vitais mais estritas. vezes mais elevados. Mas se, num país particular, só mil pessoas se ocupam na primeira categoria e um milhão na segunda, então 999.000 não se encontram em melhores circunstâncias do que há Para que um povo possa desenvolver-se com maior liberdade do cinqüenta anos; na realidade, encontram-se em situação mais crí- ponto de vista intelectual, não pode continuar escravo de suas ne- tica, se os preços do que é necessário para a vida tiverem subido. cessidades físicas, servo de seu corpo. Precisa portanto de tempo E, no entanto, é com estes cálculos médios superficiais que nos livre para poder criar intelectualmente e gozar os prazeres do espíri- enganamos, ou procuramos nos enganar, acerca da condição da to. Os progressos da organização do trabalho facultam este tempo. mais numerosa classe da população. Além disso, as categorias de Um simples trabalhador {479} na indústria do algodão não produz salário são apenas um elemento que afeta os rendimentos dos agora freqüentemente com ajuda de novas forças motrizes e de má- trabalhadores, porque também importa levar em conta a duração quinas aperfeiçoadas, tanto como antes produziam 100 ou mesmo garantida do trabalho, e sobre este ponto não pode haver dúvidas 250-350 trabalhadores? Iguais realizações há, embora não na mes- no sistema anárquico da livre concorrência com as recessões e ma escala, em todos os ramos da produção como conseqüência ne- estagnação recorrentes. Por fim, devemos ter em conta o tempo cessária do fato de as forças exteriores da natureza se verem pro- de trabalho habitual, hoje e no passado. Para os trabalhadores in- gressivamente forçadas a colaborar com o trabalho humano. Se a gleses da indústria do algodão, subiram de doze a dezesseis ho- quantidade de tempo e esforço humano que em época anterior se ras por dia nos últimos vinte e cinco anos, isto é, precisamente necessitava para satisfazer determinada soma de necessidades ma- desde a introdução da maquinaria que economiza trabalho, devido teriais foi reduzida em metade, se ampliou na mesma medida o âm- à avidez dos empresários. Semelhante crescimento num país e num ramo da indústria deve, de acordo com os já bem conhecidos direitos da ilimitada explora- 4 Die Bewegung du Produktion. Eine geschechtlich - statistische Abhandlung von Schulz. Zürick und Winterthur, 1843. 6 bito para a criação e o gozo espiritual, sem nenhum atentado con- ais mais estreitas entre os sexos (Ibid., p.71-72). tra o bem estar material (...). Mas a divisão das vantagens que Nas fábricas inglesas de fiação de algodão, movidas a água e a va- conquistamos ao velho Cronos no seu próprio campo é ainda de- por, estavam empregadas em 1.835: 20.558 crianças entre os 8-12 terminada pelo jogo dos dados do acaso cego e injusto. Calculou- anos de idade, 35.867 entre os 12-13 e {480} 108.208 entre os 13- se já que em França, ao presente nível de produção, a média de 18 (...) É verdade que o progresso da maquinaria, na medida em um trabalho de cinco horas diárias por cada pessoa capaz de tra- que remove cada vez mais das mãos humanas todas as operações balhar seria suficiente para obviar a todas as necessidades mate- uniformes, tende para a completa eliminação destes males. Mas no riais da sociedade (...) apesar da economia de tempo por meio da caminho de tão rápido progresso está o fato de os capitalistas pode- modernização da maquinaria, a duração do trabalho servil nas fá- rem apropriar-se das forças das classes mais baixas, mesmo das bricas aumentou para grande parte da população (Ibid. 67,68). crianças, de modo fácil e barato, e a usar e abusar delas em lugar A passagem do trabalho complexo (ao trabalho mecânico) supõe da maquinaria (Schulz: Movimento da Produção, p.70-71). sua decomposição em operações simples. Mas por hora só uma O apelo de Lord Brougham aos trabalhadores: ‘Tornai-vos capitalis- parte das operações uniformes, repetitivas, é realizada pelas má- tas!’ (...) o mal de que milhões de homens são apenas capazes de quinas, a outra corresponde aos homens. De acordo com a natu- ganhar para comer por meio de um trabalho esgotante, fisicamente reza das coisas e com experiências concordantes uma tal ativida- nocivo, moral e espiritualmente mutilante; de que devem mesmo de continuamente uniforme é tão prejudicial para o espírito como considerar-se felizes por ter a felicidade de encontrar semelhante para o corpo; e quando esta união da maquinaria com a simples trabalho (Ibid p. 60). divisão do trabalho em numerosas mãos humanas surgem logo to- das as desvantagens desta última. Tais desvantagens revelam-se, Por conseguinte, para viver, os não-proprietários são obrigados a por exemplo, na elevada mortalidade dos trabalhadores de fábrica pôr-se direta ou indiretamente ao serviço dos proprietários, isto é, a (...). A importante distinção entre até que ponto os homens traba- tornar-se dependentes.5 lham com máquinas ou como máquinas não foi objeto de atenção. Criados - soldados (gages); trabalhadores - salários; empregados - (Ibid., p.69) salários ou emolumentos (traitements or emoluments) (Ibid 409-410) Para a futura vida dos povos, as forças naturais privadas de razão “alugar o trabalho”, “emprestar o trabalho a juros”, “trabalhar no lu- em ação nas máquinas serão os nossos escravos e servos (Ibid., gar de alguém” (...) “emprestar os materiais de trabalho a juros”, “fa- p.74). zer trabalhar no lugar de alguém” (Ibid., p. 411). Nas fábricas inglesas de fiação de algodão, só se encontram em- Esta ordem econômica condena os homens a tais ocupações abje- pregados 158.818 homens, contra 196.818 mulheres. Para cada tas, a tal degradação desolada e amarga que, em comparação, o es- 100 homens trabalhadores nas fábricas de algodão de Lancashire tado selvagem surge como uma condição real (Ibid., pp. 417-418). A há 103 mulheres trabalhadoras; e na Escócia, 209 mulheres para prostituição da classe não-proprietária sob todas as formas” (Ibid. p. cada 100 homens. Nas fábricas inglesas de linho em Leeds havia 421 sg). Lumpemproletariado. 147 mulheres para cada 100 homens trabalhadores; em Dundee e na costa oriental da Escócia, 280 mulheres para cada 100 ho- mens. Nas fábricas inglesas de seda (...) muitas mulheres traba- Charles Loudon,6 na obra Solution du Problème de la Population (Paris, lhadoras; nas fábricas de lã, que requerem maior força física, há 1.842), estima o número de prostitutas na Inglaterra como sendo entre 60 mais homens (...) De igual modo, nas fábricas de algodão da Amé- rica do Norte, em 1.833, havia 38.927 mulheres empregadas jun- tamente com 18.593 homens. Deste modo, as mudanças na orga- nização do trabalho trouxeram consigo uma esfera mais ampla de 5 Pecqueur: Théorie Nouvelle d'Économie Sociale ou étude sur lórganisation des atividade lucrativa para as mulheres (...) uma situação econômica sociétés Paris, 1842, p. 409 mais independente para as mulheres casadas (...) e relações soci- 6 Charles London: Solution du Probléme de la population et de la subsistance, soumise à un médicin dans une série de lettres.Paris, 1842 7 mil e 70 mil, o número de mulheres de “virtude duvidosa” quase o mesmo. As grandes fábricas preferem comprar o trabalho das mulheres e das crianças, porque é mais barato do que o dos homens. O trabalhador, em relação ao patrão, não se encontra de modo ne- A média de vida destas criaturas infelizes na vida pública, depois nhum na situação de vendedor livre (...). O capitalista é sempre livre que entraram para a carreira do vício, é por volta de seis ou sete para empregar o trabalho e o operário se vê {482} obrigado a vendê- anos. De maneira a manter o número de 60 mil a 70 mil prostitu- lo. O valor do trabalho fica completamente destruído se não for ven- tas, tem de haver pelo menos 8 mil ou 9 mil mulheres, no três rei- dido a todo o instante. O trabalho não pode ser nem acumulado nem nos, que cada ano adotam este infame negócio; isto é cerca de poupado, ao contrário das autênticas mercadorias. O trabalho é vida vinte e quatro novas vítimas cada dia ou a média de uma por hora. e se a vida não for todos os dias permutada por alimento depressa Assim, {481} se a mesma proporção for constante pelo mundo afo- sofre danos e morre. Para que a vida do homem seja uma mercado- ra, haverá constantemente um milhão e meio destas criaturas infe- ria, deve então se admitir a escravatura (Ibid., pp. 49-50). lizes. (...) A população do miseráveis cresce com a sua miséria e é no mais extremo limite da indigência que seres humanos se amonto- Por conseguinte, se o trabalho é uma mercadoria é uma mercadoria do- am em grande número para lutar pelo direito de sofrer. Em 1821, a tada das propriedades mais funestas. Mas até segundo os princípios da população da Irlanda era de 6.801.827. Em 1831, elevara-se a economia política, ele não é uma mercadoria, uma vez que não é o livre 7.764.010; um aumento de quatorze por cento em 10 anos. Em resultado de um mercado livre. O sistema econômico atual Leinster, uma província onde a pobreza é menor, a população au- reduz ao mesmo tempo o preço e a remuneração do trabalho, aper- mentou apenas 8 por cento, ao passo que em Connaught, a pro- feiçoa o trabalhador e degrada o homem (Ibid., pp.52-53). A indús- víncia mais pobre, o aumento atingiu os vinte e um por cento (Ex- tria se transformou em guerra e o comércio em jogo (Ibid., p.62). trato de Relatórios da Irlanda Publicados na Inglaterra, Viena, 1840). Buret: De la Misére, etc., Tomo I, pp.[36]-377. As máquinas de trabalhar algodão (na Inglaterra) representam seus 84.000.000 de artesãos. A indústria se encontrou até agora na situação de uma guerra de A economia política considera o trabalho abstratamente como uma coi- conquista: “esgotou as vidas dos que formavam o seu exército com sa. O trabalho é uma mercadoria: se o preço é elevado, a procura é gran- a mesma indiferença dos grandes conquistadores. O seu objetivo foi de e se o preço é baixo a oferta é grande. Como mercadoria, o trabalho a posse da riqueza, não a felicidade dos homens” (Buret, op.cit., deve mais e mais baixar de preço; em parte a concorrência entre o capita- p.20). lista e o trabalhador, em parte a concorrência entre os próprios trabalha- dores o obriga [Ibid., pp.42-43]. Estes interesses (isto é os interesses econômicos), quando de todo abandonados a si mesmos têm necessariamente de entrar em confli- to; não possuem outro árbitro além da guerra, e as decisões de (...) A população trabalhadora, vendedora de trabalho, fica neces- guerra atribuem a derrota e a morte a um lado e a vitória do outro sariamente reduzida à menor parte do produto (...). Será a teoria (...) é no conflito de forças opostas que a ciência busca a ordem e o do trabalho como mercadoria diferente de uma teoria disfarçada equilíbrio: a guerra perpétua, nesta perspectiva, constitui a única via da servidão? Porque se olhou o trabalho apenas como valor de para obter a paz; tal guerra chama-se concorrência (Ibid, p.23). troca? {483} A guerra industrial, para ser conduzida com êxito, exige gran- des exércitos que podem concentrar-se num ponto e ser dizimados sem restrições. Os soldados deste exército suportam as cargas que sobre eles são postas, não por devoção ou por dever, mas apenas 7 Eugène Buret De la Misére des classes laborieuses en Angleterre et en France. para escapar ao duro destino da fome. Não tem afeto ou gratidão 2 volumes, Paris 1840 pelos chefes: estes não se encontram ligados aos subordinados por 8 qualquer sentimento de benevolência, e não os conhecem como homens, mas como instrumentos de produção, que devem produzir Através do direito positivo (Say, Tomo II, p.4). o mais possível e custar o menos possível. As multidões de traba- lhadores, sempre cada vez mais amontoadas, nem sequer tem a {484} Que é que uma pessoa adquire com o capital, com a herança de segurança de que sempre terão emprego. A indústria, que os con- uma grande propriedade, por exemplo? vocou, apenas lhes permite viver quando deles precisa; logo que os possa dispensar abandona-os sem a menor preocupação. As- sim os trabalhadores que foram despedidos se vêem obrigados a Mas a pessoa que herda uma grande fortuna não alcança imediata- oferecer a sua pessoa e a sua força por qualquer preço que lhes mente qualquer poder político (...) O tipo de poder que a posse ime- concederem. Quanto mais longo, mais penoso e fastidioso for o diata e diretamente lhe transmite é o poder de compra; um certo di- trabalho que lhes dão, menor será a paga: é possível ver trabalha- reito sobre todo o trabalho dos outros ou sobre todo o produto do dores que labutam sem interrupção durante dezesseis horas por trabalho, que então se encontra no mercado (Smith, tomo I, p. 61). dia e que mal conseguem ganhar o direito de não morrer” (Ibid., pp. [68]-69). Estamos convencidos e a convicção é partilhada na Inglaterra pe- O capital é assim o poder de governar o trabalho e os seus produtos. O los comissários nomeados para investigar as condições dos tece- capitalista possui este poder, não em virtude das suas qualidades pessoais lões de tear manual de que as grandes cidades industriais perderi- ou humanas, mas como proprietário do capital. O seu poder é o poder de am a sua população trabalhadora em pouco tempo se não rece- compra do seu capital a que nada pode resistir. bessem constantemente das regiões rurais vizinhas uma afluência Veremos depois como o capitalista, por meio do capital, exerce o poder regular de indivíduos saudáveis, de sangue novo (Ibid., p. 362). de governar o trabalho e, em seguida, como o próprio capital governa o capitalista. Que é o capital? Lucro do Capital (1) Capital Uma certa quantidade de trabalho armazenado e acumulado (Smith, Tomo II, p.312). 1. Em que se baseia o capital, isto é, a propriedade privada dos pro- dutos do trabalho alheio? O capital é trabalho acumulado. (...) embora o capital não se reduza ao roubo ou à fraude, precisa, no entanto, da ajuda da legislação para santificar a herança (...) 2. Fundos, “Stock”. (Say, Tomo I, p. 136)8. Significa todo acúmulo de produtos da terra ou do trabalho manufa- Como é que alguém se torna proprietário dos fundos produtivos? Como turado. Só tem o nome de capital quando traz ao proprietário rendi- é que alguém se torna possuidor dos produtos criados por estes fundos? mento ou lucro (Smith, Tomo II, p. 191). 8 Jean-Baptiste Say: Traité d'Economie Politique, 3ª edição, 2 volumes, Paris 1817. 9 vel que seja agora determinar com precisão os lucros dos capitais, pode-se no entanto, fazer uma idéia a partir do interesse do dinhei- ro. Se for possível obter muito lucro com dinheiro, se dará muito pe- (2) O Lucro do Capital la capacidade de dele se servir, e pouco se também pouco for o lu- cro obtido por sua mediação (Smith, Tomo I, pp. [180]-181). A apro- O lucro ou ganho do capital é inteiramente diferente do salário do priação, que a habitual taxa de juro tem de conservar em relação à trabalho. A diferença se manifesta de dois modos: em primeiro lu- taxa de lucro líquido, varia necessariamente com a subida ou desci- gar, os lucros do capital são “totalmente regulados pelo valor dos da do lucro. Na Grã-Bretanha, significa-se o duplo interesse com o fundos empregados”, embora o trabalho de inspeção e de direção que os comerciantes chamam um lucro bom, moderado, razoável, possa ser idêntico para diferentes montantes de capital. Além dis- expressões sonoras que querem apenas dizer um lucro comum e so, nas grandes fábricas, “todo o trabalho é confiado a algum em- usual (Smith, Tomo I, p.198). pregado principal.”. “Cuja remuneração não está relacionada ao capital cuja gestão superintende.” Apesar de o trabalho do proprie- tário ficar neste caso reduzido a quase nada, “ele ainda exige lu- Qual é a mais baixa taxa de lucro? Qual a mais elevada? cros em proporção com seu capital” (Smith, Tomo I, pp 97 –99). A mais baixa taxa de lucro ordinário dos capitais tem de ser algo Por que é que o capitalista reclama tal proporção entre o lucro e o capi- mais do que o necessário para compensar as perdas ocasionais, a tal? que está sujeita a aplicação do capital. Este excedente é precisa- mente o ganho ou lucro líquido. O mesmo vale para a mais baixa ta- xa de juro (Smith, Tomo I, p. 196). Ele não teria interesse em empregar os trabalhadores, a não ser que esperasse da venda do seu trabalho algo mais do que o que é A mais elevada taxa a que podem subir os lucros ordinários é a que, necessário para reembolsar os fundos por ele adiantados {485} na maior parte das mercadorias, absorve a totalidade das rendas da como salários, e não teria interesse em empregar uma grande so- terra e reduz os salários na produção das mercadorias ao mais bai- ma de preferência a uma pequena soma de fundos se o seu lucro xo preço, à simples subsistência do operário. O trabalhador tem não estivesse em proporção com o volume dos fundos aplicados sempre de ser alimentado de uma ou outra maneira, enquanto se (Tomo I, p. 97). aplica ao trabalho; mas as rendas da terra podem desaparecer intei- ramente. Exemplo: os funcionários da Companhia da Índia Oriental em Bengala (Smith, Tomo I, pp. 197-198). O capitalista obtém portanto, em primeiro lugar, um lucro sobre os salá- rios, em seguida, sobre as matérias-primas que ele adianta. Além de todas as vantagens da concorrência limitada, que o capitalista Qual a relação entre o lucro e o capital? consegue explorar em tal caso, pode ainda manter por modos respeitáveis o preço de mercado acima do preço natural. Se é difícil determinar os salários médios habituais do trabalho em dado tempo e lugar, mais difícil será ainda definir o lucro dos capi- {486} Em primeiro lugar, através do segredo comercial [grifos de tais. As variações no preço das mercadorias com que o capital ne- Marx]. gocia, a boa ou má sorte dos seus rivais e clientes, mil outros aci- dentes a que se encontram sujeitas as mercadoria, quer nos transportes quer nos armazéns, originam uma mudança diária, Se o mercado está muito afastado dos seus fornecedores isto é; pe- quase horária, no lucro (Smith, Tomo I, pp.179-180). Por impossí- lo encobrimento da mudança de preços, da sua subida acima do ní- 10

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