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Malcolm X PDF

623 Pages·2014·4.29 MB·Portuguese
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N umerosas personagens compõem as metamorfoses sofridas por M alcolm Little, o franzino filho de uma família de negros pobres n ascido numa pequena cidade do Centro-Oeste americano, até sua c onversão decisiva em Malcolm X, o religioso muçulmano e i ncendiário combatente da revolução mundial que morreu como apóstolo da paz entre os povos. A ntes de se tornar um interlocutor de guerrilheiros, intelectuais, t eólogos e primeiros-ministros ao redor do planeta, o mártir pioneiro d os direitos civis nos Estados Unidos foi sucessivamente Homeboy, J ack Carlton, Detroit Red, Big Red e Satan; Malachi Shabazz, Malik S habazz e El-Hajj Malik El-Shabazz. Esses nomes de sonoridades e s entidos tão contrastantes entre si indicam os rumos contraditórios a ssumidos pela vida de Malcolm até o encontro definitivo com o Islã, q ue o levaria ao ativismo político. Ladrão, agenciador de prostitutas e v iciado em drogas na década de 1940, quando também conheceu os h orrores da prisão, ele abandonou o crime para abraçar com sua o ratória brilhante, amparada em leituras autodidatas e nos e nsinamentos do Corão, uma luta sem quartel contra o racismo e a injustiça social. E ntretanto, como demonstra Manning Marable, a mesma p ersonalidade profundamente contestadora sempre esteve por trás das d iversas máscaras sociais usadas por Malcolm. Numa narrativa m inuciosa, o autor acompanha os passos desse gigante afro-americano a o longo de dezenas de cidades dos Estados Unidos, além das viagens à Á frica, à Europa e ao Oriente Médio como porta-voz da revolta dos descendentes de escravos e dos direitos dos oprimidos. Prólogo A vida além da lenda Nos primeiros anos do século passado, o bairro logo ao norte do Harlem, mais tarde conhecido como Washington Heights, era um subúrbio escassamente povoado. Só a visão de um homem de negócios como a de William Fox seria capaz de levar à construção de um opulento centro de entretenimento na Broadway, entre as ruas 165 e 166 Oeste. Fox instruiu o arquiteto Thomas W. Lamb a projetar um prédio mais esplêndido do que qualquer outro teatro da Broadway. Quando ficou pronto, em 1912, uma dispendiosa fachada de terracota enfeitava as paredes frontais, colunas de mármore protegiam a entrada, e entalhes de pássaros exóticos decoravam o saguão: esses motivos coloridos, inspirados no grande artista do século xix, James Audubon, deram a Fox a ideia de chamar aquele palácio do prazer de Audubon. No primeiro andar do prédio, Lamb projetou um enorme cinema, grande o suficiente para acomodar 2300 pessoas. Em anos posteriores, o segundo piso foi reservado para dois espaçosos salões de baile: o Rose Ballroom, que podia acomodar oitocentos fregueses, e o Grand Ballroom, onde cabiam até 1500 convidados.1 Em poucas décadas, o bairro que ficava em volta do Audubon começou a mudar, tornando-se cada vez mais negro e operário. A administração atendia a nova clientela trazendo as mais renomadas orquestras dançantes da época, incluindo Duke Ellington, Count Basie e Chick Webb. O Audubon também se tornou a casa de muitos sindicalistas militantes da cidade, e de 1934 a 1937 o recém-fundado Sindicato dos Trabalhadores de Transporte realizava ali suas reuniões — com os confrontos violentos ocasionais.2 Numa noite de setembro de 1919, por exemplo, uma reunião de quatrocentas pessoas, patrocinada pelo Lantern Athletic Club, foi interrompida por quatro disparos de arma de fogo. Duas pessoas ficaram gravemente feridas.3 Durante a Segunda Guerra Mundial, o Audubon era alugado para casamentos, bar mitsvás, reuniões políticas e festas de formatura. Depois de 1945, porém, o bairro mudou mais uma vez, quando muitos moradores brancos de classe média venderam suas propriedades e fugiram da periferia. A decisão da Universidade Columbia de expandir seu hospital na esquina da rua 168 Oeste com a Broadway, para transformá-lo num importante campus de ciências da saúde, gerou centenas de novos empregos para o influxo negro, enquanto o Audubon adaptava-se às realidades econômicas fechando seu cinema e dividindo o espaço para alugar. Mas os dois salões de baile, o Rose e o Grand, resistiram. Em meados dos anos 1960, o prédio já tinha perdido a maior parte da grandiosidade original. A entrada principal dos salões de baile era pequena e apagada. Os fregueses tinham de subir um inclinado lance de escadas para o saguão do segundo piso, depois passar pela gerência e seguir para o Rose, do lado esquerdo do prédio, ou para o Grand, que dava para a Broadway. O salão maior tinha cerca de 55 metros por dezoito, com 65 cabines separadas nas paredes norte, leste e oeste, cada uma capaz de abrigar doze pessoas. Mais distante da entrada principal do prédio, ao longo da parede sul, havia um modesto palco de madeira, atrás do qual numa antecâmara apertada e mal iluminada músicos e oradores se reuniam antes das apresentações. Na tarde de inverno de domingo, 21 de fevereiro de 1965, o Grand Ballroom tinha sido reservado para a controvertida Organização para a Unidade Afro- Americana (Organization of Afro-American Unity, oaau), grupo político do Harlem. Por quase um ano, a administração do Audubon vinha alugando o salão para eles, mas nunca deixou de preocupar-se com seu líder, Malcolm X. Cerca de dez anos antes, ele chegara, como ministro do Templo nº 7, sede local de uma seita islâmica militante, a Nação do Islã Perdida e Reencontrada (Lost-Found Nation of Islam, noi). Os membros da seita, que passou a ser chamada pela imprensa de “muçulmanos negros”, diziam que os brancos eram demônios e que os negros americanos eram a tribo asiática perdida de Shabazz, escravizada na selva racial da América. A rota para a salvação exigia que os convertidos rejeitassem seus sobrenomes de escravos, substituindo-os pela letra X, símbolo que representava o desconhecido. Prometia-se aos membros que, depois de anos de dedicação pessoal e crescimento espiritual, eles receberiam seus sobrenomes “originais”, em consonância com sua verdadeira identidade asiática. Como porta- voz mais ativo publicamente, Malcolm X tornou-se conhecido por suas críticas desafiadoras aos líderes de direitos civis e aos políticos brancos. Em março do ano anterior, Malcolm X tinha anunciado sua independência da noi. Ele rapidamente estabeleceu seu próprio grupo espiritual, Mesquita Muçulmana (Muslim Mosque, Inc., mmi), em grande parte para abrigar os membros da noique tinham deixado a seita por solidariedade a ele. Apesar do rompimento, ele continuou a fazer declarações altamente polêmicas. “Haverá mais violência do que nunca este ano”, previu ele para um repórter do New York Times em março de 1964, por exemplo. “É melhor que os brancos entendam isso, enquanto há tempo. Os negros, no âmbito da massa, estão prontos para agir.”4 O chefe de polícia de Nova York reagiu a essa previsão rotulando Malcolm de “outro que se diz ‘líder’ e que defende abertamente o derramamento de sangue e a revolta armada e faz pouco dos sinceros esforços de homens razoáveis para resolver o problema da igualdade de direitos por meios apropriados, pacíficos e legítimos”. Malcolm não se deixou intimidar pelo ataque. “A maior homenagem que alguém pode me fazer”, respondeu ele, “é dizer que sou irresponsável, porque responsáveis, para eles, são os negros subservientes às autoridades brancas — negros ‘Pai Tomás’.”5 Semanas depois, Malcolm X pareceu ter tido uma revelação espiritual. Em abril, visitou a cidade sagrada de Meca, num hajj espiritual, e ao voltar para os Estados Unidos declarou que se convertera ao Islã sunita ortodoxo. Rejeitando vínculos com a Nação do Islã e com seu líder, Elijah Muhammad, anunciou sua oposição a qualquer forma de fanatismo e intolerância. Dizia-se ansioso para cooperar com os grupos de direitos civis e trabalhar com qualquer branco que, genuinamente, apoiasse a causa dos negros americanos. Mas, apesar desse reconhecimento, continuou a fazer declarações polêmicas — por exemplo, convocando os negros a formar grupos de tiro para proteger suas famílias de ataques racistas, e condenando os candidatos à presidência dos grandes partidos, Lyndon Johnson e Barry Goldwater, por não oferecerem escolha aos negros. Os programas da oaau eram, em sua maioria, coreografados como fóruns educacionais para a comunidade local, encorajando a participação da plateia. O orador da reunião de 21 de fevereiro foi Milton Galamison, destacado pastor presbiteriano que tinha organizado protestos contra escolas de qualidade inferior em bairros negros e latinos de Nova York. A oaau não teve participação direta, mas Malcolm elogiou publicamente a iniciativa do pastor, e seus vices devem ter desejado uma aliança informal. Apesar de o início do programa da tarde ter sido anunciado para as duas horas, até aquele momento não mais de quarenta pessoas tinham passado pela entrada principal. O fraco comparecimento inicial talvez refletisse o medo de possível violência. Durante meses, a Nação do Islã travara uma disputa notória com seu antigo porta-voz nacional, e os seguidores de Malcolm no Harlem e em outras cidades tinham sido fisicamente atacados. Uma semana antes, a casa dele, localizada no tranquilo bairro de Elmhurst, Queens, tinha sido atingida por uma bomba no meio da noite. Para evitar confrontos públicos, o Departamento de Polícia de Nova York costumava enviar um grupo de até doze policiais para os comícios da oaau, sempre que realizados no Audubon. Um ou mais policiais, geralmente incluindo o comandante do dia, ficavam a postos no segundo piso, dentro do escritório, de onde tinham ampla visão de todas as pessoas que entravam no salão principal. Muitos outros ficavam ostensivamente posicionados na entrada principal, ou na frente do prédio, do outro lado da rua, numa pequena praça que os moradores chamavam de Pigeon Park. Naquela tarde particular, porém, não havia um único policial na entrada do Audubon; apenas um esteve na praça, e por pouco tempo.6 Nenhum foi visto no escritório comercial. A rigor, apenas dois patrulheiros uniformizados foram mandados para dentro do prédio, com ordens para permanecer no Rose Ballroom — o menor dos dois salões de baile, deserto a não ser pela presença deles — a considerável distância da reunião anunciada.7 A ausência substantiva de policiais seria crítica, porque mais cedo, naquela manhã, cinco homens que há meses planejavam assassinar Malcolm X fizeram uma última reunião. Embora o lugar desse encontro fosse Paterson, em Nova Jersey, os cinco homens eram membros da mesquita da Nação do Islã de Newark. Apenas um conspirador era funcionário da mesquita; os outros eram militantes da noie pressupunham que suas ações tinham sido aprovadas pela cúpula da Nação. Depois da reunião na casa de um dos conspiradores, onde repassaram as atribuições de cada um pela última vez, os cinco entraram num Cadillac e seguiram para a ponte George Washington. Saíram no norte de Manhattan e acharam uma vaga de estacionamento perto do Audubon, que também lhes daria acesso rápido à ponte quando terminassem, facilitando a fuga para Nova Jersey.8 A única força de segurança dentro do grande salão e na entrada principal era constituída por cerca de vinte seguidores de Malcolm. O chefe da equipe de segurança de Malcolm era seu guarda-costas pessoal, Reuben X Francis, que pouco antes, naquela tarde, tinha dito a William 64X George que a equipe do dia estaria desfalcada, e que precisaria de sua ajuda. Geralmente, o fiel William ficava perto da tribuna dos oradores (bem no meio da parte fronteira do palco), de onde podia ver toda a plateia. Nesse dia, porém, Reuben o instruiu a ficar na entrada, o mais longe possível do palco.9 Reuben também delegou algumas decisões ao coordenador de segurança da reunião, John D. X, cujo trabalho consistia em supervisionar guardas no perímetro do Grand Ballroom. O protocolo normal exigia que as equipes de segurança ficassem em pé até trinta minutos — tarefa dura, especialmente para aqueles que não tinham experiência em fazer o policiamento de multidões. Geralmente as posições mais importantes eram atribuídas a ex-membros da noi, que tinham experiência com segurança e eram treinados em artes marciais. Se um conhecido simpatizante da organização tentasse entrar na reunião, era interrogado, calmamente, mas com firmeza. Membros que tinham história pessoal de violência, ou eram conhecidos pela hostilidade a Malcolm, eram escoltados para fora do prédio. Um desses homens era Linwood X Cathcart, antigo membro do Templo nº 7, de Malcolm, que recentemente ingressara na mesquita de Jersey City. Ele entrara no Audubon à 1h45, indo sentar-se na primeira fila de cadeiras arrumadas no salão de dança. A equipe de Malcolm o identificou de imediato, concluindo que sua presença podia ser um problema. Cathcart usava desaforadamente um broche da noina lapela do paletó. Reuben o convenceu a ir até os fundos do salão, onde, depois de uma troca de palavras, insistiu para que tirasse o broche ofensivo, se quisesse permanecer. Cathcart cedeu, e voltou para seu lugar.10 Posteriormente, o pessoal da segurança de Malcolm diria que ele foi o único simpatizante da noique haviam identificado. O responsável pelas medidas de segurança aquela tarde era Anas M. Luqman (Langston Hughes Savage), outro membro da noique tinha rompido laços com a Nação por lealdade a Malcolm. Em seu depoimento posterior ao júri de instrução, Luqman situou seu horário de chegada aproximadamente à 1h20. Ele falou rapidamente com algumas pessoas e, como tinha feito tantas outras vezes, arranjou as cadeiras no palco, posicionou a tribuna do orador e removeu algum equipamento que estava sobrando. Em seguida, “foi para a plateia e ficou por ali, até a reunião começar”. Pouco depois das duas, resolveu verificar as portas mais uma vez, à direita do palco, perto do tablado do orador. Por uma razão qualquer, estavam destrancadas, o que o deixou intrigado, mas em vez de alertar o pessoal da segurança, voltou para sua cadeira.11 Apesar do recente ataque a bomba e das crescentes ameaças de violência, Malcolm tinha insistido em que ninguém da sua equipe de segurança, à exceção de Reuben, portasse armas naquele domingo. Numa reunião da oaau noites antes, suas ordens tinham sido vigorosamente contestadas. O chefe do pessoal de Malcolm, James 67X Warden, estava convencido de que não intensificar a segurança aquela tarde quase certamente traria problemas. Posteriormente, ao explicar suas ações, disse ele: “Queríamos averiguar [se traziam armas]. Mas era uma reunião [pública] da oaau. Malcolm disse: ‘Esse pessoal não está acostumado a ser revistado por ninguém’. Estamos lidando com um grupo totalmente diferente”.12 Consequentemente, quando as pessoas entravam no Audubon, muitas delas trajando volumosos sobretudos de inverno, ninguém foi parado. Se Reuben estava preocupado, não aparentava, e até saiu do salão para pagar ao gerente a taxa de 150 dólares daquela tarde.13 Àquela altura, todos os futuros assassinos já estavam dentro do prédio. Como tinham previsto, ninguém os deteve para ver se estavam armados. O grupo dividiu-se. Os três pistoleiros acharam cadeiras na primeira fila, na frente ou à esquerda da tribuna do orador. Um atirador, homem atarracado, de cor escura, na casa dos vinte anos, deveria dar os primeiros tiros. Dois outros carregavam revólveres. A função deles era acabar com Malcolm depois dos disparos iniciais. Os dois últimos conspiradores sentaram-se lado a lado, nas cadeiras de madeira da sétima fila. Eles deveriam distrair a atenção do público. Se possível, um deles acenderia uma bomba de fumaça.14 Por volta das duas da tarde, a plateia aumentara para mais de duzentas pessoas, que começavam a demonstrar impaciência. Benjamin 2X Goodman, ministro assistente de Malcolm da Mesquita Muçulmana, Inc., subiu ao palco e começou a falar por meia hora, para aquecer. Como Benjamin não estava entre os oradores do programa, a maioria das pessoas continuou a falar e a andar de um lado para outro, falando com amigos. Cerca de dez minutos depois, os comentários de Benjamin começaram a despertar a atenção dos ouvintes, quando ele rememorou temas recentes dos comícios de Malcolm, como a oposição à Guerra do Vietnã. Todos sabiam que Malcolm quase sempre subia à tribuna logo depois das apresentações de Benjamin.15 Minutos antes das três, Benjamin ainda proferia a audiência quando, sem aviso, um homem alto, de cabelo louro escuro, caminhou bruscamente até uma cadeira a poucos passos da tribuna. Surpreendido pela entrada do líder, Benjamin terminou de falar apressadamente, depois se virou para sentar numa das cadeiras no palco. De regra, por razões de segurança, Malcolm não tinha permissão de ficar ali sozinho. Nessa ocasião, entretanto, ele impediu que o colega sentasse, murmurando-lhe instruções ao ouvido. Com ar perplexo, Benjamin desceu e voltou para a sala atrás do palco.16 “As-salaam alaikum”, proclamou Malcolm, fazendo a tradicional saudação árabe. “Walaikum salaam”, responderam centenas de vozes. Mas antes que ele pudesse dizer qualquer outra coisa, houve uma confusão inesperada na sexta ou sétima fila de cadeiras. “Tire a mão do meu bolso!”, gritou um homem para alguém perto dele. Ambos se levantaram e começaram a discutir, desviando a atenção de todos. Do palco, Malcolm gritou: “Parem! Parem!”.17 Os dois principais guardas da tribuna, Charles X Blackwell e Robert 35X Smith, lutaram para separar os homens. A maioria dos seus colegas também saiu de suas posições para acabar com a interrupção, deixando Malcolm inteiramente só no palco. Foi então que o conspirador da primeira fila levantou-se e andou abruptamente em direção à tribuna. Sob o sobretudo de inverno, ele acomodava uma escopeta de cano serrado. A cerca de quinze passos do palco, parou, puxou o sobretudo para trás e levantou a arma. Para muitos afro-americanos, 21 de fevereiro de 1965 está tão profundamente gravado na memória quanto o assassinato de John F. Kennedy e o de Martin Luther King Jr. para outros americanos. Na turbulenta esteira de sua morte, os discípulos de Malcolm X adotaram o slogan “Black Power” e o elevaram à condição de santidade laica. No fim dos anos 1960, Malcolm X encarnava o ideal de negritude para uma geração inteira. Como W. E. B. Du Bois, Richard Wright e James Baldwin, ele tinha denunciado os custos psicológicos e sociais que o racismo impusera à sua gente; também era largamente admirado como homem de ação intransigente, o oposto dos líderes negros não violentos e de pensamento voltado para a classe média, que tinham dominado o movimento de direitos civis antes dele. O líder mais estreitamente ligado a Malcolm na vida e na morte era, sem dúvida, King. No entanto, apesar de ter passado a maior parte do começo da vida na área urbana de Atlanta, King raramente era identificado como representante dos negros do gueto. Nas décadas que se seguiram ao seu assassinato, ele foi associado a imagens do Sul predominantemente rural e interiorano. Malcolm, diferentemente, era produto do gueto moderno. A raiva que expressava era uma reação ao racismo de contexto urbano: escolas urbanas segregadas, moradias de baixa qualidade, altas taxas de mortalidade infantil, drogas e crime. Como nos anos 1960 a maioria esmagadora dos afro-americanos vivia em cidades grandes, as condições que definiam sua existência estavam mais estreitamente ligadas àquilo de que Malcolm falava do que àquilo que King representava. Consequentemente, ele foi capaz de formar um grande público entre os negros das cidades, que viam na resistência passiva uma ferramenta insuficiente para desmantelar o racismo institucional. A metamorfose tardia de Malcolm, de raivoso militante negro para ícone multicultural americano, foi produto do êxito extraordinário da Autobiografia de Malcolm X, redigida a quatro mãos com o escritor Alex Haley, e lançada nove meses antes do seu assassinato. Best-seller nos primeiros anos de sua publicação, o livro logo se impôs como texto-padrão no currículo de centenas de faculdades e universidades. No fim dos anos 1960, toda uma geração de poetas e escritores afro-americanos produzia um conjunto de obras aparentemente interminável prestando homenagem ao ídolo caído. Na imaginação deles, a imagem de Malcolm ficou permanentemente congelada, como a do homem de sorriso largo e malicioso, imaculadamente bem vestido, e dedicado à promoção dos interesses e aspirações da sua gente. Do momento em que foi morto, grupos muito diferentes, incluindo trotskistas, nacionalistas culturais negros e muçulmanos sunitas, o reivindicavam para si. Centenas de instituições e clubes de bairro foram rebatizados em honra do homem que o ator Ossie Davies saudara como “nossa masculinidade, nossa viva, negra masculinidade”.18 Uma Associação Malcolm X foi fundada por afro- americanos nas Forças Armadas. No Harlem, ativistas formaram um Clube Democrático Malcolm X.19 Em 1968, o produtor de cinema independente Marvin Worth contratou James Baldwin para escrever um roteiro baseado na

Description:
maçônica influenciada pelas escolas egípcias de mistérios). da morte de Ahmad, em 1908, a causa Ahmadiyya dividiu-se entre os Qadianis, a.
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