Edmund Husserl INVESTIGAÇÕES LÓGICAS Primeiro Volume Prolegômenos à Lógica Pura De acordo com o texto de Husserliana XVIII Editado por Elmar Holenstein Tradução de Diogo Ferrer Diretor científico Pedro M. S. Alves Aprovada pelos Arquivos-Husserl de Lovaina Phainomenon - Clássicos de Fenomenologia Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa FORENSE UNIVERSITÁRIA Rio de Janeiro A EDITORA FORENSE se responsabiliza pelos vícios do produto no que concerne à sua edição, aí com preendidas a impressão e a apresentação, a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseá-lo e lê-lo. Os vícios relacionados à atualização da obra, aos conceitos doutrinários, às concepções ideológicas e referên cias indevidas são de responsabilidade do autor e/ou atualizador. As reclamações devem ser feitas até noventa dias a partir da compra e venda com nota fiscal (interpretação do art. 26 da Lei n. 8.078, de 11.09.1990). Translation from German language edition: LOGISCHE UNTERSUCHUNGEN. ERSTER BAND: PROLEGOMENA ZUR REINEN LOGIK by Edmund Husserl Copyright © 1975 Kluwer Academic Publishers B.V. Kluwer Academic Publishers B.V.is a part of Springer Science+Business Media Ali Rights Reserved Com base num convénio com a Springer Verlag e o Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, detentor dos direitos da tradução para língua portuguesa, a qual foi realizada no quadro do Projecto de Investigação “Tradução das Obras de Husserl” da FCT, sob a direcção de Pedro M. S. Alves. Investigações Lógicas. Primeiro Volume: Prolegómenos à Lógica Pura ISBN 978-85-309-5033-0 Direitos exclusivos da presente edição para o Brasil Copyright © 2014 by FORENSE UNIVERSITÁRIA um selo da EDITORA FORENSE LTDA. Uma editora integrante do GEN | Grupo Editorial Nacional Travessa do Ouvidor, 11 - 6o andar - 20040-040 - Rio de Janeiro - RJ Tels.: (0XX21) 3543-0770 - Fax: (0XX21) 3543-0896 [email protected] | www.grupogen.com.br O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indeni zação cabível (art. 102 da Lei n. 9.610, de 19.02.1998). Quem vender, expuser à venda, ocultar, adquirir, distribuir, tiver em depósito ou utilizar obra ou fonogra- ma reproduzidos com fraude, com a finalidade de vender, obter ganho, vantagem, proveito, lucro direto ou indireto, para si ou para outrem, será solidariamente responsável com o contrafator, nos termos dos artigos precedentes, respondendo como contrafatores o importador e o distribuidor em caso de reprodução no exterior (art. 104 da Lei n. 9.610/98). Ia edição - 2014 Tradutor: Diogo Ferrer Diretor científico: Pedro M. S. Alves CIP - Brasil. Catalogação-na-fonte. Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ. H96i Husserl, Edmund, 1859-1938 Investigações lógicas: prolegómenos à lógica pura: volume 1 / Edmund Husserl; tradução Diogo Ferrer. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2014. il. Tradução de: Logische Untersuchungen: prolegomena zur reinen Logik glossário, anexo ISBN 978-85-309-5033-0 1. Lógica. 2. Teoria do conhecimento. 3. Fenomenologia. 4. Filosofia. I. Ferrer, Diogo. II. Título. 13-07416 CDD: 160 CDU: 16 ÍNDICE GERAL Apresentação da Tradução Portuguesa...................................................................................... IX Prefácio......................................................................................................................................... XIII Prefácio à Segunda Edição......................................................................................................... XV INVESTIGAÇÕES LÓGICAS - PRIMEIRO VOLUME PROLEGÓMENOS À LÓGICA PURA Introdução................................................................................................................................... 3 § 1 A controvérsia sobre a definição da lógica e o conteúdo essencial das suas doutrinas.... 3 § 2 Necessidade de uma discussão renovada das questões de princípio................................... 4 §3 As questões controversas. O caminho a tomar.................................................................... 5 Capítulo I - A LÓGICA COMO DISCIPLINA NORMATIVA E EM ESPECIAL COMO DISCIPLINA PRÁTICA.................................................................................................... 7 § 4 A incompletude teorética das ciências particulares............................................................. 7 § 5 A completação teorética das ciências particulares pela metafísica ou doutrina da ciência.. 8 § 6 A possibilidade e justificação de uma lógica como doutrina da ciência........................... 9 § 7 Continuação. As três propriedades mais significativas das fundamentações................... 12 § 8 A relação destas propriedades com a possibilidade da ciência e da doutrina da ciência__ 14 § 9 Os procedimentos metódicos nas ciências: em parte fundamentações, em parte dispositi vos auxiliares para as fundamentações.............................................................................. 16 § 10 As ideias da teoria e da ciência como problemas da doutrina da ciência....................... 18 § 11 A lógica ou doutrina da ciência como disciplina e como técnica normativa.................. 19 § 12 Definições relevantes da Lógica.......................................................................................... 20 Capítulo II - AS DISCIPLINAS TEORÉTICAS COMO FUNDAMENTO DAS NORMA TIVAS ................................................................................................................................. 23 § 13 A controvérsia sobre o caráter prático da lógica.............................................................. 23 § 14 O conceito da ciência normativa. O padrão ou princípio que lhe confere unidade........ 30 §15 Disciplinas normativas e técnicas...................................................................................... 34 § 16 As disciplinas teoréticas como fundamento das normativas........................................... 35 Capítulo III - O PSICOLOGISMO, OS SEUS ARGUMENTOS E A SUA POSIÇÃO EM RELAÇÃO AOS CONTRA-ARGUMENTOS USUAIS................................................. 39 § 17 A controvérsia sobre se os fundamentos teoréticos essenciais da lógica normativa se encontram na psicologia...................................................................................................... 39 § 18 As demonstrações dos psicologistas.................................................................................... 40 § 19 Os argumentos habituais do partido oposto e a sua solução psicologista....................... 40 § 20 Uma lacuna na demonstração dos psicologistas............................................................... 44 Capítulo IV - CONSEQUÊNCIAS EMPIRISTAS DO PSICOLOGISMO........................... 47 §21 Caracterização de duas consequências empiristas do ponto de vista psicologista e sua refutação............................................................................................................................. 47 Investigações Lógicas - Prolegômenos à Lógica Pura • Edmund Husserl § 22 As leis do pensar como pretensas leis da natureza que causam, em atuação isolada, o pensamento racional........................................................................................................... 50 § 23 Uma terceira consequência do psicologismo e sua refutação........................................... 53 § 24 Continuação....................................................................................................................... 56 Capítulo V - AS INTERPRETAÇÕES PSICOLÓGICAS DOS PRINCÍPIOS LÓGICOS.. 59 § 25 O princípio da não contradição na interpretação psicologista de Mill e Spencer............ 59 § 26 Da interpretação psicológica do princípio de Mill não resulta nenhuma lei, mas uma proposição de experiência inteiramente imprecisa e cientificamente não comprovada.. 61 Apêndice aos dois últimos parágrafos - Acerca de algumas falhas principiais do em pirismo................................................................................................................................. 63 § 27 Objeções análogas contra as restantes interpretações psicológicas do princípio lógico. Equívocos como fontes do erro........................................................................................... 65 § 28 A pretensa duplicidade do princípio da não contradição, segundo a qual ele deve ser apreendido simultaneamente como lei da natureza do pensar e como lei normativa da sua regulação lógica........................................................................................................... 69 § 29 Continuação. A doutrina de Sigwart................................................................................ 73 Capítulo VI - O ESCLARECIMENTO PSICOLOGÍSTICO DA SILOGÍSTICA. FÓRMU LAS DE RACIOCÍNIO E FÓRMULAS QUÍMICAS..................................................... 77 § 30 Tentativas de interpretação psicológica dos princípios silogísticos................................... 77 §31 Fórmulas de raciocínio e fórmulas químicas.................................................................... 79 Capítulo VII - O PSICOLOGISMO COMO RELATIVISMO CÉTICO............................. 83 § 32 As condições ideais de possibilidade de uma teoria em geral. Conceito rigoroso do ceti cismo .................................................................................................................................. 83 § 33 Ceticismo em sentido metafísico........................................................................................ 85 § 34 O conceito do relativismo e as suas particularizações....................................................... 86 § 35 Crítica ao relativismo individual........................................................................................ 86 § 36 Crítica do relativismo específico e, em particular, do antropologismo............................. 87 § 37 Observação geral. O conceito do relativismo em sentido alargado................................. 91 § 38 O psicologismo em todas as suas formas é um relativismo............................................... 92 § 39 O antropologismo na Lógica de Sigwart............................................................................ 93 § 40 O antropologismo na Lógica de B. Erdmann.................................................................... 101 Capítulo VIII - OS PRECONCEITOS PSICOLOGISTAS..................................................... 115 § 41 Primeiro preconceito........................................................................................................... 115 § 42 Esclarecimentos................................................................................................................... 118 § 43 Retrospectiva sobre os contra-argumentos idealistas. As suas insuficiências e o seu senti do correto............................................................................................................................. 122 § 44 Segundo preconceito........................................................................................................... 124 § 45 Refutação: também a matemática pura se tornaria num ramo da psicologia................ 124 § 46 O domínio de investigação da pura lógica é, analogamente ao da matemática pura, ideal..................................................................................................................................... 125 § 47 Atestações probatórias pelos conceitos lógicos fundamentais epelo sentido dos princípios lógicos................................................................................................................................... 129 § 48 As diferenças decisivas....................................................................................................... 131 § 49 Terceiro preconceito. A lógica como teoria da evidência................................................... 133 VI índice Geral § 50 A reformulação equivalente das proposições lógicas como proposições sobre as condições ideais da evidência dos juízos. As proposições resultantes não são psicológicas....................135 §51 O ponto decisivo nesta controvérsia..........................................................................................139 Capítulo IX - O PRINCIPIO DA ECONOMIA DO PENSAR E A LÓGICA...........................143 § 52 Introdução.................................................................................................................................143 § 53 O caráter teleológico do princípio de Mach-Avenarius e o significado científico da econo mia do pensar...........................................................................................................................144 § 54 Exposição mais pormenorizada dos objetivos justificados de uma economia do pensar, principalmente na esfera da metodologia puramente dedutiva. A sua relação com a téc nica lógica ......146 §55 A ausência de significado da economia do pensar para a lógica e teoria do conhecimento puras, e a sua relação com a psicologia..................................................................................150 § 56 Continuação. O íxrrepov npórepov da fundamentação do domínio puramente lógico pela economia do pensar..........................................................................................................153 Capítulo X - CONCLUSÃO DAS OBSERVAÇÕES CRÍTICAS.................................................157 § 57 Objeções relativas a erros de interpretação óbvios dos nossos esforços lógicos......................157 § 58 As nossas referências a grandes pensadores do passado, principalmente a Kant..................159 § 59 Referências a Herbart e a Lotze................................................................................................160 § 60 Referências a Leibniz...............................................................................................................163 §61 Necessidade de investigações particulares para a justificação crítica e gnosiológica da ideia da lógica pura e a sua realização parcial......................................................................166 ANEXO - Referências a F. A. Lange e B. Bolzano........................................................................167 Capítulo XI - A IDEIA DA LÓGICA PURA................................................................................171 § 62 A unidade da ciência. A conexão das coisas e a conexão das verdades...............................171 § 63 Continuação. A unidade da teoria..........................................................................................173 § 64 Os princípios essenciais e não essenciais que conferem unidade à ciência. Ciências abs tratas, concretas e normativas..................................................................................................175 § 65 A questão pelas condições de possibilidade ideais das ciências e das teorias em geral. A. A questão referente ao conhecimento atual........................................................................177 § 66 B. A questão referente ao conteúdo do conhecimento.............................................................179 § 67 As tarefas da lógica pura. Primeira: afixação das categorias puras da significação, das categorias objetivas puras e das suas complicações legais.......................................................181 § 68 Segunda tarefa: as leis e teorias fundadas nestas categorias...................................................183 § 69 Terceira tarefa: a teoria das formas possíveis de teorias ou a doutrina pura das multipli- cidades.......................................................................................................................................184 § 70 Esclarecimentos sobre a ideia da doutrina pura das multiplicidades...................................185 § 71 Divisão do trabalho. As realizações dos matemáticos e as dos filósofos...............................188 § 72 Ampliação da ideia da lógica pura. A teoria pura das probabilidades como teoria pura do conhecimento empírico........................................................................................................190 Anúncio do Autor...........................................................................................................................193 Glossário...........................................................................................................................................195 VII APRESENTAÇÃO DA TRADUÇÃO PORTUGUESA A primeira edição dos Prolegômenos à Lógica Pura de Edmund Husserl data de 1900, e constitui a primeira parte, publicada em volume independente, das Investigações Lógicas, cuja edição ficou concluída no ano seguinte com um segundo volume que incluía as seis ex tensas investigações lógicas propriamente ditas. As Investigações Lógicas são historicamente o texto inaugural da fenomenologia de Husserl que, muito mais tarde, em 1936, continuava a considerá-las como “ainda hoje indispensáveis”.1 Dentro das Investigações, os Prolegômenos ocupam um lugar especial, introdutório mas também largamente independente, como introdução crítica exaustiva e, de modo mais sumário, também introdução programática à fenomenologia. As suas duas grandes áreas temáticas são, por um lado, a apresentação de um programa de fundação e delimitação de uma lógica pura como ciência teorética e, por outro lado, alicerçar este programa num es tudo crítico, largamente autossuficiente, de concepções alternativas sobre os fundamentos e a delimitação da lógica. A crítica ocupa a maior parte da obra e constitui um exemplo clás sico de argumentação filosófica clara, exaustiva e concludente, cujas razões tornam impos sível um retorno simples às concepções anteriores. Duas concepções principais são visadas: aquela que entende a lógica como uma técnica do pensar correto, e a que pretende fundar a lógica na psicologia, denominada por Husserl então como “psicologismo”. Quanto à pri meira, Husserl argumenta que os preceitos normativos para qualquer técnica pressupõem conhecimentos teoréticos que só acidentalmente são normativos. No que respeita à segunda, demonstra, num primeiro passo, que a fundação da lógica sobre qualquer ciência empírica e, nomeadamente, a psicologia, conduz ao relativismo e, em seguida, que todo o relativismo fundacional é autocontraditório ou “contrassenso”.2 A validade teórica da intelecção das ver dades lógicas não é comparável à das leis empíricas ou psicológicas. Sobre esse fundo crítico esboça-se, de maneira breve e ainda tão só programática, a ideia de uma lógica como teoria da ciência, das suas condições de validade, objetividade e di visões naturais. Husserl projeta uma doutrina geral da ciência que apresentará as “condições ideais de possibilidade do conhecimento em geral, ou do conhecimento dedutivo e teorético em geral”,3 nos seus conceitos e leis primitivas que tornam possíveis as significações e enlaces teoréticos, tanto na sua vertente objetiva quanto na subjetiva. Tratar-se-á de “trazer à luz o que é a essência”4 não só das “formas elementares de enlace (...), e.g., o enlace conjuntivo, disjuntivo ou hipotético de proposições em novas proposições” e dos conceitos fundamen tais da “doutrina pura das multiplicidades”, como também, de conceitos correlativos como os de “conceito, proposição, verdade”, “objeto, estado de coisas, unidade, pluralidade, número, relação, enlace etc., (i.e.) as categorias objetivas puras ou formais”,5 ou, noutra formulação, “o 1 Cit. in Husserliana XVIII, XLI. 2 Cf. e.g. ib. 120 (p. <120> infra). 3 Ib. 240 (p. <240> infra). 4 Ib. 255 (p. <255> infra). 5 Ib. 245 (p. <245> infra). Investigações Lógicas - Prolegômenos à Lógica Pura • Edmund Husserl que é a essência da coisa’, ‘processo’, causa, efeito’, ‘espaço’, ‘tempo’ etc.”.6 Assim, "se a ciência constrói teorias para a resolução sistemática dos seus problemas, o filósofo pergunta que é a essência da teoria, o que torna a teoria em geral possível, e outras questões similares”,7 e esta será a tarefa da lógica pura como disciplina filosófica projetada a partir da crítica decisiva ao psicologismo e ao relativismo. As Investigações Lógicas foram reeditadas por Husserl em 1913, tendo os Prolegô menos sofrido algumas alterações, na maior parte dos casos menos importantes. O texto que apresentamos em tradução é o dessa segunda edição, sendo as alterações em relação à primeira colocadas entre r e explicadas em notas de rodapé numeradas, onde A se refere à primeira edição (1900) e B à segunda (1913) e subsequentes. As notas do autor são indicadas por NA, as escassas notas do tradutor estão assinaladas com NT. A tradução ora apresenta da é do texto do volume XVIII da Husserliana, intitulado Logische Untersuchungen: Erster Band: Prolegomena zur Reinen Logik (Text der 1. und der 2. Auflage herausgegeben von Elmar Holenstein, Den Haag, Martinus Nijhoff, 1975), volume a que se refere a paginação indicada no corpo do texto entre < > e a negrito. O volume XVIII da Husserliana poderá ser consultado para o aparato crítico, que renunciamos a incluir nesta tradução. As citações feitas por Husserl em língua alemã surgem traduzidas para o português, as feitas noutras línguas estão apresentadas no original, seguindo-se a tradução portuguesa feita pelo tra dutor, com exceção do excerto de Leibniz reproduzido na p. <223>, cuja tradução muito cordialmente se agradece ao Doutor Adelino Cardoso. A exemplo do volume traduzido da Husserliana, apresentamos, no final do texto, o “Anúncio do Autor” publicado no Viertel- jahrschriftfür Wissenschaftliche Philosophie (24 (1900), p. 511-512), onde Husserl sumaria as suas concepções e intenções para os Prolegômenos. Completa ainda a nossa tradução um Glossário Alemão-Português, onde estão indi cadas as principais opções terminológicas. Quando, por motivos inerentes à tradução, houve lugar a variações, a opção terminologicamente fixa está assinalada em tipo itálico. A termi nologia procura, embora não invariavelmente, tomar em atenção não só esta obra, mas a arti culação possível com o conjunto do projeto de tradução de Husserl em português. Aos Dou tores Pedro Alves e Carlos Morujão agradece-se a discussão, que trouxe indicações impor tantes para a tradução. Colhemos também auxílio, nalguns passos, nas traduções castelhana, E. Husserl, Investigaciones lógicas (tomo I, traducción por M. G. Morente y J. Gaos, segunda edición, Revista de Occidente, Madrid, 1967), e inglesa, Edmund Husserl, Logical Investiga tions (volume I, translated by J. N. Findlay, Routledge, London/New York, 1970, 2001). Diogo Ferrer 6 Ib. 255 (p. <255> infra). 7 Ib. X <xviii, 3> Dedicado a Cari Stumpf Com admiração e amizade <Hua XVIII, 5> PREFÁCIO As Investigações Lógicas, cuja publicação teve início com estes Prolegômenos, nasce ram de problemas incontornáveis que sempre novamente entravavam, até finalmente inter romperem o curso dos meus esforços de muitos anos visando um esclarecimento filosófico da matemática pura. Para além das questões acerca da origem dos conceitos e intelecções fundamentais da matemática, esses esforços diziam também respeito principalmente às di fíceis questões da teoria e do método matemáticos. Aquilo que nas exposições da lógica tradicional, ou de qualquer modo reformada, deveria ter de aparecer como facilmente com preensível e transparente, a saber, a essência racional da ciência dedutiva, com a sua unidade formal e método simbólico, apresentava-se-me, no estudo das ciências formais efetivamente existentes, como obscuro e problemático. Quanto mais fundo penetrava a análise, tanto mais tomava consciência de que a lógica do nosso tempo não está à altura da ciência atual, que ela, no entanto, é chamada a esclarecer. Apresentavam-me especiais dificuldades a investigação lógica da aritmética e da doutrina das multiplicidades, disciplina e método abrangente de todas as particularidades das formas especiais de números e extensões. A investigação forçou-me a considerações de natureza muito geral, que se elevavam acima da esfera estritamente matemática e tendiam para uma teoria universal dos sistemas dedutivos formais. Das séries de problemas que se me impunham, indique-se aqui apenas uma. A manifesta possibilidade de universalizações e modificações da aritmética formal, pelas quais, sem alteração essencial do seu caráter teorético e do seu método de cálculo, ela pode ser conduzida além do domínio quantitativo, <6> não podia deixar de despertar a inte- lecção de que o quantitativo não pertence, de todo, à essência mais universal do matemático, ou “formal”, nem do método calculatório nele fundado. Quando, na “lógica matematizante”, travei conhecimento com uma matemática de fato sem quantidade e, na verdade, como uma disciplina dotada de forma e método matemáticos inatacáveis, que tratava em parte dos anti gos silogismos e, em parte, de formas de inferência que permaneceram estranhas à tradição, ganharam então forma para mim os importantes problemas acerca da essência universal do matemático em geral, acerca das conexões ou, por assim dizer, das fronteiras naturais entre os sistemas da matemática quantitativa e não quantitativa e, em especial, e.g., acerca da rela ção entre o formal da matemática e o formal da lógica. Eu tinha naturalmente de avançar a partir daí para as questões mais fundamentais sobre a essência da forma do conhecimento, na sua diferença em relação à matéria do conhecimento, e sobre o sentido da diferença entre as determinações, verdades ou leis formais (puras), por um lado, e materiais, por outro. Mas vi-me também envolvido em problemas da lógica e da teoria do conhecimento gerais, que apontam numa direção inteiramente diversa. Eu tinha partido da convicção do minante de que é da psicologia que têm de esperar o seu esclarecimento filosófico, tanto a lógica em geral, quanto a lógica das ciências dedutivas. E, em consequência, as investigações psicológicas ocuparam um lugar muito vasto no primeiro volume (o único publicado) da minha Filosofia da Aritmética. Em certos aspectos, esta fundação psicológica nunca me sa tisfez inteiramente. No que concerne à questão pela origem das representações matemáticas, Investigações Lógicas - Prolegômenos à Lógica Pura • Edmund Husserl ou acerca da formação dos métodos práticos, que é, de fato, psicologicamente determinada, o resultado da análise psicológica parecia-me claro e instrutivo. Mas assim que passava das conexões psicológicas do pensar para a unidade lógica do seu conteúdo (a unidade da teo ria), não se deixava evidenciar verdadeira clareza ou continuidade. E tanto mais por isso me inquietava também a dúvida principiai sobre a compatibilidade da objetividade da matemá tica, e de toda a ciência em geral, com uma fundamentação psicológica <7> do [domínio] lógico. Porque deste modo o meu método inteiro, suportado nas convicções da lógica do minante - ou seja, esclarecer logicamente a ciência dada por meio da análise psicológica -, ficou abalado, vi-me cada vez mais empurrado para reflexões críticas gerais sobre a essência da lógica e, igualmente, sobre a relação entre a subjetividade do conhecer e a objetividade do conteúdo do conhecimento. Totalmente abandonado pela lógica, lá onde dela esperava respostas para as perguntas específicas que lhe tinha para fazer, vi-me por fim obrigado a adiar inteiramente as minhas investigações filosófico-matemáticas, até que conseguisse al cançar uma clareza segura acerca das questões fundamentais da teoria do conhecimento e na compreensão crítica da lógica como ciência. Se publico agora estes ensaios, nascidos de um trabalho de muitos anos, visando uma nova fundamentação da lógica pura e da teoria do conhecimento, faço-o na convicção de que a suficiência com que afasto o meu caminho do da corrente lógica dominante não será mal interpretada, dados os sérios motivos objetivos que me conduziram. O curso do meu desenvolvimento levou-me, nas minhas convicções lógicas fundamentais, a afastar-me muito dos homens e das obras a que a minha cultura científica mais deve e, por outro lado, a aproximar-me assinalavelmente de uma série de investigadores cujos escritos não soube anteriormente apreciar no seu justo valor, e que, por isso, muito pouco consultei ao longo do meu trabalho. Tive, infelizmente, de desistir de um acrescento posterior de referências literá rias e críticas extensivas sobre investigações aparentadas. No que concerne à crítica leal que dirigi à lógica e à teoria do conhecimento psicológicas, gostaria de fazer lembrar as palavras de Goethe: “com coisa nenhuma se é mais rigoroso do que com os erros já emendados.” Halle, 21 de maio de 1900 XIV