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INTRODUÇÃO Para que o estudante de música alcance o nível profissional esperado, é ... PDF

370 Pages·2013·2.32 MB·Portuguese
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1 INTRODUÇÃO Para que o estudante de música alcance o nível profissional esperado, é necessário que passe por um longo período de preparação, normalmente iniciado ainda na infância. São processos difusos e experiências pessoais com a música que conduzem este aprendizado, manifestando-se na diversidade de relações entre os sujeitos e o objeto. Os processos de aprendizagem em música acontecem por diversos caminhos: de acordo com as circunstâncias, características pessoais dos indivíduos, estilos e dificuldades de aprendizagem, desenrolando-se de forma distinta para os sujeitos. Esses processos são construídos dentro de dois tipos de vivência: a educação musical não-formal e a formal, podendo haver simbiose entre ambas. Pode-se afirmar que, de uma forma geral, o indivíduo que alcança o nível profissional esperado em música foi iniciado muito cedo em processos de aprendizagem musical, inclusive aqueles que ocorrem através de instrução não-formal. Tratando-se especificamente da educação formal em música: esta ocorre por intermédio de programas de ensino, seja em instituições ou mesmo através de orientação obtida junto a um professor particular. Estudos descrevem que esta modalidade de educação em música exige um longo período de intensa dedicação: Estudos sobre a quantidade de tempo necessária para atingir níveis profissionais em música apontaram que ‘tipicamente, dezesseis anos de prática são necessários para atingir a excelência no tocar um instrumento, com o indivíduo começando normalmente a tocar muito cedo, mantendo vinte e cinco horas de prática semanais na adolescência, subseqüentemente aumentando para cinqüenta horas’ (Hallam, 1997: 195). (...) ‘evidência de vários domínios demonstra que uma performance de elite é alcançada gradualmente, e cerca de dez anos de intensa preparação são necessários para se atingir um nível internacional de performance em domínios tradicionais’ (Ericsson, 1997: 25). Apesar de existir uma considerável variação individual, é consenso que muitos anos de intensa prática são necessários antes que um nível profissional de atuação seja alcançado. (SANTIAGO, 2001, p. 164) Pode-se afirmar que os processos de aprendizagem musical, formal ou não- formal, visando à atuação profissional ou amadorística, são todos permeados por um elemento essencialmente envolvido no desempenho das atividades musicais: a percepção musical. 2 Poderia mesmo se dizer que a percepção musical está presente em todo processo de aprendizagem em música, formal ou não-formal, não enquanto disciplina, mas enquanto faculdade que permite a interação com os estímulos sonoros presentes no meio. Antes de ser disciplina, dentro da educação formal em música, a percepção musical é parte de um conjunto de processos perceptivos que tem como característica intermediar as relações entre sujeito e ambiente. Dentro desse conjunto, a percepção musical consistiria numa especificidade, isto é, decorrente de uma necessidade particular e desenvolvida a partir das interações entre um determinado sujeito e um determinado contexto, resultando a percepção musical das relações do sujeito com o seu mundo sonoro. A música tem como matéria-prima o som, de modo que a percepção musical está presente em toda relação do sujeito com a música. Independente de ser através de educação musical formal ou não-formal, a percepção musical é a interface necessária à relação do sujeito com o mundo sonoro, constituindo-se enquanto ferramenta essencial à práxis musical. Assim, as relações entre sujeito e mundo são intermediadas pela percepção que, ao reunir os saberes existentes no indivíduo por meio de inferências, impulsiona a construção de conhecimento em diversas áreas, assim como na música. A concepção advinda com a Ciência Moderna, que secciona em partes para melhor conhecer, partiu as relações entre sujeito e mundo em muitas perspectivas, desdobrando-se em estudos e abordagens diversas, que se dedicam ora sobre o sujeito, ora sobre o mundo. Na teia da cientificidade, que disciplinariza até o indisciplinarizável, eis que a percepção, que permeia todas as relações e lhes dá o sentido conforme a experiência de cada um, é colocada um pouco a margem das preocupações sobre os processos educativos, mesmo na educação musical formal, onde a percepção encontra um lugarzinho qualquer para ser lembrada sob o nome de percepção musical. Transformada em disciplina, a percepção musical acompanha o processo de educação formal em música, mas viu-se apartada da sua natureza elementar: a de ser um fio que conecta as tramas das experiências, imprimindo-lhes o sentido e conduzindo o processo de aprendizagem. Distante da própria música, a disciplina percepção musical não apresenta conexão com a prática do instrumentista (BORTZ, 2007; NETO, 2010), uma postura 3 incoerente e injustificável, uma vez que ao seccionar o objeto do seu contexto, priva-lhe de construção de sentido pelos indivíduos, fugindo à própria natureza dos processos perceptivos. O ensino da percepção musical no Brasil tem sido alvo de críticas que reprovam o caráter fragmentado e atomizado com o qual são conduzidas as práticas pedagógicas utilizadas tradicionalmente pelos professores: calcadas em número restrito de atividades, demasiadamente focadas na repetição, promovendo sempre e cada vez mais a desconexão entre os saberes construídos em sala de aula e aqueles necessários à prática musical. Tal concepção de ensino verificada na disciplina tem sido questão recorrente em discussões acadêmicas: artigos, capítulos de livros (GROSSI, 2003; GRANJA, 2006), dissertações e teses publicadas sobre a disciplina percepção musical têm revelado a preocupação com os moldes pelos quais a disciplina é conduzida. O resultado das pesquisas no meio acadêmico brasileiro se traduz num interesse por gerar abordagens que sejam alternativas ao modelo vigente. No entanto, apesar dos esforços empreendidos, os problemas da disciplina percepção musical persistem, uma vez que muitas propostas permanecem no papel e não têm repercussão no cotidiano das instituições que promovem o ensino musical no país. Permeando o sistema de educação musical, pode-se admitir que o ensino de percepção musical vive um paradoxo que tem comprometido a qualidade do ensino formal de música, da base ao superior. A proposição de novas abordagens para o ensino de percepção musical é um dado revelador, uma vez que mostra a necessidade de buscar alternativas a um modelo vigente que parece fracassado, apontando a urgência de assumir um novo direcionamento para o ensino da percepção musical. Entretanto, a elaboração de abordagens alternativas é a ponta do iceberg: é preciso considerar a questão em uma dimensão mais ampla e mais complexa, questionando mesmo os seus fundamentos, para que, a partir daí, sejam lançadas as bases para abordagens que possam efetivamente contribuir para a educação musical brasileira como um todo. A disciplina percepção musical necessita de uma mudança de perspectiva sobre si mesma, passando a não mais comportar abordagens restritas apenas ao domínio dos aspectos técnicos da música, mas sim, que empreenda esforços para alcançar resultados musicais satisfatórios, em todos os níveis e estágios da educação musical. 4 A disciplina percepção musical, obrigatória na maior parte dos programas de música, tem carga horária variável de acordo com a instituição e, embora possa ser encontrada sob denominações diferentes, é consensualmente distribuída no eixo teórico da grade curricular dos cursos superiores de música, ao lado de disciplinas como harmonia, análise, contraponto e estruturação musical, entre outras. Muitas vezes considerada ‘ponto intermediário entre teoria e prática’, uma vez que ‘reforça’ os conteúdos teóricos através de exercícios práticos.1 Este entendimento aponta ausência de fundamentação e objetivos próprios à disciplina percepção musical e a caracteriza como uma espécie de ‘apêndice’ no currículo em música, pois além de declarar abertamente a duplicação de conteúdos, reforça a dicotomia existente entre teoria e prática nesta formação, a tal ponto de ser necessária uma disciplina especial para que se dê certa conexão... Diante desse quadro, surgem questões sobre: como construir abordagens para a percepção musical sem antes uma discussão sobre fundamentos e objetivos desta disciplina? Como sustentar uma crítica ao modelo vigente, considerado reducionista tecnicista, e partir de um pressuposto que reforça a dicotomia entre teoria e prática? Como analisar as práticas pedagógicas sem inserí-las num contexto? E finalmente, como vislumbrar novas perspectivas sem propor transformações desde os fundamentos? É preciso estar atento às incoerências e contradições internas que na prática parecem se acomodar muito bem 2 e que, silenciosamente, continuam a assombrar a formação musical. Tais incoerências devem ser corrigidas ao instalar-se um questionamento sobre a percepção musical para aquém e para além de sua situação enquanto disciplina, afinal, o que é percepção musical? Para quê serve? Qual a sua importância para a educação musical? É disciplina teórica ou prática nos programas de música? Sendo prática, o que faz no corpo teórico? Sendo teórico-prática, por que não se conecta à prática do instrumentista, contribuindo efetivamente para o seu fazer musical? 1 OTUTUMI, 2008. Reúne nomenclaturas para a disciplina percepção musical, tais como “Treinamento Auditivo”, “Teoria e Percepção Musical”, “Leitura e Escrita Musical – LEM”, “Teoria Musical e Solfejo”, entre outros dados. 2 VEYNE, 1998, p. 262: “Ficaremos reduzidos a constatar, lamentavelmente, que, por vezes, as pessoas crêem e, por vezes, não crêem, que não as fazemos acreditar em qualquer ideologia simplesmente pedindo-lhes isso e que, por outro lado, são bem capazes de acreditar em coisas que, no plano da crença, são contraditórias entre elas, ainda que na prática se acomodem muito bem.” 5 São perguntas simples, mas sem perguntá-las toda e qualquer abordagem estará partindo de uma realidade presumida, um senso comum a respeito do que seja a percepção musical. Importante considerar que uma abordagem que se ergue no vazio não se sustenta, caracterizando-se mais por ser um empreendimento pessoal, sem validade científica e sem muito alcance; um esforço isolado que pouco poderá contribuir para uma mudança de paradigma no ensino de percepção musical. Sem uma discussão que considere as bases para o ensino de percepção musical, não haverá mudança no status quo. Se não há mudança, não se tem processo e se não há processo, significa dizer que sub-existe apenas a manutenção da situação atual. É necessário, portanto, promover um corte com uma suposta relação determinista com o objeto ‘disciplina percepção musical’, afastando-se da ‘tese natural’, aquela segundo a qual o mundo é o que é, um dado já concluído, acabado; entendimento que tende a considerar o presumido como ponto de partida para as nossas ações. Para afastar-se dessa ótica, recorremos ao diálogo etimológico aninhado no seio filosófico, instigado principalmente pela crítica foucaultiana, que consiste em: (...) uma crítica da crítica, que está sempre pronta a se voltar sobre si mesma para perguntar sobre as condições de possibilidades de sua existência, sobre as condições de sua própria racionalidade. Neste sentido, é uma crítica cética e incômoda: ela mais pergunta – até mesmo sobre si mesma – do que explica. Ela torce e se retorce sobre ela mesma, revisando-se e desconstruindo-se permanentemente. (VEIGA-NETO, 2011, p. 24) Nesta abordagem a presença de Paul Veyne (1998) é muito bem-vinda através das provocações do seu livro Como se escreve a história, publicado em 1971, que se coloca com um modelo narrativista de reflexão. Republicado em 1978 conjuntamente com o ensaio Foucault revoluciona a história, onde Veyne interpreta a obra de Michel Foucault, considerada um marco na transformação fundamental do pensamento histórico, por trazer uma mudança de perspectiva: da análise focada em ‘objetos’ para a análise focada nas ‘práticas’. Busca-se trazer esta perspectiva à presente abordagem, angariando subsídios para o abandono da ‘tese natural’ em educação musical, isto é, substituindo a noção de ‘objeto natural’ pela investigação sobre a ‘natureza do objeto’ a partir de suas práticas, provendo elementos para uma transformação fundamental no pensamento pedagógico em percepção musical. 6 Assim, o que ocuparia uma simples e direta descrição de contexto dá lugar a uma abordagem histórica que se propõe à dispersão das evidências segundo a perspectiva foucaultiana, alçando elementos emergentes da institucionalização do ensino de música, da constituição da disciplina percepção musical e, ainda, a definição das concepções de formação profissional em música no Brasil, desvelando-se as práticas pedagógicas dentro de uma visão reducionista tecnicista. Diante disso, buscou-se formular bases para uma nova concepção de educação, que permita considerar os aspectos constituintes da natureza dos processos educativos. Assim, o presente estudo desdobra-se sobre um conjunto de questões essenciais para o alcance de uma compreensão integrada sobre o ensino de percepção musical no Brasil, examinando diversos aspectos imbricados na constituição deste tema, de tal forma que a abordagem é articulada em dimensões que apresentam a seguinte estrutura: Fundamentação Teórica Natureza do objeto Abordagem histórica Fig. 1. Estrutura do estudo desenvolvido. Na base, o estudo das condições históricas (contexto); seguida pelo estudo da natureza do objeto (práticas pedagógicas no ensino de percepção musical; natureza dos processos perceptivos e natureza dos processos educativos); e finalmente, uma fundamentação teórica para abordagens em percepção musical, considerada a partir do estudo sobre a percepção, sobre a natureza dos processos educativos e das questões que envolvem o fazer musical. As questões adjacentes abordadas nessas seções contemplam aspectos como: (I) Abordagem histórica – questões referentes à Educação, Docência, Educação Musical, Ensino Superior de Música; (II) Natureza do objeto – Solfejo de Paris, Percepção musical no Brasil, Processos perceptivos, Percepção para a Educação Musical, Percepção Musical; (III) Fundamentação teórica para abordagens em percepção musical – a natureza da educação, da verdade e da música. 7 A apreciação dessas grandes seções temáticas (I, II, III) e suas questões adjacentes resultam numa seqüência de capítulos conexos, que contribuem para a construção da perspectiva sobre o tema, onde temos: Capítulo 1. Reflexões sobre prática docente a partir de um diálogo etimológico. Corresponde a um ensaio, uma abertura à discussão, trazendo subsídios para a elaboração das questões essenciais que conduzem a investigação a partir da etimologia de alguns termos. Capítulo 2. Da historicidade do objeto e Pressupostos Filosóficos. Define os princípios filosóficos que orientam o estudo e que refutam, a todo custo, o presumido e a noção de objeto natural, considerados prejudiciais a qualquer investigação e abordagens educativas. Capítulo 3. Des-contextualização: um breve estudo sobre Educação. Reforça a noção de rompimento com o presumido, buscando uma apreciação do sistema educacional a partir de aspectos de sua historicidade. Capítulo 4. In-contextualização: dirigindo o olhar para a docência. Consiste numa inflexão do tema em direção à atividade docente, buscando destacar a concepção tradicional para formação de educadores e alguns de seus desdobramentos, questionando a utilização da técnica pela técnica, do modelo pelo modelo, trazendo elementos emergentes de um contexto de massificação e mecanização do ensino. Capítulo 5. Contextualização: constituição do tecido da educação musical no Brasil. Propõe um corte transversal no tecido histórico a fim de acompanhar o processo de institucionalização do ensino de música no Brasil através da oferta de instrução musical especializada (Conservatórios) e a integrada (nas escolas regulares), verificando suas implicações para a formação docente em música. Capítulo 6. Regulamentação do ensino superior de música no Brasil. Apresenta as exigências legais que levaram o ensino de música para as universidades, concepções curriculares e desafios a serem superados. Capítulo 7. O ensino de percepção musical e suas práticas pedagógicas. Com base na abordagem histórica realizada, são apontados os elementos emergentes para a sua constituição, formulando a hipótese de existência de problemas metodológicos a partir da literatura específica produzida na área, verificando a necessidade de novas bases para o ensino de percepção musical no Brasil. 8 Capítulo 8. Por uma genealogia da percepção. Busca investigar a natureza da percepção, projetando a investigação para além da disciplina percepção musical como forma de obter uma de-composição do entendimento comum sobre a mesma. Capítulo 9. Pesquisa em percepção no Brasil. Consiste num levantamento bibliográfico de Teses e Dissertações defendidas no período de 2009-2011 que afirma o aspecto transdisciplinar da percepção, que se oferece tanto como questão central de pesquisa quanto ao modo de uma ferramenta suporte para investigações em diversos campos. Capítulo 10. A percepção na perspectiva da Educação Musical. Dedica atenção a observar o lugar destinado à percepção musical em destacadas abordagens em educação musical no decorrer do século XX, constatando as preocupações dos referidos autores sobre a importância do desenvolvimento e refinamento da escuta musical. Capítulo 11. O que é isto – a percepção musical? Aborda questões inerentes à percepção musical como: atributos da música, a complexidade da escuta e a aquisição de padrões sonoros, investigando o papel da percepção musical na aprendizagem, na performance e na construção de sentido em música. Capítulo 12. Em busca de um modelo para abordagens em Educação Musical. Parte dos paradigmas que conduzem o pensamento reducionista tecnicista que gerencia a vida moderna e segue em direção ao questionamento sobre verdade, chegando a uma argumentação que desvencilhe as abordagens educativas da visão de mundo pautada na ‘tese natural’ para abraçar o ‘mundo sublunar em educação’ em suas quatro dimensões. Capítulo 13. Discutindo a noção de objeto natural em música. Infiltrando-se no denso campo que relaciona percepção e musicalidade, questiona a natureza do fazer musical e artístico, discutindo sobre concepções de verdade e de estética e como têm influenciado a educação musical. Reivindica o abandono da noção de objeto natural em música, propondo a reintegração à práxis musical como alternativa para superação da dicotomia teoria-prática verificada nas abordagens pedagógicas em percepção musical. Capítulo 14. Fundamentação teórica para abordagens em percepção musical. Afirma o fazer musical enquanto conhecimento subjacente (Subjectum) que orienta as ações, abordagens, técnicas de ensino, a didática, enfim, as práticas pedagógicas em educação musical (Objectum) que, enquanto ferramentas, constituem meios para a inserção na práxis musical, através da construção de Modelos Interprativos em Música (MIM). Capítulo 15. Considerações finais. Aponta que uma abordagem educacional para ser considerada atual precisa estar em sintonia às demandas sociais emergentes. O capítulo traz conceitos que descrevem aspectos da sociedade contemporânea globalizada. Diante 9 do exposto, conclui que o ensino de percepção musical deve assumir seu caráter transdiciplinar e oferecer-se enquanto opção metodológica para a construção da autonomia e inserção do pensamento complexo em educação musical. Uma investigação desse porte não ambiciona apresentar as respostas, mas antes buscar as perguntas, colocando-se na própria dinâmica da percepção ao abraçar as questões que ela oferece como caminho para desvelar-se. Afastando-se do presumido, o estudo caminhou ao encontro da perspectiva fenomenológica para compreensão da percepção em sua intencionalidade. A percepção mostra-se como uma força magnetizadora, um ímã a atrair para si aquilo que se faz possibilidade de engendrar, na experiência, conhecimento. Sendo ela mesma, a percepção, fonte de conhecimento. Diante dessa característica da percepção decorreu a necessidade do presente estudo tentar abarcar, apreender tudo que se oferecia como possibilidade de interagir com esse objeto multifacetado e caleidoscópico que é a percepção humana, refletindo a natureza e dinâmica própria da percepção, em contínuo movimento de busca das informações disponíveis no meio e sua integração através da experiência. Tal como é possível observar nas crianças, a percepção é um incansável e inigualável deslumbramento diante do mundo, estimulando e construindo um stock de conhecimentos a partir das experiências. Experiências e descobertas que nunca a saciam, ao contrário, impelem-na a desbravar cada vez mais, a movimentar-se nesse mundo para que esse mundo se movimente por ela. E que fascinante feito esse, o da criança! Aprendamos com ela e deixemos que ela nos ensine a dinâmica da percepção. Desta maneira, o presente estudo pretende ser inclusivo na medida em que se permite considerar diversas questões correlatas ao ensino de percepção musical, a fim de construir uma apreciação mais completa sobre ele. Apreender de modo integrado a questão ensino de percepção musical significa compreendê-la em seus elementos constituintes, a saber: ensino, percepção e música. A partir disso, torna-se viável buscar perspectivas filosóficas e metodológicas, que proporcionem à disciplina realizar-se de modo mais pleno e harmonizado à sua natureza. Considerando a questão nos seus aspectos constituintes poderá ser possível a concreta superação dos problemas que envolvem a disciplina. Importante destacar que a tarefa não pretendeu esgotar o tema, o que seria impossível, exatamente por não ser a percepção um dado concluído, pois como nos diria Merleau-Ponty (1999), a percepção não é sequer uma ciência do mundo, ela é 10 simplesmente o pano de fundo sobre o qual se desenrola a nossa experiência, o meio pelo qual somos e estamos no mundo. Diante da natureza da percepção, já podemos inferir que uma investigação sobre a percepção musical não pode ter pretensões de ser definitiva. Seria como negar a própria natureza do objeto. Assim, não intencionamos alcançar a Verdade para a disciplina percepção musical oferecendo, de forma conclusiva, uma abordagem metodológica a ser seguida, o que não corresponderia aos objetivos da presente investigação. Nosso maior interesse é investigar a importância da percepção para o fazer musical, sublinhando a necessidade de ampliação da perspectiva sobre o tema. Embora não se trate de uma tarefa fácil, discutir a importância da percepção musical para o fazer musical pode esclarecer o papel que a disciplina tem para a educação musical em sentido amplo. Esta reflexão expressa uma necessidade de reformulação ampla da concepção de ensino, dos conteúdos e das práticas pedagógicas em percepção musical, propondo uma fundamentação que oriente as abordagens sobre finalidades e objetivos da disciplina. Sobre fundamentos mais definidos, as abordagens para o ensino de percepção musical deverão ser verdadeiramente múltiplas, tanto quanto forem os professores e os contextos, provendo os processos de ensino-aprendizagem do sentido necessário que deve conectar fundamentos e finalidades por meio de estratégias mais adequadas às especificidades existentes, permitindo aos estudantes orientar-se e conduzir-se por meio da experiência única que é a sua construção de conhecimento. Acreditamos que para isso tornar-se possível é preciso que a fundamentação proposta seja articulada a uma nova concepção para a formação e que, por sua vez, esteja inserida no paradigma contemporâneo do Desenvolvimento Humano Sustentável. As demandas sociais contemporâneas requerem a emergência de um novo perfil profissional para a sociedade e quanto a isso o professor tem papel fundamental, devendo ponderar cuidadosamente sua prática. O presente estudo pretende, sobretudo, oferecer contribuição para a área de educação musical, admitindo a necessidade de abandonar o presumido e a noção de objeto natural para abraçar a diversidade, a complexidade, a transdiciplinaridade e tudo o mais que possa ser assunto de nossas práticas, afinal “nós assistimos, a cada instante, a este prodígio da conexão das experiências, e ninguém sabe melhor do que nós como ela se dá, já que nós somos esse laço de relações.” (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 19)

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Para 'educar', a etimologia nos oferece duas vertentes para sua instruir na Arte de Música as pessoas de ambos os sexos, que a ella percepção musical, sob o nome Solfejo (Solfège), “que vem de sol-fa, em outras palavras
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