BALDUINIA. n.lO, p. 11-20, 25-11-2007 IDENTIFICAÇÃO BOTÂNICA E ANATOMIA DA MADEIRA DE 1 DISCARIA AMERICANA GILLIES ET HOOKER SIDINEIRODRIGUES DOSSANTOS2 JOSÉNEWTON CARDOSO MARCHIORI3 TRAIS SCOTTI DOCANTO-DOROw4 RESUMO O presente trabalho trata da descrição botânica e anatomia da madeira de Discaria americana Gillies et Hooker, combase emmaterial coletado noEstado doRio Grande doSul.Aestrutura microscópica damadeira reúne: elementos vasculares muito curtos a curtos, com placas de perfuração simples e espessamentos espiralados na parede; traqueídeos vasculares abundantes junto a vasos com espessamentos espiralados; parênquima paratraqueal pouco abundante; raios heterogêneos com 1-4células de largura, compostos prin- cipalmente de células quadradas mas com células eretas namargem; efibras libriformes não septadas, extre- mamente curtas amuito curtas. SUMMARY [Botanical identification and wood anatomy ofDiscaria americana Gillies etHooker]. This paper deaIswith the botanical description and wood anatomy ofDiscaria americana Gillies etHooker, based onmateriaIs from the State ofRio Grande doSul,Brazil. The wood microscopic structure showed: very short to short vessel elements, with simple perforation plates, helical thickenings and altemate intervessel pits; abundant vascular tracheids around vessels, also with helical thichenings on the walls; paratracheal axial parenchyma; heterocellular rays, with 1-4cells wide, composed mostly bysquare ceJls,butwithupright cells inthe margins; and very short to short non-septate libriform fibers. INTRODUÇÃO O gênero Discaria Hook. compreende 8 A família Rhamnaceae compreende cerca espécies, distribuídas pela América do Sul, de 58gêneros e900 espécies, distribuídas pelas Oceania eNova Zelândia (Tortosa, 1995). Tra- regiões temperadas, subtropicais etropicais do tam-se de arbustos espinhosos subáfilos ou de mundo (Barroso, 1984); pobremente represen- folhas perenes, com frutos do tipo cápsula tada na flora brasileira, ela resume-se a8gêne- tricoca; as flores, de cálice tubuloso (4-5-den- rose9espécies noRio Grande do Sul, incluindo tado) e corola nula ou com 4-5 pétalas, apre- subarbustos, arbustos, árvores e lianas, que ha- sentam 4-5 estames insertos no tubo calicinal, bitam áreas campestres, aorla ou estratos infe- ovário trilocular, estilete glabro, estigma trífido riores de florestas. edisco aderido aotálamo, de margem livre, não Geralmente espinescentes e de ambientes enrolada (Bustamante, 1976). Afim a Disca- secos, as Ramnáceas brasileiras apresentam ria, o gênero Colletia diferencia-se por suas folhas simples trinervadas, pétalas côncavas, floresapétalas, pelodiscofloraldebordoinvoluto estames opostos às pétalas, ovário nitidamente e pelos ramos com nós não demarcados, sem médio eóvulos basais (Schultz, 1984). linha transversal (Hurrell &Bazzano, 2003). Artigo recebido em 15/01/2007 eaceito para publicação em30/0112007. I 2 Biólogo, mestrando doPrograma dePós-Graduação emEngenharia Florestal, Centro deCiências Rurais, Universidade Federal de Santa Maria, CEP 97105-900, Santa Maria (RS). [email protected] 3 Engenheiro Florestal, Dr., bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq, Professor Titular do Departamento de Ciências Florestais, Universidade Federal deSanta Maria, CEP 97105-900, Santa Maria (RS). [email protected] 4 Bióloga, Dra, Professora do Departamento de Biologia, Universidade Federal de Santa Maria, CEP 97105-900. [email protected] 11 Nativa em Santa Catarina e Rio Grande do tando num padrão ulmiforme; raios de 1-6célu- Sul, Discaria americana Gill. etHook. éoúni- llisde largura eaté mais de 50células de altura, co representante do gênero no país, até o mo- heterogêneos em parte; pontoações raio- mento. Espécie heliófila eseletiva higrófila, ha- vasculares pequenas amédias, por vezes unila- bita preferencialmente ambientes úmidos e teralmente compostas; parênquima escassamen- ensolarados, em margens rochosas de arroios e te paratraqueal; e fibras de paredes espessas, na orla de matas ciliares (Johnston & Soares, com pontoações diminutas. Sobre os aspectos 1972). gerais e macroscópicos da madeira, o mesmo Com relação à anatomia da madeira, Met- autor cita para Discaria: cerne castanho e calfe & Chalk (1972) relacionam para a maio- alburno amarelado, não nitidamente demarca- ria da família: vasos tipicamente pequenos, do; brilho médio; odor egosto não característi- comumente emmúltiplos ecom arranjo tenden- cos; madeira dura, pesada, resistente, de textu- te aradial; porosidade em anel; vasos de lenho ra média, com grã reta a irregular, fácil de tra- tardio com espessamentos espiralados; placas balhar, embora muito fibrosa, de durabilidade de perfuração simples; pontoações intervas- presumivelmente baixa, e carente de interesse culares alternas; elementos vasculares de com- comercial. primento médio a moderadamente curtos; Primeira de uma série de publicações alian- parênquima predominantemente paratraqueal; do descrição botânica eanatomia das madeiras fibras curtas ou de comprimento médio; raios deRhamnaceae, opresente trabalho visa acon- marcadamente heterogêneos até homogêneos, tribuir para omelhor conhecimento desta famí- por vezes compostos inteiramente de células liano sul doBrasil. quadradas aeretas; fibras com pontoações sim- ples, de comprimento médio amoderadamente MATERIAL E MÉTODOS curtas; e presença de traqueídeos vasculares O material estudado compreende duas amos- em espécies com vasos em arranjo diagonal ou tras de madeira e exsicatas botânicas proceden- dendrítico. tesdedistintos herbários doRio Grande doSul. Para o gênero Discaria, Record & Hess Sobre as amostras de madeira, obtidas na (1949) relacionam: porosidade em anel mais ou xiloteca do Herbário do Departamento de Ci- menos distinta; poros em arranjo ulmiforme ou ências Florestais (HDCF) da Universidade Fe- zig-zag diagonal; e raios com até 6 células de deral de Santa Maria, constam os seguintes re- largura. Para as madeiras do gênero, Metcalfe gistros: & Chalk (1972) agregam: porosidade em anel - HDCF 1779. Pedras Altas, Potreiro da Capororoca; ousemi-difusa; vasos dediâmetro inferior a 100 Marchiori s.n., 20.VILI985. - HDCF 2197. Caçapava do Sul, Pedra do Segredo; 11m,emarranjo semelhante ouquase ulmiforme; Marchiori n.245; 14.1.1986. parênquima paratraqueal aliforme, por vezes As exsicatas examinadas para a descrição localmente confluente; e fibras de paredes es- botânica integram os acervos do HDCF pessas a muito espessas. (Herbário do Departamento de Ciências Flo- Em sua diagnose do gênero, Record (1939) restais, Universidade Federal de Santa Maria, inclui, entre outras características anatômicas: RS), PEL (Herbário do Departamento de Botâ- anéis de crescimento distintos; porosidade em nica, Universidade Federal de Pelotas, RS), anel; poros de paredes finas, muito pequenos a PACA (Herbarium Anchieta, Unisinos, São diminutos, não individualmente visíveis aolho Leopoldo, RS) e SMDB (Herbário do Departa- nú; vasos muito numerosos e com espessa- mento de Biologia, Universidade Federal de mentos espiralados, agrupados em arranjo Santa Maria, RS), constando os seguintes re- diagonal, zig-zag ou faixas concêntricas, resul- gistros: 12 BRASIL: RIO GRANDE DO SUL: Alegrete, estân- Rincão dos Cardoso, campo desolo rochoso, divide espa- cia do major Augusto Ferreira da Costa, arbusto ço com mio-mio, caraguatá ealgumas espécies de capim, paucifoliado, espinhoso, com flores, 1.N. C. Marchiori flores brancas, imaturas, cheiro adocicado, Ionara F.C.& s.n., I.xII. 1983(HDCF 1406); ibidem, Ibirocai, material Sandro G, s.n., 5.VIII.1999 (SMDB 9513). Uruguaiana, com flores, J. N. C. Marchiori s.n., 9.IX.1984 (HDCF Imbaá, material estéril, S. J. Longhi 761, 29.XII.1986 1567). Bagé, BR-153, ca. de lO km da ponte do rio (HDCF 2582); Touro Passo, material com flores rosadas, Camaquã, embeira deestrada, frutos imaturos, com cálice S.J.Longhi 871, 30.VIII.1987 (HDCF 2699). persistente, verde, 1.A.Jarenkow 3264, 09.x1.1996 (PEL Adescrição botânica foi realizada mediante 16.842). Caaró, p. São Luiz, in rupestribus dumetosis, análise do material acima relacionado e da ob- com frutos, 1.Arnetzen s.n., 10.X.1933 (PACA 1233). servação de indivíduos acampo. No exame das Caçapava do Sul, Pedra do Segredo, com flores, madeira estruturas, usou-se lupa, régua de precisão (0,5 coletada, 1.N. C.Marchiori 245,14.1.1986 (HDCF 2197); mm)epapel milimetrado; aterminologia baseou- Passo do Camaquã, CBC, A.A. Filho &R.Cauduro s.n., 9.XII, 1989 (SMDB 2929). Dom Pedrito, Faz. da Toca, se em Radford et aUi (1974). As informações junto ao rio Tacuarembó-Chico, em borda de mata ciliar, relativas ao porte, fenologia, consistência eco- com frutos, J. Mauhs & M. S. Marchioretto s.n., loração de peças morfológicas valeram-se de 18.x1.2003 (PACA 87633). Encruzilhada do Sul, Faz. informações constantes nas etiquetas de prox. aoPasso do Marinheiro, arbusto emcampo, estéril, exsicatas eemobservações feitas acampo; para N. R. Bastos 141 & S. Diesel s.n., 18.IY.1991 (PACA os demais aspectos, buscou-se referências da 70743); Espumoso, Vila São Jorge, material com flores, D. Vogel s.n., 29.VII1.1993 (SMDB 4802). Jari, p. literatura. Tupanciretã, incampestribus dumetosis, estéril, B.Rambo Para a descrição anatômica da madeira, fo- s.n., 26.1.1942 (PACA 9379). Lavras do Sul, Faz. dos ram preparadas lâminas de cortes anatômicos Ferreira, emcampo com afloramento rochoso, muito fre- e de macerado. qüente, com flores efrutos, N. R.Bastos 405, 7.xI1.1993 De cada uma das amostras de madeira fo- (pACA 86872). Pedras Altas, Potreiro da Capororoca, com flores, madeira coletada, 1. N. C. Marchiori s.n., ram preparados três corpos-de-prova, orienta- 20.VII.1985 (HDCF 1779).Porto Alegre, incampestribus dos para a obtenção de cortes anatômicos nos dumetosis, fr.novos, B.Rambo s.n., 1943(PACA 11117). planos transversal, longitudinal radial elongitu- Pelotas, Instituto Agronômico do Sul, recém frutificado, dinal tangencial. Os corpos-de-prova foram Irmão A.Egydio 27,28.1.1950 (PEL s.n.); ibidem, materi- amolecidos por fervura em água etrabalhados alvegetativo, A.Bertels 48, 17.V1.1950 (PEL s.n.); ibidem, em micrótomo de deslize, regulado para a ob- borda demato, material florido, C.Oliveira 43,23 .IX.1958 (PEL s.n.). Piratini, ca. de 2 km em direção à BR-293, tenção de cortes anatômicos com espessura subarbusto ca. 0,6 m, em campo alto, frutos imaturos, nominal de 20 11m. Os cortes foram coloridos verdes, 1.A. Jarenkow 3594, 22.X.1997 (PEL 18.354). comacridina-vermelha, crisoidina eazul-de-astra Quaraí, Faz. do Jarau, inrupestribus dumetosis, estéril, (Dujardin, 1964), desidratados emsérie alcoóli- B. Rambo s.n., 1.1945 (PACA 26307). Santana da Boa ca ascendente (30%, 50%, 75%, 90%, 95%, Vista, Cerro doDiogo, arbusto ca. 1,3m,borda demata à beira daBR-392, flores brancas, aromáticas, M. Sobral & duas vezes álcool absoluto) e montados em lâ- J.A. Jarenkow 7990, X.1995 (PEL 14.853). Santana do minas permanentes, com Entellan. Livramento, estrada p. Quarai, perto do arroio Caty, na Das amostras de madeira também se obte- margem, solo pedregoso, inundável, estéril, 1.Mauhs s.n., ve um quarto corpo-de-prova, com vistas à 17.X1.2003 (PACA 87635). Santa Maria, Passo do maceração. Usou-se, neste caso, a técnica de Arenal, erva 03-0,5 m de altura, com flores, R. Beltrão Jeffrey (Burger &Richter, 1991), sendo apas- s.n., 15.IX.1955 (SMDB 810); Barragem deVaide Serra, com frutos, O. Vargas s.n., (SMDB 2180); VaIde Serra, ta resultante tingida com solução aquosa de campo, arbusto I m altura, raro, com flores, A. A. Filho safranina 1%. A desidratação e montagem de s.n.,26.VIII.1987 (SMDB 2688). São Gabriel, Faz. Santa lâminas permanentes seguiram oanteriormente Cecília, inrupestribus dumetosis, estéril, B.Rambo, s.n., descrito, com adiferença deque aprimeira des- I.1944 (PACA 25772). São Lourenço do Sul, Faz. sas etapas foi desenvolvida sobre papel de fil- Crisanto Soares, arbustiva herba in campo, estéril, A. Sehnem s.n., IO.XII. 1965 (PACA 81536). Santiago, tro. 13 BALDUINIA, n.9, p. 10-12, 30-XI-2006 Aterminologia, número de medições edes- metade superior,de3,5-11,5mmdecomprimento crição da estrutura antômica seguiram as reco- por 1,3-2,7 mm de largura; ápice mucronado, mendações da Copant (1973). Para a determi- retuso, arredondado, até acuminado, freqüente- nação da percentagem dos diferentes tipos ce- mente recurvo, ao menos quando seco; base lulares, seguiu-se a metodologia recomendada estreitamente cuneada, às vezes longa e es- porMarchiori (1980). Osvalores quantitativos, treitando-se gradualmente; nervuras hipódro- apresentados na Tabela 1,são resultantes de 30 mas, salientes na face abaxial (Figura 1b). medições por caráter, com exceção da percen- Pecíolos de 0,5-2,0 mm de comprimento. tagem dos tipos celulares edas classes de raio, Estípulas interpeciolares unidas em tomo dos para os quais foram realizadas 600 determina- nós, de cor marrom, geralmente pareadas, tri- ções ao acaso; a freqüência de poros/mm2 foi angulares, com parte distai freqüentemente ca- obtida de forma indireta, a partir de quadrados duca, medindo até 2,5 mm de comprimento e com área conhecida, superpostos em pilosas, sobretudo na face ventral (Figura la'). fotomicrografia de seção transversal. As medi- Flores completas, perfeitas, tetrâmeras, rara- ções foram realizadas em microscópio Carl mente pentâmeras, desimetria radial (Figura Ic), Zeiss, no Laboratório deAnatomia da Madeira numerosas, brancas, glabras, pediceladas, pe- da Universidade Federal de Santa Maria. As quenas (4,0-11,5 mm de comprimento por 1,8- fotomicrografias foram tomadas em aparelho 4,0 mm de largura), axilares e solitárias, às ve- Carl Zeiss, no Laboratório de Anatomia da zes aos pares ou em fascículos de 3, dispostas Madeira da Universidade Federal do Paraná. geralmente empequenos ramosjovens, foihosos, Os desenhos constantes na Figura 1, são obra produzidos pelo meristema axilar, osquais, oca- de Leonardo Paz Deble, a quem os autores sionalmente, podem estar bastante contraídos e agradecem. afilos (Figura la'). Pedicelos de 1,0-6,7 mm de comprimento (Figura la'). Cálice petalóide, DESCRIÇÃO BOTÂNICA carnoso, em tubo de largura mais ou menos Arbusto de 0,30 a 1,30 m de altura, densa- uniforme e 1,5-4,2 mm de comprimento, com mente ramoso e espinhento, com poucas ou nervuras evidentes eumpouco salientes naparte muitas folhas, até ocasionalmente sub-áfilo. externa, aomenos emmaterial seco (Figura Ic). Ramos decussados, cilíndricos, com gemas na Lacínias deltóides, de 0,9-1,5 mm de compri- parte inferior da axila e ramificados em quase mento e ápice caloso, com uma nervura longi- todos os nós (Figura la); quando jovens, são tudinal-ventral espessa. Pétalas geralmente côn- verdes, finos, flexíveis, de aspecto rugoso epor cavas a cuculadas, às vezes planas, de forma vezes puberulentos; lenhosos ede casca super- ovada, elíptica ou deltóide; base curto- ficialmente fissurada, nos antigos; os de última unguiculada; ápice inteiro, acuminado (Figura ordem, são curtos (até 4,5 cm de comprimen- 1e),em alternância emenores doque assépalas to), espinescentes, de extremidade muito agu- (commetade aquase 2/3desuaaltura), inseridas da, rígida, marrom, quase sempre uninodos, re- na extremidade do tubo, pouco evidentes. Dis- tos a ligeiramente curvos, ascendentes e não co nectarífero carnoso, espesso, glabro, ramificados; nós marcados por escura linha hemisférico, localizado nabase dotubo, adnato transversal. Folhas diminutas, verdes, pecioladas, àmetade inferior do ovário, mas com uma por- glabrasoucomalgumapilosidade (principalmen- ção livre eelevada ao seuredor, horizontalmen- te no dorso), decussadas, solitárias, ocasional- te ondulada, de bordo inteiro (Figura Id). mente aos pares ou em fascículos nos ramos Estames opostos às pétalas, livres do disco; fi- jovens (Figura la'); limbo oblanceolado a es- letes laminares, aomenos emmaterial seco, ade- treitamente oblongo, às vezes estreito-elíptico, rentes ao tubo em quase toda sua extensão, inteiro ou menos freqüentemente serreado na exceto na parte distaI, que é livre; anteras 14 FIGURA 1.Ramo florido deDiscaria americana (a).Detalhe deramo(a'). Folha (b).Flor (c).Flor, com detalhe dodisco (d). Pétala (e). Fruto (t).Semente (g). 15 dorsifixas, rimosas e, com freqüência, ligeira- noUruguai (Lombardo, 1982).Floresce deagos- mente rostradas. Ovário semi-ínfero, tricarpelar, to a dezembro (Bastos, 1999). trilocular, com umóvulo por lóculo; estilete ge- ralmente longo eincluso; estigma trilobado (Fi- DESCRIÇÃO DA MADEIRA gura ld). Fruto seco, do tipo cápsula Anéis decrescimento distintos, marcados por anomalicida, com textura crustácea e distinta- nítido agrupamento diagonal de vasos (padrão mente tricoco (Figura lf), envolto na base, an- dendrítico) no lenho tardio, que termina em es- tes da deiscência, pelos restos dotubo edo dis- treita faixa de fibras de diâmetro radial reduzi- co; glabro, mede de 4,0-6,0 mm de largura por do, contrastando com uma linha tangencial de 3,5-4,5 mm de altura; os mericarpos tornam-se vasos, no início do anel seguinte (Figura 2a). livres entre si eda fina parede externa do fruto Porosidade difusa. Poros extremamente nume- namaturidade, porocasião dadeiscência, abrin- rosos (325-485-625/mm2), representando 8-16- do-se ao longo da sutura ventral até a metade 22 % do volume da madeira; extremamente da dorsal, para liberar a semente. Sementes pequenos a pequenos (15-31-63 11m), apresen- marrons, acinzentadas ou avermelhadas, tam seção poligonal a oval (Figura 2b) e pare- obovadas emvista lateral, ligeiramente angulo- desfmas(1,2-2,8-3,8 11m). Elementos vasculares sas no ventre econvexas no dorso (Figura 19). muito curtos a curtos (170-273-330 11m), com apêndices curtos (7,5-31-118 11m), em uma ou Etimologia: De origem grega (diskos), o nome em ambas as extremidades. Placas de perfura- genérico remete ao disco da flor, peça ção simples (Figura 2c,3a). Vasos com espes- morfológica que fornece elementos para a se- sarnentos espiralados (Figura 3a,b), sem con- paração entre Discaria e Colletia. O epíteto teúdos. Pontoado intervascular em disposição específico (americana) refere-se à sua área alterna; pontoações de forma oval a circular, de ocorrência, restrita à América do Sul pequenas amédias (5-6,5-11 11m),com abertu- (Johnston & Soares, 1972). ra lenticular, horizontal, não guarnecida; pontoações raio-vasculares e parênquimo- Distribuição & Habitat: Discaria america- vasculares pequenas a médias, semelhantes às na ocorre desde osuldoBrasil (Santa Catarina, intervasculares. Rio Grande do Sul) e Uruguai, até a península de Valdez, no litoral argentino, alcançando a Traqueídeos vasculares semelhantes em Cordilheira doAndes naprovíncia deMendoza; comprimento aoselementos vasculares, eigual- habita regiões serranas, dunas, morros calcários mente providos de pontoações areoladas e esolos rochosos (Tortosa, 1983).No Rio Gran- espessamentos espiralados na parede. de do Sul, sua distribuição geográfica asseme- Parênquima axial pouco abundante, ocupan- lha-se à do gênero Colletia, sendo encontrada do 2-7,8-11 %dovolume da madeira, em arran- nas regiões fisiográficas da Encosta e Serra do jo paratraqueal escasso. Células parenquimá- Sudeste, nos Campos de Cima-da-Serra, na ticas retangulares, de35-65-150 11mde compri- Campanha, na Depressão Central, no Planalto mento por 10-13-18 11mde largura, em séries Médio e nas Missões (Bastos, 1999). verticais nãoestratificadas, de 107-243-350 11m de altura, compostas, geralmente, de 4 células. Comentários: No Brasil, a espécie é vulgar- Raios numerosos amuito numerosos (7-13- mente conhecida como brusca (Johnston & 19por mm), ocupando 10-14-18% do volume Soares, 1972),quina-do-campo, quina-do-brasil da madeira. Tecido radial fracamente hetero- e quina-do-rio-grande (Correa, 1984); na Ar- gêneo, composto decélulas quadradas, com uma gentina, como brusquilla, coronilIo-del-campo e faixa marginal de células mais altas (fracamen- tola (Tortosa, 1995); ecomo quina-del-campo, te eretas). Raios unisseriados abundantes (26- 16 -- ------7-0--0 -u-~-~-- -- ----- ~-- 200um FIGURA 2-Aspectos anatômicos damadeira deDiscaria americana. Seçãotransversal, mostrando anéis decrescimento distintos, porosidade dendrítica efibras de paredes espessas (a). Os mesmos detalhes, com maior aumento (b). Seção longitudinal radial, destacando células radiais quadradas e eretas, dois vasos com placas de perfuração simples e o pontoado raio-vascular (c).Raios de 1-4células delargura, emseção longitudinal tangencial (d). 17 FIGURA 3.Seçãolongitudinal radialdamadeira,destacando vasoscomespessamentos espiralados naparede(seta)eplacas deperfuração simples (a).Vasoscomespessamentos espiralados eraios,emseçãolongitudinal tangencial (b). 37-45 %), muito baixos (75-186-490 flm), ex- bras Iibriformes extremamente curtas a muito tremamente finos (7,5-13-25 flm), com 1-7-18 curtas (470-645-810 flm), de paredes espessas células em altura. Raios multisseriados, em sua (2,5-3,6-5,0 flm) ecom pontoações simples di- maioria bisseriados (22-31,7-43 %), trisseriados minutas. Fibras gelatinosas, freqüentes. (19-25,7-36 %) e escassos tetrasseriados (1-5,6- Canais secretores, tubos laticíferos e tani- 11%); muito baixos amedianos (160-405-763 níferos, líber incluso, estratificação e cristais, flm), com 6-19-36 células de altura, ede muito ausentes. Máculas medulares, ocasionais. finos aestreitos (17,5-32,5-72,5 flm), com 2a4 células de largura (Figura 2d). Células ANÁLISE DA ESTRUTURA ANATÔMICA esclerosadas, latericuliformes, mucilaginosas, Adescrição anatômica descrita coincide com envolventes e oleíferas, ausentes. Raios de re- as referências de Record (1939), Record & lacionamento normal; raios agregados e Hess (1949) eMetcalfe & Chalk (1972) para a fusionados, ausentes. família Rhamnaceae e gênero Discaria: anéis Tecidofibroso proeminente, ocupando 51-62- de crescimento distintos; poros muito numero- 67 % do volume da madeira, composto de fi- sos,pequenos adiminutos eemarranjo dendrítico 18 TABELA 1:Dados quantitativos damadeira. nO Característica anatômica mín. média máx. s 1 Fração de poros (%) 8,0 16,0 22,0 4,60 2 Freqüência de poros (poros/mm2) 325 485 625 88,30 o 3 total deporos (Jlm) 15,0 31,0 63,0 9,80 o 4 do lume de poros (Jlm) 12,5 25,5 55 9,30 5 Espessura da parede de poros (Jlm) 1,2 2,8 3,8 0,68 6 Comprimento deelementos vasculares (Jlm) 170 273 330 39,00 7 Comprimento deapêndices (Jlm) 7,5 31 118 22,10 8 opontoações intervasculares (Jlm) 5,0 6,5 11 1,20 o 9 pontoações raio-vasculares (Jlm) 4,0 5,9 12 1,70 10 opontoações parênquimo-vasculares (Jlm) 4,0 5,3 9,0 1,10 11 Fração deparênquima axial (%) 2,0 7,8 11 2,80 12 Altura das séries deparênq. axial (Jlm) 107 243 350 45,50 13 Altura das séries deparênq. axial (células) 2 4 6 0,60 14 Altura das células deparênquima axial (Jlm) 35 65 150 17,70 15 Largura das células deparênquima axial (Jlm) 10 13 18 1,90 16 Fração deraios (%) 10 14 18 2,80 17 Freqüência deraios (raios/mm) 7 13 19 3,33 18 Fração de raios unisseriados (%) 26 37 45 5,40 19 Altura de raios unisseriados (Jlm) 75 186 490 90,20 20 Altura de raios unisseriados (células) I 7 18 3,90 21 Largura deraios unisseriados (Jlm) 7,5 13 25 3,30 22 Altura deraios multisseriados (Jlm) 160 405 762 161,30 23 Altura de raios multisseriados (células) 6 19 36 7,60 24 Largura deraios multisseriados (Jlm) 17,5 32,3 72,5 10,60 25 Largura de raios multisseriados (células) 2 3 4 0,60 26 Fração de raios bisseriados (%) 22 31,7 43 7,30 27 Fração deraios trisserriados (%) 19 25,7 36 4,90 28 Fração de raios tetrasseriados (%) 1,0 5,6 11,0 2,70 29 Fração de fibras (%) 51 62 67 4,90 30 Comprimento defibras (Jlm) 470 645 810 89,80 o 31 defibras (Jlm) 10,0 12,6 17,5 2,02 o 32 lúmen defibras (Jlm) 2,5 5,4 10,0 1,48 33 Espessura parede de fibras (Jlm) 2,5 3,6 5,0 0,71 mín.=valormínimo;máx=valormáxímo;s=desviopadrão;Jlm=micrômetros;0 =diâmetro. 19 oudiagonal; elementos vasculares muito curtos Burger, L.M., Richter, H. G.Anatomia da Madeira. a curtos, com placas de perfuração simples e SãoPaulo: Nobel, 1991. 154p. espessamentos espiralados na parede; traqueí- Bustamante, L.E.N. Flora de lacuenca de Santiago deos vasculares presentes, também providos de de Chile. Santiago: Ediciones da laUniversidad deChile, 1976.v.2.559 p. espessamentos espiralados na parede; raios Copant. Comissão Panamericana deNormas Técni- heterogêneos, com 1-4 células de largura; cas. Descrição macroscópica, microscópica e parênquima paratraqueal escasso; e fibras de geral da madeira - esquema I de recomenda- paredes espessas, com pontoações diminutas. ção.Colômbia, 1973.19 p.(COPANT30). Com relação às referências bibliográficas, Correa, M.P.Dicionário das plantas úteis do Brasil cabe salientar, todavia, que omaterial em estu- e das exóticas cultivadas. Rio de Janeiro: Mi- do não apresenta a típica porosidade em anel; nistério da Agricultura, Instituto Brasileiro de não havendo variação sensível no diâmetro dos Desenvolvimento Florestal, 1984. v.5.p.568. vasos, oinício doanel émarcado por uma linha Dujardin, E.P.Eine neue Holz-Zellulosenfaerbung. tangencial de poros que contrasta com oarran- Mikrokosmos, n.53,p.94, 1964. jo dendrítico, muitocaracterístico nolenhotardio. Hurrell, J.A, Bazzano, H.B. Arbustos 1.Nativos y Considerando as demais espécies do gêne- exóticos. Buenos Aires: L.O.L.A, 2003. 264 p. Johnston, M. C., Soares, M.A deF.Ramnáceas. In: ro, a espécie em estudo apresenta raios mais Reitz, P.R.Flora Ilustrada Catarinense. Itajaí: finos, não havendo raios com mais de 4células Herbário Barbosa Rodrigues, 1972.50 p. de largura. Lombardo, A. Flora Montevidensis. Montevideo: Aocorrência deporos extremamente peque- Intendencia Municipal, 1982. v.1,p.316p. nos, numerosos e em arranjo dendrítico (ou Marchiori, 1.N. C.Estudo anatômico do xilema se- diagonal) éfreqüente em arbustos de locais se- cundário de algumas espécies dos gêneros cos, segundo Carlquist (1966), como é o caso Acacia eMimosa, nativas no Estado do Rio da espécie em estudo. Aocorrência de elemen- Grande doSul.Curitiba:UFPR, 1980.186p.Dis- tos vasculares muito curtos e com espessa- sertação (Mestrado emEngenharia Florestal) - mentos espiralados na parede também pode ser Universidade Federal doParaná. interpretado como estratégia ecológica, pois Metcalfe, C. R., Chalk. L. Anatomy of the aumenta a superfície interna dos mesmos e, Dicotyledons. Oxford: Clarendon Press, 1972. 1500p. portanto, asuacapilaridade (Carlquist, 1966). Radford, AE., Dickson, W.C.,Massey, 1.R.,Bell, C. Ostraqueídeos vasculares com espessamen- R. Vascular Plant Systematics. New York: tos espiralados, observados em Discaria ame- Harper&Row, 1974.891p. ricana, constituem caráter freqüente nas Record, S. J. American woods of the family Ramnáceas com vasos em arranjo diagonal ou Rhamnaceae.Tropical Woods,n.58,p.6-24,1939. dendrítico, segundo Metcalfe &Chalk (1972). Record, S.1.,Hess,R.W.Timbers ofthe NewWorld. New Haven: YaIeUniversity Press, 1949.640 p. BIBLIOGRAFIA Schultz,A.R.H.Introdução àBotânica Sistemática. Barroso, GM.Sistemática deAngiospermas doBra- PortoAlegre: Editora UFRGS, 1984.v.2.414 p. sil.Viçosa:UFV, 1984.v.2.p.237-239. Tortosa, R. D. El género Discaria (Rhamnaceae). Bastos,N.R.,Morais,D.AfamíliaRhamnaceae R.Br. Boletín de laSociedad Argentina deBotánica, no RS: Estudo taxonômico dos gêneros Disca- v.22,n. I-4,p.331-335, 1983. ria Hooker e Co/letia Commerson ex Jussieu. Tortosa, R. D. Flora fanerogámica argentina: Pesquisas, SérieBotânica, SãoLeopoldo, n.49, Rhamnaceae. Córdoba: Programa Proflora p.121-142,1999. (Conicet), Museo Botânico, 1995. fase. 9.18 p. 20