ebook img

História da Literatura como Provocação à Teoria Literária PDF

84 Pages·1994·9.379 MB·Portuguese
Save to my drive
Quick download
Download
Most books are stored in the elastic cloud where traffic is expensive. For this reason, we have a limit on daily download.

Preview História da Literatura como Provocação à Teoria Literária

Em 13 de abril de 1967, Hans Ro bert Jauss abriu o semestre letivo da Universidade de Constança, na Ale manha, com a palestra denominada "º que é e com que fim se estuda história da literatura?». Seu propó sito era reabilitar a história da litera tura, que, segundo ele, encontrava se em franca decadência, após ter reinado soberana por todo o século XIX e fundamentado os currículos escolares. Nos anos 60, a hegemo nia do estruturalismo convertera a história da literatura num animal em extinção, cultuado por antigos ou desatualizados pesquisadores. Buscando as raízes dessa mudan ça radical, Jauss rastreia as orienta ções da historiografia e constata seus equívocos. Após verificar que nem o marxismo nem o formalismo transpõem os desafios que a ques tão suscita, formula sua proposta: à história da literatura compete levar em conta a recepção. Sem refletir sobre o modo como as obras foram lidas, avaliadas e transmitidas, nun ca se saberá por que elas permane ceram ou que valor tiveram. Jauss assim elevou o leitor a uma posição privilegiada dentro dos es tudos literários. Ignorado pelo es truturalismo, que postulava a auto suficiência do texto literário, e dis solvido em classe social pelo mar xismo, o leitor vinha sendo figura menor, até irrelevante, nas conside rações sobre a literatura. Jauss in verte a formulação, ao afirmar que, se as obras são lidas, é porque são compreendidas; portanto, têm senti do para uma época, um grupo so cial, um gênero. Buscar essas leitu ras é acompanhar a trajetória da HANs jAuss ROBERT A HISTÓRIA DA LITERATURA COMO PROVOCAÇÃO À TEORIA LITERARIA Tradução Sérgio Tellaroli m filitora alira Série Temas volume 36 Estudos literários Título original: Literaturgeschichte als Provokation der Literaturwissenschaft © Universitatsverlag Konstanz GmbH, Konstanz, 1967 TEXTO EDITOR Fernando Paixão ASSISTÊNCIA EDITORIAL Mário Vilela ARTE EDIÇÃO DE ARTE (MIOLO) Divina Rocha Corte CAPA Errore Botcini INDICAÇÃO EDITORIAL Duda Machado ISBN 85 08 04631 6 1994 Todos os direitos reservados Editora Ática S.A. Rua Barão de Iguape, 11 O - CEP O1 507-900 Tel.: (PABX) 278-9322 - Caixa Postal 8656 End. Telegráfico "Bomlivro" - Fax: (011) 277-4146 São Paulo (SP) Sumário I ............................................................................. 5 II ............................................................................. 9 III ............................................................................. 15 IV 18 V ............................................................................. 2~ VI ............................................................................. 24 VII ............................................................................. 27 VIII ............................................................................. 31 IX ............................................................................. 35 X ............................................................................. 41 XI ............................................................................. 46 XII ............................................................................. 50 Notas ........................................................................ 58 Anexo: Os horizonres do ler ......................................... 71 1 A história da literatura vem, em nossa época, se fazendo cada vez mais mal-afamada - e, aliás, não de forma imerecida1. Nos últimos 150 anos, a história dessa venerável disciplina tem inequivocamente trilhado o caminho da decadência constante. Todos os seus fritos culminantes datam do século XIX. A époLa de Gervinus e Scherer, de De Sanctis e Lanson, escrever a histó ria de uma literatura nacional era considerado o apogeu da carrei ra de um filólogo. Os patriarcas da história da literatura tinham como meta suprema apresentar, por intermédio da história das obras literárias, a idéia da individualidade nacional a caminho de si mesma. Hoje, essa aspiração suprema constitui já uma lem brança distante. Em nossa vida intelectual contemporânea, a his tória da literatura, em sua forma tradicional, vive tão-somente uma existência nada mais que miserável, tendo se preservado ape nas na qualidade de uma exigência caduca do regulamento dos exames oficiais. Como matéria obrigatória do currículo do ensi no secundário, ela já quase desapareceu na Alemanha. No mais, histórias da literatura podem ainda ser encontradas, quando muito, nas estantes de livros da burguesia instruída, burguesia es ta que, na falta de um dicionário de literatura mais apropriado, as consulta principalmente para solucionar charadas literárias2• 6 Nos cursos oferecidos nas universidades, a história da litera tura está visivelmente desaparecendo. Há tempos já não constitui segredo algum afirmar que os filólogos de minha geração orgu lham-se de ter substituído os tradicionais painéis globais ou de época de sua literatura nacional por cursos voltados para um enfo que sistemático ou centrados em problemas históricos específicos. A produção científica oferece um quadro semelhante: as empreita das coletivas, na forma de manuais, enciclopédias e volumes inter pretativos - estes constituindo o ramo mais recente das assim cha madas sínteses de livraria-, desalojaram as histórias da literatura, tidas por pretensiosas e pouco sérias. Significativamente, tais cole tâneas pseudo-históricas raramente resultam da iniciativa de estu diosos, mas devem-se, em geral, à idéia de algum editor empreen dedor. Já a pesquisa levada a sério, por sua vez, encontra registro em monografias de revistas especializadas, pautando-se pelo critério mais rigoroso dos métodos científico-literários da estilística, da retórica, da filologia textual, da semântica, da poética e da história das palavras, dos motivos e dos gêneros. Por certo, também as revis tas atuais especializadas em filologia encontram-se ainda, em gran de medida, repletas de ensaios que se contentam com uma aborda gem histórico-literária. Seus autores, porém, vêem-se expostos a uma dupla crítica. Da ótica das disciplinas vizinhas, os problemas que levantam são, aberta ou veladamente, qualificados de pseudo problemas, e seus resultados, desdenhados como um saber pura mente antigo. Tampouco a crítica oriunda da teoria literária reve la-se mais complacente em seu juízo. Tal crítica tem a objetar à his tória clássica da literatura que ela apenas se pretende uma forma da escrita da história, mas, na verdade, move-se numa esfera exterior à dimensão histórica e, ao fazê-lo, falha igualmente na fundamen tação do juízo estético que seu objeto - a literatura, enquanto uma forma de arte - demanda3. Primeiramente, cumpre esclarecer essa crítica. A história da literatura, em sua forma mais habitual, costuma esquivar-se dope rigo de uma enumeração meramente cronológica dos fatos orde nando seu material segundo tendências gerais, gêneros e "outras categorias", para então, sob tais rubricas, abordar as obras indivi dualmente, em seqüência cronológica. A biografia dos autores e a apreciação do conjunto de sua obra surgem aí em passagens alea- 7 tórias e digressivas, à maneira de um elefante branco. Ou, então, o historiador da literatura ordena seu material de forma unilinear, seguindo a cronologia dos grandes autores e apreciando-os confor me o esquema de "vida e obrà' - os autores menores ficam aí a v~r navios (são inseridos nos intervalos entre os grandes), e o pró prio desenvolvimento dos gêneros vê-se, assim, inevitavelmente fracionado. Esta última modalidade de história da literatur;; cor responde sobretudo ao cânone dos autores da Antigüidade clássi ca; já a primeira encontra-se com maior freqüência nas literaturas modernas, que se defrontam com a dificuldade - crescente à me dida que se aproximam do presente - de ter de fazer uma seleção dentre uma série de autores e obras cujo conjunto mal se consegue divisar. Contudo, uma descrição da literatura que segue um câno ne em geral preestabelecido e simplesmente enfileira vida e obra dos escritores em seqüência cronológica não constitui - como já observou Gervinus - história alguma; mal chega a ser o esqueleto de uma história4. Do mesmo modo, nenhum historiador tomaria por histórica uma apresentação da literatura segundo seus gêneros que, registrando mudanças de uma obra para a outra, persiga as formas autônomas do desenvolvimento da lírica, do drama e do romance e emoldure o todo inexplicado com uma observação de caráter geral - amiúde tomada emprestada à história - sobre o Zeitgeist e as tendências políticas do período. Por outro lado, não é apenas raro, mas francamente malvisto, que um historiador da literatura profira vereditos qualitativos acerca de obras de épocas passadas. Muito pelo contrário, o historiador costuma, antes, apoiar-se no ideal de objetividade da historiografia, à qual cabe apenas descrever como as coisas efetivamente aconteceram. Sua abs tinência estética funda-se em boas razões. Afinal, a qualidade e a categoria de uma obra literária não resultam nem das condições históricas ou biográficas de seu nascimento, nem tão-somente de seu posicionamento no contexto sucessório do desenvolvimento de um gênero, mas sim dos critérios da recepção, do efeito* pro- Em razão da já consagrada cradução de Wirkungsgeschichte por "história do efeito", o subsrancivo Wirkung (efeiro, didcta, atuação, ação) foi aqui mvariavdmence tradu:údo por "efeito". "Contexto sucessório" traduz aqui {e nas demais passagens do texto em que o autor emprega o termo) Folgeverhiilmis, cuja tradução literal sena •relação de suces são". (N.T.) 8 duzido pela obra e de sua fama junto à posteridade, critérios es tes de mais difícil apreensão. Ademais, se, comprometido com o ideal da objetividade, o historiador da literatura limita-se à apre sentação de um passado acabado, deixando ao crítico competen te o juízo acerca da literatura do presente inacabado e apegando se ao cânone seguro das "obras-primas", permanecerá ele o mais das vezes, em sua distância histórica, uma ou duas gerações arra sado em relação ao estágio mais recente do desenvolvimento da literatura. Na melhor das hipóteses, participará, pois, como leitor passivo da discussão presente sobre os fenômenos literários con temporâneos, tornando-se, assim, na construção de seu juízo, um parasita de uma crítica que, em segredo, ele desdenha como "não científica". Que papel resta hoje, portanto, a um estudo históri co da literatura que, para recorrer a uma definição clássica do in teresse na história - a de Friedrich Schiller-, tem tão pouco a ensinar ao observador pensante que não oferece ao homem prático nenhum modelo a ser imitado, nem nenhum esclarecimento ao filósofo, e que, ademais, não logra prometer ao leitor nada que se assemelhe a uma fonte do mais nobre entretenimentos?

See more

The list of books you might like

Most books are stored in the elastic cloud where traffic is expensive. For this reason, we have a limit on daily download.