Lilian Simone Godoy Fonseca Hans Jonas e a responsabilidade do homem frente ao desafio biotecnológico Belo Horizonte Universidade Federal de Minas Gerais Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas 2009 1 Lilian Simone Godoy Fonseca Hans Jonas e a responsabilidade do homem frente ao desafio biotecnológico Tese apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Filosofia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais como requisito à obtenção do título de Doutor em Filosofia. Linha de Pesquisa: Filosofia da Ciência Orientador: Prof. Dr. Ivan Domingues Belo Horizonte Universidade Federal de Minas Gerais Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas 2009 2 Aos meus pais, os responsáveis pela minha existência e por minhas convicções. Ao Yuri, por ter despertado em mim o mais genuíno sentimento de responsabilidade. 3 AGRADECIMENTOS: Agradeço a Capes pela concessão da bolsa que possibilitou minha dedicação exclusiva à realização do meu doutoramento e, em especial, pela bolsa de estudos no exterior, dentro do Programa de Estágio de Doutorando - o PDEE, que tornou possível um ano de profícuos estudos junto à Université catholique de Louvain, na Bélgica, de janeiro de 2006 a janeiro de 2007. Agradeço também à Profa. Nathalie Frogneux, que me acolheu, na função de co- orientadora, junto à Faculté des sciences philosophiques, da UCL, e comigo generosamente compartilhou o seu profundo conhecimento sobre o conjunto da obra de Hans Jonas e, mesmo à distância, através de seu livro, forneceu-me um precioso guia para vencer as dificuldades teóricas. Ao Prof. Ivan Domingues, por aceitar, desde o início com grande interesse e entusiasmo, o tema proposto e durante todo o percurso, ter se mostrado atento às minhas falhas e compreensível com minhas limitações, ainda assim, apontando sempre direções mais pertinentes e seguras. Se o resultado não expressa todo o seu empenho, certamente, cabe a mim o demérito por não ter vencido todas as imprecisões apontadas. Aos Professores Alcino Bonella e Carlos Drawin, pelas críticas e sugestões que fortaleceram sensivelmente a versão ora apresentada, cujas imperfeições remanescentes não fazem jus à inestimável contribuição ensejada. Aos Professores Oswaldo Giacoia e Telma Birchal, pelas sugestões e críticas apresentadas no momento da defesa. À Andréa por sua boa vontade e atenção permanentes. À família que, apesar de tantos problemas, possibilitou a realização do trabalho. Aos amigos, pelos momentos em que pude renovar a energia para prosseguir a tarefa. À Ana Paula, por tudo. E ao princípio, sempre!! 4 O futuro da humanidade é o primeiro dever do comportamento humano coletivo na era da civilização técnica, que chegou a ser ‘onipotente’ de modo negativo. Não está aqui explicitamente incluído o futuro da natureza como condição sine qua non; mas ademais, independentemente disso, o futuro da natureza é de sua responsabilidade metafísica, uma vez que o homem não só se converteu em um perigo para si mesmo, mas também para toda a biosfera. (PV, p. 245; PR, p. 227) 5 SUMÁRIO Introdução ................................................................................................................ p. 13 Parte I – Problemática: Exposição dos diferentes aspectos do problema ....... p. 20 Capítulo 1: O Homem na era biotecnológica ................................................. p. 22 1.1 - O século XXI como o “século das biotecnologias” ........................... p. 22 a) O que são as biotecnologias? ....................................................................... p. 23 b) Como e quando surgiram? ........................................................................... p. 24 c) Usos já implantados até o momento ............................................................ p. 26 1.2 - Usos possíveis, usos discutíveis: a caminho do pós-humano? ..................... p. 28 1.3 - As biotecnologias e o retorno da eugenia ..................................................... p. 59 Capítulo 2: Dificuldades conceituais à abordagem do problema ................... p. 72 2.1 - Dificuldades colocadas à reflexão ética pelo pensamento moderno: os dualismos cosmológico, antropológico e moral ........................................................ p. 73 A) Descartes e o moderno dualismo no homem .............................................. p. 74 B) As dicotomias colocadas pela (ou atribuídas à) filosofia de David Hume . p. 81 B.1) A problemática passagem do ser ao dever .......................................... p. 81 B.2) A separação entre juízos de fato e juízos de valor ............................... p. 85 C) A separação kantiana entre razão prática e razão teórica ............................ p. 97 2.2 - Dificuldades colocadas à reflexão ética decorrentes do pensamento contemporâneo ......................................................................................................... p. 101 A’) G. E. Moore e a falácia naturalista ......................................................... p. 102 B’) Weber e a neutralidade axiológica ........................................................... p. 104 2.3 - A desarticulação entre ética, ciência e técnica .......................................... .p. 112 Capítulo 3: A situação da ética contemporânea ............................................ p. 124 3.1 A perspectiva metaética ................................................................................ p. 128 3.2 Duas diferentes abordagens de ética normativa ............................................ p. 129 6 A” Kant e a razão prática como origem do dever incondicional .................. p. 130 B” Weber e a distinção entre Ética da Convicção e Ética da Responsabilidade .................................................................................................................................. p. 136 3.3 O surgimento e desenvolvimento das Éticas Aplicadas e Bioética ............. .p. 146 Parte II – Sistemática: A ética da responsabilidade como resposta ao desafio atual .................................................................................................................................. p. 158 Capítulo 4: Do Fenômeno da Vida rumo ao Princípio Responsabilidade ... p. 158 4.1 – Breve apresentação biobibliográfica de Hans Jonas .................................. p. 160 4.2 - O dualismo como problema central na reflexão filosófica jonassiana ........ p 167 4.3 – O trajeto para a resolução do dualismo ....................................................... p.171 A. “Tentativas” anteriores para a resolução do dualismo cartesiano ............. p. 171 A.1 A Substância de Spinoza .................................................................... p. 171 A.2 A Mônada de Leibniz ......................................................................... p. 172 A.3 O pan-organismo de Whitehead ......................................................... p. 174 B. A solução de Hans Jonas ........................................................................... p. 176 4.4 – Avaliação e conseqüências dessa solução .................................................. p. 191 4.5 – As diferentes formulações de pr e a resposta jonassiana às éticas anteriores ....... ................................................................................................................... p. 206 Capítulo 5 - A fundamentação ontológica da ética do futuro ....................... p. 230 5.1 - A questão do saber como propedêutica à fundamentação .......................... p. 231 5.2 - Fundamentação passo 1 - A Teoria dos fins ou a relação entre Ser e fins . p. 253 5.3 - Fundamentação passo 2 - A teoria da responsabilidade ou a articulação entre o Bem, o Dever e o Ser ............................................................................................... p. 272 Capítulo 6 – Técnica Medicina e Ética como aplicação do Princípio Responsabilidade .................................................................................................................................. p. 314 6.1 – A concepção jonassiana sobre as pesquisas biotecnológicas em geral .. p.319 7 6.2 – A reflexão jonassiana acerca das pesquisas com seres humanos .......... p. 332 6.3 - A reflexão jonassiana quanto às aplicações das biotecnologias em seres humanos ................................................................................................................... p. 360 Capítulo 7 – Contribuições, críticas e limitações da formulação jonassiana ao enfrentamento do desafio biotecnológico .......................................................... p. 388 7.1 – Contribuições da ética da responsabilidade à discussão do tema ......... p. 388 7.2 – Críticas à formulação ética jonassiana .................................................. p. 407 1. Aspecto conceitual ................................................................................. p. 408 a. Os tripla significação do termo «valor» ............................................ p. 408 b. A ambigüidade do estatuto do «homem» ......................................... p. 410 c. Um conceito limitado de «natureza» ................................................ p. 413 2. Aspecto metodológico ........................................................................... p. 414 a. O recurso à «heurística do medo» ..................................................... p. 414 b. Viabilidade de uma fundamentação ontológica ................................ p. 419 c. Uma ética subjetivista: rumo ao «psicologismo»? ............................ p. 420 3. Aspecto prático ...................................................................................... p. 422 a. Apologia ao totalitarismo político? ................................................... p. 423 b. Contra a liberdade da ciência? .......................................................... p. 424 7.3 – Para vencer os limites da formulação ética jonassiana ......................... p. 425 Conclusão ....................................................................................................... p. 447 Referências Bibliográficas .............................................................................. p.453 1) Títulos de Hans Jonas ......................................................................... p. 453 2) Textos sobre Jonas .............................................................................. p. 454 3) Títulos afins ........................................................................................ p. 458 4) Instrumentos de pesquisa consultados ................................................ p. 465 5) Leituras secundárias ............................................................................ p. 467 6) Sites consultados ................................................................................. p. 468 8 Abreviaturas: Títulos de Jonas: CDA: Le concept de Dieu après Auschwitz EF: Pour une Éthique du Futur EL: Évolution et Liberté Gpr: “De la Gnose au principe responsabilité” OF: Organismus und Freiheit PhE: Philosophical Essays PhL: The Phenomenon of Life PhV: Le Phénomène de la Vie PR: Le Principe Responsabilité PV: Das Prinzip Verantwortung TME: Technik, Medizin und Ethik TME[e]: Técnica, medicina y ética (versão espanhola) TPUT: “The Practical Uses of Theory” Outros: ECT: “Ética, Ciência e Técnica” (Ivan Domingues) EPM: Enquête sur les Principes de la Morale (Hume) DH: “La puissance de la subjetivité comme dignité de l’homme” (Frogneux) FMC: Fundamentação da Metafísica dos Costumes LK: Lexikon Kantien (Na verdade: Kant-Lexikon) MW: Max Weber (Julien Freund) PcV: Política como Vocação (edição da UnB) PEf: Principia Ethica (versão francesa) TNH: Tratado da Natureza Humana (Hume) VM: Hans Jonas ou la Vie dans le Monde (Frogneux) 9 Resumo: O principal objetivo desse estudo foi examinar a formulação ética do filósofo alemão Hans Jonas, à luz do desafio colocado pelos avanços biotecnológicos dirigidos à aplicação em seres humanos não apenas com o propósito de curar, mas de aperfeiçoar ou de hibridar a espécie humana com outras espécies ou máquinas. Algo que se torna cada vez mais possível, em função dos crescentes progressos das pesquisas nessa área. Buscou-se evidenciar as questões que estão em jogo, sobretudo, na proposta da chamada eugenia positiva e no projeto pós- humano e confrontar com elas a formulação ética jonassiana, para estabelecer um parâmetro ou um limite eticamente consistente, visando inibir a execução real de tal programa. 10
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