FLAVIO ANTÔNIO DA CRUZ O CONFRONTO ENTRE O CONCURSO FORMAL DE CRIMES E O CONCURSO APARENTE DE NORMAS PENAIS NO DIREITO BRASILEIRO: revisão crítica sob os influxos de uma hermenêutica emancipatória. CURITIBA 2014 FLAVIO ANTÔNIO DA CRUZ O CONFRONTO ENTRE O CONCURSO FORMAL DE CRIMES E O CONCURSO APARENTE DE NORMAS PENAIS NO DIREITO BRASILEIRO: revisão crítica sob os influxos de uma hermenêutica emancipatória. Tese apresentada ao programa de Doutorado da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná. Orientador: Prof. Dr. Paulo César Busato. Co-orientador: Prof. Dr. Juarez Cirino dos Santos CURITIBA 2014 C957c Cruz, Flavio Antônio O confronto entre o concurso formal de crimes e o concurso aparente de normais penais no direito brasileiro: revisão crítica sob os influxos de uma hermenêutica emancipatória / Flavio Antônio da Cruz; orientador: Paulo César Busato; coorientador: Juarez Cirino dos Santos. – Curitiba, 2014. 937 p. Bibliografia: p. 862-937. Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Paraná, Setor de Ciências Jurídicas, Programa de Pós-graduação em Direito. Curitiba, 2014. 1. Direito penal. 2. Hermenêutica (Direito). I. Busato, Paulo César. II. Santos, Juarez Cirino dos. III. Título. CDU Catal Catalogação na publicação - Universidade Federal do Paraná Sistema de Bibliotecas - Biblioteca de Ciências Jurídicas Bibliotecário: Pedro Paulo Aquilante Junior - CRB 9/1626 TERMO DE APROVAÇÃO FLAVIO ANTONIO DA CRUZ O CONFRONTO ENTRE O CONCURSO FORMAL DE CRIMES E O CONCURSO APARENTE DE NORMAS PENAIS NO DIREITO BRASILEIRO: revisão crítica sob os influxos de uma hermenêutica emancipatória. Tese apresentada à Banca de Doutoramento do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná como requisito parcial para o título de Doutor em Direito do Estado, formada pelos seguintes examinadores: BANCA EXAMINADORA Prof. Dr. Paulo César Busato Orientador - Professor Adjunto de Direito Penal da UFPR Prof. Dr. Juarez Cirino dos Santos Co-orientador - Professor Adjunto aposentado de Direito Penal da UFPR Professor do ICPC Prof. Dr. Celso Luiz Ludwig Professor Adjunto de Filosofia do Direito - UFPR Prof. Dr. Rodrigo Sánchez Rios Professor Titular de Direito Penal - PUC/PR Prof. Dr. Fábio André Guaragni Professor Titular de Direito Penal - Unicuritiba Curitiba, 11 de agosto de 2014. Para Ane e Davi, com todo amor que há nessa vida! Dedico essa tese ao insigne Prof. Dr. Juarez Cirino dos Santos, com admiração. AGRADECIMENTOS Ane, obrigado por todo apoio ao longo desses 15 anos de namoro. Obrigado pela vida que geramos! Obrigado por ter me escolhido! Lembro sempre de você dizendo: 'termine!' Pois você sabe que sou como o fio de Ariadne ou como a caixa de Pandora... Sem você, Ane, nada teria graça! Davi. Espero que os estudos penais virem assunto de história. Quem sabe, meu filho, consigamos construir uma sociedade sem cadeias. Saiba que foi muito difícil trocar alguns dos nossos passeios no parque em prol da escrita desse trabalho. Agradeço minha mãe, com todo amor que há nessa vida. Meu porto seguro, sempre! Agradeço ao meu pai, com saudades. Por todo o empenho para que eu estudasse, por todos os sacrifícios que fez ao longo de uma vida de muito esforço e dedicação. Pai! Sinto muito a sua falta, e trocaria qualquer título por mais alguns minutos com a sua presença. Sueli e Tokio. Vocês são como pais. Afetuosos e generosos. Sou também muito grato por tudo quanto fazem por mim. Lamento não conseguir retribuir toda a dedicação e cuidado. Obrigado. Obrigado a meus irmãos, em especial à Jane. Jane, obrigado por ter me ensinado a escrever na mais tenra infância; por me estimular a ler Bíblias antigas e por ter sempre cuidado de mim. Cris, Ede, Edson, Sandra, Hélzio..., um time! Saudade de vocês. Obrigado a todos os amigos que compartilharam comigo momentos de angústia e alegrias. Amigos da pós, amigos da Justiça Federal, amigos da infância, amigos da Unicuritiba, Abdconst, Positivo, ICPC. Faltariam folhas para lhes agradecer da forma realmente merecida. Agradeço ao meu orientador, insigne Prof. Dr. Paulo César Busato, por toda a paciência e apoio ao longo da redação desse trabalho. Sou grato sobretudo pela confiança depositada. Manifesto minha grande admiração e estima. Obrigado por tudo! Tenho o maior orgulho de ter sido seu orientando. Dr. Paulo! Obrigado sobretudo por compartilhar uma visão filosófica do Direito Penal; por contrapô-lo constantemente com angústias que surgem de outro local de fala - como diz o Professor Jacinto Coutinho. Sou grato também ao insigne Prof. Dr. Juarez Cirino dos Santos, gigante da Criminologia e ser humano de coração imenso, quem muito admiro e a quem também muito devo. Obrigado, professor Juarez, por todos os ensinamentos e por todas as palavras de apoio. Obrigado, sobretudo, por estimular novas visões de mundo. Sou também grato por ter sido admitido como seu orientando. Não tenho palavras suficientes para lhe agradecer! E que a vida lhe seja sempre suave, recompensando com toda a alegria do mundo. Agradeço imensamente aos Professores que compuseram a minha banca de qualificação, Prof. Dr. Celso Luiz Ludwig, Prof. Dr. Fábio André Guaragni e Prof. Dr. Rodrigo Sánchez Rios. Muito obrigado pelas recomendações, pelas indicações bibliográficas e todo apoio para a conclusão dessa pesquisa. Manifesto meus votos de elevada estima e de muita admiração. Prof. Dr. Rodrigo Rios, sinto-me também muito honrado de ter sido seu orientando no mestrado. Muito obrigado, Professor!, por todo o apoio e estímulo ao longo desses anos e pela interlocução constante. Dr. Fábio e Dr. Celso. Nâo tenho palavras para agradecer de forma adequada toda a atenção dedicada a esse trabalho! Agradeço aos professores da pós-graduação da UFPR. Louvo a qualidade das aulas, a abertura para o diálogo, a cultura imensa! Obrigado. Expresso, por fim, os meus agradecimentos ao Programa de Pós-graduação da Universidade Federal do Paraná, que me acolheu ao longo desses 04 anos de estudo. Quero agradecer especialmente aos servidores da Secretaria do PPGD, sempre solícitos e prestativos. Muito obrigado! A fim de encontrar a verdadeira alcachofra, nós a despimos de suas folhas. WITTGENSTEIN, Ludwig. Investigações filosóficas. 2. ed. Tradução de José Carlos Bruni. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 72. A pluralidade da interpretação, longe de ser um defeito ou uma desvantagem, é o sinal mais seguro da riqueza do pensamento humano. Tanto é verdade que nada é mais absurdo do que conceber a interpretação como única e definitiva, como quereriam aqueles que sustentam que um conhecimento somente é pleno e completo, se único; e que a pessoalidade do conhecimento é uma limitação deplorável e fatal. O engano destes preconceitos é conceber a precisão e a evidência de um modo tão rasteiro e chamativo que não as saiba encontrar, de modo algum, lá onde vige a variedade e a novidade da vida humana. PAREYSON, Luigi. Verdade e interpretação. Tradução de Maria Helena Nery Garcez e Sandra Neves Abdo. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 51. RESUMO Busca-se, com a presente investigação, suscitar algumas reflexões sobre a decisão judicial no âmbito da teoria do concurso de crimes. A tradição jurídica pós-iluminista ampara-se na premissa de que as decisões judiciais estariam previamente programadas pela lei. O senso comum teórico supõe que a prolação da sentença condenatória implicaria mera concretização de normas já veiculadas, de modo exaustivo, nos textos legais pertinentes. Enquanto projeção do conceito do Estado de Direito, o postulado da legalidade determina que toda manifestação de poder deve ser submetida ao controle da razão pública (nulla poena sine lege, nulla lege sine necessitate etc). Isso significa que a imposição e o cálculo das penas criminais devem decorrer de critérios explicitados em lei publicada em momento anterior à ocorrência do crime. Há, todavia, um conjunto de fatores irracionais que influenciam toda compreensão do mundo: metrarregras, traumas e idiossincrasias variadas. A tese busca evidenciar que há grande margem de arbítrio na identificação dos casos de concurso aparente e casos de concurso formal. O Código Penal brasileiro não oferece critérios explícitos para a identificação dos casos de concurso aparente, ao contrário, por exemplo, do Código Penal espanhol. Essas modalidades de concurso – aparente/formal - têm em comum o fato de que, ao menos de modo abstrato, em ambas as hipóteses há uma única ação suscetível de se amoldar a dois ou mais tipos penais incriminadores. O reconhecimento de concurso aparente é mais benéfico para o acusado, na medida em que enseja sanção inferior àquela que seria aplicada ao concurso formal. O problema é que a distinção entre um caso e outro é relegada, de certo modo, ao sentimento de justiça de cada magistrado. E isso parece infirmar justamente as suposições que animam a dogmática penal. Para além dessa questão central, o tema do concurso demanda considerações metafísicas (como recortar unidades de ação?), considerações lógicas (relações entre os enunciados normativos, tema importante para o concurso aparente) e considerações valorativas (questão própria ao ne bis in idem, consunção e comportamentos copunidos). Dada a complexidade da questão, a investigação contrapôs as categorias dogmáticas, de um lado, com alguns insights proporcionados pela epistemologia, pela filosofia da ação e pela sociologia. Atribuiu-se significativo peso para a obra de Hans-Georg Gadamer – Verdade e Método I -, a fim de demonstrar que não há como axiomatizar totalmente as deliberações judiciais. Como toda compreensão de mundo, as sentenças dependem de contexto e de intérprete. Isso não pode vaticinar, todavia, uma concepção niilista, que renuncie à tentativa de se conter o arbítrio. Daí que os magistrados devem ser instados a deixarem manifestos, no limite do que é humanamente possível, todos os valores que animam suas sentenças. Apenas em um contexto de razão discursiva, com controles recíprocos, é que a violência estatal pode ser reduzida, conquanto jamais possa ser eliminada. Desse modo, a questão do concurso de crimes foi tomada como pano de fundo para uma reflexão sobre a decisão judicial e sua justificação. Palavras-chave: concurso aparente, concurso formal, concurso de crimes, hermenêutica, epistemologia, Estado de Direito. ABSTRACT The present study sought to propose some reflections on the judicial decision within the scope of the theory of joinder of offenses. The post-Enlightenment legal tradition relies on the assumption that judicial decisions would be previously programmed by law. The theoretical common sense assumes that the entry of judgment would imply a mere embodiment of standards already and exhaustively conveyed in the relevant legal texts. As a projection of the concept of Rule of Law, the postulate of legality defines that every manifestation of power should be subject to the control of public reason (nulla poena sine lege praevia et certa). This means that imposing and calculating sentences should fulfill criteria that were made explicit in the law that was published previously to crime occurrence. However, there is a set of irrational factors that affect the understanding of the world: meta rules, traumas and idiosyncrasies. This dissertation sought to highlight that there is a broad margin of discretion when identifying cases of ideal joinder of offenses and cases of formal joinder of offenses. The Brazilian Penal Code does not provide explicit criteria to identify cases of ideal joinder of offenses, in contrast, for example, with the Spanish Penal Code. These modalities of joinder of offenses – ideal / formal – have in common the fact that, at least abstractly, both hypotheses contain a single action that is susceptible to adjust to two or more incriminating types of crimes. Ascribing the character of ideal to a joinder of offenses would be more beneficial to the defendant as it triggers sanctions that are lower than sanctions used in formal joinders of offenses. The problem is: the distinction between one and another relies on each magistrate’s sense of justice, which seems to fairly invalidate the premises that animate criminal dogmatics. Beyond this central issue, the theme of joinder of offenses requires metaphysical considerations (how to outline action units?), logical considerations (relations between normative statements, which is an important theme for ideal joinder of offenses) and evaluative considerations (which is inherent to ne bis in idem, merger doctrine and co-punishment). Given the issue’s complexity, this investigation contrasted dogmatic categories on one hand, with insights provided by epistemology, philosophy of action and sociology. A significant weight was given to Hans-Georg Gadamer’s work – Truth and Method I - in order to demonstrate that judicial determinations cannot be entirely axiomatized. As in any process of understanding the world, judgment depends on both context and the interpreter. However, this should not predict any nihilistic conception that renounces to the attempt to restrain discretion. Therefore, magistrates should be urged to express, to the limit of what is humanly possible, all the values that underlie their judgments. Only in a context of discursive reason with reciprocal controls can state violence be reduced, even though it cannot be eliminated. Thus, the issue of joinder of offenses has been chosen as a starting point for a reflection upon judicial decision and its justification. Key words: ideal joinder of offenses, formal joinder of offenses, joinder of offenses, hermeneutics, epistemology, Rule of Law.
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