Escola Politécnica da Universidade de São Paulo Departamento de Engenharia de Estruturas e Fundações Laboratório de Estruturas e Materiais Estruturais ESTUDO DO PROCESSO DE FISSURAÇÃO NA ANÁLISE DINÂMICA DE ESTRUTURAS DE CONCRETO ARMADO Projeto de pesquisa apresentado à FAPESP para solicitação de bolsa de pós-doutorado Candidato: Renato César Gavazza Menin Supervisor: Túlio Nogueira Bittencourt São Paulo, Setembro de 2006 RESUMO O presente projeto de pesquisa de pós-doutorado tem como objetivo principal a simulação computacional do comportamento de estruturas de concreto armado submetidas a uma análise dinâmica utilizando o método de Newmark na integração da equação de equilíbrio dinâmico ao longo do tempo. Pretende-se utilizar dois modelos de elementos finitos para representar o comportamento do concreto armado fissurado: um do tipo distribuído e um do tipo incorporado e em seguida fazer uma análise comparativa das vantagens e desvantagens apresentadas pelos mesmos. Os modelos numéricos serão implementados no programa computacional Quebra2D-Femoop, desenvolvido pela Tecgraf/Puc-Rio e pelo LMC/USP, sendo os resultados posteriormente aferidos com a utilização do programa DIANA e resultados experimentais. O projeto de pesquisa está inserido no Grupo de Pesquisa coordenado pelo professor Túlio Nogueira Bittencourt (GMEC: http://www.lmc.ep.usp.br/people/tbitten/gmec/home.htm), o qual será supervisor desse trabalho. Esse Grupo de Pesquisa tem realizado vários trabalhos nas áreas de monitoração, análise experimental e simulação computacional de estruturas de concreto armado. Este projeto de pesquisa de pós-doutorado está diretamente ligado ao Projeto Temático FAPESP/04-03049-1 (“MONITORAÇÃO E AVALIAÇÃO DA DEFORMABILIDADE, DA FISSURAÇÃO E DA SEGURANÇA DE ESTRUTURAS DE CONCRETO”), e ao Projeto de Auxílio de Pesquisa FAPESP/05-52210-2 (“PROTOTIPAGEM DE ESTRUTURAS EM ESCALA REDUZIDA EM UM AMBIENTE INTEGRADO, UTILIZANDO RECURSOS DE MONITORAÇÃO, INTERPRETAÇÃO E ANÁLISE NUMÉRICA”). 1. INTRODUÇÃO O concreto armado se tornou um dos mais importantes materiais estruturais no último século, sendo amplamente utilizado em muitas áreas da engenharia civil na construção de uma grande variedade de tipologias estruturais: edificações, pontes, plataformas offshore, barragens, reatores nucleares, etc. Dentre os materiais constituintes do concreto armado estão uma pasta de cimento endurecida, os agregados e a armadura de aço. Portanto se trata de um material bastante heterogêneo cujo comportamento é bem complexo. Durante o processo de carregamento da estrutura observa- se uma relação tensão-deformação não linear agravada por uma forte anisotropia causada pelos processos de concretagem e endurecimento, gerando uma complicada distribuição de tensões internas. As tensões de tração induzem um processo de fissuração progressiva, acompanhado por deformações lentas durante os processos de retração e fluência do material. Devido a sua complexidade, uma grande quantidade de pesquisadores tem trabalhado na tentativa de desenvolver modelos constitutivos para simular o comportamento do concreto armado. Mais recentemente, observa-se um grande interesse de pesquisadores em simular o comportamento do concreto armado quando submetido a uma análise dinâmica provocada por diferentes modelos de carregamentos variáveis ao longo do tempo ou devidos a acelerações sísmicas (Maekawa et. al, 2003). Nesta linha de pesquisa, têm-se feito estudos sobre análises modais para determinação de autovalores e autovetores associados às freqüências e aos modos de vibração de estruturas, bem como simulações experimentais (Dowell e Seible, 2001) e numéricas (Ragueneau e Mazars, 2001; e Han et al., 2001) de carregamentos dinâmicos provocados por acelerações sísmicas em diversos tipos de elementos estruturais: vigas, pilares, pilares-parede (shear walls), lajes, pórticos, cascas e dutos. Alguns efeitos destrutivos em estruturas reais de concreto armado provocados por acelerações sísmicas do terreno são mostrados na Figura 1. Verifica-se claramente a grande intensidade das forças e gravidade da destruição causada por acelerações sísmicas, justificando assim o grande interesse na pesquisa de aprimoramento de técnicas para simular e entender melhor o comportamento das estruturas nestas situações. Figura 1: Efeitos provocados por carregamentos sísmicos em estruturas. 2. OBJETIVOS O objetivo principal deste trabalho de pós-doutorado é fazer uma análise dinâmica utilizando o método de Newmark na integração da equação de equilíbrio dinâmico ao longo do tempo para simular o comportamento de estruturas de concreto armado. Pretende-se utilizar dois modelos de elementos finitos para representar o comportamento do concreto armado fissurado: um do tipo distribuído e um do tipo incorporado e em seguida fazer uma análise comparativa das vantagens e desvantagens apresentadas pelos mesmos. No caso do modelo distribuído, uma das possibilidades é a utilização de um diagrama tensão- deformação multilinear cuja calibragem pode ser feita segundo o Código Modelo CEB-FIP 1990 (CEB, 1993), através de ensaios de tirantes de concreto armado. No caso do modelo incorporado, existe a possibilidade de utilização do modelo de Dvorkin et. al (1990), o qual não inclui a contribuição da armadura, sendo esta parcela levada em consideração através de um modelo de transferência de tensão por aderência. Para representar o comportamento do concreto intacto, pretende-se utilizar o modelo elástico não-linear de Ottosen (1979) ao passo que para simular o comportamento das barras de aço da armadura pode-se empregar um modelo incorporado que permita uma disposição arbitrária das barras de aço no interior dos elementos de concreto. Os modelos numéricos serão implementados no programa computacional Quebra2D-Femoop, desenvolvido pela Tecgraf/Puc-Rio e pelo LMC/USP, sendo os resultados posteriormente aferidos mediante a utilização do programa de análise estrutural DIANA ou com resultados experimentais encontrados na literatura. 3. METODOLOGIA 3.1 MODELOS DE FISSURAÇÃO EM ESTRUTURAS DE CONCRETO ARMADO Na definição do comportamento estrutural do concreto, uma das suas propriedades mais marcantes é a sua baixa resistência à tração frente a sua resistência à compressão. Esta característica faz com que as estruturas de concreto funcionem fissuradas já para baixos níveis de carregamento, reduzindo consideravelmente a rigidez da estrutura. Durante a fissuração, a distribuição interna das tensões é bastante modificada e o concreto começa a apresentar comportamento não-linear. A perda de integridade estrutural no concreto devido à fissuração tem atraído muita atenção dos pesquisadores, entretanto, devido à natureza localizada, a correta modelagem da fissura é um tópico bastante complexo, pois trata da descontinuidade no campo de deslocamentos. Na simulação numérica de estruturas de concreto armado fissuradas via Método dos Elementos Finitos, a escolha adequada do tipo de modelo a ser utilizado em cada situação é determinante para o sucesso da análise. Particularmente, três aspectos têm especial importância: a forma de representação da fissura; a simulação do comportamento do material fissurado; e a representação da armadura. Historicamente, no contexto dos elementos finitos, três linhas distintas vinham sendo desenvolvidas para representar a fissuração do concreto: discreta, distribuída e incorportada. Na representação de forma discreta, as fissuras são modeladas como descontinuidades de deslocamentos entre os elementos. Estes modelos se baseiam na idéia de trabalhar sempre com a parte do sólido que permanece contínua e não danificada, de modo que na formação ou progressão de uma fissura, seus lados se incorporam ao contorno do sólido. Neste modelo, as fissuras devem se desenvolver ao longo do contorno dos elementos, o que gera uma restrição na direção da propagação das mesmas. Apesar dos esforços atuais para contornar tais inconvenientes, como geradores automáticos de malha e aumento da velocidade e memória dos computadores, a aplicação destes modelos fica limitada aos casos de progressão de poucas fissuras, o que dificulta a utilização destes modelos no caso da grande maioria das estruturas de concreto armado. Quando as fissuras estão espalhadas ao longo da estrutura, o que normalmente acontece em estruturas de concreto armado, os modelos de fissura distribuída têm sido amplamente aplicados. Nesta representação, o material fissurado é tratado como contínuo, e a descontinuidade do campo de deslocamentos causada pela fissura é espalhada ao longo do elemento. Embora sejam usados com sucesso na análise da maioria das estruturas de concreto armado, estes modelos de fissura apresentam algumas deficiências quando empregados para estudar situações de fraturamento localizado que ocorrem, principalmente, nas estruturas de concreto simples. Além disso, alguns tipos de estruturas de concreto armado, como vigas- parede que rompem por cisalhamento, podem apresentar uma situação de fraturamento localizado. O problema da sensibilidade em relação à malha, que é aliviado com a introdução dos conceitos da Mecânica da Fratura, é uma destas deficiências. Recentemente, modelos de fissura incorportada têm sido desenvolvidos como alternativa para simulação numérica da fissuração em estruturas de concreto simples e armado. Estes modelos de fissura reúnem os aspectos favoráveis das duas técnicas anteriores: não há necessidade de fazer uma redefinição de malha e os resultados obtidos são independentes da malha de elementos finitos utilizada. Estes modelos se baseiam no conceito de descontinuidades incorporadas dentro de elementos finitos padrão. Nas próximas seções serão apresentados dois modelos constitutivos para representar o comportamento de peças de concreto armado fissuradas: um do tipo distribuído e um do tipo incorporado. 3.1.1 MODELO DE FISSURA DISTRIBUÍDA Segundo Rashid (1968), desde as primeiras aplicações do Método dos Elementos Finitos a estruturas de concreto, ficou claro que sempre é mais conveniente representar as fissuras pela alteração nas propriedades constitutivas do que pela alteração da malha de elementos finitos. Inicialmente, o procedimento utilizado era tornar nula a rigidez do material na direção da máxima tensão de tração, uma vez que a tensão calculada excedia a resistência à tração do concreto - ruptura frágil. Simultaneamente, as tensões no concreto eram liberadas e reaplicadas na estrutura como cargas residuais. Após este período inicial, quando se considerava que a ruptura do concreto acontecia de forma frágil, constatou-se que melhores resultados eram obtidos considerando uma diminuição gradual da tensão com o aumento da deformação após a tensão máxima ter sido atingida. Na análise de peças de concreto armado, o diagrama tensão-deformação que representa esta diminuição gradual da tensão pode ser calibrado através de valores experimentais. Assim, vários efeitos que acontecem durante a fissuração do concreto, tais como o amolecimento do concreto simples e a contribuição do concreto entre fissuras, o chamado "tension-stiffning effect", são considerados de forma implícita. O modelo constitutivo proposto para ser utilizado no presente trabalho para a simulação do concreto tracionado fissurado é o modelo com amolecimento multilinear, conforme mostrado na Figura 2, podendo-se distinguir três trechos: • 1º Trecho: relativo ao período de formação de fissuras, ocorrendo uma redução gradual da tensão com o aumento da deformação. • 2º Trecho: relativo ao período de fissuração estabilizada, caracterizado pelo aumento de deformação com tensão constante. • 3º Trecho: relativo ao período de pós-escoamento da armadura, novamente com diminuição da tensão com o aumento da deformação. Figura 2: Modelo de fissuração distribuída. A determinação dos parâmetros de cada trecho é feita através da análise de barras de concreto armado submetidas à tração pura (tirantes). Considerando que a deformação na armadura é igual à deformação no concreto adjacente, a deformação no tirante, antes de ocorrer a primeira fissura, é determinada pela expressão: N ε= (1) E A +E A s s c c onde A é a área da seção da armadura; A é a área de concreto tracionado; E é o módulo de s c s deformação longitudinal do aço; E é o módulo de deformação longitudinal do concreto c intacto; e N é a carga axial aplicada. Após a formação da primeira fissura, a expressão anterior se modifica para: N εcr = (2) nn E A +E*A s s c sendo E* o módulo de deformação do concreto fissurado levando em consideração o amolecimento do concreto simples e a contribuição do concreto entre fissuras. Observando a Figura 3, o valor de E* é dado pela seguinte expressão: εcr εcr −1 E* = f ult nn (3) t εcr −εcr ult s1r onde f é a resistência à tração do concreto; ε é a deformação da armadura no estádio I no t s1r instante da primeira fissura; ε cr é a deformação última do trecho; e ε cr é a deformação ult nn média na fissura. Figura 3: Deformação média no modelo. Substituindo-se o valor do módulo de deformação do concreto fissurado definido na Eq.(3) na expressão da deformação média da Eq.(2), chega-se a: ε +εcr εcr =ε + f s2 ult (4) nn s2 tE ρ(εcr −ε )− f s ult s1r t que define o valor da deformação média da barra tracionada fissurada, sendo ε a deformação s2 da armadura calculada no estádio II (totalmente fissurado) e ρ a taxa de armadura na zona tracionada (ρ = A /A ). Para se determinar a deformação última do trecho, a deformação s c calculada pelo modelo distribuído é igualada à deformação média proposta pelo Código Modelo CEB-FIP 1990 (CEB, 1993), resultando na seguinte expressão: ( ) ( ) − fε + E ρε + f Aε −ε εcr = t s2 s s1r t s2r s1r (5) ult − f +E ρA(ε −ε ) t s s2r s1r A deformação última do primeiro trecho, ε cr(1) e a tensão f correspondem ao final do ult t,1 período de formação de fissuras. No segundo trecho, fissuração estabilizada, a tensão permanece constante enquanto a deformação cresce até o valor último de ε cr(2), ult correspondendo ao escoamento da armadura. Para a deformação última do terceiro trecho, correspondente ao período pós-escoamento da armadura, é imposto o valor de 10 ‰. Assim, o modelo de fissuração distribuída proposto leva em consideração a contribuição do concreto entre fissuras (tension-stiffening) em função da taxa de armadura. 3.1.2 MODELO DE FISSURA INCORPORADA Os modelos incorporados surgiram como uma alternativa para representar tanto o comportamento do concreto simples como o do concreto armado, combinando os pontos favoráveis dos modelos de fissuração discreta e distribuída, de modo que as fissuras possam se propagar em qualquer direção e os resultados obtidos sejam independentes da malha de elementos finitos utilizada. No caso do presente trabalho, pretende-se utilizar um modelo de fissura incorporada proposto por Dvorkin et al. (1990), no qual não é incluída a contribuição da armadura no equilíbrio interno de forças do elemento. A inclusão da parcela da armadura no modelo proposto será feita através da utilização de um modelo de transferência de tensão por aderência, conforme apresentado nos trabalhos de Russo et al. (1990) e Ávila (2003). Em seguida serão mostrados dois modelos constitutivos empregados para representar a transferência de tensão através da fissura. Um dos modelos constitutivos a serem implementados para simular a transferência de tensão na fissura é o de amolecimento linear representado na Figura 4. Este modelo está de acordo com os princípios da Mecânica da Fratura, já que a área limitada pela curva: tensão transmitida através da fissura x abertura da fissura (σ x w ) é igual energia de fratura do c c material (G). f Figura 4: Modelo constitutivo incorporado com amolecimento linear. Assim, o valor da máxima abertura de fissura que permite a transferência de tensão, w , é max expresso por: w = 2G f (6) max f t ao passo que, a energia de fratura é determinada, segundo o Código Modelo CEB-FIP 1990 (CEB, 1993), por: G = 0,0003(f )0.7 (7) f t Observando-se as expressões anteriores, verifica-se que o modelo necessita de um único parâmetro, a resistência à tração do concreto, f, como dado externo. Uma alternativa a ser t implementada para simular a transferência de tensão através da fissura é o modelo exponencial mostrado na Figura 5. De forma similar ao modelo linear, este modelo também está de acordo com os princípios da Mecânica da Fratura. As expressões que definem a curva de amolecimento são (Dvorkin et. al, 1990): ( ) σ = f exp −aw (8) s t c a = 0,95f /G (9) t f
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