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escola e democracia PDF

50 Pages·2011·2.49 MB·Portuguese
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5 Dermeval Saviani ESCOLA E DEMOCRACIA POLÊMICAS DO NOSSO TEMPO EDITORA@ AUTORES ASSOCIADOS Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (ClP) (Câmara Brasileira do Livro, SP,Brasil) Saviani,DerrnevaJ, 1944- Escola e democracia: teorias da educação, curvatura da vara, onze teses sobre educação epolítica!Dermeval Saviani.- 32.ed.- Campinas, SP:AutoresAssociados, 1999.- (Coleção polêmicas do nosso tempo; v.S) Bibliografia. ISBN BS-BS70 1-23·4 Sumário I. Auto-determinação (Educação) 2. Educação - Filosofia 3. Ensino 4. Pedagogia 5. Políticae educação I.Título. 11.Série. 95-5065 CDD-370.11S índices para catálogo sistemático: I.Educaçãoedemocrada 370.115 PREFÁCIO À 30' EDiÇÃO 5 I' Edição- t983 Impresso no Brasil- Junho de 1999 PREFÁCIO À 20' EDiÇÃO 7 APRESENTAÇÃO 13 Conselho Editorial: ASTEORIAS DA EDUCAÇÃO EO PROBLEMA DA Casemiro dos Reis FilIw, Dermeval Saviani, MARGINALIDADE 15 Gilberta S. de M. lannuzzi, Walter E. Garcia • D problema 15 Diretor Executivo • As teorias não·criticas 17 Flávio Baldy dos Reis • As teorias critico-reprodutivistas 27 Diretora Editorial • Para uma teoria crítica da educação .40 Gilberta S.de M. Jannuzzi • Post-scriptum 42 Capa ESCOLA EDEMOCRACIA 1- ATEORIA Vlad Canwrgo DA CURVATURA DA VARA. .47 Milton José de Almeida • O homem livre 49 Copyright © 1999by Editora Autores Associados • A mudança de interesses 52 EDITORA AUTORES ASSOCIADOS • Afalsa crença da Escola Nova 53 Caixa Postal 6164 •eEP:13081·970 •Campinas -SP • Ensino não é pesquisa 56 FoneIFax:(O 19)289·5930 • A Escola Nova não édemocrática 59 e-mail: [email protected] • Escola Nova: a hegemonia da classe dominante 60 Catálogo on-line: www.autoresassociados.com.br descontinuidade da política educacional, os vícios da má- quina administrativa, a escassez de recursos e a conse- qüente precariedade da educação pública. A década de 90 surge, assim, marcada por um clima de perplexidade e descrença. A orientação dita neoliberal assumida por Fernando Collor e agora pelo governo Fer- nando Henrique- Cardoso vem se caracterizando por políti· Prefácio à 20~edição cas educacionais claudicantes: combinam um discurso que reconhece a importância da educação com a redução dos investimentos na área e apelos à iniciativa privada e orga- nizações não-governamentais, como se a responsabilida- de do Estado em matéria de educação pudesse ser trans- ferida para uma etérea "boa vontad_epública". Nesse contexto não deixa de ser reconfortante o fato A primeira edição deste livro data de setembro de de que este livro, que se constitui ao meSmo tempo como 1983. Portanto, em pouco mais de quatro anos se esgotaram denúncia das formas disfarçadas de discriminação educa- 19 edições, cada uma delas com tiragem de 5.000 exempla- cional e anúncio de uma pedagogia superadora das desi- res. A acolhida vem sendo, pois, -calorosa, chegando mesmo gualdades, tenha atingido 30 edições, quase um terço de- alguns leitores a revelar grande entusiasmo por este trabalho. las já nessa difícil década de 90. A par da grande acolhida (e talvez mesmo por causa Efetivamente, se ascondições se tornaram adversas, dela), surgiram também algumas críticas. Obviamente, esta esse fato, em lugar de nos levar ao desânimo como infeliz- obra não está isenta de limitações e defeitos. A julgar pelos mente tende a acontecer, deve nos conduzir a ampliar a depoimentos dos leitores, o reconhecimento de limitações nossa capacidade de luta, organizando-nos mais fortemen- nãoobscurece os méritos que o trabalho contém. te e atuando decisivamente no interior das escolas e junto Assim, o primeiro texto, se não esgota a temática que ao Estado no sentido de transformar em verdade prática a aborda, constitui uma síntese clara e didática das principais consciência, já consensual, da importância estratégica da teorias da educação, o que tem sido sobremaneira útil aos educação e da urgência da resolução de Seus problemas. educadores ajudando-os na compreensão de sua prática e Que esse livro continue a auxiliar os educadores de permitindo·lhes situarem-se mais claramente no universo pe- todos os níveis e de todas as regiões deste país em sua dagógico.Os próprios críticos têm se beneficiado dessa sín- luta tenaz por uma educação de qualidade acessível a to- tese já que nela se apóiam, o que implica um endosso da dos os brasileiros, é a única recompensa que almeja o seu classificação e análise das teorias pedagógicas aí apresen· autor. ladas. O segundo texto tem um caráter preparatório para a Campinas, 19 de março de 1996. teoria crítica da educação que fora apenas anunciada no 1 texto anterior e cujo eSboço éobjeto da exposição efetuada Dermeval Saviani I no terceiro texto. Trata-se dé uma abordagem centrada mais no aspecto polêmico do que no aspecto gnosiol6gico. Por is- 7 6 f:O, mutatis mutandis, vale para ele a observação feita por Dessa forma, a denúncia da Escola Nova é apenas Gramsci a propósito da critica de Groce à concepção mar- uma estratégia visando ademarcar mais precisamente o âm- xista de "superestrutura ideológica": "Quando, por razões bito da pedagogia burguesa de inspiração liberal e o âmbito 'políticas', práticas, para tomar um grupo social independente da pedagogia socialista de inspiração marxista. Aliás, não foi da hegemonia de um outro grupo, fala-se de 'ilusão', como é outro o comportamento do próprio Marx que, em 1848,ao se engajar na luta política -elostrabalhadores na Alemanha não possfvel - de boa-fé - confundir uma linguagem polêmica com um principio gnosiológico?" (Gramsci, 1978: 261). A par se negou a participar do Movimento Democrático sob a con- dos limites ligados ao caráter polêmico, a exposição contém dição, porém, de deixar sempre explícita a diferença entre a também defeitos de estilo derivados do fato de ser transcri- perspectiva proletária e aquela dos burgueses e pequeno- ção direta de uma fala não baseada em texto escrito. Daf o burgueses progressistas (cf. Fedosseiev at alii, 1983: 190). tom oral de que está impregnada. O mérito do texto é antes De minha parte, tenho procurado sistematicamente estabele· h,eurfstico do que analitico. Não se trata de uma exposição cer esta diferenciação como pode ser comprovado de forma exaustiva e sistemática, mas da indicação de caminhos para recorrente em meus diferentes trabalhos. Dentre eles, cito a crítica do existente e para a descoberta da verdade históri- como exemplo o texto "A defesa da escola pública" que de- ca. O leitor encontra arum estfmulo para um ajuste de contas veria integrar este livro, o que não ocorreu por falta deespa~ consigo mesmo ante as tendências pedagógicas com as. ço - e esta é outra limitação da presente obra. No refe- rido texto me empenho em demarcar a perspectiva burguesa quais tem se envolvido. Se na polêmica avulta a questão da Escola Nova, isto da perspectiva socialista, explicitando os limites da concep- não deve induzir a equfvocos. Este não é um livro contra a ção liberal na defesa da escola pública e registrando como o Escola Nova enquanto tal. É, antes, um livro contra a peda- próprio movimento popular acabou por cair na armadilha da "ilusão liberai" (Saviani, 1984: 10-25). gogia liberal burguesa. Por isso, enganam-se aqueles que imaginam que, por efetuar a critica à Escola Nova, o autor É esse e não outro o sentido que assume neste livro a desta obra estaria de algum modo reabilitando a pedagogia crrtica à Escola Nova. Nesse contexto chegam a soar um burguesa. Ora, não se nega à Escola Nova o seu caráter tanto deslocadas as abordagens que, provocadas por este progressista em relação à Escola Tradiciooal. Aliás, isso está trabalho, pretendem reabilitar a Escola Nova a partir da pers- , formalmente explfcito no terceiro texto. Entretanto, enquanto pectiva proletária. I proposta burguesa, a Escola Nova articula em torno dos inte- 1~ resses da burguesia os elementos progressistas que, obvia- Demarcadas as perspectivas, feita a crítica da visão li- b mente, não são intlinsêcamente burgueses. É dessa forma berai burguesa, os elementos progressistas desarticulados i"l que a burguesia trava a luta pela hegemonia procurando su- da concepção dominante são, no terceiro texto, articulados " :,H1 bordinar aos seus interesses os interesses das demais no âmbito da perspectiva pedagógica correspondente aos , classes. Do ponto de vista do proletariado a luta hegemônica interesses da classe trabalhadora. Ainda que não se tenha implica o processo inverso: "Trata-se de desarticular dos in- podido explorar e aprofundar suas diversas implicações, teresses dominantes aqueles elementos que estão articula- avança-se ardecididamente na formulação de uma teoria crf~ dos em torno deles, mas não são inerentes à ideologia domi- tica (não-reprodutivista) da educação a qual, como foi assi- nante e rearticulá-Ios em torno dos interesses dominados" nalado no final do primeiro texto, s6 pode ser formulada do (Saviani, 1980: 10-11). ponto de vista dos interesses dominados (cf. p.41). 8 9 o último texto, "Onze teses sobre educação e política", classe, poiscom aconquista dopoder pelo proletariado, queé procura situar o debate pedagógico muito além dos acanha- aclasse cujo domínio consiste nasuperação das classes, já dos limites geralmente marcados pela repetição de slogans nãoháoutra classe queaele sepossa contrapor como histori- esvaziados de conteúdo. Com efeito, sem perder de vista a camente progressista. Seria, então, o próprio proletariado? realidade concreta da sociedade de classes, projetou-se a Naverdade, nãosetratajá dadestruição do Estado. Umavez reflexão para o horizonte de possibilidades, isto é, para o cumprido o papel de instrumento coercitivo para inviabilizar momento da passagem do reino da necessidade ao reino da astentativas derestauração do poder burguês, oEstado (so- liberdade, o momento da constituição da sociedade sem ciedade política), nãosendo maisnecessário, desaparecerá. classes, momento catãrtico por excelência em que toda a A concepção acima exposta é encontrada reitera- sociedade humana se reencontra consigo mesma. A alguns tivamente nos escritos de Marx, resultando, assim, um leitores parece ter e~capado tal intento, talvez em razão do contrasenso invocar esse autor para desautorizar a linha caráter lapidar das teses formuladas e da economia das ex- de reflexão por mim desenvolvida (cf. Marx, s.d.: 38; Marx, plicações apresentadas (seria este outro defeito do livro?). A 1974: 80 e 90; Marx, 1968: 47-8; Marx, 1984: 62-8). Para questão do "desaparecimento do Estado" permite ilustrar es- economia deste prefácio, cito apenas ofinal de A miséria se ponto. No texto afirmo: "Sabe-se que não se trata de des- da filosofia: "Somente numa ordem de coisas em que não truir o Estado; ele simplesmente desaparecerá por não ser existem mais classes e antagonismos entre classes as mais necessário" (cf. p. 96). Obviamente, o contexto aí é o evoluções sociais deixarão de ser revoluções políticas" da passagem do reino da necessidade ao reino da liberdade, (Marx, 1985: 160). O mesmo se diga de Gramsc;: "Ofim do portanto, a passagem do socialismo ao comunismo que sig- Estado sublinhado por Marx e Lênin é concebido por nifica o advento da sociedade sem classes. Conseqüente- Gramsci como aabsorção, pela sociedade civil, dasocie- mente, o Estado que fora utilizado pelo proletariado como dade política que, numa sociedade sem classes, estádes- instrumento de transição para a sociedade sem classes, ao tinadaà extinção naproporção enamedida emque sehar- ser esta consolidada, perde a razão de ser e desaparece. monizam os interesses do proletariado eos interesses do Que dizer então da interpretação que considera a colo- conjunto do corpo social" (Grisoni &Maggiori, 1973: 177- cação supra como indicadora deque o Estado burguês nãoé 8). Nas palavras do próprio Gramsci: <lAclasse burguesa destruído mas consente no seu desaparecimento? Antes de está 'saturada'; não só não se amplia, mas se desagrega; qualquer outra consideração, cabe registrar que tal interpre- não só não assimila novos elementos, mas desassimila tação não corresponde ao que foi registrado no texto. Com uma parte de si mesma (ou, pelo menos, as desas- efeito, lá está escrito: "sabe-se que não se trata de destruir o similações são muitíssimo mais numerosas do que as as~ Estado"; e não: "sabe-se quenão se trata de destruir ()Esta- similações). Uma classe que se considere capaz de as- do burguês". Nesse ponto da reflexão supõe-se já superada similartodaa sociedade, eaomesmo tempo seja realmen- a sociedade burguesa. Ora, a revolução socialista (proletária) te capaz de exprimir este processo, leva à perfeição esta não destrói o Estado em si mesmo. Ao conquistar o poder, o con cepção do Estado edo direito, detal modo aconceber o proletariado, através do mesmo ato revolucionário, destitui fim do Estadoedodireito, emvirtudedeterem eles comple- (destrói) o Estado burguês e constitui o Estado proletário. Co- tado asua missão e deterem sido absorvidos pela Socie- mo falar, nessa nova situação, de destruição do Estado? dade Civil" (Gramsci, 1976: 147). E, mais adiante: "O ele- Quem destruirá o Estado proletário? Não será uma outra mento Estado-coerção pode ser imaginado em processo 11 10 de desaparecimento, à medida que se afirmam elementos cada vez mais conspícuos de sociedade regulada (ou Estado ético ou sociedade civil)" (Gramsci, 1976: 149). Para esta edição foi feita uma revisão de todo o traba- lho corrigindo-se algumas falhas de impressão ao mesmo tempo em que se procurou minorar os defeitos de estilo do segundo texto. Apresentação Agradecendo a confiança dos leitores espero que os esclarecimentos deste prefácio os ajudem a melhor compre- ender as posições assumidas pelo autor. Os comentários feitos tiveram apenas essa intenção, não cabendo, pois, in- terpretá-los como resposta às objeções dos crfticos. Pelo respeito que merecem os colegas que valorizaram este tra- balho com suas apreciações, cabe considerá-las uma a uma de forma detida. Como não é possível fazer isso num simples Este pequeno livro foi organizado da seguinte maneira: prefácio, tais considerações são relT)etidas para outro mo~ o primeiro texto reproduz o artigo "As teorias da educação e menta eoutro lugar. o problema da marginalidade na América Latina" publicado originalmente em Cadernos de Pesquisa, n2 42, a90sto/82, da Fundação Carlos Chagas. Os textos seguintes, Escola e Democracia (I) e Escola São Sepé (RS), 26 de janeiro de 1988 e Democracia (11)reproduzem, respectivamente, os artigos "Escola e democracia ou a 'teoria da curvatura da vara' ", oAutor ANDE, 1981 e "Escola e democracia: para além da 'teoria da curvatura da vara' ",ANDE, 1982. O último texto, Onze teses sobre Educação e Polftica, foi escrito especialmente para integrar a presente publicação. Seu objetivo é encaminhar, de modo explrcito, a discussão das relações entre educação e política já que ar reside a questão central que atravessa de ponta a ponta o conteúdo deste livro. Dada a estreita conexão entre os artigos acima men- cionados, tem havido uma tendência a estudá-los conjunta- mente, o que, entretanto, tem sido obstado pelas dificuldades em encontrá-los disponfveis nas livrarias. Adecisão de reuni- los numa mesma publicação atende, assim, à solicitação de diversos leitores no sentido de contornar aquelas dificulda- des. 12 13 ESCOLA EDEMOCRACIA li - PARAALÉM DATEORIA DA CURVATURA DAVARA 69 • Pedagogia nova e pedagogia da existência 71 • Para além das pedagogias da essência e da existência 73 • Para além dos métodos novos etradicionais 76 • Para além da relação autoritária ou democrática na sala de aula 85 Prefácio à 3011 edição 0.0 ••••••••••••••••••••••••••••• _••••••••••••••••• • Conclusão: a contribuição do professor 88 ONZE TESES SOBRE EDUCAÇÃO E POLíTlCA 91 BIBLlOGRAFIA GERAL. 103 Quando essa obra foi lançada asociedade brasilei- ra passava por uma fase de grande mobilização. Estáva- mos no início da década de 80 e os primeiros frutos das lutas pela democratização começavam a ser colhidos. Em 1983 tomavam posse os governadores de Estado eleitos diretamente, após quase 20 anos de eleições in- diretas controladas pelo regime militar instalado no po- der em conseqüência do golpe de 1964. "Escolae Demo- cracia" vinha a público em setembro de 1983 e começa- vam -se asarticu lações emtorno dacampanha pelas elei- ções diretas para presidente da República, campanha essa que seria ofato político mais saliente de 1984. Nocontexto indicado era intensa amobilização dos e- ducadores, carregada de expectativas favoráveis. Espera- va-se que, no quadro das transformações políticas, aedu- caçãoencontrarlacanaisadequados parasedesenvolverno sentido da universalização da escola pública, garantindo um ensino de qualidade atoda a população brasileira. En- saios nessa direção foram tentados por alguns governos estaduais emunicipais, mas os desdobramentos da transi- -çãodemocrática no âmbito da chamada "Nova República" não corres ponderam àquelas expectativas educacionais. Emverdade, oreferido processo detransição acabou sen- do dominado pela "conciliação das elites", mantendo-se a 5 Esperamos que este livro, a exemplo dos artigos que lhe deram origem, continue a auxiliar professores e alunos na busca de uma compreensão mais sistemática e crrtica das diferentes teorias da educação. Finalmente, aproveitamos a oportunidade para agrade- AS TEORIAS DA EDUCAÇÃO cer a Cadernos de Pesquisa, Revista de estudos e pesqui- sas em Educação, da Fundação Carlos Chagas e ANDE, Revista da Associação Nacional de Educação pela anuência EOPROBLEMA à inclusão dos artigos napresente obra. DA MARGINALIDADE São Paulo, setembro de 1983. o PROBLEMA DERMEVAL SAVIANI De acordo com estimativas relativas a 1970,"cerca de 50% dos alunos das escolas primárias desertavam em con- dições de sernianalfabetismo ou de analfabetismo potencial na maioria dos pafses da América Latina" (Tedesco, 1981: 57). Isto sem levar em conta o contingente de crianças em idade escolar que sequer têm acesso à escola e que, por- tanto,já se encontram apriori marginalizadas dela. O simples dado acima indicado lança de imediato em nossos rostos a realidade da marginalidade relativamente' ao fenômeno da escolarização. Como interpretar esse dado? Como explicá-lo? Como as teorias da educação se posicio- nam diante dessa situação? Grosso modo, podemos dizer que, no que diz respeito à questão da marginalidade, as teorias educacionais podem ser classificadas em dois grupos. Num primeiro grupo, temos aquelas teorias que enten- dem ser a educação um instrumento de equalização social, portanto, de superação da marginalidade. Num segundo grupo, estão as teorias q~e entendem ser a educação um instrumento de discriminação social, logo, umfator de marginalização. 14 15 Ora, percebe-se facilmente que ambos os grupos ex- Nessesentido, aeducação, longe deseruminstrumento desu- plicam a questão da marginalidade a partir de determinada peração da marginalidade, se converte num fator de margi- maneira de entender as relações entre educação e socieda- nalização já que sua forma específica de reproduzir a margi- de. Assim, para o primeiro grupo a sociedade é concebida nalidade social é a produção da marginalidade cultural e, es~ como essencialmente harmoniosa, tendendo à integração de pecificament~scolar. seus membros. A marginalidade é, pois, um fenômeno aci- Tomando como critério de criticidade a percepção dos ',1 dentai que afeta individualmente a um número maior ou me- condicionantes objetivos, denominarei as teorias do primeiro nor de seus membros o que, no entanto, constitui um desvio, grupo de"teoriasnão-críticas" jáqueencaramaeducaçãocomo uma distorção que não 56 pode como deve ser corrigida. A autônoma e buscam compreendê-Ia a partir dela mesma. In~ educação emerge ar como um instrumento de correção des- versamente, aquelas do segundo grupo são críticas uma vez sas distorções. Constitui, pois, uma força homogeneizadora que se empenham em compreender aeducação remetendo-a que tem por função reforçar 05 laços sociais, promover a sempre aseus condicionantes objetivos, istoé,aosdeterminan- coesão e garantir a integração de todos os indivíduos no cor- tes sociais, vale dizer, à estrutura sócio-econômica que con- po social. Sua função coincide, pois, no limite, com a supera- diciona aforma de manifestação do fenômeno educativo. Co- ção do fenômeno da marginalidade. Enquanto esta ainda mo, porém, entendem que afunção básicada educação éare- produção dasociedade, serãopormimdenominadas de"teorias existe, devem se intensificar os esforços educativos; quando crítico-reprodutivistas" . for superada, cumpre manter os serviços educativos num ní~ vel pelo menos suficiente para impedir o reaparecimento do problema da rQWginalidade. Como se vê, no que respeita às relações entre educação e sociedade, concebe~se a educa~ AS TEORIAS NÃO-CRíTICAS ção com uma ampla margem de autonomia em face da so~ ciedade. Tanto que lhe cabe um papel decisivo na conforma- ção da sociedade evitando sua desagregação e, mais do que A PEDAGOGIATRADICIONAL ,H I isso, garanlindo a construção de uma sociedade igualitária. Já o segundo grupo de teorias concebe a sociedade A constituição dos chamados "sistemas nacionais de como sendo essencialmente marcada pela divisão entre gru- ensino" data de meados do século passado. Sua organiza- pos ou classes antagônicos que se relacionam à base da ção inspirou-se noprincípio dequeaeducação édireito deto- força, a qual se manifesta fundamentalmente nas condições dos edever doEstado. Odireito detodos àeducação decorria de produção da vida material. Nesse quadro, a marginalidade do tipo desociedade correspondente aos interesses danova é entendida como um fenômeno inerente à própria estrutura classe que seconsolidara nopoder: aburguesia. Tratava-se, da sociedade. Isto porque o grupo ou classe que detém maior pois, de construir uma sociedade democrática, de consoli- força se converte em dominante se apropriando dos resulta~ dar a democracia burguesa. Para superar a situação de dos da produção social tendendo, em conseqüência, a rele~- opressão, própria do "Antigo Regime", eascender aumtipo gar os demais à condição de marginalizados. Nesse contex- de sociedade fundada no contrato social celebrado "livre- to, a educação éentendida como inteiramente dependente da mente" entre os indivíduos, era necessário vencer abarreira da ignorância. Só assim seria possível transformar os súditos estrutura social geradora de marginafidade, cumprindo ar a 'função de reforçar a dominação e'legitimar a marginalização. em cidadãos, istoé, emindivíduos livres porqueesclarecldos, 16 17 A PEDAGOGIA NOVA ilustrados. Como realizar essa tarefa? Através do ensino. A escola é erigida, pois, no grande instrumento para converter As críticas à pedagogia tradicional formuladas a partir os súditos em cidadãos, "redimindo os homens de seu duplo do final do século passado foram, aos poucos, dando origem pecado histórico: a ignorância, miséria moral e a opressão, a uma outra teoria da educação. Esta teoria mantinha a cren- miséria política" (ZanoUi, 1972: 22-3). ça no poder da escola e em sua função de equalização so- Nesse quadro, a causa da marginalidade é identificada cial. Portanto, as esperanças de que se pudesse corrigir a com a ignorância. Émarginalizado da nova sociedade quem distorção expressa no fenômeno da marginalidade, através não é esclarecido. A escola surge como um anUdoto à igno- da escola, ficaram de pé. Se a escola não vinha cumprindo rância, logo, um instrumento para equacionar o problema da essa função, tal fato se devia a que o tipo de escola implan- marginalidade. Seu papel é difundir a instrução, transmitir os tado - a escola tradicional - se revelara inadequado. Toma conhecimentos acumulados pela humanidade e sistematiza- corpo, então, um amplo movimento de reforma cuja expres- dos logicamente. O mestre-escola será o artífice dessa gran- são mais típica ficou conhecida sob o nome de "escolano- de obra. A escola se organiza, pois, como uma agência cen- vismo". Tal movimento tem como ponto de partida a escola trada no professor, o qual transmite, segundo uma gradação tradicional já implantada segundo as diretrizes consubstan- lógica, o acervo cultural aos alunos. A estes cabe assimilar ciadas na teoria da educação que ficou conhecida como pe- os conhecimentos que lhes são transmitidos. dagogia tradicional. A pedagogia nova começa, pois, por efetuar a crftica da pedagogia tradicional, esboçando uma À teoria pedagógica acima indicada correspondia de- nova maneira de interpretar a educação e ensaiando implan- terminada ma~ira de organizar a escola. Como as iniciativas tá-Ia, primeiro, através de experiências restritas; depois, ad- cabiam ao professor, o essencial era contar com um profes- vogando sua generalização no âmbito dos sistemas escola- sor razoavelmente bem preparado. Assim, as escolas eram res. organizadas na forma de classes, cada uma contando com Segtlndo essa nova teoria, a marginalidade deixa de um professor que expunha as lições que os alunos seguiam ser vista predominantemente sob o ângulo da ignorância, isto atentamente e aplicava os exercícios que os alunos deveriam é, o não domfnio de conhecimentos. O marginalizado já não realizar disciplinadamente. é, propriamente, o ignorante mas o rejeitado. Alguém está in- tegrado não quando é ilustrado, mas quando se sente aceito Ao entusiasmo dos primeiros tempos suscitado pelo ti- pelo grupo e, através dele, pela sociedade em seu conjunto. po de escola acima descrito de forma simplificada, sucedeu É interessante notar que alguns dos principais representan- progressivamente uma crescente decepção. A referida es- tes da pedagogia nova se converteram à pedagogia a partir cola, além de não conseguir realizar seu desiderato de uni- da preocupação com os "anormais" (ver, .por exemplo, De· versalização (nem todos nela ingressavam e mesmo os que croly e Montessori). A partir das experiências levadas a ingressavam nem sempre eram bem sucedidos) ainda teve efeito com crianças "anormais" é que se pretendeu generali- de curvar-se ante o fato de que nem todos os bem-sucedidos zar procedimentos pedagógicos para o conjunto do sistema se ajustavam ao tipo de sociedade que se queria consolidar. escolar. Nota-se, então, uma espécie de biopsicologização Começaram, então, a se avolumar as críticas a essa teoria da sociedade, da educação e da escola. Ao conceito de "a- da educação e a essa escola que passa a ser chamada de normalidade biológica" construído a partir da constatação de escola tradicional. 19 18

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nosso tempo; v.S). Bibliografia. ISBN BS-BS70 1-23·4 aparelhos ideológicos de Estado. A partir desses instrumentos conceituais, Althusser (s/ d.
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