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Escola, classe e luta de classes PDF

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Georges Snyders Escola, Classe e Luta de Classes MDM COPIADORA c EDITORA FCHF— UFG Livro Completo Capa: Paulo Gaia Editoração: ConexãoEditorial ProduçãoEditorial:AdalmirCaparrós Fagá FotolitosdeCapa: SMFotolito Impressão eAcabamento:BartiraGráficaeEditoraS/A SUMÁRIO 1ºEdição—Abril de2005 TítuloOriginal: École, ClasseetLuttedes Classes O 1976—by: Presses Universitairesde France Tradução: Leila Prado Introdução 11 Primeira Parte A escola e as suas separações Snyders, Georges Escola, classe e luta de classes / Georges Aspectos positivos 17 Snyders ; (tradução Leila Prado). — São Paulo: Primeiro tema: Não sepode entenderhoje uma Centauro, 2005. ideologia que não tome emconsideração a contribuição dos nossos cinco autores 17 Título original : École, classe et lutte des classes Bibliografia. É Bourdieu-Passeron decifram as desigualdades 19 H- Baudelot-Establet: A escola e os seus antagonismos 26 1. Baudelot, Christian 2. Boudieu, Pierre, H- Illich abre perspectivas mundiais 28 1930- 2002 3. Conflito social 4. Escolas-—Aspectos Segundo tema: Reclamamospara o marxismo sociais 5. Establet. Roger 6. Iltich, Ivan umdireito deprioridade 30 7. Passeron, Jean-Claude 8. Sociologia educacional I. Título. A luta contra a diferenciação dos Ciclos Escolares confunde-se com a luta pelo socialismo 33 05-2247 CDD-306.432 H- Como conduzir a luta contra os ciclos diferenciados 45 Primeiro tema: 4 escola divisionista 45 I- As duas redes de Baudelot-Establet 45 Índices para catálogo sistemático: H- Os conteúdos do PP como sub-produtos 56 1. - Escola e sociedade : Sociologia educional HJ- Humilhação, Humildade 68 306.432 Segundo tema: À escola reprodutora e conspiradora 75 O2005 daTradução: Terceiro tema: A burguesia não confia na escola 84 CENTAURO EDITORA I A crise da escola atinge também a burguesia 84 TravessaRoberto SantaRosa, 30 H- A burguesia reconheceuaescola 02804-010—SãoPaulo—SP como sua cúmplice? 89 Tel. 11 —3976-2399—Tel./Fax 11 —3975-2203 E-mail: editoracentauroOterra.com.br HI- Descolarização 91 www.centauroeditora.com.br feio GEORGESSNYDERS ESCOLA,CLASSEELUTADECLASSES Conclusão da Primeira Parte 95 Terceira Parte E Os ciclos, divisão da sociedade em classes 95 Realidade e Irrealidade da Cultura H- As forças positivasjápresentes na escola 99 I- IHlich ou “Não conheço a Luta de Classes” 195 HI- A escola como local de lutas 101 Primeiro tema: A cultura doperito reduzirá a zero IV- Autonomia do ensino pedagógico? 105 a cultura dó homemvulgar? 196 V- Voltando uma vez mais aos nossos autores 109 I A convivência: recordação de alguns temas 196 Segunda Parte H- Antecipação ou nostalgia? 204 O Combate não principia porfalta de combatentes HI- Uma luta impiedosa entre os especialistas e os homens vulgares 206 É TIlich - A escola prepara para o servilismo? 115 IV- O sucesso de Illich provém de ele reunir experi- Primeiro tema: Escola, não-escola, antiescola 116 ências muito fregiientes 210 I O que vem a ser uma escola? 16 V- A cultura dos especialistasjá é umarealidade H- Da boa utilização possível de Illich e conquistará terreno e eficácia numa e dos seus limites 120 sociedade transformada 218 Segundo tema: Existirá o marxismo? 123 Segundo tema: Cortarcom a escola? 234 Terceiro tema: Soube Illich interpretara É Adquirimos os nossos conhecimentos pelo recusa dosjovens? 129 não-sistemático 234 Quarto tema: O alargamento do ensino: progresso ou Il- Reflexões críticas sobre as redes 237 condenação? 131 Terceiro tema: A morte da escolapara Hlich epara os H- Baudelot-Establet - A escola transformará os alunos pedagogos soviéticos daprimeira geração 252 em pobres pequenos seres privados da realidade? 135 I A escola definha 252 Primeiro tema: Criança modelo 135 H- O lado exato e o lado utópico 256 Segundo tema: À relação teoria-prática 138 HI- Para uns a escola morre em beleza, para outros Terceiro tema: O que vem a sera escolapolitécnica? 144 apocalipticamente 265 I- O que foi realizado na China é prodigios 145 H- Gramsci como antídoto de Illich 267 Il- Regresso ao marxismo 152 H- Bourdieu-Passeron ou A Luta de Classes Impossível 275 Hl- A escola politécnica na RDA 156 I A seriedade prejudica, a desenvoltura compensa 275 I- Como se realiza a escolha dos estudos 161 H- O ensino constitui o segundo grau dairrealidade 284 I Interiorização do destino estatístico 161 HI- Apesar de tudo alguns momentos dialéticos 290 IÉ- E, contudo... 164 IV- As diferentes utilizações da cultura 297 IV- Bourdieu-Passeron - A ideologia dos dotes 171 Primeiro tema: Utilização conservadora da cultura 297 Primeiro tema: Bourdieu-Passeron desmontam a Segundo tema: Restituira cultura a siprópria 300 ideologia das classes dominantes 17 H O papel da alegria no combate político 302 Segundo tema: Bourdieu-Passeron ajudam-nosa H- “Três exemplos das relações entre a ideologia lutarcontra as mistificações 176 dominante e a ideologia dominada 313 Terceiro tema: Subsistem gravesproblemas 181 V- Baudelot-Establet ou A Luta de Classes Inútil 319 Conclusão da Segunda Parte 191 GEORGESSNYDERS Primeiro tema: A ideologiaproletária como manifestação repentina ou como conquista 319 I- Constituição da ideologia proletária 319 I- Validade da existência proletária 323 IM- A escola não é necessariamente inútil 333 Segundo tema: Questões de linguagem 339 E As duas linguagens servem uma recíproca INTRODUÇÃO incompreensão 339 I- Os que viram a cara quando um popular abre a boca 342 Nl- A contribuição dos lingiistas 349 A falha evidente nos meus dois livros anteriores con- VI Duplo rosto das crianças do proletariado 357 Primeiro tema: Os que vêem apenas, nosfilhos da sistia no fato de eu quererrefletir acerca da pedagogia pro- classeproletária, apositividade 358 gressista a partir de contextos progressistas e de relações Segundo tema: Descobriro duplo rosto dopróprio educativas progressistas, mas sem ressaltar os problemas das proletariado 365 estruturas do ensino e das diversas clientelas privativas dos Terceiro tema: Voltando às crianças doproletariado 369 vários tipos de ensino. Daí a importância, neste momento, de Conclusão - Para uma escola progressista 383 um reencontro e de uma confrontação com a sociologia da E como não chego a uma conclusão 397 educação. Notas Bibliográficas 399 Novaleitura crítica de cinco autores: todavia, a minha intenção não é de forma alguma medi-los todos pela mesma medida; espero que as diferenças surjam, saltando aos olhos, tanto pelo conteúdo do que será dito a seu respeito como pelo tom das observações ou da discussão. Para Bourdieu-Passeron!, todos quantos se ocupam da escola são devedores de contribuições absolutamente funda- mentais, quer no domínio diretamente escolar, quer na refle- xão sobre a cultura livre ou a ideologia dos dotes. Baudelot-Establet? têm a extraordinária virtude de ha- ver aplicado à pedagogia uma análise marxista e, assim, trouxeram à luz do dia as ilusões é os logros que se geravam em redor do tema da escola única. ' Pierre Bourdieu eJean-ClaudePasseron, educadoresesociólogos franceses. 2*Chri.s.t..ian Baudelote RogerEstablet,educadoresesociaólogos franceses. 10 ll GEORGESSNYDERS ESCOLA,CLASSEELUTADECLASSES Com estes quatro autores, muito aprendemos, muito impossíveis de saciar. E deste modo se confirmaria que a fixamos, mesmo se tentamos interpretá-los diferentemente, escola não possui em si qualquer força capaz de a fazer pro- inserindo num outro contexto aquilo que nos levaram a gredir. Falta de esperança, fatalismo e responsabilização dos descobrir. docentes. Pelo contrário, a obra de Illich! surge-nos como essenci- O que leva uns a abandonara luta, outros a se consa- almente mistificadora: sem dúvida, que os perigos por ele grar exclusivamente à política, renunciando à fachada peda- denunciados tanto na nossa escola como na nossa sociedade gógica; se a escola se reduz a uma fraude total ou a um erro estão longe de ser imaginários, mas sustentamos que, do absoluto, a pedagogia é diversão, ilusão, e assim se manterá princípio até o fim, ele opera um verdadeiro desvio intelec- até que a sociedade seja abalada. tual que transforma as acusações em lugares-comuns, acaba Os meus estudantes interpretaram mal os autores, ou sou- por mascarar as causas e as responsabilidades e propõe solu- beram tirar porsi conclusões que eles não dão explicitamente? ções emprestadas pelo habitual arsenal da utopia — mas a Foi para lutar contra este derrotismo que quis escrever utopia evidente remete para a realidade do conservantismo. . o presente livro. Não se trata de desculpar a escola, não se Por que, então, já que são diferentes, reunir num único voltará ao âmbito das constatações fundamentais, não se apre- estudo estes cinco autores? sentará a escola como libertadora, ou única, ou acolhendo Parece-nos que, efetivamente, eles tendem a exercer igualmente uns e outros, não repetiremos que há indistinta- sobre os seus leitores uma influência muito mais homogênea mente tão bons alunos entre os ricos como entre os pobres. do que nos permitiria supor o exame das suas obras. O que Mas, precisamente a partir destas acusações, e para que Julgamos observar nos nossos estudantes — e há vários anos elas não se transformem num travão no preciso momento em — é que uns e outros, por vias diferentes, lhes transmitem a que nos apontaram o caminho mais justo, em que contáva- sensação de uma escola onde nada de válido se passa, a cul- mos que fossem abrindo caminho à nossa ação — e até su- tura aí dispensada não conteria o mínimo valorreal e, desde pomos que estão prestes a fazê-lo — surge uma tarefa» logo, a escola deixaria de ser um local onde o combate pela urgente: inserir a escola na luta de classes, compreender co- ; democracia socialista é possível e necessário. mo participa a escola nessa luta de classes; porque é, em; Uma escola como puro e simples instrumento de re- última instância, o desconhecimento do que é a luta de clas-: produção social, manobrando para esmagar osfilhos do pro- ses que, nos nossos cinco autores, nos parece arrastar, por ' letariado, ou, segundo Illich, para levar ao servilismo as processos evidentemente muito diversos, âquilo que ousa- crianças de todas as classes. As matérias estudadas destinam- mos considerar como os seus desvios. se apenas a permitir aos jovens de boa família distinguir-se Para Illich todos são igualmente culpados e supõem do vulgo, a fim de convencer os pequenos proletários da sua poder lançar um apelo indistintamente a qualquer um para indignidade; para perverter todas as crianças arrastando-as a trabalhar a favor da convivência total; as reivindicações do um consumo desenfreado, excitando desejos e necessidades proletariado não passam de desejos de consumir mais, dese- Jos tão nefastos e insensatos como os dos burgueses. i Ivan Hli+ch, teó2logoeeducadoraustríe.aco. 12 13 GEORGESSNYDERS ESCOLA,CLASSEELUTADECLASSES Para Baudelot-Establet, a luta de classes parece desem- assalariado é a forma extrema da alienação e produz as con- penhar um papel de primeiro plano. Mas, na realidade, basta- dições plenas do desenvolvimento íntegro e universal das ria deixar o proletariado exprimir-se, viver a sua cultura, tal forças produtivas do indivíduo. como elejá a constituiu, não reprimir as suas atitudes espon- Marx acrescenta que é “sob uma forma invertida, de tâneas; o proletariado e os filhos do proletariado são evoca- pernaspara o ar” — e nisso se situa a resposta a Baudelot- dos comojá havendo atingido, pela sua experiência própria e Establet: o proletariado tem de contribuir com um esforço imediata, um tal ponto de realização, para não dizer de per- imenso para ultrapassar as suas próprias divisões, concen- feição, que parece supérfluo um partido operário tendo como trar-se numa força única, escapar às mistificações das ideo- tarefa organizar as ações, coordená-las e adaptá-las a todo logias dominantes; de onde se deduz que a vanguarda da momento às possibilidades objetivas desse mesmo momento. classe operária, os sindicatos e o partido desempenham um Sob este aspecto diríamos que, comeles, a luta de classes se papel insubstituível: fazer jorrar das massas esta verdade revela inútil. combativa de que são portadoras, mas que tantos riscos corre À luta de classes parece impossível na perspectiva de de ser sufocada, dispersada, esmigalhada, contrariada. Bourdieu-Passeron, porque as classes dominadas são a tal É o marxismo no seu conjunto que deveríamos evocar ponto cúmplices do patronato, convencidas da sua indigni- para respondera Illich, visto que é o marxismo no seu conjun- dade, que não se distingue verdadeiramente o que poderia to que é ignorado. Como repete Illich e com ele o grupo dos constituir o elemento propulsor do seu combate. conservadores, eles estão sempre descontentes; quanto mais fAssume por isso uma extraordinária importância situar têm, mais lhes dão e mais querem. Mas a luta dos explorados com precisão o conceito marxista da luta de classes.|Não como rompendo caminho até uma sociedade sem classe e temos a pretensão de o conseguir em breves linhas, masgos- constituindo, assim, a própria positividade da história. taríamos simplesmente de responder a Bourdieu-Passeron Tendo sido levado sem descanso a combater em duas que o proletariado encontra na sua experiência cotidiana os frentes: contra o conservantismo, as ilusões lenificantes que motivos e a força necessários à sua luta. ele quer difundir, para desarmar os trabalhadores e contra O capitalismo é o mundo da exploração, mas esse mun- certas impaciências que se transformam em renúncias, espe- do nunca é uma propriedade exclusiva, lugar seguro e ro não ter caído no meio termo, nem no compromisso, nem aprazível da classe dominante; esta não deixa de esbarrar com no há algo de bom e algo de mau em cada posição e em ca- as forças da oposição, pois ela própria as suscita. Dirá Marx da autor. Tudo quanto posso afirmar é que me esforcei por que “todo o desenvolvimento do capitalismo se processa de tomara escola como local de contradições dialéticas”. maneira antagônica... sob uma forma contraditória”. E, que é “pelo desenvolvimento histórico dos antagonismos imanen- tes”, que a etapaulterior, a etapa superior, será atingida. A história como dialética significa que o proletariado é * Uma vez mais, cumpro o agradável dever de agradecer à Revista Enfunce e à humilhado, aviltado, e, simultaneamente, forma-se, forja-se, sua Diretora, a senhora Gratiot-Alphandéry, que acolheu o meu artigo: Foi o adquire podere lucidez. A relação do capital com o trabalho mestre-escola quemperdeuabatalhadasdiferençassociais?—primeiroesboço deste trabalho. - I4 15 PRIMEIRA PARTE A ESCOLAE AS SUAS SEPARAÇÕES CAPÍTULOI ASPECTOS POSITIVOS PRIMEIRO TEMA: Não se pode entender hoje uma pedagogia que não tome em consideração a contribuição dos nossos cinco autores Mesmo que Baudelot-Establet só nos tivessem ensina- do uma coisa: a escola favorece os socialmente privilegia- dos; desvaloriza os outros; é aos herdeiros de situações privilegiadas que cabe os sucessos escolares, a possibilidade de uma escolaridade prolongada, o acesso à Universidade, portanto, aos postos dirigentes, aos quais sob forma direta ou implícita são atribuídas as mais elevadas classificações, que vão em massa para aqueles cuja família já está instalada em posição dominante — eles assinalariam uma data decisiva na história da pedagogia. Mesmo que Baudelot-Establet só nos tivessem ensina- do uma coisa: a escola única não é única, nãopode sê-lo numa sociedade dividida em classes; a cultura dispensada 17 GEORGESSNYDERS ESCOLA,CLASSEELUTADECLASSES pela escola não é una; seus itinerários, seus fins, não são zer recuar até a um inconsciente um tanto vergonhoso aquilo apenas diferentes, mas opostos, tudo quanto se passa na es- de que suspeitávamos, embora vagamente. cola é atravessado pela divisão em classes antagonistas — a sua contribuição seria de uma importância decisiva. Para o futuro, eis-nos constrangidos a olhar os fatos Mesmo que Illich só tivesse dado ao tema das dispari- frontalmente; o milagre que esperaríamos no íntimo do nosso dades escolares uma dimensão nova (e a que ponto dramáti- coração: a escola como universo preservado, ilha de pureza ca, interpretada à escala mundial), não apenas em relação às — à porta da qual se deteriam as disparidades e as lutas soci- sociedades industriais e ricas mas também em relação aos ais — esse milagre não existe, a escola faz parte do mundo. países que consideramos em via de desenvolvimento, para Em algumas páginas muito breves, pois estes temas es- não lhes chamarmos colonizados e explorados — levantaria tão agora muito divulgados, lembraremos o que nos parece uma questão irreversível. constituir, do ponto de vista da diferenciação dos destinos | escolares, a contribuição essencial dos nossos autores.: É preciso dizer que nos ensinaram ou lembraram isso? “Pois, na realidade, tudo já constava dasanálises de Marx e I — Bourdieu-Passeron decifram as desigualdades de Lenin; mas nos tínhamos esquecido, por assim dizer, a- bandonado, tão difícil é enfrentar uma realidade que desmen- Doliceu ou dociclo I do CES! ao CET”, passando pelo te ideais proclamados, e mais ainda, ideais pelos quais CEG” (ou ciclo II do CES), não há simplesmente, como pro- efetivamente se luta, clama a doutrina oficial, diferença, diversidade, mas sim uma Era tão importante defender a escola, a escola laica hierarquia. Significa isto em especial que é difícil a um aluno contra a escola enfeudada a um dogma, a escola republicana do CEG continuar a sua carreira escolar no liceu — muito contra a escola diretamente, abertamente reacionária, a esco- mais difícil mesmo do que para quem já fez o primeiro ciclo la pública contra o embargo patronal — e sobretudo, a escola do liceu. Pois o aluno do CEG vê-se constrangido a adaptar- em si, a instrução face à ignorância e à utilização do trabalho se a uma instituição diferente no seu corpo docente, no seu de crianças de oito, dez, doze anos — que varremos do cam- espírito e no seu recrutamento social. po lúcido da consciência o caráter de classe do mundo esco- Em termos estatísticos, esta hierarquia revela-se pela lar. Para os combates que íamos travar, seria necessário, percentagem de alunos do CEG que obterão o bacharelato” mesmo provisoriamente, pôr de lado esta terrível dependên- — percentagem muito mais fraca do que entre os que princi- cia da escola? piaram logo um sexto ano do ciclo nobre. Ainda muito mais E depois, esta desigualdade fundamental e constante, este prolongar incômodo da exploração social dentro das 'Collêged'EnseignemtSecondaire. nossas classes, consideramos intoleráveis, quase fisicamente 2,Collêged'EnseignementTechnique. intoleráveis, até na medida em que amamos a nossa escola e ;Collêged'EnseignementGénéral. a nossa tarefa de educadores, portanto, a única saída era fa- * ensino longo (liceuse liceus técnicos) é sancionado pelo bacharelato (filoso- fia, ciênciasexperimentais, matemáticaselementares, matemáticas técnicas). Este bacharelatodáacesso aoensinosuperior. 18 19 GEORGESSNYDERS ESCOLA,CLASSEELUTADECLASSES desiguais são as oportunidades de acesso ao ensino superior didatar: o exame tem por função dissimular a eliminação a partir dos diferentes tipos de estabelecimentos secundários, sem exame. Todos aqueles de que se dirá que desistiram por a partir das diferentes carreiras escolares. livre vontade, porsua iniciativa (renúncia voluntária), não se Ora, o recrutamento social de alunos e de professores candidatam ao ensino longo nem ao ensino superior; trata-se, não é o mesmo nos CEG e nosciclos I: naqueles a percenta- na realidade, dos que estavam presos nos ciclos onde eram gem de alunos saídos de meios populares é muito mais ele- tão reduzidas as possibilidades de chegar ao ponto terminal, vada, ao passo que nestes os alunos vindos de meios Será necessário explicar com números e percentagens que favorecidos estão fortemente super-representados. estes últimos se recrutam essencialmente dentro de certas Considerando os respectivos professores, quanto à sua categorias sociais? origem social e ao tempo que puderam consagrar à sua for- Por que tantas discussões e controvérsias a respeito do mação profissional e atendendo ao vencimento que auferem, bacharelato, quando esta exclusão lenta e retardada é prati- chega-se a constatações de igual natureza e as diferenciações camente ignorada ou em qualquer caso passada pudicamen- orientam-se todas no mesmo sentido. É, portanto, a desi- te em silêncio? É que os debates são conduzidos por gualdade social que comanda a desigualdade escolar, que representantes de classes sociais para quem o único risco de constitui a realidade da desigualdade escolar: a hierarquia eliminação é o exame; o ponto de vista das classes sociais, dos estabelecimentos de acordo com o prestígio escolar e condenadas à auto-eliminação não tem ensejo para se expri- com o rendimento social dos títulos a que conduzem corres- mir. À perspectiva ilusória que leva a supor que o cursus ponde estritamente à hierarquia destes estabelecimentos se- escolar depende do resultado do exame quando,na realidade, gundo a composição social do seu público. é muitíssimo mais importante encarar o caso de todos aque- Os alunos que se matricularam no ciclo CEG vão ser les que não teriam tido acesso à sala de exame, reflete, no mais rapidamente eliminados do sistema escolar do que os plano ideológico, um egocentrismo ingênuo, voluntariamen- do ciclo I; de fato, eles tiveram de sujeitar-se a uma conde- te ingênuo, das classes privilegiadas. nação por defeito ou por excesso. E são maciçamente ascri- anças do povo que serão assim marginalizadas sem Assim, para afastar as classes populares,já não se atua conseguirem alcançar os diplomas mais prestigiosos, esco- por exclusão, por oposição absoluta, aqueles que estão den- larmente e socialmente — e os mais rentáveis. A escola não tro do sistema escolar e os que ficam de fora, isto é, na fá- contrariará a reprodução das classes sociais. brica ou no campo: procede-se por sábias gradações e sabiamente dissimuladas, que vão dos estabelecimentos, Por conseguinte, a verdadeira clivagem não sejoga en- seções, disciplinas ligadas às melhores possibilidades de tre admitidos e não-admitidos a exame (por exemplo, o ba- êxito posterior, tanto escolar como social, até aos diferentes charelato), mesmo que o exame seja efetuado em condições graus de relegação. A discriminação das classes populares formalmente irrepreensíveis, mas sim entre os que se candi- faz-se pouco a pouco, com brandura — e assim se consegue datam e os que não levam os estudos suficientemente longe, dissimulá-la melhor. suficientemente na direção requerida, para se poderem can- 20 21 GEORGESSNYDERS ESCOLA,CLASSEELUTA DECLASSES Existe um determinado número de casos de mobilidade fessores, é, em geral, mais favorável, mais estimulante; ou social — e todos os professores citam o exemplo de determi- ainda, a posição elevada do pai é acompanhada de posições nado aluno vindo de muito baixo, que graças ao seutrabalho, destacadas de outros membros da família, que proporcionam ao seu zelo e aos seus dotes, conseguiu tão brilhante situa- deste modo à criança, diferentes modelos de identificação e ção. Mas, na realidade, a classe dominante conserva ciosa- de êxito, bem como apoios. As vantagens e desvantagens mente nas suas mãos o controle desta seleção, que não faz sociais atuam em cascata de efeitos cumulativos — e preci- perigar de forma alguma o conjunto das hierarquias estabele- samente por isso é muito difícil introduzir, por reforma par- cidas. Precisamente porse tratar de casos, esses poucos vão cial, qualquer modificação durável. ser absorvidos pelo meio ambiente, modelar-se segundo re- gras instituídas, arriscam-se mesmo a ficar fortemente alge- A ação da escola exerce-se sobre crianças cujo modo mados a um sistema que lhes permitiu vencer, sair-se bem. de vida, educação familiar, primeira educação são extrema- Decapita-se a classe operária, proporcionam-se à classe mente diversos: a cultura das classes privilegiadas aproxima- detentora do poder alguns elementos válidos que lhe presta- se da cultura escolar, os seus hábitos assemelham-se aos há- rão serviço, muito mais do que se insuflam na sociedade pos- bitos e aos ritos escolares — e preparam-nas, pois, direta- sibilidades de renovação. Estas possibilidades de ascensão mente, para as aprendizagens escolares. Os seus filhos vão social denunciam-nas Bourdieu-Passeron como meio de tornar assimilar a contribuição da escola à maneira de uma herança, verossímil a ideologia de uma escola que a todos oferece é-lhes familiar, faz parte do seu elemento natural. iguais oportunidades; um meio de mascarar o peso da origem Para os outros, trata-se de uma conquista muito cara, social e, finalmente, de negar a existência de classes. Os mira- têm de a conseguir laboriosamente, através de uma espécie culados constituem a caução do sistema e apesar das aparên- de conversão imensamente difícil. Resumindo, é um empre- cias lisonjeiras, não passam, na realidade, de reféns. endimento de adaptação a um grupo social, de certa maneira Resumindo, a organização e o funcionamento do sis- uma reeducação. A escola limita-se a confirmar e a reforçar tema escolar retraduzem continuamente e segundo códigos um habitus de classe, que constitui o fundamento real de múltiplos as desigualdades de nível social por desigualdades todos os progressos escolares. Porisso a escola só triunfa em de nível escolar. relação àqueles que se beneficiaram para lá do recinto esco- lar e bem antes de lá entrarem, no seio familiar, dos hábitos Interrogando-se e forçando-nos a interrogarmo-nos so- de família, de um certo estilo de vida. bre as razões das desigualdades sociais nos sucessos escola- E estes, na escola, procuram menos adquirir algo de res, Bourdieu-Passeron mostrarão que não se trata de uma novo do que legitimar escolarmente aquilo que em grande casualidade simples e linear, que torna o sucesso dependente parte já adquiriram pelo modo de inculcação que, desde o de um determinado fator particular, mas do equilíbrio de nascimento, os envolveu e apoiou. É necessário explicar que conjunto de um sistema: por exemplo, a posição elevada do este modo de ensinamento é o das classes favorecidas? As pai implica vulgarmente a residência e a escolaridade numa classes sociais são caracterizadas pordistâncias desiguais até grande cidade, onde o meio, tanto dos alunos como dos pro- 22 23

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