li a SANDRA JATAHY RESA\/ENXO Editora daUniversidade UiiversidadeFedenddoRioGrstiâedoSul FAPERGS Ao longo da segunda metade do século XIX, uma questão esteve no centro das preocupações da elite brasileira: encontrar novas formas de subordinação do trabalhador ao capital frente à desagregaçãoda or dem escravocrata. Processava-senopaísa transição capitalista, implicando, por um lado, o assentamento das teses materiais deum novomododeproduçãoe, por outro lado, o estabelecimento de to doumaparatopolítico-administrativo e também ideológicode legitimação danovaordemburguesaemergente. Na conformação de um mercado detrabalho livre,aselitessevaleram tanto de recursos instrumentais-le- gaisparaoenquadramentodotraba lhador à nova ordem quanto difundi ramconceitosevaloresadequadosà também nova moral do trabalhador. Dois abolicionistas, códigos de posturas municipais, aparatos poli ciaise judiciários remodeladose em expansãoforam instrumentosparaa normatizaçãodavida paraa discipli- narização do trabalho e para o con trole do acesso dos liberais ao mer cadode trabalho em formação. Às práticas de controle social acrescentava-se a reelaboração ideologizada do trabalho e da vaga bundagem, pólos opostos de uma mesma realidade capitalista em construção. Tratava-se de construir umanovaética,queopunhao mundo de trabalho, sede da sociedade civil organizada,daordem,datranqüilida dee doprogressoaomundodaocio sidade,docrime,dovícioe damargi nalidade que era preciso controlar e punir. | E g | i ^bÉÁLTERNÒS UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL . Reitor Gerhard Jacob Vice-Reitor Tuiskon Dick Pró-ReitordeExtensão WaldomiroCarlos Manfrói Pró-ReitordePesquisaePós-Graduação AbílioAfonsoBaeta Neves Pró-Reitorde Administração JoséSerafim Gomes Franco Pró-Reitorde Planejamento Edemundoda Rocha Vieira Pró-Reitorde Assistência àComunidade^Universitária Fernando Irajá Félixde Carvalho Pró-ReitordeGraduação Darcy Dillenburg EDITORA DA UNIVERSIDADE Diretor Sergius Gonzaga CONSELHO EDITORIAL Celi Regina Jardim ttnto Fernando Zawislak IvoSeftonAzevedo Joaquim B. Fonseca LuisAlbertoDeBoni LuizDuarteVianna MárioCostaBarberena Sérgio Roberto Silva SergiusGonzaga, presidente EDUNI-SUL Filiadaà AssociaçãoBrasileiradas Editoras Universitárias(ABEU) eparticipantedo Programa Interuniversitáriopara Distribuiçãodo Livro (PIDL) SUBALTERNOS SANDRA JAXAMY RESAVENTO Trabalho livre e ordem burguesa Editora daUniversidade UniversidadeFederaidcjRioGrandedoSul FAPERGS © de Sandra Jatahy Pesavento 1." edição: 1989 Diieitos reservados desta edição: Universidade Federal do Rio Grande do Sul Capa: Caria Luzzatto Editoração: Geraldo F. Huff Revisão: Marli de Jesus Rodrigues dos Santos, Anajara Carbonell Closs e Mônica Ballejo Canto Montagem: Rubens Renato Abreu Sandra Jatahy Pesavento Professora no DepartamentodeHistóriadaUFRGS. Mestraem História pela PUCRS. Doutora em História pela USP. Autora de República velha gaúcha: charqueadas, frigoríficos e criadores —RS 1889-1930 (1980); História do Rio Grande do Sul (1980); RS: a economia e opodernos anos trinta (1980); RS: agropecuáriacolonialeindustriali zação (1983); A Revolução Federalista (1983); A Revolução Farrou pilha (1985); História da indústriasul-rio-grandense (1985); Pecuária e indústria. Formasde realização do capitalismo na sociedadegaúcha no século XIX (1986); Burguesia gaúcha. Dominação de capital e disciplina de trabalho. RS: 1889-1930. P472c Pesavento, SandraJatahy Aemergênciados subalternos : trabalholivree ordem burguesa / Sandra Jatahy Pesavento. —Porto Alegre : Edi torada Universidade/UFRGS : FAPERGS, 1989. 1. Mão-de-obra —Trabalho —Negros - Economiaes- cravagista —RioGrandedo Sul. 2.Trabalholivre - Eco nomiacapitalista - RioGrandedo Sul. 3. Mercadodetra balholivre —Acumulaçãode capital —Rio Grandedo Sul. I. Título. CDU 331.024(-96):330.342.12(816.5) 331.011:330.342.14(816.5) 331.5.011:330.146(816.5) ElaboradaporZaida Maria MoraesPressler CRB-10/203 ISBN 85-7025-183-1 SUMARIO Brasil, século XIX: aemergência de novos tempos 7 O RioGrande no fim doséculo: aespecificidadeda formação domercadode trabalhonosul 15 Os riscos da liberdade eacompulsãoao trabalho 36 O caminhoda cidade: discriminaçãoeintegração 61 BRASIL, SÉCULO XIX: A EMERGÊNCIA DE NOVOS TEMPOS Ao longo da segundametadedo séculoXIX,umaquestão esteve no centro das preocupaçõesdaselites brasileiras:encontrar novas for^ mas de subordinação do trabalhador ao capitalfrente à desagregação da ordem escravocrata. Processava-se no pafs a transição capitalista, implicando, por um lado, o assentamento das bases materiais de um novo modo de produçãoe, por outro, o estabelecimento de todo umaparatopolítico- administrativo e também ideológico de legitimação da nova ordem burguesa emergente. A questão nuclear deste processo em curso foi a passagem da força de trabalho escrava para a força de trabalho assalariada, trânsito este que implicava a conformação de um mercado de trabalho livre e a elaboração de novas formas de dominação. Neste contexto, era preciso tanto garantir o fornecimento de mão-de-obra num volume adequado que permitisse a continuidade da produção e a sualucratividade, quanto disciplinare organizaros limites dessenovomercado quesedefiniria pelo assalariamento. Paraoprimei ro problema — volume de mão-de-obra — a elite dirigente nacional atuou através deduas formas:oabolicionismo,que protelou alibertação dos escravos ao máximo possível, e o imigrantismo, que forneceu ao café a quantidade de braços necessária. No tocante ao segundo problema —conformação do mercado de trabalho livre —, a classe dominante valeu-se de instrumentos jurídicos e de outras formas de coerção ideológica para manter as rédeas da dominação. Tratava-se de foijar um trabalhador dócil, adequado à preservação da ordem e garantidor do progresso material. Para tanto, a eüte dirigentelegislou, interveio, normatizou, vigiou e pautou as condutas, os papéis e os espaços a serem desempenhados e ocupados por este novo trabalhador que surgia. Evidentemente, este foi um processo que se impôs, mas uão sem encontrar resistência, e gerar atos de sabotagem e outras formas de reação por parte dos subalternos. A identificação da emergênciado trabalho livre e da conseqüente reelaboração das relações de dominação como fulcro da transição capi talista remete, por suavez, àanálisedascondiçõeshistóricas objetivas que deram concretude àqueles processos. Neste sentido, a abolição. a imigração e a República são temas que têm sido alvo de numerosos estudos, antigos e recentes.^ Colocando a questão em termos da produção científicamais atua lizada que informa a análise destes temas, o processo teria se dado da seguinte forma: o surgimento da indústria moderna instaurou um mecanismo de acumulação que dispensavaos elementos característicos do período anterior,responsáveis pela acumulaçãoprimitiva, tais como a escravidão e o monopólio comercial. Com a fábrica, possibilitou-se a reprodução de forças produtivas capitalistas. Aproduçãomecanizada, ou demassa, combinando o uso da máquinacom o trabalho assalariado, possibilitou o aumento da produção e da produtividade, ampliando a margem de lucro do capital. Redefiniram-se com isso as funções das antigas zonas coloniais,mudando o caráterdas relações de domina ção/subordinação já picsaites na fase anterior. Numa nova divisão internacional do trabalho, caberia às antigas regiõescoloniaiso forneci mento de produtos alimentícios e matérias-primas a baixo preço, bem como a ampliação do mercado consumidor para os produtos industriali zados. Tais redefinições na periferia acarretavam, para as economias centrais, o rebaixamrato dos custos de reprodução da força-trabalho e dos componentes docapital constante, a absorção da produçãoindus trializada em larga escala e, conseqüentemente, a reprodução ampliada do capital e da sua maigem de lucro. Em termos objetivos da realidadelatino-americana, este processo implicou, a curto e médio prazos,arupturado pactocolonial,desdobra do na extinção dos monopólios e na abolição do trabalho compulsório. Entretanto, o processo em si não foi mecânico e linear, obedecendo, pelo contrário, às contradições dos interesses sociais em jogo e à própria diferenciação interna que as regiões coloniais haviam sofrido na fase precedente. Se, na passagem do séc. XVDI para o séc. XIX, o fim do monopólio e a liberaliz;ação do comércio assumiram forma concreta com a independênciadas nações latino-americanas, a elimina- Cabe citar, entre outras, as seguintes obras: COSTA, Emilia Viotti da. A crise do escravismo e a grande imigração, São Paulo, Brasiliense, 1981. GERARA, Ademir. O mercado de trabalho livre no Brasil, São Paulo,Brasiliense, 1986. KOWARICK, Lúcio. Trabalho e vadiagem: a origem do trabalho livre no Brasil. São Paulo, Brasiliense, 1987. QUEIRÓZ, Suely R. Reis de. A abolição da escravidão, São Paulo, Brasiliense, 1981. SAES, Décio. A formação do Estado burguês no Brasil —J888'1891, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985. SALLES, Iraci Galvão. Trabalho, progresso e sociedade civilizada, São Paulo, Huci- tec/Promemória/INL, 1986. 8