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eletroquímica das partículas coloidais e sua relação com a mineralogia de solos altamente ... PDF

20 Pages·2001·0.31 MB·Portuguese
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Eletroquímica das partículas em solos altamente intemperizados 627 Revisão / Review ELETROQUÍMICA DAS PARTÍCULAS COLOIDAIS E SUA RELAÇÃO COM A MINERALOGIA DE SOLOS ALTAMENTE INTEMPERIZADOS Maurício Paulo F. Fontes1,4*; Otávio Antônio de Camargo2,4; Garrison Sposito3 1Depto. de Solos - UFV, CEP: 36571-000 - Viçosa, MG. 2Centro de Solos e Recursos Agroambientais - IAC, C.P. 28 - CEP: 13001-970 - Campinas, SP. 3Environmental Geochemistry Group, Division of Ecosystem Sciences, University of California, 94720-3110 - Berkeley, CA, USA. 4Bolsista CNPq. *Autor correspondente <[email protected]> RESUMO: O conhecimento das propriedades eletroquímicas das partículas minerais dos solos altamente intemperizados é imprescindível para o avanço dos estudos em diferente áreas da Ciência do Solo, como, Física, Manejo e Conservação, Fertilidade e Poluição do Solo. Nesse contexto, o comportamento das cargas superficiais e seu relacionamento com a mineralogia dos solos de carga variável é de importância fundamental para o entendimento e a melhoria da capacidade preditiva de diversos fenômenos, tais como dispersão e floculação de colóides, troca catiônica, adsorção de ânions, especialmente os fosfatos, adsorção de metais pesados, etc. Assim, essa revisão de literatura faz uma abordagem científica do tema ”Eletroquímica das partículas coloidais e sua relação com a mineralogia de solos altamente intemperizados”, na qual é contemplado o histórico da evolução do conhecimento nesse campo e os desafios para o aprofundamento das pesquisas futuras na área. As diferentes tendências e posicionamentos existentes na literatura sobre Pontos de Carga Zero (PCZs), Caracterização e Medição de Cargas, Nomenclatura e Simbologia de PCZs e Relacionamento entre Cargas e Minerais de solos altamente intemperizados são também apresentados. Conceituações básicas são revisitadas e conceitos novos ou pouco utilizados na Ciência do Solo são apresentados e discutidos, com o intuito de se melhorar o entendimento e aprimorar a interpretação de tão importante ramo da Química, Mineralogia e Poluição de Solos. Palavras-chave: PCZ, carga superficial, solos tropicais, mineralogia ELECTROCHEMISTRY OF COLLOIDAL PARTICLES AND ITS RELATIONSHIP WITH THE MINERALOGY OF HIGHLY WEATHERED SOILS ABSTRACT: The knowledge of the electrochemical properties of the mineral particles of highly weathered soils is indispensable for the advance of the studies in different Soil Science areas, like as, Soils Physics, Conservation and Management, Fertility and Pollution. In this context, the surface charge behavior and its relationship with the mineralogy of variable charge soils is of fundamental importance to the understanding and the improvement of the predictive capability of several phenomena, such as, floculation and dispersion of colloids, cations exchange, anion adsorption, specially phosphates, heavy metals adsorption, etc. Therefore, this literature review aims at to make a scientific approach of the topic “Electrochemistry of colloidal particles and its relationship with the mineralogy of highly weathered soils”, in which, the historical evolution of the knowledge in this field is covered and the challenges to the development of the research in this area are raised. Different tendencies and views existing in the literature about Zero Points of Charge (ZPC), Charge Characterization and Measurement, ZPCs Terminology and Simbology and Relationship between Charge and Minerals of the highly weathered soils are also presented. Basic concepts are revisited and new or seldom used concepts in Soil Science are presented and discussed with the objective of improving the understanding and refining the interpretation of such important branch of the Soil Chemistry and Mineralogy field. Key words: ZPC, surface charge, tropical soils, mineralogy INTRODUÇÃO nutrição de plantas e que podem interferir em fenômenos relacionados ao seu manejo e conservação ocorre na O estudo das cargas elétricas das partículas superfície dessas partículas. coloidais é de fundamental importância para o Nas últimas décadas, a investigação de atributos entendimento de diversos fenômenos físico-químicos que eletroquímicos de solos tropicais tem aumentado muito, ocorrem nos solos, já que a maioria das reações principalmente após o trabalho de Raij & Peech (1972), eletroquímicas que influenciam sua fertilidade e a e tem abrangido pesquisas em diferentes tipos de solos, Scientia Agricola, v.58, n.3, p.627-646, jul./set. 2001 628 Fontes et al. predominando os Oxissolos e Ultissolos (Gallez et al., praticamente o único óxido de Al presente nesses 1976; Tessens & Zauyah, 1982; Magalhães & Page, solos. Contudo, todos eles mostram grande diversidade 1984a; Wada & Wada, 1985; Cochrane & Souza, 1985; de características como tamanho de partículas, Gillman & Sumner, 1987; Charlet & Sposito, 1987; faces expostas, graus de substituição isomórfica, Sakurai et al., 1990; Perez et al., 1993; Alleoni & grau de envelhecimento, etc., o que os induzem a Camargo, 1994a, 1994b; Silva et al.,1996; Dynia & comportamentos bem diferenciados quanto a Camargo, 1998), seguidos dos Inceptissolos importantes reações do solo. A diversidade das (Balasubramanian & Kanehiro, 1978; Gillman, 1984a), características é atribuída, principalmente, aos diferentes Alfissolos ( Raij & Peech, 1972; Hendershot, 1978), e ambientes de formação a que esses minerais estão Andossolos ( Fey & Roux, 1976; Okamura & Wada, sujeitos. 1983). Alguns destes solos foram comparados com os Pela sua formação e por influência de sua pertencentes a outras ordens, como Molissolos (Parker mineralogia, os solos altamente intemperizados e com et al., 1979; Stoop, 1980, Espodossolos (Laverdière & carga variável apresentam propriedades agronomicamente Weaver, 1977), e Entissolos (Mekaru & Uehara, 1972). desejáveis como boa profundidade, estrutura estável, boa O ponto de carga zero (PCZ) é uma das mais porosidade e alta permeabilidade. Por outro lado, eles importantes propriedades do solo para a descrição de também apresentam propriedades de alguma forma fenômenos decorrentes da dupla camada elétrica de indesejáveis como alta acidez, baixa reserva de interfaces reversíveis (Raij, 1973; Sakurai et al., 1989; nutrientes, baixa capacidade de troca catiônica, alta Zhang & Zhao, 1997). Além disso, é usado para a capacidade de adsorção aniônica (especialmente fosfato) determinação de vários atributos pedológicos, tais como e PCZ alto. desenvolvimento pedogenético (Hendershot & Lavkulich, A maioria dessas propriedades está ligada direta 1978), topossequência (Lepsch & Buol, 1974) ou ou indiretamente ao desenvolvimento e ao balanço de cronossequência (Hendershot et al., 1979; Parker et al., cargas elétricas na superfície das partículas que 1979). compõem seu sistema coloidal. Assim sendo, a A reconhecida importância do PCZ fez com que caracterização da carga elétrica superficial de partículas inúmeros trabalhos fossem realizados envolvendo desde dos solos predominantes em regiões tropicais e métodos de determinação até práticas de manejo (Rojas subtropicais torna-se parte essencial da maioria dos & Adams, 1980; Naidu et al., 1990), para procurar estudos sobre eles conduzidos. Apesar da reconhecida modificar seu valor para níveis mais adequados para importância da matéria orgânica nos fenômenos de absorção de nutrientes pelas plantas. Porém, existe desenvolvimento e balanço de cargas, principalmente muita ambigüidade em torno do conceito de PCZ quando nos horizontes superiores do solo, a ênfase será dada se compara sua aplicação no sistema solo com relação aos materiais inorgânicos. a sua aplicação em sistemas puros como dos óxidos. Esta revisão tem como objetivos principais: a) Solos altamente intemperizados, como destacar e conceituar alguns aspectos fundamentais das Latossolos e Argissolos, são predominantes no território reações eletroquímicas, o seu envolvimento com o ponto brasileiro e de grande relevância na América Latina. Eles de carga zero e a sua relação com a mineralogia de ocupam extensas áreas cultivadas e são ainda solos com cargas variáveis; e b) indicar caminhos a importantes como reservas naturais, com um papel serem pesquisados em solos altamente intemperizados proeminente na resolução dos problemas relacionados para o desenvolvimento e elucidação de pontos à produção de alimentos e à proteção ao meio ambiente. importantes sobre o tema. Por serem solos com grau de intemperismo mais elevado, possuem mineralogia da fração argila dominada DESENVOLVIMENTO DE CARGAS NOS CONSTI- por minerais silicatados do tipo 1:1 e óxidos1 de Fe, Al TUINTES DOS SOLOS além de, ocasionalmente, de Mn. Aparentemente, As superfícies dos materiais coloidais do solo são possuem mineralogia simples, mas uma observação carregadas eletricamente, o que significa que essas mais atenta na literatura demonstra que existe imensa superfícies têm um excesso ou um déficit de elétrons variabilidade no comportamento desses poucos minerais. (Uehara & Gillman, 1981) que, em conjunto com os íons De modo geral, esses solos apresentam pequenas presentes na solução do solo, constituem uma dupla quantidades de minerais como micas e vermiculita com camada de cargas (van Olphen, 1977). Com a hidroxi-entrecamadas (VHE), o que pode, em certos distribuição de cargas, um potencial elétrico máximo se casos, ser importante em algumas propriedades físico- desenvolve na superfície da partícula e decresce com a químicas. distância na solução. Se a dupla camada de cargas for Caulinita é o principal e virtualmente o único resultado de imperfeições internas e substituições mineral silicatado em quantidade expressiva; goethita e isomórficas estruturais, a densidade de cargas é hematita são os principais óxidos de Fe, e gibbsita é constante, ao passo que o potencial elétrico de superfície 1Para brevidade e simplicidade no texto, o termo geral óxidos se refere a óxidos, hidróxidos e oxihidróxidos Scientia Agricola, v.58, n.3, p.627-646, jul./set. 2001 Eletroquímica das partículas em solos altamente intemperizados 629 é variável. Se a dupla camada for criada pela adsorção Uma característica essencial à formação e de íons determinantes de potencial (IDP), a densidade desenvolvimento de cargas nos colóides de carga de cargas é variável enquanto que o potencial elétrico variável é a possibilidade da hidroxilação da sua de superfície é constante e é determinado somente pela superfície. Na presença de água, os íons Si, Al ou Fe, concentração ou atividade desses íons em solução. por exemplo, localizados na superfície de minerais como caulinita, hematita, goethita e gibbsita, Carga Permanente completam sua camada de coordenação com íons As cargas permanentes são produto das hidroxila de modo que toda superfície se torna substituições iônicas isomórficas nas estruturas minerais hidroxilada (Stumm, 1992). A figura 1 mostra a e sempre se manifestam em qualquer pH dos solos. Esta representação do fenômeno. carga é inerente ao mineral e pode também ser chamada Nessa representação se introduz o conceito de de carga estrutural. As substituições iônicas isomórficas, que os grupamentos hidroxila nesses minerais podem simplificadamente chamadas de substituições estar ligados a um, dois, ou até três metais na estrutura isomórficas, ocorrem nos minerais primários, na sua do mineral, de acordo com a proposição de Russel et diferenciação magmática, e nos secundários na sua al. (1974) e Parfitt et al. (1975). Assim, podem ser formação no solo ou pela herança de minerais primários. chamados de hidroxila de coordenação simples, dupla Mas elas produzem carga significativa apenas nos e tripla, respectivamente. minerais argilosos silicatados do tipo 2:1 e em alguns Na camada hidroxilada, cargas positivas ou poucos minerais primários, tipo mica, quando esses negativas podem ser criadas (Parks & de Bruyn, 1962; atingem tamanho pequeno o suficiente para compor a Herbillon, 1988) por protonação ou desprotonação do fração argila dos solos. Smith & Emerson (1976) afirmam grupamento hidroxila de acordo com esquema mostrado que a caulinita (argila do tipo 1:1) também possui carga na figura 2, para óxidos em configuração octaédrica e negativa permanente, em adição à carga variável, mas metal trivalente. que ela é pequena e de pouca expressão. Teoricamente, A carga e o potencial da superfície variam com a carga permanente pode ser negativa ou positiva, a concentração de H+ e OH-, íons determinantes de contudo, em função de tamanhos iônicos, a substituição potencial (IDP). Para uma mesma concentração de H+ se faz, normalmente, por um elemento de menor valência ou OH-, o potencial se mantêm constante mas a carga substituindo o de maior valência (Al3+ → Si4+, Mg2+ → de superfície varia com a concentração e valência dos Al3+), o que leva a déficit de carga positiva na estrutura eletrólitos (força iônica) da solução. cristalina e a manifestação de carga negativa na superfície do colóide (Gast, 1977). Tessens & Zauyah (1982) postulam a existência de carga permanente H H H H positiva em solos altamente intemperizados e relacionam Superfície O O O O + H+ O O O O essas cargas à substituição de Fe3+ por Ti4+ na estrutura M M M M M M dos óxidos de Fe. M M Figura 1 - Hidroxilação de superfícies de minerais que apresentam Carga Variável cargas dependentes de pH. M é o metal estrutural do Cargas variáveis são aquelas originárias da mineral podendo ser Si, Fe, Al, Mn, etc. adsorção de íons na superfície dos colóides do solo, sendo a carga líquida determinada pelo íon que é adsorvido em excesso. Íons capazes de interferir na uS p carga ao serem adsorvidos são chamados íons cífer determinantes de potencial. Como os principais íons ei determinantes de potencial na solução do solo são H+ e O HH+ 12 O - 32 OH-, esses colóides são também chamados de colóides M M de carga dependente do pH. Se se levar em M OH + 1 + OH- M O - 1 consideração que outros íons podem atuar como 2 2 + determinantes de potencial o termo mais genérico M H + M colóides de carga variável deve ser preferido (Uehara & OH o O - 1 Gillman, 1981). Caulinita, goethita, hematita e gibbsita M M são os principais minerais do solo que apresentam essa característica. O HH+ 12 O - 32 Na matéria orgânica, a carga variável é negativa e tem sua origem na dissociação de hidroxilas de grupamentos carboxílicos, fenólicos, enólicos etc. Ela desenvolve-se a valores de pH bem mais baixos do que nos óxidos, sendo menos provável a ocorrência de cargas Figura 2 - Distribuição das cargas de grupamentos superficiais típicos positivas nestes materiais, nas condições de pH do solo. de óxidos em configuração octaédrica e metal trivalente. Scientia Agricola, v.58, n.3, p.627-646, jul./set. 2001 630 Fontes et al. A Figura 2 mostra os casos extremos de onde M representa o metal coordenado ou o íon silício protonação com formação do máximo de cargas na superfície de argila. Mais recentemente, Barrow positivas, e desprotonação com formação do máximo de (1987), Stumm (1992) e McBride (1994), seguindo uma carga negativa. Entre os extremos de carga positiva e tendência geral na literatura, utilizaram os conceitos do negativa há um ponto em que a carga é zero ou pela equilíbrio ácido-base e das constantes de dissociação ausência de cargas ou pela presença de quantidades ácida (Ka) para descrever as reações de protonação e iguais de carga positiva e negativa. Esse ponto recebe desprotonação das superfícies minerais oxídicas e seus a denominação genérica de ponto de carga zero (PCZ). grupamentos funcionais da seguinte forma: PCZs: Definições e Simbologia da Literatura M - OH ⇔ M - OH + H+ (1) A definição mais utilizada na literatura é a de 2 Parks & Bruyn (1962): Ponto de carga zero (PCZ) = valor de pH para o qual a carga superficial de um sistema Ka(cid:2)={M{M−O−OHH}[H(cid:1)}+] (2) reversível de dupla camada é zero, sendo determinado por um valor particular de atividade dos íons M - OH ⇔ M - O + H+ (3) determinantes de potencial na fase sólida. Esta definição feo i uAsrandoal dp o(r 1R9a7ij7 &) ,P eeencthr e(1 9o7u2t)r,o Ess,p insoeznad eot atla. m(1b9é75m) Ka(cid:1)={M{M−−OO}[HH}+] (4) complementada por Laverdière & Weaver (1977), que acrescentaram que neste ponto o potencial elétrico na qual { } é concentração da espécie de superfície em superficial é também nulo. Entretanto, eles mol kg-1 de adsorvente sólido, [ ] é concentração de representaram este atributo como pH . Hendershot & solutos em mol L-1, e M é um metal ou íon silício na pcz Lavkulich (1978) complementaram que a carga líquida estrutura do mineral em coordenação com oxigênios ou total da fase sólida no PCZ é nula, seja ela oriunda de hidroxilas. cargas dependentes de pH, associadas com superfícies Devido à natureza ácida dos grupamentos OH, de óxidos hidratados, seja da matéria orgânica. De tem-se recorrido às constantes de dissociação ácida para acordo com Sposito (1989), a condição do PCZ é obtida explicar a variação do PCZ para os minerais, e diversos experimentalmente no valor de pH no qual as partículas modelos explicativos têm sido formulados. É bom do solo não se movem num campo elétrico aplicado ou destacar que o conceito de PCZ para solos com quando ocorre assentamento ou floculação delas. Este predominância de argila de carga permanente tem ponto aparece quando o valor da densidade de cargas significado muito restrito. dissociadas é zero (σ = 0). Quando medido D Ponto Isoelétrico eletrocineticamente, ele é igual ao ponto isoelétrico. É O ponto isoelétrico (PIE) é um atributo bom lembrar que o PCZ geralmente representa o pH de fundamental em Química Coloidal, sendo que na máxima aglomeração de partículas e o menor potencial Química do Solo, às vezes, ele se confunde com o PCZ de solubilização do mineral (Parks & de Bruyn, 1962). (Camargo & Alleoni, 1995), embora diversos autores Diferentes minerais do solo apresentam PCZ a tenham sugerido várias diferenças entre eles (White & diferentes concentrações de H+, ou seja, a diferentes Zelazny, 1986). valores de pH que variam de pH 2 a 4 para alguns óxidos Para Parks & de Bruyn (1962), PIE é o valor de de Si e Mn até pH 8 a 10 para alguns óxidos de Fe e Al. pH no qual o somatório dos produtos das valências dos Por definição os minerais apresentam PCZs baixos ou cátions por suas respectivas atividades na solução é altos conforme possuam pontos de carga zero a baixo igual ao somatório dos produtos das valências dos pH (alta atividade de H+) ou a alto pH (baixa atividade ânions pelas respectivas atividades, sendo o ponto que de H+), respectivamente. corresponde à condição de solubilidade mínima de um A variação dos valores de PCZ dos vários sólido em equilíbrio com a solução. minerais do solo parece depender essencialmente da O termo PIE foi definido por Uehara & Gillman natureza acídica dos diversos grupamentos OH que (1980) como o pH no qual a carga líquida no plano que aparecem em suas superfícies. Greenland & Mott (1978) separa a dupla camada difusa e a camada de Stern é usam o conceito de acidez e alcalinidade para zero ou como o pH no qual o potencial zeta é igual a representar a extensão da associação ou dissociação de zero (Singh & Uehara, 1998). Para um eletrólito prótons na superfície dos minerais da seguinte forma: indiferente, na ausência de adsorção específica na camada de Stern, o PIE é o mesmo que o PCZ para um H+ OH- sistema de cargas variáveis puro. El-Swaify & Sayegh (1975) definiram o PIE como M- OH2+ ⇔ M - OH ⇔ M - O- + H2O o valor de pH no qual as adsorções de NH + e Cl- (íons 4 mais ácido mais alcalino utilizados em experimento com um Oxissolo e um Inceptissolo) foram iguais. Scientia Agricola, v.58, n.3, p.627-646, jul./set. 2001 Eletroquímica das partículas em solos altamente intemperizados 631 Segundo Hendershot & Lavkulich (1978), o PIE modelo eletrostático. O modelo se baseia em um do sólido, representado por PIE(S), é o pH no qual a equilíbrio entre sítios positivos e negativos na superfície carga líquida nas superfícies com cargas dependentes do sólido envolvendo H+ da seguinte forma: de pH é zero. Bell & Gillman (1978) e Pyman et al. (1979) M - O- + 2H+ ⇔ M – OH + (5) chamaram de PIES o valor de pH em que ocorre 2 adsorção igual de H+ e OH-. Já para Fernandez Caldas Nesse equilíbrio assume-se que o importante é et al. (1980), o PIES corresponde ao pH no qual a soma o trabalho eletrostático ganho pela aproximação dos 2H+ algébrica das cargas dos íons determinadores de a M-O-. Levando-se em consideração que efeitos do potencial é igual a zero. campo cristalino aumentam a estabilidade da ligação M- OH, chega-se às seguintes equações para sólidos de Ponto Zero de Titulação metal de número de coordenação 6: Ponto zero de titulação (PZT) é o pH ou a faixa de valores de pH resultantes da reação de superfícies PCZ = A - B (Z/R) - C (EECC) (6) sólidas com variadas concentrações de um eletrólito PCZ = A - 11,5 [Z/R + 0,0029 (EECC) (7) indiferente, sem que sejam adicionados ácido ou base ef. (Raij & Peech, 1972; Laverdière & Weaver, 1977; Parker PCZ = 18,6 - 11,5 [Z/R + 0,0029 (EECC) + a] (8) et al., 1979; Chaves & Trajano, 1992). Fernandez Caldas et al. (1980) usaram, entretanto, a mesma abreviatura e fazendo-se para simbolizar o pH no qual a adsorção líquida de H+ e OH- é nula (Z/R) = [Z/R + 0,0029 (EECC) + a] (9) ef. Outras representações PCZ = 18,6 - 11,5 (Z/R) (10) ef. Espinoza et al. (1975) afirmam que, como os solos PCZ = 16,5 - 11,5 (Z/R) (11) contêm uma mistura de minerais secundários de argila ef. contendo carga negativa constante e óxidos e Em que A, a, B e C são constantes, A leva em argilominerais com cargas dependentes de pH, seria correto ef. consideração o efeito de estabilização do campo usar o termo PCZ “aparente” da mistura, e não somente cristalino (EECC), e (Z/R) é a relação ajustada para a PCZ, como nos casos de determinações em óxidos puros. ef. estabilização do campo cristalino da valência Z do metal O termo ∆pH foi sugerido (Hendershot et al. M e à soma R do raio desse metal com o diâmetro do PCZ 1979) para representar a diferença entre o ponto de oxigênio. A equação (10) representa os óxidos anidros carga zero e o pH medido em KCl 1 mol L-1, como e (11) os hidratados. Parks (1965) salienta que para indicativo da medida do desenvolvimento pedogenético óxidos anidros e hidratados de metais com número de de determinado solo. Stoop (1980) representou como pH0 coordenação 4, a constante A da equação deve ser o valor de pH no qual a carga superficial é nula. substituída por valores de 16,0 e 13,9, respectivamente. Wann & Uehara (1978) e Uehara (1988) A equação (10) prediz que o PCZ deve variar utilizaram o termo pH para representar o pH no qual a linearmente com a relação Z/R, aumentando à medida 0 carga líquida variável é zero, sendo resultante da em que Z/R diminui. A equação também estabelece a adsorção de H+ e OH-, e obtido na intersecção das curvas importância da valência e do raio do metal constituinte de titulação de um determinado sal. Esta simbologia foi da estrutura dos minerais controlando a acidez da usada também por Tessens & Zauyah (1982) e Zhang superfície e, conseqüentemente, o PCZ. Assim, minerais et al. (1989). Outros autores (Gillman, 1984; Gillman & que têm na sua estrutura metais com alta valência e Sumner, 1987; Gangaiya & Morrison, 1987; Singh & pequeno raio iônico têm grupamentos funcionais OH Uehara, 1998) utilizaram o termo pH para representar o 0 mais ácidos que minerais com metais de mais baixa pH no qual o potencial superficial e, conseqüentemente, valência e maior raio iônico. Esse comportamento é o a densidade de carga variável é nula. resultado da distribuição de densidade eletrônica do Morais et al. (1976) utilizaram o termo PCZ para oxigênio da hidroxila em direção ao metal de alta definir um ponto obtido após a medição da adsorção de valência e raio pequeno, ao mesmo tempo que existe um íons de diferentes sais, como, KCl, MgCl, MgSO, K SO, 2 4 2 4 enfraquecimento da ligação covalente O-H com a enquanto que Magalhães & Page (1984b) propuseram conseqüente ionização mais fácil do H (McBride, 1989). um método chamado de “equilíbrio” mas chamaram de Por esse raciocínio, pode-se ordenar os principais PCZ o ponto obtido nesse método, da mesma maneira cátions estruturais dos minerais do solo da seguinte como haviam chamado esse ponto quando utilizaram a forma quanto a capacidade de atrair a nuvem eletrônica titulação potenciométrica e a retenção iônica. dos elementos próximos: PCZ: Modelos de Previsão Si > Al > Fe O primeiro modelo de previsão, proposto por Parks (1965, 1967), é baseado no modelo de Esses cátions, nessa ordem, têm maior eletrovalência de Pauling e recebeu a denominação de capacidade de atrair a nuvem eletrônica dos oxigênios Scientia Agricola, v.58, n.3, p.627-646, jul./set. 2001 632 Fontes et al. aos quais estão em contato, especialmente os de M - O- + H+ ⇔ M – OH (16) superfície, provocando uma ionização mais fácil do H da M - O- + Ct++ ⇔ M - O Ct+ (17) hidroxila. A diferenciação do Si para Al e Fe se faz pela valência e raio, ao passo que entre Al e Fe a em que Ct+ é o cátion trocável, sugere que a aplicação diferenciação se faz pelo raio iônico. da teoria da solvatação de Born para adsorção de Devido à dificuldade de predição do PCZ de cátions (Sverjensky, 1993) pode ser importante nas alguns óxidos e de silicatos, Yoon et al. (1979) reações de protonação de superfície. Desenvolvendo seu desenvolveram um modelo para corrigir os problemas modelo, Sverjensky (1994) chegou à equação para o encontrados com a utilização das equações propostas cálculo de PCZ: por Parks (1965, 1967). O modelo proposto combina a PCZ = - 0,5 (∆Ωγ / 2.303 RT) (1/ ) - B (s/ ) + log K” + (18) química cristalina com a teoria eletrostática da εk γM-OH H protonação, sugerindo que esta deve ser representada em que ∆Ωγ é o termo de solvatação de Born, εk é a do ponto de vista cristalográfico pela adição de prótons constante dielétrica para o sólido, B(s/ ) corresponde γM-OH a um oxigênio em movimento com carga residual υ da a B(υ/L), já definidos anteriormente, e logK” + é uma H seguinte forma: constante de equilíbrio. Segundo Sverjensky (1994), o primeiro termo na equação refere-se à contribuição da M - O(2 - υ)- + 2H+ ⇔ M υ + - OH (12) solvatação, que depende muito das propriedades do 2 sólido (1/ ), o segundo termo refere-se à repulsão Em que υ representa a força de ligação εk eletrostática dos prótons superficiais pelo metal eletrostática de Pauling. A equação parcial do modelo imediatamente abaixo da superfície e o termo final é uma é: combinação da constante geral de ligação intrínseca para PCZ = A – B(υ /L) - 0,5 log [(2 - υ)/υ] (13) o próton na superfície do sólido com a parte remanescente da contribuição da solvatação que Em que A e B são constantes semelhantes às do modelo depende das constantes dielétricas da água na interface anterior e podem ser obtidas por regressão, υ é igual a e na solução, e da atração eletrostática do próton ao Z/ , valência dividida pelo número de coordenação do NC oxigênio de superfície. metal estrutural e L é o comprimento da ligação metal- Utilizando oito minerais como padrão e suas hidroxila. Em termos práticos, L pode ser calculado pela propriedades, o autor simplificou a equação (18) em: soma L´ + r, em que L´ pode ser representado pela média do comprimento da ligação M-O no interior do cristal e r PCZ = 21,1158 (1/ ) - 42,9148 (s/ ) + 14,6866 (19) εk γM-OH pode ser tomado como 0,101 nm, que é a distância de e postula que, com ela, pode-se predizer o PCZ de O-H no gelo e muito próximo da distância da ligação O- outros óxidos utilizando-se os valores de constante H em água, hidróxidos e sólidos hidratados (Yoon et al., dielétrica e valores de força de ligação eletrostática de 1979). A equação final se torna: Pauling e o comprimento da ligação metal hidroxila. PCZ = 18,43 - 53,12 (υ/L) - 0,5 log [(2 - υ)/ υ] (14) Embora os resultados sejam consistentes e de concordância muito próxima entre os PCZs calculados ou e medidos (Sverjensky, 1994), algumas dúvidas ainda PCZ = 18,43 - 53,12 [(υ /L) + 5,61 x 10-4 C] - 0,5 log [(2 - υ)/ υ] (15) persistem. O valor utilizado pelo autor do PCZ medido para a gibbsita, e muito importante para dar validade ao Em que C é a energia de estabilização do campo modelo, é 9,84, mas Parks (1965), citando cristalino, termo utilizado apenas para os metais de Schuylenborgh & Sänger (1949), Schuylenborg (1951) e transição. Esse modelo deu resultados consistentes para Koz’mina et al. (1963), observou que esses autores alguns óxidos ou hidróxidos mas não conseguiu explicar encontraram valores de PCZ entre 3,8 e 5,2 para bem o PCZ para óxidos ou hidróxidos com ligações de amostras naturais e sintéticas de gibbsita. Esses valores ponte hidrogeniônicas fortes, o que é uma limitação para não são contestados na literatura, sendo alguns deles, alguns dos principais minerais do solo (White & Zelazny, inclusive, utilizados por Stumm & Morgan (1981), Stumm 1986). (1992) e Sparks (1995) para exemplificar a variação a Como o PCZ calculado dessa forma ainda que está sujeito o PCZ de minerais do solo. deixava algumas discrepâncias entre valores calculados O que parece ser um fator importante, e que será e medidos, Sverjensky (1994) apontou que deveria existir discutido adiante, é a incapacidade dos modelos de um efeito adicional não levado em consideração no previsão existentes (Sparks, 1965; 1967; Yoon et al. modelo eletrostático/química cristalina de protonação de 1979; Sverjensky, 1994) de captarem as variações de superfície, que é associado com a solvatação de prótons morfologia externa a que estão sujeitos os minerais do em solução aquosa. De acordo com esse autor, a solo. Dessa forma, todos os minerais são tratados de semelhança da adsorção de prótons superficiais com maneira igual e como se apresentassem uma superfície adsorção de cátions superficiais, representada pelas externa semelhante, com os mesmos grupos funcionais equações (16) e (17): em qualquer situação. Scientia Agricola, v.58, n.3, p.627-646, jul./set. 2001 Eletroquímica das partículas em solos altamente intemperizados 633 CARACTERIZAÇÃO E MEDIÇÃO DAS CARGAS A equação simplificada (21) indica que, nos colóides de potencial de superfície constante, a Modelos baseados na teoria da dupla camada densidade de carga varia com a concentração de A presença de cargas positivas e negativas eletrólitos do meio. Isso significa que se o potencial é caracterizando a natureza anfotérica de alguns solos foi constante, com uma mudança na força iônica da solução demonstrada por Mattson (1927), há mais de setenta há mudança na densidade de carga para a manutenção anos e por Schofield (1939) para as partículas de argila. da equação. Isso acontece nos solos de carga variável. Possivelmente, por não ser essa uma característica Além disso, para os colóides de potencial importante nos solos das regiões temperadas, o assunto constante e, por extensão, para os solos de carga ficou esquecido por algumas décadas. variável, a relação entre a concentração de íons Embora Schofield (1958) tenha aplicado a teoria determinantes de potencial e o potencial se faz por da dupla camada de Gouy-Chapmann para solos e Parks meio da equação de Nernst (van Olphen, 1977; Hunter, & de Bruyn (1962) e Parks (1965) tenham publicado 1993): importantes trabalhos na área de PCZ e PIE de óxidos sólidos, foi somente com o trabalho de Raij e Peech (1972) equsteu dsoe dinaicsi ocua ruamct epríesrtíiocdaos ddea rceanrgoava ddeo sinutpeererfsísceie pdeolos ψo= KzeT ln(H(H+)+P)CZ ou ψo= KzeT ln((HH0++)) (23) solos das regiões tropicais. Nesse trabalho, considerado que, com as devidas substituições das constantes o verdadeiro divisor de águas da Eletroquímica de Solos envolvidas, transforma-se em: moderna, iniciou-se a aplicação de modelos matemáticos para estudar o comportamento das cargas de superfície. ψo = 59 (pH - pH) ou ψψ ψψ o = 59 (pHo - pH) mV a 25°C (24) PCZ Nele, também se demonstrou que os minerais dominantes A equação (24) permite calcular o potencial de nos solos altamente intemperizados dos trópicos se superfície a qualquer pH desde que o PCZ seja comportavam essencialmente como os óxidos metálicos conhecido. e apresentavam predominantemente cargas dependentes Substituindo-se (24) em (20) têm-se: de pH. O ponto de partida para a utilização dos modelos matemáticos foi a utilização da teoria da dupla camada σ=(2nπKT)12 sen h ((cid:1)zKeT) 59 (pHPCZ −pH) (25) de cargas de Gouy-Chapmann, que descreve com sucesso várias propriedades dos colóides do solo, Com auxílio da equação (25) pode-se predizer, incluindo a carga elétrica de superfície (Singh & Uehara, pelo menos qualitativamente, como a densidade de 1986). A equação final da teoria de Gouy-Chapmann cargas varia com relação às características da suspensão. relaciona a densidade de carga (σ) com o potencial de Quando o pH da suspensão se iguala ao PCZ do colóide, superfície (ψ) (Overbeek, 1952; Babcock, 1963; tanto o potencial superficial quanto a densidade de cargas Adamson, 1967; van Olphen, 1977; Raij & Peech, 1972) são zero. Vê-se também que σ aumenta positivamente da seguinte forma: conforme o pH diminui abaixo do PCZ e σ aumenta negativamente em função do aumento do pH acima do 2nεKT ze σ=( )12 sen h ( ) ψo (20) PCZ. Do mesmo modo as cargas positivas ou negativas π (cid:1)KT aumentam ou diminuem com o aumento da concentração em que σ é a densidade de carga superficial, n é a eletrolítica da solução, dependendo se o pH da solução está abaixo ou acima do PCZ, respectivamente. O gráfico concentração de eletrólitos, e é a constante dielétrica do de σ em função do pH dá uma família de curvas para meio, K é a constante de Boltzmann, T é a temperatura diferentes concentrações de eletrólitos com interseção no absoluta, z é a valência do íon saturante, e é carga do elétron e ψo é o potencial de superfície. PCZ do colóide. Em síntese, esse foi o ponto de partida para utilizar a adição de ácidos e bases fortes sob Para um dado sal em solução aquosa, pode-se diferentes concentrações de eletrólitos na solução, para fazer: determinar a densidade de cargas e o ponto de carga zero (cid:1)εKT ze =A e =B A e B = constantes e a (PCZ) dos solos com predominância de colóides de carga π 2KT variável. equação (20) reduzir-se-á a: A partir dessa data até hoje, diversos autores têm σ = A (n)1/2 sen h B ψψψψψo (21) usado a técnica da titulação potenciométrica na determinação da carga superficial e dos chamados pHo, PCZ etc., de diversos solos (Gillman, 1974; El-Swaify e que para um potencial de superfície muito pequeno Sayegh, 1975; Espinosa et al., 1975; Gallez et al., 1976; transforma-se em Gillman & Bell, 1976; Hendershot e Lavkulich, 1978; σ(cid:1)(cid:1)=(cid:1)(cid:1)(ε4Kπ)(cid:1)Ψo (22) PPaargkee,r 1e9t 8a4l.;, 1M9a7r9c;a Cnoos-Mtaa ertti nael.z, 1&9 8M4;c BMraidgeal,h ã1e9s8 9&; Scientia Agricola, v.58, n.3, p.627-646, jul./set. 2001 634 Fontes et al. Siqueira et al., 1990; Chaves & Trajano, 1992; Alleoni & Para um eletrólito indiferente do tipo 1:1, para Camargo, 1994a; Silva et al.,1996; Dynia & Camargo, valores de pH – pH menor que a unidade e o 1998). Essa metodologia encontra-se descrita em considerando que nessas condições senh1,15z(pH - pH) o Camargo et al. (1986). ≈ 1,15(pH - pH) (Uehara e Gillman, 1980), e o Parker et al. (1979) publicaram uma avaliação substituindo-se as constantes por seus valores na crítica da utilização da teoria do ponto de carga zero ao equação (28), tem-se: sistema solo. Nesse trabalho, eles utilizaram uma nova σ = σ -0,135 n1/2 (pH - pH) (30) terminologia para o pH no qual uma série de curvas de T p 0 titulação potenciométrica se interceptam e demonstraram ou ao pH correspondente a PCLZ: que não necessariamente o encontro dessas curvas σ = - 0,135 n1/2 (pH - pH) (31) definiria o PCZ ou pHo. Eles chamaram esse pH de p 0 Ponto de Efeito Salino Zero (PESZ). O ponto de carga e assim, a correspondência entre os dois pontos de líquida zero foi determinado como sendo o pH no qual a carga zero fica: adsorção de cátions e ânions se igualava e houve PCLZ = (σ /0,135 n1/2) + pH (32) discrepância entre valores de PCLZ e PESZ. A adsorção p o específica de catíons, a troca de H+ com contraíons em que pH é uma propriedade intrínseca da mistura e o o PCLZ depende da concentração de eletrólitos, n, a associados com carga permanente e o consumo do menos que σ =0. ácido ou base adicionados em reações paralelas p secundárias nas quais o consumo de H+ ou OH- pode Nesse modelo, pH0 é obtido pelo ponto de interseção de duas ou mais curvas obtidas pela titulação não significar uma mudança na carga de superfície, são potenciométrica a diferentes concentrações de eletrólito, algumas razões apontadas para justificar as de acordo com a metodologia de Parks & Bruyn (1962) discrepâncias dos valores. Os autores enfatizaram que e Raij & Peech (1972). A carga permanente (σ ) é medida cuidados devem ser tomados ao se utilizarem os valores p pela diferença entre a adsorção de cátions e ânions no obtidos pela interseção das curvas para se fazer pH determinado na ausência de adsorção específica predições. A nomenclatura sugerida por Parker et al. 0 de íons. Se a adsorção de cátions excede a de ânions, (1979) passou a ser adotada por vários autores (Rojas a carga permanente é negativa e se o inverso ocorre, & Adams, 1980; Tessens & Shamshuddin,1982; Madrid σ é positiva. O PCLZ corresponde ao pH no qual a et al., 1984; Schulthess & Sparks, 1986; Meijer & p adsorção de cátions e ânions é igual (Gillman e Uehara, Buurman, 1987; Toner IV et al., 1989; Zhang et al., 1989). 1980). Em ambos os casos, utiliza-se, basicamente, a A constatação de que a maior parte dos solos metodologia de adsorção de cátions e ânions em nos trópicos tem na sua composição colóides com função do pH, como descrita originalmente por predomínio de cargas variáveis levou Uehara & Gillman Schofield (1949). (1980) e Gillman & Uehara (1980) a apresentarem um Wada & Okamura (1983), usando uma modelo que relaciona a densidade de carga superficial formulação teórica diferente, também chegaram a dois com o potencial de superfície para sistemas híbridos. valores de pontos de carga zero aos quais chamaram Nesse modelo, a densidade de carga líquida total de PCZ e PCC (ponto de carga constante), que equivale, superfície em um sistema misto é: essencialmente, ao PCLZ e pH, respectivamente. 0 σ = σ + σ (26) T p v Modelos Baseados no Balanço de Cargas Em que σ é a densidade de carga dos colóides com Um passo importante e com enfoque diferente no p carga permanente e por isso mesmo constante e σ é a estudo das cargas superficiais de partículas coloidais de v densidade de cargas dos colóides com carga variável. solos foi proposto por Sposito (1981). Esse autor Introduzindo-se algumas modificações na preconizou o estudo do balanço de cargas por meio de equação 20, de Gouy-Chapmann, apresentada uma lei geral da conservação que não exige modelo anteriormente têm-se: químico de superfície, como a teoria da dupla camada de cargas. Esse balanço de cargas se aplica a qualquer 2nεKT tipo de solo, tanto os com predominância de minerais de σV =( π )12 sen h 1,15 z(pHo – pH) (27) carga permanente quanto aqueles com maioria dos minerais de carga variável, desde que apresentem uma interface com cargas elétricas. σ = σ + 1,67 x 10-6 n1/2 (pH - pH) (28) T p 0 A equação geral do balanço de cargas pode ser Essa equação mostra que há dois pontos de expressa como a soma de diversas densidades de carga carga zero, um para σ =0 e outro para σ=0. O ponto de (Sposito, 1981; 1983; 1984; 1989b; 1992) e a carga total T v carga zero da mistura é expresso como ponto de carga da partícula pode ser representada matematicamente líquida zero (PCLZ) pela equação: σ + σ = 0 (29) σ = σ + σ + σ + σ (33) p v p o H EI EE Scientia Agricola, v.58, n.3, p.627-646, jul./set. 2001 Eletroquímica das partículas em solos altamente intemperizados 635 Em que σ é a densidade de carga da partícula, σ é a carga difusa (σ ), que é a carga desenvolvida pelos íons p o D densidade de carga líquida estrutural permanente, σ na parte difusa da dupla camada de cargas. Essas H é a densidade de carga protônica líquida, σ é a cargas movem-se quase que livremente em solução, EI densidade de carga líquida devida a íons que formam mas perto o suficiente para balancear σ . Assim: p complexos de esfera interna e σ é a densidade de EE σ + σ + σ + σ + σ = 0 (34) carga líquida devida a íons que formam complexos de o H EI EE D esfera externa. σ + σ = 0 ⇒ σ = -σ (35) p D p D Carga Estrutural Permanente Se a densidade de carga é expressa em mols A carga estrutural permanente (σ ) é aquela o de carga por unidade de massa, a carga líquida dos íons criada pela substituição isomórfica na estrutura dos adsorvidos é: minerais e já definida anteriormente. Carga Protônica (q - q) = σ + σ + σ (36) + - EI EE D Carga protônica líquida (σ ) é a diferença entre H em que q se refere ao excesso de carga superficial de mols de prótons e mols de íons hidroxila complexados cátions e ânions. Em algumas aplicações, é útil por grupos funcionais de superfície e, conceitualmente, agruparem-se os componentes do balanço de carga os prótons encontrados na parte difusa da dupla camada (Sposito, 1992) como: de cargas não são incluídos em σ (Sposito, 1989; 1992). Esse componente do balaHnço de cargas é σ = σ + σ (37) in o H essencialmente dependente do pH, pois com sua na qual σ é a densidade de carga superficial intrínseca mudança haverá modificação na protonação ou ou aquelain inerente à partícula. desprotonação dos grupos funcionais de superfície dos Pontos de Carga Zero minerais, causando mudança na densidade de cargas, ou seja, em σ . Além do pH, a concentração de eletrólitos Em função do balanço de cargas, alguns pontos H de carga zero podem ser definidos, dependendo do tipo indiferentes ou a força iônica da solução afeta essa cargas. Valores de σ podem ser positivos, negativos ou de densidade de carga que é colocada em questão. H Fontes (1996) propõe uma terminologia unificada para nulos. Valores máximos para os principais minerais de distinguir os diferentes tipos de PCZs (TABELA 1). carga dependente de pH podem ser estimados a partir de dados cristalográficos e variam assim: goethita TABELA 1 - Símbolos, nomes e condições para os diferentes -6,7 a +4,4; gibbsita -5,6 a +2,8 e caulinita -1,0 a +0,35 tipos de PCZ definidos em função do balanço µmol m-2 (Sposito, 1984). de cargas. Símbolo Nome Condição Carga de Complexos de Esfera Interna Carga líquida de complexos de esfera interna (σ ) PCZ Ponto de Carga Zero σp = 0 ou σD = 0 é a carga originária da presença de íons, exceto H+ e OHEI- PCZL Ponto de Carga Zero σ = 0 ou ∆q = 0 Líquida in , que formam complexos com os grupos funcionais Ponto de Carga Zero superficiais, ligando-se diretamente à estrutura cristalina PCZPL σ = 0 Protônica Líquida H dos minerais. Essa carga tem origem na adsorção específica de alguns ânions como fosfato, sulfato, silicato PCZES Ponto de Carga Zero por (∂σH) =0 Efeito Salino ∂I T etc. (Hingston et al., 1972; 1974; Jepson et al., 1976; Parfitt Fonte: Fontes (1996). & Atkinson, 1976; Parfitt & Smart, 1978; Wann & Uehara, 1978; Martin & Smart, 1987; McBride, 1989) e de cátions A tentativa de uniformizar os nomes prende-se como Cu, Pb, Zn, Cd, Ni, etc. (Kinniburgh et al., 1976; ao fato de que todos são pontos nos quais diferentes Bowden et al.,1977; McBride,1994). tipos de carga deixam de existir ou se igualam a zero. Na realidade, Zero deveria funcionar como adjetivo e Carga de Complexos de Esfera Externa indicar uma qualidade do substantivo Líquida ou A carga líquida de complexos de esfera externa Protônica Líquida, fazendo com que Ponto de Carga origina-se de íons que se localizam na camada de Stern, Líquida Zero e Ponto de Carga Protônica Líquida Zero próximos da superfície das partículas mas sem a sejam mais corretos em termos de linguagem. Contudo, interferência estrutural. Íons como Al3+, Ca2+, Mg2+, SO(cid:1)(cid:3)−etc. são importantes na formação desse tipo de a estrita obediência às regras gramaticais pode, muitas vezes, tornar os termos científicos mais prolixos ou carga. menos impactantes e, com isso, diminuir o poder de sua Carga Difusa mensagem. Existe, portanto, um conflito entre a Como os sistemas coloidais são sempre expressão técnica e a gramatical, sendo válida a criação eletricamente neutros, se a carga das partículas (σ ) na ou adaptação do termo técnico sempre que necessário p equação (33) é diferente de zero, ela tem que ser para facilitar a expressão (Prof. Nestor Kämpf, balanceada. Isso se dá pela formação da densidade de comunicação pessoal ao primeiro autor). Scientia Agricola, v.58, n.3, p.627-646, jul./set. 2001 636 Fontes et al. Apenas o PCZES difere um pouco dos outros aumenta a força de formação do complexo de esfera porque, na realidade, o que se iguala a zero é a variação interna entre o Cs+ e a carga estrutural do mineral. Após da carga protônica líquida em relação à variação da força a secagem, promove-se uma troca iônica com o Li+ iônica da solução, sob temperatura constante. A (LiCl) para retirar o Cs+ dos grupos funcionais hidroxila terminologia PCZES não é invalidada porque essa e por último remove-se o C+ adsorvido por troca com s invariância de σ é conseqüência da variação de cargas o NH + que tem capacidade de penetrar nos poros H 4 em colóides anfotéricos que caracterizam uma condição ditrigonais das superfícies siloxanas (Anderson & de igualdade a zero. Sposito, 1991). A terminologia para o termo PCZES difere da Esse método tem sido usado com sucesso por apresentada por Alleoni & Camargo (1993) e Camargo Anderson & Sposito (1991), Chorover & Sposito (1995), & Alleoni (1996), que propõem o termo Ponto de Efeito Fontes & Sposito (1995) e Peixoto et al. (1995a) em Salino Nulo (PESN). Segundo esses autores, o nome solos brasileiros. Fontes & Sposito (1995), utilizando Ponto de Efeito Salino Nulo, define o valor de pH no amostras de horizontes B de Latossolos, e por isso com ponto de interseção de duas ou mais curvas de muito pouco C orgânico, observaram que o método titulação, visto que, nestas condições, parece mais permite a detecção de pequenas quantidades de adequado o uso do adjetivo nulo, que indica uma minerais com carga permanente, muitas vezes em qualidade do efeito do sal, do que do numeral zero, quantidades não detectáveis pela difração de raios-X. muito usado na literatura, para definir o ponto. Segundo Peixoto et al. (1995a), por sua vez, utilizaram amostras Sposito (1989), o PESN é estritamente um valor de pH de horizontes A , A e B de Latossolos e observaram 1 3 2 no qual a carga líquida do próton (diferença entre o que a M.O. foi uma possível fonte de erros, número de moles de H+ e OH- adsorvidos) é invariável superestimando os valores de σ , principalmente o com a concentração do sal, e não um ponto no qual a dependendo do tipo de cátion naturalmente complexado carga superficial é nula, como preconizaram Parks & pela M.O. Apesar disso, eles afirmaram que, pela lógica Bruyn (1962). da amostragem e pela natureza dos solos, foi possível Alternativamente, então, a simbologia apre- detectar e isolar o efeito da M.O. nas cargas do solo e sentada no TABELA 2 pode ser utilizada. estimar as cargas negativas permanente (σ ), variável o (σ ), da matéria orgânica (σ ) e total acessível ao Cs+ TABELA 2 - Símbolos, nomes e condições para os diferentes (σvar ). Recentemente, ChorovMeOr et al. (1999) mediram a tipos de PCZ definidos em função do balanço caTrOgTa estrutural acessível ao Cs+ em uma de cargas. cronoseqüência de solos havaianos e observaram que Símbolo Nome Condição essa carga aumentou inicialmente com a idade dos solos PCZ Ponto de Carga Zero s = 0 ou s = 0 para depois decrescer à medida que o intemperismo p D Ponto de Carga Líquida atuava nos solos mais velhos. Observaram também que PCLZ s = 0 ou D q = 0 Zero in a magnitude da retenção de Cs+ correlacionou-se Ponto de Carga Protônica positivamente com a presença de minerais 2:1 PCPLZ s = 0 Líquida Zero H detectados pela difratometria de raios-X. Ponto de Efeito Salino ¶ s A medição da densidade de carga protônica foi PESN ( H) 0 Nulo ¶ I T desenvolvida inicialmente por Charlet & Sposito (1987) Fonte: Sposito (1984;1989b;1992); Alleoni & Camargo(1993); e se baseia no fato da titulação potenciométrica, Camargo & Alleoni (1996). introduzida ao estudo de solos por Raij & Peech (1972), não medir a densidade de carga protônica a um dado Metodologia para Medir PCZs e σσσσσ pH e força iônica, mesmo que se assuma que não s Com base no desenvolvimento teórico do ocorram reações paralelas secundárias, como dissolução balanço de cargas, Sposito e diversos colaboradores de minerais. Na realidade, a titulação potenciométrica vêm desenvolvendo uma metodologia que permite a produz um valor de σ relativo aquele do solo no começo medição da carga estrutural permanente (σ ) (Anderson da titulação e que éH chamado de σ . Por isso, a o Haparente & Sposito, 1991) e a medição simultânea da densidade obtenção do PCZES ou PESN pelo cruzamento das de carga protônica (σ ) em conjunto com a adsorção de curvas de σ e pH a diferentes forças iônicas não permite H H cátions e ânions (Charlet & Sposito, 1987; 1989; assumir que esse ponto equivale ao PCZPL. Assim, foi Chorover & Sposito, 1995). desenvolvida uma metodologia experimental para se A medição da carga estrutural permanente (σ ) medir, simultaneamente, a titulação potenciométrica e a o baseia-se na alta seletividade que o íon Cs+ tem para adsorção de cátions e ânions para se construirem curvas com as argilas 2:1 em função da formação de renormalizadas de σ vs pH para determinar PCZPL e H complexos de esfera interna nos poros ditrigonais das PCZES, em solos de carga permanente próxima a zero superfícies siloxonas desses minerais. Essa (Charlet & Sposito, 1987). Pode-se também estabelecer seletividade é aumentada no sistema onde o cátion uma relação entre estes dois atributos como já mostrado trocador é o Li+ e a secagem do material adsorvente na equação (30) (Zhang & Zhao, 1997). Scientia Agricola, v.58, n.3, p.627-646, jul./set. 2001

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and the improvement of the predictive capability of several phenomena, such as, floculation and dispersion of colloids Therefore, this literature review aims at to make a scientific approach of the topic “Electrochemistry of colloidal particles crítica da utilização da teoria do ponto de car
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