1 MAILZA RODRIGUES TOLEDO E SOUZA Do corpo ao texto: a mulher inscrita/escrita na poesia de Hilda Hilst e Ana Paula Tavares São Paulo 2009 2 MAILZA RODRIGUES TOLEDO E SOUZA Do corpo ao texto: a mulher inscrita/escrita na poesia de Hilda Hilst e Ana Paula Tavares Tese de Doutorado apresentada à Universidade De São Paulo Faculdade De Filosofia, Letras E Ciências Humanas, ao Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. ÁREA: Estudos Comparados de Língua Portuguesa, LINHA DE PESQUISA: Literatura e Sociedade nos Países de Língua Portuguesa. Orientador: Prof. Dr. Benjamin Abdala Júnior São Paulo – SP outubro de 2009 3 Catalogação na Publicação Serviço de Biblioteca e Documentação Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo PCD ____________________________________________________________________ Souza, Mailza Rodrigues Toledo e Do corpo ao texto: a mulher inscrita/escrita na poesia de Hilda Hilst e Ana Paula Tavares/ Mailza Rodrigues Toledo e Souza ; orientador Benjamin Abdala Junior. -- São Paulo, 2009. 204 p. Tese (Doutorado – Programa de Pós-Graduação em Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. 1. Erotismo. 2. Identidade. 3. Crítica feminista. 4. Hilst, Hilda 1930-. 5. Tavares, Ana Paula. 6. Literatura comparada. I. Título. II. Abdala Junior, Benjamin 4 DEDICATÓRIA DEDICO ESTE TRABALHO: Ao Fredo, meu amado, meu companheiro, meu marido, porque o amor existe. À Mocinha, à Cherry, ao Junior, à Mimi, à Dolly, à Clarinha, à Carol, à Florbela, ao Ênio, os filhos que eu escolhi ter, porque me ensinaram que só o amor incondicional é verdadeiro. À Mirinha, minha amiga-irmã, porque os amigos são a família que podemos escolher. À Nana, minha sobrinha-filha, porque ela é a minha Nana. 5 AGRADECIMENTOS AGRADEÇO: A Deus, porque Deus é e está em TUDO. Ao meu queridíssimo orientador Prof. Dr. Benjamin Abdala Júnior, pela preciosa orientação. A todos os meus professores, desde a infância, pois é lá que tudo começa. Às Professoras Tania Macêdo, Simone Caputo e Cleide Rapucci, por terem sido maravilhosas comigo. À D. Maria, minha sogra; à Denise, minha cunhada; e ao Fredo, meu amor e meu marido, pelo apoio neste momento crucial e tão importante da minha vida. A todos os meus colegas da USP, em especial à Érica, por ter me fornecido todo o material sobre Paula Tavares, no começo de minha pesquisa. A todos os amigos que fizeram e fazem parte da minha história! MEU MUITÍSSIMO OBRIGADA!!! 6 Ainda que descontente Te vejas pensando sempre Num alguém que está aí dentro De quem não conheces rosto Nem gosto nem pensamento. Cuida que tal Idéia Te tome. Melhor um cheio de dentro Que não conheces, um fartar-se De um nada conhecimento Do que um vazio de luto Umas cascas sem os frutos Pele sem corpo, ou ossos Sem matéria que os sustente. HILDA HILST 7 RESUMO SOUZA. M.R.T. Do corpo ao texto: a mulher inscrita/escrita na poesia de Hilda Hilst e Ana Paula Tavares. Tese (Doutorado) Universidade De São Paulo Faculdade De Filosofia, Letras E Ciências Humanas. Tendo como objeto de estudo obras poéticas de Hilda Hilst, brasileira; e Ana Paula Tavares, angolana, esta pesquisa visa a discutir caracteres da construção identitária culturalmente atribuídos à condição feminina, a partir das manifestações eróticas representadas poeticamente na obra dessas autoras. Embora sejam escritoras não diretamente vinculadas a um programa literário feminista, ao representarem poeticamente o erotismo, contribuem para promover a emancipação da mulher. Associam-se, assim, construção erótica e construção da cidadania, analisadas neste projeto de um ângulo simultaneamente literário e sócio-existencial. Palavras-Chave: Erotismo, Identidade, Crítica Feminista, Estudos Comparados, Hilda Hilst, Ana Paula Tavares. 8 ABSTRACT SOUZA. M.R.T. From the body to the text: the engraved/written woman in the poetry of Hilda Hilst and Ana Paula Tavares. Thesis (Doctorate) Universidade De São Paulo Faculdade De Filosofia, Letras E Ciências Humanas. Taking as an object of study poetic works from Hilda Hilst, Brazilian; and Ana Paula Tavares, Angolan, this inquiry aims to discuss characters from the identity construction culturally attributed to the feminine condition, derived from the erotic demonstrations poetically represented in the work of these authors. Though they are writers not straightly linked to a literary feminist program, while representing poetically the eroticism they contribute to promote the emancipation of women. Therefore, the erotic construction and the citizenship construction have been associated and analyzed in this project simultaneously from a literary and a social-existential angle. Keywords: Erotism, Identity, Feminist Critique, Comparative Studies, Hilda Hilst, Ana Paula Tavares. 9 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.................................................................................................... 10 1.1 Dos movimentos sociais às representações literárias: fluxos entre a Rede e o Ser. 24 1.2 Sociedade em Rede, Literatura, Pós-colonialismo, Feminismo, Ecologia, Erotismo: ajustando o foco sobre o Ser................................................................. 27 1.2.1 Feminismo e Crítica Feminista: percursos e percalços .......................................... 30 1.2.2 Da emancipação político-social à literária: surge a Crítica feminista..................... 35 1.2.3 Do corpo ao texto: poetização do erotismo ou erotização do poético, um jeito de (in)escrever mulher..................................................................................... 44 1.2.3.1 Hilda Hilst e Paula Tavares, duas poetas, dois locus enunciativos: um diálogo.. 47 2. DO ESPAÇO POÉTICO AO TERRITÓRIO EXISTENCIAL: A POESIA DE HILDA HILST............................................................................................... 52 2.1 Pornoerotismo ou erotismo-pornô? A escritura obscena de Hilda Hilst................ 52 2.2 Entre o sagrado e o profano: o erotismo religioso e a mulher escrita por Hilda Hilst ....................................................................................................................... 70 2.3 Do Amor: fotografias paradoxais............................................................................ 95 3. AS MARCAS DA HISTÓRIA NAS MARCAS DA POESIA........................... 112 3.1 Essas mulheres de Angola: o fluxo e o refluxo poético...........................................116 3.2. Poeticidade e emancipação feminina: o erotismo telúrico e a denuncia social na poesia de Paula Tavares ..................................................................................... 126 3.3 Ritos de passagem: travessias ................................................................................. 132 3.3.1 Circunavegações erótico-poéticas............................................................................ 139 3.4 O lago da Lua: reflexos transversais.........................................................................145 4. A MULHER NO BRASIL E EM ANGOLA: MARCAS DA OPRESSÃO FEMININA NA POESIA DE DUAS MULHERES..............................................159 4.1 Da erotização da Natureza à natureza erótica do ser mulher:Hilda Hilst e Paula Tavares, vozes das mulheres emudecidas.................................................................. 167 4.2 O corpo da mulher no corpo do poema: um espaço de encontro com o sagrado...... 175 4.3 Da hermenêutica do cotidiano para uma hermenêutica existencial: relações (eco)lógicas na poética de duas mulheres..................................................................183 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. 192 7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................. 196 10 INTRODUÇÃO O processo de globalização, ao enfatizar perspectivas individualistas e, mesmo, narcisistas, tem provocado crises em relação às questões identitárias, em nível das nações, das culturas nacionais, de gêneros, de religiões, etc. Porém, “Isto não significa que nos tempos pré-modernos as pessoas não eram indivíduos, mas que a individualidade era tanto ‘vivida’ quanto ‘conceptualizada’ de forma diferente” (HALL, 2003, p. 25), ou seja, acreditava-se, numa identidade estável que, atualmente, em virtude da dinamicidade e provisoriedade da sociedade informacional, ela acaba por ser entendida como móvel, em constantes processos de deslocamentos. Enfim, são inúmeros os predicativos atribuídos a esta situação de crise do ser social cujos caracteres se dividem problematicamente entre solicitações que o projetam “entre globalização e identidade, entre a Rede e o Ser” (CASTELLS, 2005, p.58). Segundo Castells, o maior desafio do sujeito diante da globalização é encontrar/identificar-se, só assim é possível preservar as identidades nacionais culturais e, acima de tudo preservar-se como ser humano e não um produto reificado pelo capital financeiro e pasteurizado na Rede. Assim, a luta principal na era da informação passou a ser a luta pela redefinição dos códigos culturais, e esses códigos, em última instância, residem na mente humana. A mente humana tornou-se, portanto, o principal “objeto de mercado”, por ser também “objeto” de domínio psicosocial por parte de quem possui o poder. Os movimentos sociais e culturais – feminismo, pós-colonialismo, afrocentrismo, ambientalismo, negritude, defesa dos direitos humanos, multiculturalismo, etc. – funcionam como “vozes” de identidades específicas, estabelecendo uma espécie de “meta-rede”, ou seja, grupos sociais, que podemos comparar a uma rede paralela, formada de fragmentos diversos da sociedade, mas uma vez articulados, fazem frente ao inimigo comum: a Globalização e o seu violento processo de massificação do ser. Este inimigo comum é, portanto, o “nó” que articula os movimentos sociais, apesar de sua diversidade, formando essa meta-rede através do surgimento de “poderosas identidades de resistência, que se retraem para seus ‘paraísos comunais’ e recusam-se a ser apanhadas de roldão pelos fluxos globais e individualismo radical” (CASTELLS, 2001,p.419) Os movimentos sociais podem ser diversos sem, no entanto, serem estanques entre si, podendo dialogar em determinados momentos históricos e contextos sociais, como o que vivemos atualmente no qual “Segue-se uma divisão fundamental entre o instrumentalismo universal abstrato e as identidades particularistas historicamente enraizadas” (CASTELLS,
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