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Direito e razão: teoria do garantismo penal PDF

764 Pages·2002·37.726 MB·Portuguese
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I l l I Cl r C R R f l J O II DIREITO 6 IMZÃO Teoria do Garantismo Penal 3.* edição revista Preíido TRADUTORES Norberto Bobbio ANA PAULA ZOMER SICA FAUZI HASSAN CHOUKR JUAREZ TAVARES LUIZ FLÁVIO GOMES (0Ub0r*40rtt Aléxis Couto de Brito Alice Bianchini Evandro Fernandes de Pontes Fernanda Lara Tórtima José Antonio Siqueira Pontes EDITORA í v lr Lauren Paoletti Stefanini REVISTA DOS TRIBUNAIS Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Ferrajoli, Luigi Direito e razão : teoria do garantismo penal / Luigi Ferrajoli. - São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2002. Título original: Diritto e ragione. Vários colaboradores. Vários tradutores. ISBN 85-203-1955-6 1. Direito - Teoria 2. Direito e política 3. Direito penal - Filosofia I. Título. 00-3997 ÇDU-343:340.11 índices para catálogo sistemático: 1. Garantismo penal : teoria : direito 343:340.11 LUIGI FERRAJOLI D I R E I TO E R A Z AO TEORIA DO GARANTISMO PENAL Prefácio de NORBERTO BOBBIO Tradutores ANA PAULA ZOMER FAUZI HASSAN CHOUKR JUAREZ TAVARES LUIZ FLÁVIO GOMES Com a colaboração de ALICE BIANCHINI EVANDRO FERNANDES DE PONTES JOSÉ ANTONIO SIQUEIRA PONTES LAUREN PAOLETTI STEFANINI EDITOftA í tt REVISTA DOS TRIBUNAIS DIREITO E RAZÃO TEORIA DO GARANTISMO PENAL LUIGI FERRAJOLI Prefácio de NORBERTO BOBBIO Tradutores do livro Diritto e ragione: teoria dei garantismo penale, de Luigi Ferrajoli, """" 6.ed. Roma: Laterza, 2000: ANA PAULA ZOMER, JUAREZ TAVARES, FAUZI HASSAN CHOUKR, LUIZ FLÁVIO GOMES. com a colaboração de: Alice Bianchini, Evandro Fernandes de Pontes, José Antonio Siqueira Pontes, Lauren Paoletti Stefanini 2470 © desta edição: 2002 EDITORA REVISTA DOS TRIBUNAIS LTDA. Diretor Responsável: CARLOS HENRIQUE DE CARVALHO FILHO Visite nosso site: http://www.rt.com.br CENTRO DE ATENDIMENTO AO CONSUMIDOR: Tel. 0800-11-2433 e-mail do atendimento ao consumidor: [email protected] Rua do Bosque, 820 • Barra Funda Tel. (Oxxll) 3613-8400 • Fax (Oxxll) 3613-8450 CEP 01136-000 - São Paulo, SP, Brasil TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou proces- so, especialmente por sistemas gráficos, microfílmicos, fotográficos, reprográficos, fonográficos, videográfi- cos. Vedada a memorização e/ou a recuperação total ou parcial, bem como a inclusão de qualquer parte desta obra em qualquer sistema de processamento de dados. Essas proibições aplicam-se também às características gráficas da obra e à sua editoração. A violação dos direitos autorais é punível como crime (art. 184 e parágra- fos do Código Penal) com pena de prisão e multa, busca e apreensão e indenizações diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610, de 19.02.1998, Lei dos Direitos Autorais). Impresso no Brasil ( 10 - 2002 ) ISBN 85-203-1955-6 APRESENTAÇÃO A EDITORA REVISTA DOS TRIBUNAIS, atenta às profundas e velozes transfor- mações que se operam na sociedade moderna e, sobretudo, na estrutura e no funciona- mento do Direito e da Justiça criminais, antecipa-se na introdução dos seus fundamentos, para reflexão e descoberta de novos rumos. E com esse objetivo que publica Direito e razão, de Luigi Ferrajoli, ex-magistrado e professor de Filosofia do Direito na Universidade de Camerino, um dos mais proeminen- tes pensadores^õntemporâneos do Direito, de tradição iluminista e liberal. Autor de numerosas e importantes obras, dentre elas Teoria assiomatizzata dei diritto, La sovranità nel mondo moderno e La culturg^iuridica nellltalia dei novecento, teve pu- blicada a l.a edição de Diritto e ragione em^89 e, desde então, várias foram suas edições. A receptividade àlcançada pelas idéiás de Ferrajoli não é acidental, mas procede da crise vivenciada por todos os setores do pensamento e da práxis não só na Itália ou no Brasil como no mundo ocidental globalizado. O Direito, em especial o penal, não ficou imune a todas essas transformações. Quando se pensa na Justiça penal nacional, não há como deixar de reconhecer sua forte crise de legitimidade: morosidade, sensação de impunidade, ineficácia da sanção, enfim, descrédito generalizado. No processo legislativo, por sua vez, evidencia-se a necessidade de maior celeridade e eficácia, para fazer frente, principalmente, à proteção de direitos emergentes, atinentes à informática, à genética,f ao consumo de alimentos etc. Em âmbito internacional, a agilização e intensificação das relações entre os países colocam a demanda pelo desenvolvimento de políticas e justiças criminais uniformes e de cooperação policial e judicial. Mais: antigos crimes, como o descaminho e a evasão de divisas, deverão ser redefinidos; outros, como a lavagem de capitais, redimensionados. A presente obra, ao discutir o sistema penal atual, em suas bases filosóficas, políticas e jurídicas, destrói velhos vícios teóricos e práticos para, em seguida, construir a teoria geral do garantismo como modelo ideal - um sistema normativo dotado de garantias que lhe tragam racionalidade -, a partir da qual são analisados os problemas fundamentais da pena, do delito e do processo penal. Trata-se de obra marcante, que conta com prefácio de Norberto Bobbio e tradução da 6.a edição por renomados estudiosos da matéria, escolhidos pelo próprio autor: Juarez Tavares (prefácio e capítulos 1 a 3), Ana Paula Zomer (capítulos 4 a 6), Luiz Flávio Gomes (capítulos 7 e 8) e/Fauzi Hassan Choukr (capítulos 9 a 14). E com grande orgulho que esta Editora a publica, na certeza de que com essa inicia- tiva estará contribuindo efetivamente para a construção do Direito do terceiro milênio. EDITORA REVISTA DOS TRIBUNAIS i I í í i I I i PREFÁCIO DA í.a EDIÇÃO ITALIANA Direito e razão é a conclusão de uma extensa é minuciosa investigação, levada a efeito durante anos, sobre as mais diversas disciplinas jurídicas, especialmente o direito penal, e de uma longa e apaixonada reflexão, nutrida de estudos filosóficos e históricos, sobre os ideais morais que inspiram ou deveriam inspirar o direito das nações civilizadas. Luigi Ferrajoli havia se preparado, há algum tempo, para esta obra com estudos de filoso- fia, epistemologia, ética, lógica, teoria e ciência do direito, de história das doutrinas e ins- tituições jurídicas, enriquecidos pela experiência intensa e seriamente vivida no exercício de sua antiga atividade de magistrado. Todo este amplo discurso se desenvolve de forma compacta entre a crítica dos fun- damentos gnosiológicos e éticos do direito penal, em um extremo, e a crítica da práxis judicial de nosso país, em outro, afastando-se dos dois vícios opostos da teoria sem con- troles empíricos e da prática sem princípios, e sem perder jamais de vista, não obstante a multiplicidade dos problemas enfrentados e a riqueza da informação, a coerência das par- tes com o todo, a unidade do sistema, a síntese final. As diversas partes se desdobram ^isegundo uma ordem preestabelecida e sempre rigorosamente respeitada. O princípio an- iecipa a conclusão, o fim retoma, depois do trajeto longo e linear, ao princípio. A aposta é alta: a elaboração de um sistema geral do garantismo ou, se se quiser, a construção das colunas mestras do Estado de direito, que tem por fundamento e fim a tu- tela das liberdades do indivíduo frente às variadas formas de exercício arbitrário de poder, particularmente odioso no direito penal. Mas é um jogo que tem suas regras: o autor, de- pois de havê-las estabelecido, as observa com escrúpulo e, assim, permite ao leitor encon- trar o caminho sem demasiado esforço. A coerência do conjunto se torna possível pela prévia declaração dos pressupostos metodológicos e teóricos, pelo proceder por meio de conceitos bem definidos e de suas relativas sínteses, pela concatenação das diversas partes e pela progressão racional de uma a outra. A obra, não ©bstaale a complexidade da formulação e a grande quantidade de pro- blemas afrontados, é de admirável clareza. Pode-se estar de acordo ou dissentir. Mas não devemos nos apressar em entender o que o autor quis dizer. O leitor pode transitar de uma etapa a outra do longo caminho sem que seja necessário despojar-se, a cada momento, escombros de complexidades inúteis. Ferrajoli é um amante das teses claras e precisas, que procede por meio de um conhecimento seguro dos fatos de que fala e que, ao expô-los ordenadamente, se aproveita de sua preparação em lógica (não seria inútil recordar que uma de suas primeiras provas de estudioso foi uma Teoria assiomatizzata dei diritto), o que não quer dizer idéias simples ou, ainda pior, simpjificadas. Antes, pelo contrário, a clareza que deriva da eliminação de confusões lingüísticas e conceituais tem como conse- qüência - e não poderia ser de outro modo - a multiplicação das diversidades e subdiver- 8 DIREITO E RAZÃO sidades, a dissolução de unidades aparentes, o ver de perto todos os aspectos de uma figu- ra, que de longe, na névoa do pensamento confuso, parecia uniforme. Não obstante este proceder por meio da desarticulação do inarticulado e da concre- tização do vago e do genérico, é importante, para a plena compreensão do conjunto, que não se perca de vista a idéia inspiradora da obra: a idéia iluminista e liberal - iluminista em '•^^fíTosofia e liberal em política - segundo a qual, diante da grande antítese entre liberdade e poder que domina toda a história humana - em que, nas relações entre indivíduos e entre grupos, quanto maior seja a liberdade tanto menor será o poder e vice-versa -, é boa e por conseguinte desejável e defensável a solução que amplia a e§f%reftte liberdade e restringe a do poder ou, com outras palavras, aquela para a qual o poder deve ser limitado, a fim de permitir a cada um gozar da máxima liberdade, compatível com a igual liberdade de todos os demais. A obra se desenvolve por antíteses ou grandes dicotomias, concatenadas entre si, de maneira que, em uma linha, estão as teses positivas e, em outra, as negativas. Da antítese liberdade/poder nascem todas as restantes. Começando na esfera específica do direito penal, a que se dá entreimodeío garantistaleímodelo autoritário] entre garantismò e decisionismo, e continuando com todas as que têm conexão com ela: governo das leis - pelo que se en- tende governo tanto sub lege quanto per leges, com a ulterior distinção, fundamental, en- tre mera legalidade e legalidade estrita.- e governo dos homens, Estado de direito frente a Estado absolutc^ou despótico; formalismojfrente a substancialismo, passo a passo para aquelas através das quais o autor expõe sua orientação na política penalista, direito penal mínimo frente a direito penal máximo, o direito do mais fraco frente ao direito do mais forte; em última instância, certeza frente arbítrio. A defesa das próprias teses é acompanhada da crítica das doutrinas opostas, que têm constituído grande parte da história da filosofia do direito penal e que não deixam de vol- tar à cena, umas vezes agressivamente e outras de maneira encoberta. A batalha em defesa do garantismo é, pois, sempre, apesar das solenes declarações de princípios não muito confortadas pelos fatos, uma batalha de minorias. Precisamente por isso, tanto mais difí- cil, porque deve ser defendida com armas temperadas e afiadas. Qcoire, às vezes, que o adversário oferece duas caras; então, a tese proposta se converte inevitavelmente em um tercium quid entre dois extremos. A legaiidade se opõe ao arbítrio, mas a oposição é dupla, quando o arbítrio pode derivar tanto de uma concepção objetivista do delito e, em geral, do mal, de origem metafísica, quanto de uma igualmente indevida objetivação, como a deri- vada da ^criminologia positivista] à qual o autor não reconhece caráter científico e para a qual não economiza dardos envenenados. Por sua vez, a tese do direito penal mínimo abre sua frente principal contra as teorias do direitojDen^ pena de morte), mas não pode passar por alto das doutrinas abolicionistas ou substitutivis- ^ tas, segundo as quais a pena, pelo contrário, estaria destinada a desaparecer. As vezes, os extremos se tocam: a liberdade regrada deve se opor tanto à antiliberal, quer dizer, a qual- quer forma de abuso do direito de punir, quanto à carência de regras, ou seja, à liberdade selvagem. O princípio da legalidade é contrário ao arbítrio, mas também ao iegalismo obtuso, mecânico, que não reconhece a exigência da eqüidade, a qual, com expressão tomada da lógica dos conceitos, o autor chama de poder de "conotação", e a presença de espaços nos quais habitualmente se exerce o poder do juiz. No positivismo jurídico, o problema da justiça está separado do da legitimação interna do ordenamento ou da validez: uma posi- PREFÁCIO DA l.a EDIÇÃO ITALIANA 9 ção como esta se encontra no meio tanto da redução do segundo ao primeiro, o que é pró- prio do jusnaturalismo clássico, quanto da redução do primeiro ao segundo, que caracte- riza o legalismo ético. O garantismo é um modelo ideal, do qual nos podemos mais ou menos aproximar. Como modelo, representa uma meta que permanece como tal, ainda que não seja alcança- da e não possa jamais ser alcançada inteiramente. Mas, para constituir uma meta, o mode- lo deve ser definido em todos os aspectos. Somente se estiver bem definido poderá servir de critério de valoração e de correção do direito existente. À descrição do modelo está dedicada essencialmente a primeira parte, toda ela cen- trada sobre a pura contraposição entre o momento da legislação e o da jurisdição: o pri- meiro encontra seu elemento constitutivo no convencionalismo; isto é, na teoria conforme a qual é delito o que a lei estabelece como tal, em contraste com as doutrinas objetivistas do delito, para as quais há ações más em si mesmas; e o segundo, com seu elemento cons- titutivo na doutrina contrária, doicognitivismo, segundo a qual incumbe ao juiz verificar ou refutar a hipótese acusatória por meio de procedimentos que tornem possível o conhe- cimento dos fatos. Com uma feliz antítese, feliz por seu caráter sintético, que está centra- lizada nos dois conceitos gerais do "poder" e do '.'saber", a contraposição entre legislação e jurisdição, segundo o abstrato modelo garantista, se expressa com estas duas máximas: acerca da legislação - Auctoritas, non veritas facit legem\ acerca da jurisdição - Veritas, non auctoritas facit judicium. A segunda e a terceira parte analisam, à luz do modelo, os problemas fundamentais que constituem a matéria tradicional do direito e do processo penal - a pena, o delito, o processo -, respondendo com calculada simetria, em cada um dos três temas, às quatro perguntas: se, por que, quando e como "punir"; se, por que, quando e como "proibir"; se, por que, quando e como "julgar". O modelo, uma vez apresentado em todas as suas partes, serve de critério de valoração da situação atual do direito e do processo penal na Itália: tal juízo, ao qual está dedicada a quarta parte, é muito severo e trata de demonstrar até que ponto a realidade do sistema penal vigente está longe do modelo, pela presença de três subsistemas desviados, o do direito penal comum, ainda caracterizado pela sobrevivência do código fascista e de algumas deficiências ou lacunas da mesma Constituição; o das diversas medidas de polícia que se põem ao largo do direito penal comum e a ele se sobrepõem; enfim, o introduzido pelas leis excepcionais, frente à chamada emergência. Enquanto as três primeiras partes se caracterizam por seu rigor argumentativo e pela complexidade da construção sistemática, a quarta se distingue pela amplitude da docu- mentação, que faz dela um verdadeiro e próprio repertório das partes enfermas de um sistema, de que tanto o advogado quanto o juiz, o político ou o funcionário quanto o jornalista podem obter proveito. Chamo a atenção também para a extensão das notas bibliográficas e históricas, nas quais o leitor encontrará interessantíssimas notícias rela- tivas à história de cada um dos problemas. A última parte, enfim, é uma tentativa de extrair dos resultados obtidos na descrição do modelo garantista penal as grandes linhas de um modelo geral do garantismo: antes de tudo, elevando-o almodelo ideal do Estado de direitoj entendido não apenas como Estado liberal, protetor dos direitos de liberdade, mas como Estado social^ chamado a proteger vtambém os direitos podais; em segundo lugar, apresentarido-o como uma teoria do direito que propõe um juspositivismo crítico, contraposto ao juspositivismo dogmático; e, por 10 DIREITO E RAZÃO último, interpretando-o como uma filosofia política, que funda o Estado sobre os direitos fundamentais dos cidadãos e que, precisamente, do reconhecimento e da efetiva proteção (não basta o reconhecimento!) destes direitos extrai sua legitimidade e também a capaci- dade de se renovar, sem recorrer à violência subversiva. Não tenho, por certo, a pretensão de haver dado, com esta apresentação sumária, uma idéia suficiente de uma obra destinada a suscitar um debate que não se esgotará com sua primeira edição. Menos ainda presumo de poder antecipar um julgamento. Posso di- zer, em geral, que Direito e razão é uma obra onde se encontram continuamente entretidos problemas de teoria do direito) e problemas de política do direito je que deverá ser com- preendida e julgada a partir de ambos os pontos de vista. Naturalmente, ainda que ambos os aspectos se encontrem estreitamente ligados, podem ser tratados separadamente. Uma teoria pode ter resultados prescritivos diversos, assim como um programa de reformas legislativas pode ter diversos fundamentos teóricos. Como teórico do direito, Ferrajoli pertence à família dos positivistas na tradição de Kelsen, Hart e do positivismo italiano deste último quarto de século. Mas é um positivista particularmente atento a distinguir a validez formal, ou vigência, das normas de sua vali- dez substancial e a sublinhar que, em um ordenamento que tenha recepcionado os direitos fundamentais de liberdade, a validez não pode ser apenas formal; que, portanto, existe nesse ordenamento um problema de justiça interna das leis e não só externa: um positivis- ta bem consciente de que, uma vez produzida na maior parte das constituições modernas a constitucionalização dos direitos naturais, o tradicional conflito entre direito positivo e direito natural, entre positivismo jurídico e jusnaturalismo, tem perdido grande parte de seu significado, com a consciência de que a divergência entre o que o direito é e o que o direito deve ser, expressa tradicionalmente sob a forma de contraste entre a lei positiva e a lei natural, tem-se transformado na divergência entre o que o direito é e o que direito deve ser no interior de um mesmo ordenamento jurídico ou, com palavras usadas repeti- damente pelo autor, entre "efetividade" e "normatividade". Este contraste está, além dis- so, na base da tarefa específica do jurista, várias vezes posta em relevo, que é a crítica do direito vigente: uma tarefa que contrasta com um dos eixos da ciência jurídica, segundo o positivismo de estrita observância, que é o da neutralidade valorativa da ciência do direito. A recorrente constatação deste contraste, em especial no que se refere ao direito penal italiano, constitui um dos motivos de interesse do livro, no qual a frieza e a secura - diria quase a aridez - do raciocínio não chegam jamais a sufocar o fogo da paixão civil. Se, com respeito às escolas tradicionais de teoria do direito, a orientação teórica de Ferrajoli pertence ao positivismo jurídico, ainda que corrigido e menos intransigente, mas de fato mais conseqüente, quanto ao método ou, simplesmente, quanto ao modo de proce- der na argumentação, Ferrajoli pode ser incluído entre os filósofos analíticos: positivismo jurídico e filosofia analítica têm percorrido, pelo menos na Itália, talvez mais na Itália do que em outra parte, muitos caminhos comuns. A adesão à filosofia analítica está declarada explicitamente em vários lugares. Esta vinculação é revelada na atenção continuamente ) prestada às "questões de palavras"7nongÕr do raciocínio,, jàmS£sép^^o da prova dos : fatos, na tendência ao distingue freqüenter, na^v^ão^ajodajbrma de essencialismo. Do ponto de vista da política do direito, o teórico do garantismo não pode deixar de se inserir na grande! tradição do pensamento iluminista e liberalj que nd campo do direito penal vai de Beccaria a Francesco Carrara, embora proponha uma revisão dos fundamen-

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