INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS No 137 MARÇO/2012 Desenvolver e promover informações científicas sobre MISSÃO o manejo responsável dos nutrientes das plantas para o benefício da família humana DEFICIÊNCIA TEMPORÁRIA DE CÁLCIO COMO CAUSA PRIMÁRIA DO AMARELECIMENTO FATAL DO DENDEZEIRO1 Douglas Laing2 1. INTRODUÇÃO MA, 2009). O rendimento de azeite bruto na Colômbia diminuiu de 4,2 t ha-1 em 2004 para 3 t ha-1 em 2010, e uma parcela significativa Em muitas plantações comerciais de dendezeiro desse declínio é atribuída à devastação causada pelo AF (MesA, (Elaeis guineensis) existem incidências graves de 2010). As perdas econômicas ocorrem principalmente pela redução uma desordem usualmente denominada Amareleci- do rendimento e pelo aumento dos custos associados à renovação mento Fatal (AF), ou Pudrición de Cogollo (PC), em espanhol, ou precoce do pomar e ao controle fitossanitário – incluindo o do bi- Oil Palm Bud Rot, em inglês. O distúrbio é conhecido em vários cudo do dendezeiro – incorridos durante as fases de recuperação países produtores nas Américas e na África desde os primeiros re- lenta do distúrbio. O AF é considerado por muitos como a limitação latos e observações de Reinking, em 1928 (De FRAnqueville, mais importante para a indústria do dendê na América e um gargalo 2001), em plantação exploratória conduzida pela então united Fruit crítico para a expansão da cultura na Bacia Amazônica (BOARi, Company, próximo ao distrito de Almirante, no Panamá. As incidên- 2008; FunDAçãO KOnRAD ADenAueR, 2008). cias mais graves foram relatadas em áreas específicas de produção Os sintomas do AF também encontram paralelo na cultura na Colômbia, equador, Peru, Costa Rica, Brasil – principalmente da banana (PlOetZ, 2000; tuRneR e ROSAleS, 2003) e em nos estados do Pará e Amazonas –, venezuela, Suriname, nicarágua outras culturas permanentes cultivadas nos trópicos, onde o sistema e na região equatorial ocidental da África Central, particularmente de cultivo dominante é aparentemente pouco sustentável a médio na atual República Democrática do Congo-Zaire e na República do e longo prazo. A acidificação progressiva dos solos cultivados é Congo-Brazzaville (DuFF, 1963; De FRAnqueville, 2001). considerada como um dos fatores mais críticos para o declínio da O AF não é considerado um problema sério nas regiões saúde das raízes e da rizosfera em sistemas intensivos (SeRRAnO, produtoras de Honduras, Guatemala (Costa do Pacífico), México 2003). As causas deste fenômeno no dendezeiro são muito seme- (Costa Atlântica) ou na República Dominicana. Recentemente, lhantes às encontradas na cultura da banana (nelSOn et al., 2010). sintomas de AF foram detectados nos híbridos comerciais (F1) de neste artigo discute-se a hipótese de que a deficiência tran- E. guineensis x E. oleifera na Colômbia e no equador, porém, estes sitória de cálcio (Ca) tem um papel primordial na causa do AF. A materiais geralmente apresentam menor grau de suscetibilidade. base fisiológica e as provas são apresentadas em detalhes porque há Durante séculos, os pomares tradicionais de E. guineensis localizados evidência da falta de atenção em nível mundial sobre esta questão, na África e no estado da Bahia (Brasil), nos trópicos úmidos, não caracterizada por: (a) aplicação inadequada de Ca, especialmente na tiveram incidência significativa de AF (DuFF, 1963; MAriAu et América, (b) acidificação progressiva dos solos sob o paradigma al., 1992; De FRAnqueville, 2001). de manejo agrícola importado da Ásia, e (c) uso da folha nº 17 em 2009, as perdas de produção na Colômbia foram estima- para determinar o nível de nutrientes não remobilizados no floema. das em mais de uS$ 100 milhões anuais (FedePAlMACeniPAl- Abreviações: AF = amarelecimento fatal; Cenipalma = Centro de Investigación en Palma de Aceite; CPO = óleo de palma bruto; CTC = capacidade de troca catiônica; CTCe = capacidade de troca catiônica efetiva; ENOS = El Niño Oscilação Sul; MS = matéria seca; NOAA = National Oceanic and Atmospheric Administration; PC = Pudrición de Cogollo; Denpasa = Dendê do Pará S.A. 1 Artigo parcialmente resumido do original publicado no website do autor (http://lapalmadeaceite.wikispaces.com) e no site do IPNI - Programa Equador (http://nla.ipni.net/articles/NLA0149-EN/$FILE/Palma%20PC.pdf) 2 Engenheiro Agrônomo, PhD, especialista em Fisiologia Vegetal, consultor independente, Cali, Colômbia; email: [email protected] INTERNATIONAL PLANT NUTRITION INSTITUTE - BRASIL Rua Alfredo Guedes, 1949 - Edifício Rácz Center, sala 701 - Fone/Fax: (19) 3433-3254 - Website: www.ipni.org.br - E-mail: [email protected] 13416-901 Piracicaba-SP, Brasil INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 137 – MARÇO/2012 1 INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Publicação trimestral gratuita do international Plant N0 137 MARÇO/2012 nutrition institute (iPni), Programa Brasil. O jornal publica artigos técnico-científicos elaborados pela comunidade científica nacional e internacional, visando o manejo responsável dos nutrientes das plantas. COnTEÚDO COMISSÃO EDITORIAL Deficiência temporária de cálcio como causa primária do Editor amarelecimento fatal em dendezeiro luís ignácio Prochnow Douglas Laing ............................................................................................1 Editores Assistentes valter Casarin e Silvia Regina Stipp planejamento da produção agrícola .....................................................18 Gerente de Distribuição evandro luis lavorenti IpnI em Destaque ..................................................................................21 InTERnATIOnAL pLAnT nuTRITIOn InSTITuTE (IpnI) Divulgando a pesquisa ...........................................................................23 presidente do Conselho painel Agronômico .................................................................................24 Joachim Felker (K+S Group) Vice-presidente do Conselho Cursos, Simpósios e outros Eventos .....................................................25 Stephen R. Wilson (CF industries Holdings inc.) Tesoureiro publicações Recentes .............................................................................27 Mhamed ibnabdeljalil (OCP Group) presidente ponto de Vista .........................................................................................28 terry l. Roberts Vice-presidente, Coordenador do Grupo da Ásia e África Adrian M. Johnston Vice-presidente, Coordenadora do Grupo do Oeste Europeu/Ásia Central e Oriente Médio Svetlana ivanova Vice-presidente Senior, Diretor de pesquisa e NOTA DOS EDITORES Coordenador do Grupo das Américas e Oceania Paul e. Fixen Todos os artigos publicados no Informações Agronômicas estão disponíveis em formato pdf no website do IPNI Brasil: <www.ipni.org.br> pROGRAMA BRASIL Opiniões e conclusões expressas pelos autores nos artigos não refletem Diretor necessariamente as mesmas do IPNI ou dos editores deste jornal. luís ignácio Prochnow Diretores Adjuntos valter Casarin eros Francisco publicações FOTO DESTAQUE Silvia Regina Stipp TI e Assistente Administrativo evandro luis lavorenti + P - P Assistente Administrativo Renata Fiuza ASSInATuRAS Assinaturas gratuitas são concedidas mediante aprovação prévia da diretoria. O cadastramento pode ser realizado no site do iPni: www.ipni.org.br Mudanças de endereço podem ser solicitadas por email para: [email protected] esta publicação foi impressa e distribuída com o apoio financeiro parcial das seguintes instituições/empresas: ABISOLO FERTILIzAnTES HERInGER S.A. deficiência de fósforo (P) em soja. Foto vencedora do concurso IpnI 2011 YARA BRASIL FERTILIzAnTES S.A. Crop Nutrient Deficiency Photo Contest. Crédito: luiz Antônio Zanão Júnior 2 INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 137 – MARÇO/2012 2. SINTOMATOLOGIA E ETIOLOGIA DO AMARELECIMENTO FATAL 2.1. Sintomas nos tecidos apicais Os sintomas visíveis de AF em quase todas as regiões afetadas abrangem uma gama muito variável de anormalidades nas folhas apicais mais jovens, começando muitas vezes com uma coloração amarelada. O primeiro sintoma, sempre observado nos relatórios das áreas de produção afetadas na Matéria orgânica América e na África (DuFF, 1963; MAriAu et al., (resíduos) 1992; De FRAnqueville, 2001; BOARi, 2008; MArtinez et al., 2009), é uma lesão necrótica que aparece na porção distal das flechas1 recém abertas, com decomposição subsequente dos tecidos apicais até o meristema central, culminando com a morte do dendezeiro em casos extremos. Raízes secundárias em casos mais leves de AF, tipicamente Raízes primárias associados a incidências menos graves em certas regiões – como nos llanos Orientales da Colôm- bia –, os dendezeiros afetados podem se recuperar Figura 1. Representação do efeito positivo da acumulação de material orgânico na produção no período de meses ou anos, com graus variados de de raízes secundárias normais na superfície do solo. isto é visto, por exemplo, em sucesso. em muitos casos, dendezeiros individuais plantações de pequena escala, de baixos rendimentos. nota-se raízes primárias afetados, que se recuperaram totalmente e apresen- verticais em um raio de cerca de 2 m da planta e até 3 m de profundidade, depen- tam produtividade próxima à normal, podem voltar dendo do teor de Al3+ e dos fatores físicos no perfil do solo. a desenvolver novos sintomas da doença. 2.2. Sintomas no sistema radicular 2.3. Sintomas agravados pelo bicudo ou broca-do- coqueiro O botânico inglês C.W. Wardlaw, em 1954, foi um dos pri- meiros a observar anormalidades no sistema radicular de dendezeiro O bicudo, Rhynchophorus palmarum l., da Família Curcu- com sintomas iniciais de AF (De FRAnqueville, 2001). Cin- lionidae, tem um impacto econômico significativo sobre os cultivos quenta anos depois, Albertazzi et al. (2005), na Costa Rica, em um de dendezeiro e de coqueiro na América. O bicudo causa dano direto dos primeiros ensaios formais sobre o assunto, observaram redução na planta pelo desenvolvimento de larvas que escavam galerias notável no crescimento e anormalidades nas raízes, principalmente no tronco até o meristema central. este inseto é o vetor principal nas terciárias e quaternárias, cinco meses antes do aparecimento dos do Anel vermelho, uma doença grave, especialmente em Cocos primeiros sintomas visíveis de necrose nas flechas. isto representa nucifera (Mexzón et al., 1994). Os adultos desse inseto sa- um desafio para os defensores da hipótese baseada em uma causa profítico são atraídos pelos odores da podridão gerados pelo AF, biótica primordial para o AF, pois devem explicar a causa do apa- com efeitos fatais sobre o meristema, quando, presumivelmente, recimento destes sintomas nas raízes meses antes do aparecimento as lesões iniciais são suficientemente profundas para permitir dos primeiros sintomas aéreos. à colônia de insetos chegar até o meristema central, situado a O autor, durante suas inspeções em dezenas de lotes com AF 50-90 cm abaixo do ápice do tronco, dependendo da idade da na Colômbia e no equador, observou que os sistemas radiculares planta. na América, muitos casos de morte das palmeiras estão superficiais são muito pequenos nos dendezeiros afetados com os diretamente associados à infestação do bicudo. primeiros sintomas apicais de AF, em comparação com dendezeiros equivalentes em idade e aparentemente saudáveis em outros lotes 2.4. A causa da morte do dendezeiro do mesmo material genético, que nunca apresentaram AF. nos Alguns observadores, incluindo o autor, concluíram que dendezeiros com AF, as raízes terciárias e quaternárias sempre apre- as plantas provavelmente não morrem pelo AF, mas pelos efeitos sentaram anormalidades, especialmente com pontas arredondadas, colaterais da infestação saprofítica causada pelo bicudo. este disformes e com coloração anormal. em muitos casos, a camada conceito não é aceito por todos na indústria. Porém, se houvesse de córtex das raízes primárias, normalmente de coloração marrom definitivamente como confirmar a hipótese sobre a verdadeira escuro, eram mais frágeis e facilmente removíveis. Por outro lado, as causa da morte das palmeiras, isso permitiria concluir que a raízes superficiais que crescem sob as camadas de folhas velhas em planta, sem a presença de substâncias nocivas e fatais do bicudo, decomposição (serrapilheira), especialmente nos lotes de palmeiras tem um mecanismo que permite a recuperação completa dessa maduras, com ou sem os primeiros sintomas do AF, quase sempre desordem por meio da emergência gradual de folhas anormais até eram densas, sem distorções, de coloração creme e aparentemente a produção de folhas normais. na mesma linha de raciocínio, é ativas. em particular, as raízes geotróficas negativas (JOuRDAn et al., 2000) – geralmente secundárias, com crescimento vertical possível que as primeiras folhas pequenas, que apresentam menor – eram numerosas e ativas (Figura 1). taxa de transpiração em razão da menor área foliar, auxiliem a planta com menor gasto fisiológico, o que permite, por sua vez, a recuperação gradual do sistema radicular e do meristema central 1 Folhas fechadas, ainda em formação, em posição apical. e evita a morte da planta por estresse hídrico. INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 137 – MARÇO/2012 3 2.5. Micro-organismos propostos como causa do 2.6. Investigações sobre as causas do amarelecimento amarelecimento fatal fatal no Congo A tabela 1 apresenta um resumo dos agentes bióticos mais As primeiras pesquisas fitopatológicas detalhadas e publi- importantes, relatados por pesquisadores em vários países e insti- cadas no mundo sobre o AF foram realizadas por Duff (1963), tuições na África e na América, de 1928 a 2009. uma vasta gama fitopatologista que atuou na fazenda dos irmãos lever, na pro- de micro-organismos presentes nos ecossistemas tropicais, princi- víncia de Kasai-Kwilu, no sudoeste da República Democrática Sem pastejo palmente saprófitas, foi identificada tanto em tecidos decompostos do Congo (Zaire). Duff, após um trabalho intenso e detalhado como em tecidos próximos da linha de podridão, em palmeiras no campo e nos laboratórios locais, propôs como organismo com sintomas iniciais de AF. Depois de inúmeras tentativas com causador do AF a bactéria saprofítica Erwinia lathyri. A iden- milhares de isolados, os patologistas identificaram uma ampla gama tificação do organismo – cepa sempre isolada dos tecidos das de micro-organismos como possíveis causadores do AF. flechas, na linha de podridão – foi confirmada pelo instituto Os postulados de Koch nunca foram preenchidos com Micológico de Commonwealth, na inglaterra. A mesma bactéria respeito aos diferentes micro-organismos propostos nas investi- foi isolada em palmeiras assintomáticas e também em palmei- gações patológicas. uma das razões principais para isso é que o ras nativas saudáveis que cresciam nos bosques em torno dos terceiro postulado de Koch especifica, de forma muito rigorosa, plantios comerciais. que a reprodução dos sintomas deve ser demonstrada apenas em Duff observou que o AF só estava presente onde existiam palmeiras saudáveis e normais, que crescem vigorosamente, e que fatores ambientais que afetavam a saúde das palmeiras, com sérias foram inoculadas com uma linhagem pura (anteriormente isolada implicações nas plantações comerciais insalubres, que crescem em e cultivada) do agente causal. um dos conceitos centrais do autor solos altamente intemperizados (laterítico e ácido). Os latossolos da presente hipótese abiótica, de acordo com conclusões de Duff e neossolos do sudoeste da República Democrática do Congo são (1963) e Silva et al. (1995), é que as palmeiras suscetíveis ao AF solos típicos dos trópicos Úmidos, com pH muito baixo (normal- estão subnutridas e, por conseguinte, não estão saudáveis antes mente < 5,0 em cultivo), baixa capacidade de troca catiônica efetiva da invasão dos tecidos apicais por micro-organismos saprofíticos (CtCe), baixa saturação por bases, alta acidez total e alta saturação responsáveis pela podridão desses tecidos. por alumínio (Al) não trocável. Tabela 1. resumo histórico dos principais estudos fitopatológicos acerca do amarelecimento fatal (AF) em Elaeis guineensis e lista de organismos identificados e/ou sugeridos como a causa da desordem, porém, sem evidências de satisfazer os postulados de Koch1, 2. pesquisadores Data país produtor Entidade principal Organismos propostos Reinking1 1928 Panamá united Fruit Co. Fusarium moliniforme Ghesquiere1 1935 Congo Bélgica Phytophthora palmivora, Bacillus coli Bachy1 1954 Congo França Fusarium e bactérias Duff3 1963 Congo irmãos lever Erwinia lathyri Renard et al.1 1964 Colômbia CiRAD, França Fusarium (F. oxysporum e F. solani) Renard et al.1 1976 Colômbia CiRAD, França Fusarium (F. oxysporum e F. solani) Harper et al.1 1982 equador univ. Auburn, euA Fusarium e bactérias quillec et al.1 1983 equador Orstom, França Phytophthora van Gundy1 1983 equador univ. California, euA nematóides Helicotylencus Renard2 1986 Brasil CirAd/embrapa Pythium Singh et al.7 1988 Brasil embrapa Hortaliças viróides (ácidos nucléicos) Silva4 1989 Brasil Denpasa Fungos/bactérias (27 espécies identificadas)** nieto y Gómez1 1991 Colômbia Cenipalma Fusarium solani Dollet1 1991 equador CirAd/irHO Vírus ou viróides (rnA de fita dupla) Beuther et al.1 1992 Brasil univ. Dusseldorf Viróides (rnA de fita dupla) Allen et al.1 1995 equador univ. California Erwinia nieto1 1996 Colômbia Cenipalma Fusarium, Pythium, Thielaviopsis De Franqueville1 1998 equador CiRAD, França Fusarium nieto y Gómez1 1999 Colômbia Cenipalma Fusarium, Pythium, Thielaviopsis Sánchez1 1999 Colômbia Cenipalma Phytophthora trindade et al.2 2000 Brasil embrapa-CPAtu Fitoplasma Gómez1 2000 Colômbia Cenipalma Thielaviopsis paradoxa Martínez et al.5 2008 Colômbia Cenipalma Phytophthora palmivora torres et al.6 2009 Colômbia Cenipalma Phytophthora palmivora Fonte: 1De Franqueville (2001), 2Boari (2008) no Brasil; 3Duff (1963); 4Silva et al. (1995); 5Martínez et al. (2009); 6torres et al. (2010); 7Singh et al. (1988). ** Vide tabela 2 para identificação adicional dos 27 micro-organismos. 4 INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 137 – MARÇO/2012 Duff também notou que os sintomas de murcha vascular Revisão detalhada sobre o extenso trabalho biótico conduzi- – o problema biótico mais limitante dos dendezeiros na África do há mais de três décadas no Brasil foi realizada pela fitopatologista (FlOOD, 2006) – muitas vezes precedia o AF nas mesmas pal- Boari (2008). estes estudos cobriram um largo espectro de espécies meiras. esta observação importante deve ser levada em conta em de fungos, oomicetos, bactérias, vírus, viróides, fitoplasmas, insetos estudos futuros sobre a possível relação entre incidência de murcha e nematóides, e todos foram inconclusivos quanto às causas do AF. vascular e condições ácidas e estéreis do solo. Como mencionado vale destacar o estudo da evolução espacial do AF conduzido por acima, Duff observou que os bosques não comerciais de materiais laranjeira et al. (1998) em uma fazenda na cidade de Benevides nativos de Elaeis guineensis das aldeias localizadas nas proximi- (Pará). estes pesquisadores concluíram que a condição do AF é dades das zonas comerciais devastadas pelo AF não apresentavam abiótica na natureza, porque o distúrbio não está em conformidade sintomas da doença. relatórios recentes não oficiais da Costa do com qualquer padrão estabelecido, nem quanto à aparência, nem Marfim e de Camarões têm indicado que há incidências graves do quanto ao crescimento dos focos. Além disso, não encontraram uma AF, mas apenas em plantações comerciais nestes países. direção preferencial de difusão dos focos, mas houve maior presença de palmeiras sintomáticas nas margens dos córregos. Conclusões 2.7. Investigações sobre as causas do amarelecimento semelhantes às de laranjeira et al. (1998) foram obtidas pelo autor fatal no Brasil da presente hipótese, analisando dados de Rojas (2005) sobre o trabalhos do fitopatologista silva (SilvA et al., 1995), re- censo espacial e temporal do AF em uma plantação na Colômbia, vistos por Boari (2008), foram realizados em plantações da empresa apresentadas no item 7.5 deste artigo e no site do autor. Dendê do Pará S.A. (Denpasa), com mais de 100.000 palmeiras 2.8. pesquisa recente das causas do AF afetadas pelo AF, entre 1974 e 1991. silva confirmou as observações de Duff, notando que as áreas que apresentavam maior incidência A mais recente pesquisa patológica sobre o AF, conduzida de AF coincidentemente possuiam manchas de solo com carac- pelo Centro de investigación en Palma de Aceite - Cenipalma, na Co- terísticas indesejáveis para o dendezeiro, ou porque eram solos lômbia (tORReS et al., 2010), mediante um protocolo experimental muito arenosos ou, alternativamente, muito compactos, ou áreas semelhante ao de Duff, aponta apenas para o oomiceto (pseudofungo) com afloramento de laterita na superfície ou áreas sujeitas a inun- Phytophthora palmivora como o organismo causador do transtorno. no dações periódicas, com drenagem pobre. em seu extenso trabalho, entanto, a identificação de P. palmivora como causa do AF não cumpriu uma grande variedade de organismos foi identificada (tabela 2) os postulados de Koch. um programa nacional de manejo do AF foi em dendezeiros com sintomas de AF, porém, um número enorme criado em 2009 pelo Fedepalma-Cenipalma para os anos 2009-2012. de inoculações nunca produziram sintomas completos em plantas este programa nacional é baseado em uma série de procedimentos de sadias, e os postulados de Koch nunca foram cumpridos. Os sin- controle fitossanitário, incluindo aplicações de uma ampla gama de tomas do AF foram induzidos três meses após o corte de 70% das fungicidas específicos para o controle de P. palmivora (MArtinez folhas de palmeiras cultivadas em viveiro, que foram previamente et al., 2009). O AF no Brasil tem sido estudado (BOARi, 2008), mas inoculadas a cada três meses, durante um ano, sem sinais de necrose. ainda não há solução eficaz, especialmente em áreas ambientalmente estes últimos resultados confirmam aqueles obtidos por promissoras para a palmeira no estado do Pará, ao sul de Belém. Outros Duff, que também induziu sintomas de AF em dendezeiros adultos países produtores na América, com graves incidências de AF, ainda 52 dias após a poda de todas as folhas – exceto as flechas – em não adotaram programas nacionais dessa natureza. plantas previamente identificadas como "saudáveis" (com inocu- Apesar das pesquisas realizadas em muitos países por fi- lações anteriores negativas). embora o trabalho de Duff no Congo topatologistas especializados, em trabalhos muito bem dirigidos, não tenha sido, aparentemente, conhecido no Brasil nos últimos extensos e detalhados, nos últimos 80 anos, as perdas continuam a anos, as conclusões convergentes destes dois fitopatologistas são a ocorrer em todos os países onde há áreas afetadas, especialmente na base para sustentar a hipótese abiótica, conduzida neste artigo. As América. A critério do autor, a longa história do AF é, em si mesma, pesquisas dos fitopatologistas duff e silva receberam muito pouca razão suficiente para encorajar a procura das causas abióticas para atenção na longa história da pesquisa científica do AF. esta desordem devastadora. Tabela 2. Micro-organismos isolados de tecidos apicais da palmeira Elaeis guineensis com AF em plantação da Denpasa, no estado do Pará. Fungos e Oomicetos Lasiodiplodia theobromae Pythium sp. Chaetomium sp. Microsphaera olivacea Fusarium solani Fusarium sp. Rhizoctonia sp. Curvularia pallescens Fusarium oxysporum Graphium sp. Dacrylaria sp. Mucor racemosus Mycelia sterilia Pestalotiopsis sp. Curvularia hamata Phytophthora sp. Thielaviopsis sp. Phoma sp. Colletotrichum sp. Gloeosorium sp. Bactérias Aerobacter aerogenes Erwinia herbicola Pseudomonas aeruginosa Pseudomonas putida Pseudomonas fluorescens Bacillus polymyxa Fonte: silva (1989), com identificação das espécies conduzidas por i. l. renard (irHO), J. l. Bezerra (Ceplac) e Charles robbs (uFrrJ), de acordo com informação histórica das pequisas sobre amarelecimento fatal no Brasil, realizada por Boari (2008). Os gêneros ou espécies destacados em vermelho também foram identificados por outros pesquisadores como causas bióticas do AF na tabela 1. INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 137 – MARÇO/2012 5 3. HIPÓTESE ABIÓTICA A explicação para o fenômeno das palmeiras sobreviventes, na presente hipótese, está relacionada com um limiar fisiológico A primeira versão desta hipótese foi formalmente apresen- entre as interações das condições meteorológicas, edáficas e tada pelo autor no programa de seminários do CiAt, na Colômbia, agronômicas, que contribuem para que os tecidos de algumas pal- em junho de 2009. A segunda versão (lAinG, 2010), com novas meiras (isoladas ou em grupos) permaneçam saudáveis, devido a evidências, foi apresentada no Congresso equatoriano de Ciência um menor risco de deficiência de Ca nestes micro-sítios específicos. do Solo, como trabalho convidado, em novembro de 2010. A última apresentação, disponível no site do autor, contém uma ampla gama 4. ECOFISIOLOGIA DO CÁLCIO NAS PLANTAS SUPERIORES de evidências em suporte à hipótese que complementa este artigo. Mclaughlin e Wimmer (1999) apresentaram uma revisão em todas as descrições do AF, as anormalidades nas folhas completa e abrangente sobre o papel fisiológico do Ca nas plantas mais novas – especialmente o aparecimento precoce de lesões ne- superiores, como componentes dos ecossistemas terrestres. Hepler cróticas nas flechas – são os sintomas visuais iniciais mais comuns. (2005) detalhou as muitas funções fisiológicas e a complexidade do Segundo a hipótese abiótica, o aparecimento destes tecidos necróticos Ca nas células das plantas superiores. Bangerth (1979) analisou a é causado por uma invasão microbiana composta por uma gama vari- literatura sobre distúrbios fisiológicos relacionados com a nutrição ável de micro-organismos saprófitas e oportunistas (tais como fungos, de Ca e concluiu que as desordens fisiológicas de Ca em 30 espé- oomicetos e/ou bactérias) comuns em ambientes tropicais úmidos. cies estavam mais frequentemente associadas à má distribuição do esta hipótese sugere que a invasão dos tecidos por estes organismos é elemento na planta do que à sua deficiência devido à inadequada causada por uma lesão fisiológica primária que ocorre antes da emer- absorção do solo. De acordo com os estudos disponíveis, a absorção gência das flechas afetadas, durante a fase de rápido crescimento de Ca da solução do solo e seu transporte na planta é feito exclu- heterotrófico, ou seja, nos tecidos que não realizam fotossíntese, sivamente sob a forma de íon divalente (Ca2+). sem transpiração, e que recebem sustento de outras partes da planta. A hipótese abiótica sugere um mecanismo causal para expli- 4.1. Transporte do cálcio no xilema car o distúrbio fisiológico e nutricional que envolve toda a planta, Praticamente em todas as famílias de plantas superiores, isto é, das raízes de alimentação – terciárias e quaternárias – até os incluindo todas as espécies de palmeiras, a absorção e o transporte tecidos apicais, provocando alterações estruturais – especialmente de Ca2+ é essencialmente um processo de fluxo de massa, passivo, relacionados com a insuficiência de pectato de cálcio – durante a unidirecional e vertical na rota apoplástica (através das paredes formação das paredes das células dos tecidos heterotróficos das celulares das raízes finas até o xilema). em plantas superiores, a folhas novas, que estão em rápido crescimento. maior parte do Ca é absorvida e transportada através das paredes A hipótese propõe uma deficiência temporária de cálcio das células radiculares e não pela rota simplástica, ou seja, atra- muito específica antes do aparecimento das flechas como a principal vés do citoplasma das células. A rota apoplástica tem a função de causa do AF. A incidência desta deficiência transitória depende da transportar o Ca2+ até os tubos do xilema interligados entre os feixes interação de um complexo conjunto de fatores climáticos, genéticos, vasculares (MclAuGHlin e WiMMer, 1999). edáficos, nutricionais, agronômicos e hidrológicos condicionantes A taxa de absorção de cálcio (Ca2+ em mg planta-1 dia-1) da que induzem a suscetibilidade relativa em palmeiras individuais ou solução do solo é totalmente dependente e proporcional à taxa de em grupos de palmeiras, as quais se desenvolvem em locais que transporte de água para os tecidos superiores do dendezeiro via fluxo favorecem a condição, em função das características críticas do de transpiração. A absorção e o transporte de todos os outros macro- solo, que variam espacialmente. nutrientes móveis (n, P, K, Mg e s) e menos móveis (Cl, Cu, zn) Os casos de AF ocorrem em palmeiras isoladas ou em gru- no floema são realizados principalmente por via simplástica até o pos de palmeiras de forma quase simultânea. Grupos contíguos fluxo fluido bidirecional no floema e xilema. em geral, o processo de de palmeiras em uma área específica podem mostrar os primeiros absorção e transporte, no caso destes nutrientes móveis no floema, sintomas ao mesmo tempo – tipicamente em períodos de uma a requerem a participação de processos ativos e consumo de energia; quatro semanas – em locais que são frequentemente denominados por conseguinte, a absorção é relativamente independente da taxa de "focos de infecção". esta característica, muito comum em quase diária de fluxo de transpiração (MclAuGHlin e WiMMer, 1999). todas as manifestações de AF, formaria a imagem da distribuição 4.2. Absorção de cálcio pelas raízes espacial de uma doença clássica. O conceito, porém, ainda muito difundido de que o AF é, na realidade, uma doença clássica, parece Marschner (1995) menciona que a rota inicial de absorção de derivado, em parte, destas observações recentes. Ca2+ pelas raízes das plantas superiores ocorre quase inteiramente no entanto, uma das características mais contundentes na por meio da via apoplástica, através das paredes das células, nas raí- distribuição espacial do AF, e que vai contra a hipótese da doença zes que ainda não têm a faixa de Cáspari bem desenvolvida. Sabe-se clássica, é o fato de que em quase todas as plantações existem da ausência de pêlos radiculares em palmeiras maduras em muitas palmeiras – supostamente do mesmo genótipo original – com espécies, incluindo as duas espécies de Elaeis (CORneR, 1966; crescimento saudável e imediatamente adjacentes às áreas ante- CHeRDCHAi et al., 2009; comunicação pessoal de Jack Fisher de riormente afetadas pelo AF, e que também permanecem saudáveis Fairchild, 2009). este é um fator importante a ser considerado, pois por anos após o aparecimento dos sintomas iniciais nas palmeiras a maior absorção de Ca2+ se concentra nas raízes finas e jovens. afetadas. esta última característica é muito comum em quase todas A rota apoplástica para o Ca2+ implica que a absorção inicial as áreas afetadas pelo AF e não está adequadamente explicada pelos ocorra através das raízes mais finas nas áreas próximas aos novos defensores da causa biótica, por meio de uma epidemia clássica. pontos de crescimento, que possuem tecidos sem lignificação ou em resumo, fica a pergunta: Por que essas palmeiras sobreviventes suberificação. neste sentido, a rota do Ca2+ é diferente em relação também não foram atacadas por micro-organismo tão virulento que a de alguns outros nutrientes, especialmente n, K e Mg. liew et supostamente foi a causa de muitos danos nas palmeiras afetadas al. (2010) reportaram sobre a importante contribuição dos pontos anteriormente no mesmo local? jovens das raízes primárias (coloração creme-branca) do dende- 6 INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 137 – MARÇO/2012 zeiro na absorção de isótopos de fósforo. estudos similares, mas 4.4. Mobilidade e imobilidade de nutrientes no floema utilizando isótopos estáveis de Ca (como Ca44), são necessários em Os dados na Figura 2 são um excelente exemplo destas ambas as espécies de Elaeis para confirmar mais precisamente a importantes diferenças na absorção, acumulação e remobilização via de absorção de Ca. de K, Ca e Mg em palmeiras cultivadas sem poda, em Papúa, nova A rota quase única para a absorção inicial de Ca2+ implica Guiné. nota-se que o teor de Ca aumentou durante o crescimento que as raízes das palmeiras devem continuar seu crescimento de das folhas de forma quase linear, da folha no 1 até a no 64, porque forma densa, vigorosa e saudável para assegurar a capacidade de este nutriente é mobilizado no floema e o acúmulo ocorre quando absorção contínua, especialmente de Ca, em resposta à demanda as folhas estão transpirando e ele é absorvido no fluxo de água. provocada pelo crescimento rápido do dendezeiro. isso é extre- Por outro lado, Mg e K são móveis no floema e, assim, o conteú- mamente importante em sistemas intensivos de produção, com do foliar diminui com a idade fisiológica devido à remobilização altos níveis de adubação (principalmente n, P, K e Mg). A saúde dos nutrientes para as folhas velhas. O estudo da Munévar et al. do sistema radicular das plantas superiores é vital para a saúde do (2005), do Cenipalma, sobre a variação nas concentrações foliares dendezeiro, principalmente para assegurar a absorção de nutrientes de nutrientes de acordo com a idade fisiológica das folhas, em dois imóveis no floema, como Ca, B, Fe e Mn. A presença de elevadas locais edaficamente contrastantes na Colômbia – Magdalena Medio concentrações de Al3+ na solução de solos ácidos com pH < 4,6 e Piemonte Oriental –, é uma confirmação evidente das observações próximo às raízes de alimentação – principalmente sob condições realizadas em Papúa. O estudo na Colômbia mostrou que os nu- inorgânicas em torno da rizosfera – têm efeitos muito drásticos na trientes imóveis no floema (Ca, B, Fe e Mn) acumularam-se entre absorção de Ca2+, como consequência da interferência no crescimen- as folhas no 1 e no 25 e os móveis no floema (n, P, K, Mg , Cl, Cu to normal das raízes, entre outros efeitos negativos (MclAuGHlin e Zn) diminuíram, em diferentes graus, em razão da remobilização. e WiMMer, 1999). 4.3. Relação entre transpiração e absorção dos cátions Ca2+, Mg2+ e K+ A taxa média de transpiração das plantas superiores por unidade de superfície terrestre é regida principalmente pelas interações entre (a) área foliar total funcional da copa da planta por unidade de superfície de solo (índice de área foliar), (b) resis- tência estomática completa à troca de gases e vapor de água, (c) disponibilidade de água na área explorada pelo sistema radicular no perfil do solo e (d) condições micro-meteorológicas externas definidas pela interceptação da radiação solar líquida diária e pelas interações entre temperatura, umidade do ar e circulação de ar no dossel das palmeiras. nas plantações de dendezeiro, a alta umidade do ar e a baixa incidência de radiação solar reduzem significativamente a transpiração do dossel, especialmente nos longos períodos de forte Figura 2. Conteúdos foliares de K, Ca e Mg das folhas no 1, 3, 9, 17, 25, nebulosidade tropical associados a períodos de chuvas prolongadas. 33, 41, 58 e 64 expressos em relação ao conteúdo de nutrientes estas condições são muito comuns durante os eventos de la niña na folha mais nova, no 1, em palmeiras tenera que não receberam na América tropical ocidental. Kirkby (1979) revisou a literatura poda das folhas velhas. sobre a estreita relação entre a taxa de transpiração e a absorção de Fonte: Webb et al. (2009). Ca pelas raízes das plantas superiores. Delvaux e Rufuikiri (2003) demonstraram a relação linear 4.5. Funções do cálcio na parede celular que existe entre a taxa de absorção de Ca (Ca2+ mg planta-1 dia-1) e a transpiração diária em bananeiras (litros planta-1 dia-1), enquanto estudos recentes de Scavetta et al. (1999), Herron et al. K e Mg dependem de processos energéticos e, portanto, não têm (2000), Hepler (2005) e lecourieux et al. (2006) detalham o papel relação direta com a transpiração. estes autores também quantifi- fundamental do Ca na defesa das células vegetais superiores contra caram a extrusão de prótons H+ pelas raízes em resposta à absorção a invasão de micro-organismos patológicos. O pectato de Ca é um em excesso de cátions (especialmente nH+, K+, Mg2+ e Ca2+), ocasio- componente importante de ligação na parede celular das plantas 4 nando acidificação no meio de crescimento radicular. serrano (2003) superiores, e tem várias funções, tanto estruturais como fisiológicas, identificou este último fenômeno como uma das principais causas da especialmente na formação integral dos tecidos durante a expansão acidificação de solos cultivados com bananeira. A repetição destes e o alongamento rápido, formando uma barreira contra a invasão de experimentos com Elaeis é muito importante para medir e ilustrar as micro-organismos saprófitas ambientais e mantendo a flexibilidade diferenças fisiológicas do Ca em relação aos outros cátions. das paredes (HePleR, 2005). trabalhos de Chang e Miller (2004) e Chang et al. (2008) espécies saprófitas e micro-organismos patológicos como sobre a necrose apical na monocotiledônea Lilium demonstra a rela- Fusarium, Pythium, Phytophthora, Ceratocystis (Thielaviopsis) e ção entre transpiração, necrose apical e conteúdo de Ca. A simples a bactéria Erwinia (tabela 2) secretam enzimas, tais como poli- manipulação das folhas apicais imaturas ainda enroladas aumenta a galacturonase, para atacar especificamente o pectato de Ca dentro transpiração destes tecidos, causando aumento nos níveis de Ca, e esta das estruturas da parede celular, enfraquecendo as defesas contra ação resulta em redução acentuada na incidência de necrose apical a penetração de hifas ou bactérias nos tecidos (De lORenZO et (uma séria doença fisiológica desta espécie em estufas). al., 2001). INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 137 – MARÇO/2012 7 4.6. Tecidos sensíveis à deficiência de cálcio espécies de ferro (Fe2+) solúveis em solos mais ácidos é uma evidência de que este elemento não está envolvido diretamente na ocorrência nas condições especiais de fisiologia e anatomia do dende- do AF. O silício, mineral também considerado imóvel no floema em zeiro há um tecido específico – localizado nas flechas heterotró- Elaeis, foi reputado, há alguns anos, como um dos fatores causadores ficas – no qual provavelmente ocorrem situações de oferta inade- do AF, mas, ainda assim, os progressos neste campo não são muito quada de nutrientes imóveis críticos (especialmente Ca2+) durante o convincentes (MunéVAr e rOMerO, 2009; rOMerO, 2009). no crescimento rápido, quando a planta requer mais nutrientes. nesta caso da toxicidade de Fe e Mn, dados da análise foliar disponíveis, de fase, as células das novas flechas estão em rápido alongamento, plantações localizadas em solos ácidos, apresentaram níveis foliares forçado pela pressão de turgescência dentro dos tecidos. Com a baixos ou normais em palmeiras com sintomas iniciais de AF. vacuolação destas células, a demanda de Ca2+ aumenta, não só para abastecimento do vacúolo – onde a concentração de Ca2+ é maior, em 5. FATORES AGRONÔMICOS ASSOCIADOS AO comparação com o citoplasma – mas também para reforçar as pa- AMARELECIMENTO FATAL redes das células com pectato de cálcio na fase de rápida expansão. Como já mencionado, um dos sintomas comuns observados na Costa Rica, Alvarado et al. (1996) estudaram a incidência durante a fase de recuperação do AF é o aparecimento de um número do AF relacionada às condições agronômicas, edáficas e climáticas. variável de folhas novas, pequenas e deformadas (originalmente uma das observações importantes a ser destacada foi a de que o AF proposto, por engano, como sintoma inicial do AF). este fenô- mostrou-se mais frequente nos períodos de elevada precipitação e meno ocorre devido a danos nos tecidos profundos durante uma baixa radiação solar. Solos muito argilosos e mal drenados também deficiência grave e temporária de Ca2+ (por exemplo, em condições estão associados à alta incidência de AF, estando estes resultados de acidez extrema do solo ou devido à aplicação excessiva de de acordo com os obtidos por Munévar et al. (2001), Munévar e potássio) e/ou durante períodos prolongados de baixa insolação e Acosta (2002), Acosta e Munévar (2003) e Chinchilla (2008). de evapotranspiração (por exemplo, baixas condições meteorológicas acordo com os dados disponíveis, o E. guineensis geralmente não se prevalecentes durante longos períodos de eventos de la niña nos adapta bem às condições de solo mal drenado, nas quais as camadas trópicos). dependendo da profundidade dos danos fisiológicos, os superficiais ficam saturadas por longos períodos. A sanidade do sis- tecidos das futuras folhas são danificados rapidamente, produzindo tema radicular, especialmente das raízes finas, é fortemente afetada um número variável de folhas pequenas e deformadas, dependendo pela saturação hídrica prolongada, o que compromete a capacidade das condições de cada planta, antes do aparecimento das folhas de crescimento e a absorção de Ca e de outros nutrientes imóveis normais e da possível recuperação da planta afetada. no floema (como B, Fe e Mn). O melhoramento da drenagem é, muitas vezes, a primeira linha de ataque ao AF. tecidos reprodutivos masculinos e femininos continuam a emergir juntamente com a aparição das folhas, mas com redução nas Américas, as práticas agronômicas generalizadas são uma muito variável na taxa de emergência nos meses que antecedem os cópia quase fiel do modelo de cultivo asiático, incluindo a manutenção sintomas visíveis do AF nas flechas. estes tecidos raramente são da zona de coroamento sempre limpa. nessa área, a concentração de afetados por sinais de podridão, pelo menos em primeira instância, raízes finas, nas plantas sadias que crescem em solos férteis, é quase durante as fases do AF. É possível que tenham sido protegidos pela sempre razoavelmente densa, sendo a mesma área onde normalmente pressão evolutiva por algum mecanismo fisiológico, correlação se aplica a maior parte dos fertilizantes solúveis. Fairhurst (1996) de- anatômica ou temporal relacionada com as interligações do xilema monstrou a estreita relação entre áreas de densidade radicular elevada e floema, que garantisse sua sobrevivência quando houvesse uma e zonas de aplicação de fertilizantes, na zona de coroamento. nelson limitação no suprimento de Ca. et al. (2006) confirmaram estas observações em dendezeiro cultivado em Andisol, na Papúa, usando como índice de densidade de raízes a 4.7. Deficiência e toxicidade de nutrientes não proporção de água extraída das camadas de solo no perfil, em várias mobilizados no floema distâncias do estipe. Os resultados demonstraram que as raízes ativas estavam mais concentradas na zona de coroamento, menos densas sob na grande maioria das plantas superiores, incluindo as pal- as pilhas de folhas podadas, e pouco presentes nas ruas de colheita. meiras, os nutrientes Ca, B e Mn não são mobilizados no floema e, por conseguinte, não são remobilizados após o transporte inicial, via A zona de coroamento (20% da área total plantada) é conti- rota apoplástica, até os tecidos receptores (MArsCHner, 1995). nuamente tratada quimicamente com glifosato, ou outro herbicida, nas palmeiras em geral, o ferro (Fe) também é imóvel no floema ou manualmente com foice e/ou enxada, eliminando a vegetação (MunéVAr et al., 2005). do sub-bosque (espécies folhosas, gramíneas e samambaias). estas sintomas de deficiência de B, Mn e Fe nos tecidos apicais do práticas supostamente apresentam efeitos negativos sobre a saúde dossel de palmeiras foram descritos por Broschat e elliott (2005) e das raízes superficiais. em várias publicações específicas sobre o dendezeiro (FAiRHuRSt De acordo com as observações do autor, as aplicações de et al., 2005; iPni, 2011). em geral, a ocorrência de sintomas clássicos corretivos (calcário agrícola, calcário dolomítico, gesso agrícola e da deficiência de Mn e B não está associada concomitantemente à outros) em solos ácidos da América parecem estar muito limitadas ocorrência de AF, e quase sempre aparece onde não há sinal de AF. em relação à real necessidade de Ca. Aplicações insuficientes de Ca e dados de romero (2009) mostraram que B, Fe, Mn e si, elementos outras práticas adversas em solos suscetíveis, especialmente naqueles não remobilizados no floema, não tiveram relação consistente com com baixa capacidade de troca catiônica (CtC) e baixa capacidade o AF em quatro plantações representativas da Colômbia. tampão, ao longo dos anos, possivelmente prejudicam a saúde do Os sintomas de AF estão muitas vezes presentes ou mais pro- solo e do sistema radicular das palmeiras e, portanto, aumentam a nunciados em palmeiras cultivadas em solos muito ácidos (pH < 4,6), probabilidade de deficiência transitória de Ca nos novos tecidos. por isso, é improvável que o distúrbio esteja relacionado com a defi- A aparente ausência de alta incidência de AF nas plantações ciência de Mn ou Fe. em muitos solos, o Mn aparece em concentrações tradicionais das aldeias da África e no Brasil é um importante supor- muito elevadas em pH < 4,3. Além disso, a elevada disponibilidade das te à hipótese abiótica. É provável que sob estas condições rústicas 8 INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 137 – MARÇO/2012 os sistemas radiculares das palmeiras sejam mais saudáveis devido latitudes do mundo, os efeitos de la niña, que é a fase fria da a não utilização de fertilizantes solúveis e à presença de camada Oscilação Sul (enSO, em inglês), têm sido menos frequentes orgânica no solo, na zona de coroamento, principalmente pela falta nos últimos 25-30 anos, mas quando eles ocorrem, como no de um controle rigoroso de ervas daninhas (Figura 1). recente episódio em 2008-2009 e agora em 2010-2011, tem efeitos profundos sobre a agricultura nos trópicos ocidentais 6. CHAVES DA HIPÓTESE ABIÓTICA da América. O surto de AF, muito destrutivo no sul de Puerto Wilches, Santander, Colômbia (coordenadas: n 7o17'; O 73o50'), de forma resumida, os fundamentos anatômicos e fisioló- nas três maiores plantações da região produtora (Oleaginosas de gicos da hipótese abiótica consideram que durante os quase cinco las Brisas, Monterrey e Oleaginosas Bucarelia) e em quase todas meses de rápido crescimento das palmeiras – saudáveis e em as plantações vizinhas, parece estar relacionado aos recentes condições climáticas normais – na fase heterotrófica das flechas episódios de la niña. novas, o conteúdo de Ca nos tecidos suscetíveis é reduzido abaixo Durante este período de la niña, de novembro de 2007 a do normal. estes novos tecidos estão bem fechados dentro do estipe Janeiro de 2009, as precipitações foram maiores do que as normais, circundante, sem capacidade de realizar fotossíntese e transpiração com menos horas de sol e maior umidade do ar durante 15 meses e apenas providos com nutrientes e fotossintatos translocados de quase contínuos (Figura 3). outras partes da planta. Consequentemente, eles estão sujeitos a deficiências transitórias de nutrientes que não foram mobilizados dados da incidência de AF em Monterrey (Figura 4) mos- pelo floema, especialmente Ca, induzidas pela baixa absorção desse traram um máximo mensal de novos casos registrados de aproxi- nutriente nas fases de baixa transpiração, como ocorre nos períodos madamente 22.500 plantas (5% da plantação total de palmeiras) de muita nebulosidade (normalmente 3-5 meses nos trópicos das com os primeiros sintomas visíveis nas flechas em dezembro de Américas). 2008. este evento catastrófico ocorreu após sete meses (Maio a O último efeito é exacerbado quando a solução do solo novembro de 2008) quase contínuos de baixa insolação, sob intensa contém baixa concentração de Ca2+ e elevada concentração de Al3+, influência de la niña. A diferença marcante entre 2008 e os outros geralmente relacionadas com solos muito ácidos, com pH < 4,6 na anos foi que, neste ano, as ondas de calor habituais nos meses de camada superficial da zona de coroamento, a qual corresponde à área junho a agosto – neste clima geralmente bimodal – não ocorreu onde está localizada grande parte das raízes finas de alimentação. pelos efeitos do la niña. É muito importante notar que a concentração de Al aumenta expo- em contraste, 2007 foi um período de crescimento muito nencialmente em condições de pH inferior a 4,6 (CRiStAnCHO intenso das palmeiras, com altos rendimentos, e, por isso, a acidifi- et al., 2009, 2011). Condições de alta competição entre K+, Mg2+ e cação localizada do solo ficou exacerbada nos lotes mais produtivos. Ca2+ diminuem a absorção de Ca e aumentam a probabilidade de De acordo com a hipótese abiótica, é provável que a fase lenta de ocorrência de AF. solos com alta relação Mg:Ca são suscetíveis ao novas incidências de AF entre Dezembro de 2006 e Fevereiro de ataque do AF. todos os fatores que afetam a saúde radicular afetam 2008 foi resultado da acidificação gradual dos solos. durante este a absorção de Ca2+, que depende em grande parte do crescimento período, o excesso de absorção de cátions (especialmente nH+, K+ contínuo de raízes terciárias e quaternárias saudáveis. e Mg2+) em relação a de ânions (principalmente nO-, HPO e4 Cl-) 3 2 4 esteve equilibrada com a extrusão, por meio das raízes mais ativas, 7. O PAPEL DO CÁLCIO de prótons (H+) sob a forma de ácidos orgânicos. A acidificação das camadas de solo próximas das raízes, especialmente na zona de 7.1. Evidência bioclimática coroamento, esteve acelerada durante o período. Por conseguinte, as Com o aquecimento global em curso, associado a mudanças condições geradas pelo el niño, com radiação solar muito elevada, climáticas desastrosas, atualmente observadas em quase todas as geraram condições edáficas negativas que foram, então, combinadas Figura 3. Precipitação média mensal (mm mês-1, linha azul) e horas de sol (horas mês-1, linha vermelha) em Bucarelia, Puerto Wilches, na Colômbia, no período de 2005 a 2009. INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 137 – MARÇO/2012 9 Figura 4. H oras de sol em 2007-2009 e incidência de amarelecimento fatal (casos novos por mês) na plantação da empresa Palmas Monterrey, Puerto Wilches, no sul de Magdalena Medio, na Colômbia. As áreas vermelhas indicam períodos de el niño, ou seja, períodos com horas de sol por mês maiores do que a média mensal, entre 1994-2009. As áreas azuis indicam os meses com horas de sol abaixo da média mensal durante o la niña. com um período de baixa radiação solar – o que reduziu a adsorção como tolerantes também têm mostrado suscetibilidade, mas em de Ca – durante o la niña de grande intensidade em 2008. nos menor grau do que o material de E. guineensis sob as mesmas sete meses seguintes, até dezembro de 2008, a absorção de Ca foi condições ambientais. reduzida, especialmente em microsítios mais suscetíveis ao AF. Dados comparativos de várias plantações na Colômbia su- esta combinação de condições conduziu ao pior episódio de AF gerem que o material tenera, selecionado para altos rendimentos na história do dendezeiro na Colômbia. de racemos por hectare e para outras características importantes em agosto de 2009, Monterrey registrou um total acumulado nas progênies da estação experimental dAMi, em nueva Bertanã, de 219.006 palmeiras com sintomas de AF, o que representou 50% Papúa-nova Guiné, têm consistentemente demonstrado alta sus- do total plantado em 3.145 hectares. dados recentes não confirma- cetibilidade ao AF. Os materiais Papúa Flores e Papúa ASD estão dos, disponíveis em um site regional em Julho de 2011, indicam que entre os mais suscetíveis ao AF na Colômbia (tabela 3). a incidência de AF nesta fazenda atingiu mais de 80% das palmeiras na Malásia, Cristancho et al. (2011a) estudaram os efeitos no primeiro semestre de 2011. do Al solúvel em diferentes concentrações sobre o crescimento em 2008, o rendimento de óleo de palma bruto (CPO) na e a nutrição de plantas jovens de quatro progênies de dendezeiro Zona Central da Colômbia foi o maior na história do país, com (Angola dura x Angola dura, Nigeria dura x Nigeria dura, Deli 5,0 t ha-1 (MesA, 2010). em 2010, esse valor foi reduzido para dura x Avros pisifera e Deli dura x Dumpy Avros pisifera), em 3,2 t ha-1 (46%). O declínio, em grande parte, foi devido ao AF. cultivo hidropônico (pH 4,4). O material mais suscetível à toxici- Segundo a hipótese abiótica, todos os fatores predisponen- dade de Al em termos fisiológicos e nutricionais, durante os oito tes ao AF estavam presentes nas plantações ao sul de Magdalena meses do ensaio, foi Deli dura x Avros pisifera. estes resultados Medio, na Colômbia, em 2008. As manifestações ocorreram ini- confirmam a hipótese abiótica, especificamente em relação à alta cialmente nos locais mais suscetíveis, no segundo semestre desse suscetibilidade deste material ao AF na Colômbia e na Costa Rica. ano. O pico de AF, observado na plantação de Monterrey durante um dos efeitos mais drásticos e rápidos das altas concentrações de o perío do de la niña, coincidiu com os sete meses de crescimento Al solúvel no meio radicular sobre a fisiologia das plantas superiores rápido das plantas em condições de transpiração reduzida, resul- suscetíveis é a interferência na absorção de Ca (MclAuGHlin e tando na deficiência transitória de Ca em 22.500 palmeiras. na WiMMer, 1999). opinião do autor, isso causou danos nas paredes celulares das fle- 7.2.1. Implicações da deficiência de magnésio em Nueva chas imaturas, criando condições adequadas para que organismos Bretaña saprófitas – comum nos trópicos úmidos – invadissem os tecidos em ambiente com alta umidade. neste cenário, os diferentes micro- A deficiência crônica de Mg nos solos da ilha de nueva organismos que têm sido isolados dos tecidos foliares em estudos Bretaña foi estudada em dAMi, em primeira instância nos anos 60, históricos sobre o AF são sintomas de uma condição fisiológica, pela empresa Harrison e Crossfield. Os solos do noroeste da ilha e não a origem do AF. são formados sobre cinzas vulcânicas recentes (WeBB et al., 2009), e os minerais do solo são dominados por feldspatos plagioclásios 7.2. Evidência genética (CaAl Si O -naAlSi O ). Aparentemente, a deficiência de Mg 2 2 8 3 8 nos registros mais recentes dos censos realizados em ocorre devido a: níveis muito elevados de Ca e baixo conteúdo plantações na Colômbia e no equador, com base nos limitados de Mg nestes solos, competição natural entre Ca e Mg e interação dados disponíveis, observa-se a incidência de AF em todos os negativa das aplicações de K sobre os dois nutrientes. materiais comerciais de Elaeis guineensis (tenera e Dura). Além O melhoramento genético foi a estratégia utilizada pelos disso, híbridos interespecíficos (E. guineensis x E. oleifera) pesquisadores associados à dAMi para resolver o problema. originalmente classificados como resistentes ao AF e depois As mais importantes populações geradas foram as teneras (F1) 10 INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 137 – MARÇO/2012
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