Crônicas da Crise: Política, Sociedade e Educação no Brasil Vol. 1: Política, governo, sociedade e pobreza Simon Schwartzman Copyright © 2017 Simon Schwartzman Todos os direitos reservados 2 Apresentação Estes três livros reúnem pequenos textos publicados na Internet1 ou em jornais e revistas entre 2004, quando as políticas sociais e educacionais do governo Lula começam a ganhar forma, e 2017, em meio a uma crise política, social e econômica profunda, em que todos se indagam, ou deveriam se indagar, sobre o que deu errado na experiência desse período, e que alternativas temos pela frente. O crescimento da economia, a expansão dos gastos sociais, o vigor dos debates e das campanhas eleitorais, tudo isto criou a esperança, para muitos, de que o país finalmente estaria mudando de patamar, deixando de ser um país subdesenvolvido marcado pela pobreza, baixa produtividade econômica e instabilidade política, e se transformando em uma moderna democracia menos desigual e com uma população cada vez mais educada e produtiva. A educação, crescendo em todos os níveis e envolvendo recursos cada vez maiores, seria o grande instrumento para este salto de qualidade. Eu também compartia a esperança de que isto seria possível, mas, desde o início, vi com muitas reservas as políticas sociais e educacionais que foram adotadas pelos sucessivos governos de Lula e Dilma, não só pelos equívocos que procurava identificar, mas sobretudo pelo contexto político mais amplo em que estas políticas se davam, e que não permitiam que elas fossem diferentes do que foram. Participei, nestes anos, de diversos 1 http://www.schwartzman.org.br/sitesimon/ 3 debates públicos sobre bolsa família, reforma universitária, política de cotas e a reforma do ensino médio, entre outros, sempre com a sensação de que, independentemente da qualidade dos argumentos, que não eram só meus, as decisões seguiam uma outra lógica na qual a pertinência das ideias não tinha muito lugar. Pode ser que a crise atual crie a oportunidade para construir uma nova lógica de implementação de políticas públicas, onde a evidência dos dados, o acúmulo de conhecimentos da literatura especializada e a força dos argumentos tenham mais espaço. Ao longo destes anos, editei e publiquei vários livros e artigos, quase todos disponíveis no Internet Archive2, aonde procuro tratar destes diferentes temas com mais detalhe e profundidade, mas que, pela sua natureza, não têm como transmitir o calor do debate destes textos menores. Para facilitar a leitura, dividi os textos em artigos em três volumes, o primeiro lidando com questões de política, governo, sociedade e pobreza; o segundo com questões de educação geral, média e profissional; e o terceiro com questões de educação superior, ações afirmativas, pós-graduação e ciência e tecnologia. Dentro de cada um, os textos estão agrupados por temas semelhantes, sem respeitar muito a ordem cronológica em que foram escritos Rio de Janeiro, novembro de 2017. 2 https://archive.org/details/simonschwartzman 4 Índice Apresentação ............................................................. 3 Política e Governo ...................................................... 7 O silencio dos intelectuais (2005) ............................... 8 Adiós Muchachos (2007) .......................................... 10 Chile, descolando da América Latina (2006) ............ 13 A questão da ética na política (ou, o que havia de errado com a UDN? (2006) ...................................... 16 O mensalão, a ética de Don Corleone e a democracia (2005) ....................................................................... 29 As táticas de defesa e a contribuição de Dirceu (2005) ................................................................................. 33 As organizações da sociedade civil e a democracia (2006) ....................................................................... 35 A democracia dos tolos (2007) ................................. 38 O papel das Forças Armadas (2007) ........................ 40 Ministério da Cultura para quê? (2011) ................... 43 Cultura e Democracia (2009) ................................... 46 Lula, entre Roosevelt e Perón (2010) ....................... 48 Fazendo o Brasil funcionar (2013) ........................... 55 Uma maneira emocionante de voar (2006) ............. 60 A Via democrática (2014) ......................................... 64 As eleições de 2014 .................................................. 67 Eleições, democracia e instituições (29 de setembro) ............................................................ 67 A contribuição de Marina (13 de outubro) .......... 69 Ideologia e realidade (20 de outubro) ................. 71 No escuro (27 de outubro) .................................. 73 As Instituições e o Mal-Estar na Sociedade (2014) .. 75 Pelo direito de ir e vir (2014) ................................... 90 O texto do Manifesto ........................................... 92 Visões da Democracia (2015) ................................... 94 Feliz 2016? ............................................................. 100 5 Pelo fim do presidencialismo imperial (2016) ........ 103 A Crise brasileira e a Constituição (2017) .............. 105 Sociedade e pobreza .............................................. 111 A armadilha da mediocridade (2014) ................... 112 A POF e as Garotas de Ipanema (2005) ................. 115 Bolsa escola e bolsa família ................................... 119 Bolsa família e educação (2004) ........................ 119 O impacto da ampliação da bolsa família na educação dos jovens (2007) .............................. 121 Bolsa família: sem surpresa (2008) .................... 124 Ruth Cardoso (2008) .............................................. 126 A nova linha de pobreza, e como medi-la (2011) ... 128 O Banqueiro do mundo (2005) ............................... 131 O novo relatório do Crescimento (2008) ................ 139 O isolamento brasileiro (2015) ............................... 143 Juventude, educação e emprego (2007) ................ 145 A responsabilidade criminal dos jovens (2007) ...... 148 O que o referendo das armas (não) vai decidir (2005) ............................................................................... 150 A Crise da Saúde (2005) ......................................... 154 A crise no Rio ..................................................... 154 O fim da CPMF e o melhor sistema de saúde do Mundo (2008) .................................................... 157 A importação de médicos e o ato médico (2013) ........................................................................... 159 Censura e Autoregulação na TV (2007) ................. 162 IBGE, 80 anos (2016) ............................................. 165 6 Política e Governo 7 O silencio dos intelectuais (2005) Leio no O Globo que começa hoje um ciclo de conferências inaugurado pela filósofa Marilena Chauí sobre “O Silêncio dos Intelectuais”, “um dos eventos mais esperados das últimas semanas, que promete espalhar boas e oportunas reflexões”. Leio também, na Folha de São Paulo, que “o presidente nacional do PT, Tarso Genro, disse nesta sexta-feira à noite que o PT vai voltar a incorporar a intelectualidade brasileira ao projeto estratégico do Partido. A afirmação foi feita após encontro de Tarso com cerca de 40 intelectuais e convidados na sede da Fundação Perseu Abramo, na Vila Mariana, em São Paulo. “ Ninguém me convidou para nada disto. Eu sempre quis ser intelectual, e nunca consegui. Quando entrei para a faculdade, em Belo Horizonte, morria de inveja de meus colegas intelectuais, Teotônio dos Santos e Flávio Pinto Vieira, que entendiam os filmes da nouvelle vague, escreviam nos jornais, publicavam poesias, e sobretudo participavam de festas fantásticas com mulheres lindas, em que, lá pelas tantas, todo mundo caía na piscina, e das quais eu só ouvia falar. Ao longo dos anos, fui aprendendo que ser intelectual não tem muito a ver com estudar, escrever e ter ideias, mas com algo muito mais inefável, impossível de definir, que faz com que uns estejam sempre nos suplementos literários dos jornais e sejam convidados para grandes festas, e outros fiquem sempre de fora. Em algum momento, pensei que a explicação tinha a ver com frequentar certos bares, em Belo Horizonte, ou certos pontos na Praia de Ipanema, no Rio de Janeiro. Tentei estes caminhos, mas não fui 8 muito longe: tenho pouca resistência à bebida, e minha pele é branca demais para aguentar o sol do meio dia do verão. É por isto que não sei bem que silêncio é este do qual os intelectuais estão falando tanto, nem fui chamado a me incorporar ao projeto estratégico de nenhum partido. Continuo falando bastante e dizendo o que penso, embora meus leitores possam ser ainda menos numerosos do que os do Agamenon. Ou não. 9