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crime: sexo, drogas e armas PDF

105 Pages·2015·1.24 MB·Portuguese
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CRIME: SEXO, DROGAS E ARMAS AUTOR: ANDRÉ MENDES GRADUAÇÃO 2015.2 Sumário CRIME: SEXO, DROGAS E ARMAS AULA 1 E 2 — CASA DE PROSTITUIÇÃO E RUFIANISMO .................................................................................................7 AULA 3 — MEDIAÇÃO PARA SERVIR A LASCÍVIA DE OUTREM. FAVORECIMENTO DA PROSTITUIÇÃO. ......................................26 AULA 4 — PROSTITUIÇÃO INFANTIL ......................................................................................................................30 AULA 5 — TRÁFICO INTERNACIONAL DE PESSOA PARA FIM DE EXPLORAÇÃO SEXUAL. ........................................................32 AULA 6 — TRÁFICO INTERNO DE PESSOA PARA FIM DE EXPLORAÇÃO SEXUAL. .................................................................41 AULA 7 E 8 — CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL ................................................................................................44 AULA 9 — ATO OBSCENO. ESCRITO OU OBJETO OBSCENO. ...........................................................................................47 AULA 10 — BLOCO II. DROGAS. TUTELA PENAL DA SAÚDE PÚBLICA? .............................................................................54 AULA 11 E 12 — CONSUMO DE DROGAS ..................................................................................................................58 AULA 13, 14 E 16 — TRÁFICO DE DROGAS (AULA 15 — PROVA) ....................................................................................68 AULA 17 E 18 — ASSOCIAÇÃO PARA A O TRÁFICO ......................................................................................................71 AULA 19 E 20 — FINANCIAMENTO DO TRÁFICO ........................................................................................................74 AULA 21 — BLOCO III. ARMAS. TUTELA PENAL DA INCOLUMIDADE PÚBLICA ...................................................................78 AULA 22, 23, 24 E 25 — POSSE E PORTE ILEGAL DE ARMAS DE FOGO DE USO PERMITIDO E USO RESTRITO ..............................81 AULA 26 E 27 — COMÉRCIO ILEGAL DE ARMAS .........................................................................................................84 AULA 28 — TRÁFICO INTERNACIONAL DE ARMAS .....................................................................................................92 CRIME: SEXO, DROGAS E ARMAS O sistema/1 Os funcionários não funcionam. Os políticos falam mas não dizem. Os votantes votam mas não escolhem. Os meios de informação desinformam. Os centros de ensino ensinam a ignorar. Os juízes condenam as vítimas. Os militares estão em guerra contra seus compatriotas. Os policiais não combatem os crimes, porque estão ocupados cometendo-os. 1. GALEANO, Eduardo. O livro As bancarrotas são socializadas, os lucros são privatizados. dos abraços. Tradução: Eric Ne- O dinheiro é mais livre que as pessoas. pomuceno. 2ª Ed. Porto Alegre: L&PM, 2010, p. 129. As pessoas estão a serviço das coisas.1 1. INTRODUÇÃO A disciplina eletiva Crime: sexo, drogas e armas pretende complementar a formação do aluno no domínio do Direito Penal. Após as disciplinas obrigatórias (i) Crime e Sociedade; (ii) Direito Penal Ge- 2. BRAGA, Ana Gabriela Mendes, ral; (iii) Penas e Medidas Alternativas e (iv) Direito Penal Econômico, o aluno ANGOTTI, Bruna, e MATSUDA, Fernan- da Emy. Das violências reais tem a oportunidade de avançar no estudo de tipos penais relativos à crimina- e simbólicas — a violência lidade recorrente em nossa vida social. sexual contra mulheres no Brasil. In: Boletim - 254 - Janei- Crimes sexuais, de drogas e de armas compõem parte expressiva da atua- ro/2014. ção e funcionamento dos sistemas penais ao redor do mundo. São também objeto de atenção da mídia, que empresta grande repercussão a essas formas de transgressão. São também um foco intenso de atividade legislativa, um fe- nômeno explicável a partir da afetação do próprio legislador pela divulgação massiva desses crimes pela imprensa em geral. A criminalidade sexual segue sendo um desafio para o Direito Penal, fun- 1 GALEANO, Eduardo. O livro dos abra- ços. Tradução: Eric Nepomuceno. 2ª Ed. damentalmente por estar associada, em regra, a uma particular forma de vio- Porto Alegre: L&PM, 2010, p. 129. lência concreta contra as mulheres. Nesse sentido: Entre as diversas formas 2 BRAGA, Ana Gabriela Mendes, ANGOT- TI, Bruna, e MATSUDA, Fernanda Emy. que a violência de gênero assume, o estupro é a que demonstra de maneira mais Das violências reais e simbólicas – a violência sexual contra mulheres no eloquente a existência da desigualdade entre homens e mulheres, ao submeter a 3. Cf. o exemplo de Portugal em Brasil. In: Boletim - 254 - Janeiro/2014. DOMOSŁAWSKI, Artur. Política vítima de modo integral, atingindo seu corpo e sua autonomia.2 3 Cf. o exemplo de Portugal em da Droga em Portugal: DOMOSŁAWSKI, Artur. Política da Os Benefícios da Descri- O tema das drogas parece estar presente na agenda dos países democráti- Droga em Portugal: Os Benefícios da minalização do Consumo cos como uma questão em transição. Alguns países têm optado por um mar- Descriminalização do Consumo de de Drogas. In: Série de Modelos Drogas. In: Série de Modelos Sobre Po- Sobre Políticas de Drogas. Global co regulatório da fabricação, comércio e consumo de substâncias tradicio- líticas de Drogas. Global Drug Policy Pro- Drug Policy Program. Open gram. Open Society Foundations, Junho Society Foundations, Junho de nalmente ilícitas, diante da flagrante falência da denominada war on drugs.3 de 2011. Disponível em: http://www. 2011. Disponível em: http://www. Os crimes relacionados às armas e munições constituem um problema opensocietyfoundations.org/sites/ opensocietyfoundations. default/files/drug-policy-in-portugal- org/sites/default/files/drug- amplo e complexo. Muitas mortes violentas pelo mundo estão associadas às -portuguese-20111206_0.pdf. Acesso -policy-in-portugal-portu- em 30 de junho de 2015. guese-20111206_0.pdf. Aces- so em 30 de junho de 2015. FGV DIREITO RIO 3 CRIME: SEXO, DROGAS E ARMAS armas de fogo, uma indústria que circula cifras astronômicas. No caso do 4. Cf. WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência: Mor- Brasil, o número de pessoas mortas por armas de fogo é expressivo, conforme tes Matadas por Arma de Fogo. Brasília, 2015, pg. 25. se pode depreender do gráfico abaixo4: O estudo dos tipos penais relativos à liberdade sexual, drogas e armas de fogo é relevante para o processo formativo do aluno, principalmente pelo foco que caracteriza essa disciplina eletiva: refletir sobre essas particulares for- mas de criminalidade no Brasil sob os pontos de vista judicial e de formula- ção de políticas legislativas. 2. DELIMITAÇÃO DO CONTEÚDO DA DISCIPLINA A disciplina se divide em três blocos, de modo a abranger os crimes eleitos como objeto de estudo do curso, na forma do cronograma abaixo: AULA DATA TEMA BLOCO I. SEXO. Tutela Penal da Dignidade Sexual. Lenocínio. 1. 4/ago Casa de prostituição e rufianismo. 2. 6/ago Casa de prostituição e rufianismo. 4 Cf. WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência: Mortes Matadas por Arma de Fogo. Brasília, 2015, pg. 25. FGV DIREITO RIO 4 CRIME: SEXO, DROGAS E ARMAS Mediação para servir a lascívia de outrem. Favorecimento da 3. 11/ago prostituição. 4. 13/ago Prostituição infantil. 5. 18/ago Tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual. 6. 20/ago Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual. 7. 25/ago Crimes contra a Liberdade Sexual. 8. 27/ago Crimes contra a Liberdade Sexual. 9. 1/set Ato obsceno. Escrito ou objeto obsceno. 10. 3/set BLOCO II. DROGAS. Tutela Penal da Saúde Pública. 11. 8/set Consumo de Drogas. 12. 10/set Consumo de Drogas. 13. 15/set Tráfico de drogas. 14. 17/set Tráfico de drogas. 15. 22/set Tráfico de drogas. 16. 24/set Associação. 17. 29/set Associação. 18. 1/out Prova 1 19. 20/out Análise das questões e correção coletiva da P1. 20. 22/out Financiamento. 21. 27/out Financiamento. 22. 29/out BLOCO III. ARMAS. Tutela Penal da Incolumidade Pública. 23. 3/nov Posse ilegal. 24. 5/nov Posse ilegal. 25. 10/nov Porte. 26. 12/nov Porte. 27. 17/nov Comércio Ilegal 28. 19/nov Comércio Ilegal 29. 24/nov Tráfico Internacional 30. 26/nov Considerações finais e encerramento do curso. 31. 1/dez PROVA 2 32. 8/dez 2ª CHAMADA 33. 15/dez PROVA FINAL FGV DIREITO RIO 5 CRIME: SEXO, DROGAS E ARMAS 3. METODOLOGIA A metodologia tradicional de estudo dos crimes em espécie importa em avaliar: I. Bem jurídico tutelado II. Tipo objetivo III. Tipo subjetivo IV. Sujeitos ativo e passivo do delito V. Consumação e tentativa VI. Classificação do crime Entendemos que o aluno pode acessar esse conhecimento recorrendo à literatura penal convencional. Por essa razão, a metodologia eleita para este curso aponta para a formulação de uma pergunta-guia por aula, acompanha- da de uma decisão judicial, notícia ou texto específico para análise. O objetivo é proporcionar ao aluno uma reflexão em torno do tema que ultrapasse o padrão limitado resultante da metodologia tradicional do estudo dos crimes em espécie. 4. BIBLIOGRAFIA Como orientação bibliográfica geral, o aluno poderá recorrer aos manuais que contém parte especial e legislação penal complementar. Sugestões: BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte especial. Vol. 4. 6ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral e parte especial. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. As demais leituras poderão ser encontradas no próprio material didático. 5. AVALIAÇÃO A avaliação divide-se em duas provas. Espera-se que o aluno possa resol- ver problemas e propor soluções para situações concretas derivadas da parte especial do direito penal. FGV DIREITO RIO 6 CRIME: SEXO, DROGAS E ARMAS AULA 1 E 2 — CASA DE PROSTITUIÇÃO E RUFIANISMO No Direito Penal brasileiro, a prostituição não é considerada crime. Con- tudo, a exploração da prostituição é criminalizada. No Relatório Final apresentado pela Comissão de Juristas para a elabora- ção de anteprojeto de Código Penal, aprovado em junho de 2012, foi suge- rida a descriminalização de alguns tipos penais voltados à tutela da liberdade sexual, dentre eles os crimes de Casa de Prostituição e Rufianismo: A proposta da Comissão, portanto, é fortemente descriminalizadora, propondo a supressão dos crimes de “violação mediante fraude”, art. 215, 5. Cf. pg. 231 do Relatório Final “mediação para satisfazer a lascívia de outrem”, art. 227, “casa de pros- disponível em: www.senado. tituição”, art. 229, “rufianismo”, art. 230, “ato obsceno”, do art. 233 e gov.br/atividade/materia/ getPDF.asp?t=110444&tp=1. “escrito ou objeto obsceno”, art. 234.5 Acesso em 29 de junho de 2015. QUAIS SERIAM OS FUNDAMENTOS QUE CONDUZIRIAM A UMA DECI- SÃO PELA DESCRIMINALIZAÇÃO DESSES TIPOS PENAIS? Considere a sentença penal abaixo para reflexão. *** Estado do Rio de Janeiro Poder Judiciário Tribunal de Justiça Comarca da Capital Cartório da 43ª Vara Criminal Erasmo Braga, 115 Sala 806CEP: 20020-903 — Centro — Rio de Janeiro — RJ e-mail: [email protected] Fls. Processo: 0205412-03.2012.8.19.0001 Classe/Assunto: Ação Penal — Procedimento Ordinário — Casa de Pros- tituição (Art. 229 — CP) Autor: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEI- RO Réu: ROBERTO RODRIGUEZ PEREIRA Réu: EVERTON MARCOS DE SOUZA RODRIGUES Inquérito 2599/12 21/05/2012 13ª Delegacia Policial ________________________________________________________ Nesta data, faço os autos conclusos ao MM. Dr. Juiz Rubens Roberto Rebello Casara Em 17/08/2012 5 Cf. pg. 231 do Relatório Final disponí- vel em: www.senado.gov.br/atividade/ materia/getPDF.asp?t=110444&tp=1. Acesso em 29 de junho de 2015. FGV DIREITO RIO 7 CRIME: SEXO, DROGAS E ARMAS SENTENÇA Cuida-se de ação penal proposta em face de Roberto Rodriguez Pereira e Everton Marcos de Souza Rodrigues dando-os como incursos nas sanções dos artigos 229 do Código Penal, porque, segundo a denúncia, desde abril de 2007, de forma estável e habitual, em comunhão de ações, “mantém, por conta própria ou de terceiros, estabelecimento em que ocorria e ocorre explo- ração sexual, inclusive, encontros para fins libidinosos, com nítido propósito de obtenção de lucro” (fl. 02). A denúncia foi ofertada com lastro em inquérito policial (fls. 02f/208). A ação penal foi recebida em 22 de maio de 2003, conforme se depreende da decisão de fl. 41. Há decisão, que indeferiu o pedido de “interdição cautelar” da sociedade empresária descrita na denúncia e determinou a citação dos réus, entranhada à fl. 218. As folhas penais dos réus vieram às fls. 222/235. O Ministério Público ofereceu a apelação de fls. 241/242. Há o laudo de exame de documentos de fl. 246. A resposta à acusação de Roberto está às fls. 247/265 e a de Everton às fls. 266/288. Vieram as provas técnicas de fls. 285/290. O relatório da diligência realizada pelo GAP da 1ª Central de Inquéritos está entranhado às fls. 295/335. Os autos vieram conclusos para o juízo de admissibilidade tanto do recur- so interposto quanto da própria acusação. É o relatório. Passo, pois, a decidir. Do juízo de admissibilidade da apelação de fls. 241/242. Em que pese este julgador estar convicto de que a decisão de fl. 218 me- rece ser mantida, isso porque: a) inexiste o chamado poder geral de cautela em matéria penal (Nesse sentido: LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, v. II; BADARÓ, Gustavo. Processo penal. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 709-709; NICOLLIT, André. O novo processo penal cautelar: a prisão e as demais medidas cautelares. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p. 24-25). Sobre o tema, Magalhães Gomes Filho é claro: “não se pode cogitar em matéria cri- minal de um ‘poder geral de cautela’, por meio do qual o juiz possa impor ao acusado restrições não expressamente previstas pelo legislador”. Como ensina FGV DIREITO RIO 8 CRIME: SEXO, DROGAS E ARMAS André Nicolitt, em “decorrência do due processo of law, bem como do fato das cautelares representarem restrições a direitos fundamentais, não se pode falar em poder geral de cautela do juiz, havendo verdadeira taxatividade no rol das medidas cautelares” ; e b) ausente o interesse-utilidade da medida ju- dicial, uma vez que não foram manejadas as medidas administrativas adequa- das e suficientes à interdição da sociedade empresária em atenção ao devido procedimento legal, passo ao juízo de admissibilidade do recurso. No caso em exame, o recurso é tempestivo e cabível (recurso de apelação é residual). Presentes os demais requisitos de admissibilidade recursal. Assim, recebo o recurso. Venham as razões e as contrarrazões recursais. Do contexto (em que a ação penal foi proposta) Na atual quadra histórica, não há como desconhecer que a interpretação (e interpretar é uma função criativa, uma vez que há uma diferença ontológi- ca entre o texto legal e a norma produzida pelo intérprete) está condicionada pelo contexto. Assim, cabe indagar o contexto em que o Ministério Público pede a condenação de Roberto e Everton pela incidência comportamental no tipo descrito no artigo 229 do Código Penal. De início, pode-se perceber que a ação penal foi proposta em meio ao cli- ma político-repressivo gerado a partir da adoção de medidas higienistas volta- das à preparação da cidade do Rio de Janeiro para os megaeventos esportivos de 2014 e 2016. Essa circunstância fica clara com a leitura da medida cautelar incidental de interdição judicial do estabelecimento (fls. 210/217), na qual o Ministério Público, após fazer menção ao “turismo sexual” e à proximidade com grandes eventos internacionais (“valendo citar a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016” — fl. 217), afirma que é “imperiosa a inter- venção do Poder Judiciário, contribuindo para a mudança de tão pejorativa imagem” (fl. 217). É relevante, ainda, notar que, segundo consta da própria denúncia, a in- vestigação que deu origem à acusação iniciou-se em abril de 2007 e só em maio de 2012 a ação penal foi proposta. Diante dessa hipótese, ou seja, de que a ação penal foi proposta em meio ao projeto político de afastar da cidade «imagens pejorativas», que não pode ser descartada em razão da manifestação de fl. 217 e do relatório de fls. 303/333 (que elenca e descreve “casas de mas- sagem”, bares, casas de show e casas de swing situadas na zona sul da cidade do Rio de Janeiro), importa lembrar que a persecução penal não pode ser uma resposta imediata de natureza administrativa, sob pena de violação ao princípio da resposta não contingente, que regula a atividade de criminaliza- ção primária e secundária. Mas, não é só. A análise do contexto em que foi oferecida a denúncia revela também que a acusação é formulada logo após a Comissão de Juristas FGV DIREITO RIO 9 CRIME: SEXO, DROGAS E ARMAS indicada pelo Senado Brasileiro concluir, na mesma linha do que já existe em diversos países nos quais o fenômeno da secularização se fez consistente, pela desnecessidade (na realidade, inadequação constitucional) da tipificação do delito de “casa de prostituição” (atual artigo 229 do Código Penal). Poder-se-ia afirmar que a ação penal proposta em desfavor de Roberto e Everton, ainda que sem a vontade do ilustre acusador signatário da denún- cia (e, aqui, se está a falar do inconsciente, aquele “saber que não se sabe”), acaba por simbolizar uma espécie de “canto do cisne” dos desejos punitivos direcionados à conduta que encontra adequação típica no moribundo artigo 229 do Código Penal. Ademais, como explicou o Professor e Desembargador Aramis Nassif, ao tratar de imputação similar a que consta da denúncia em exame, “a eficácia da norma penal nestes casos mostra-se prejudicada em razão do anacronismo histórico, ou seja, a manutenção da penalização em nada contribui para o fortalecimento do Estado Democrático de Direito, e somente resulta num tratamento hipócrita diante da prostituição institucionalizada com rótulos como ‘acompanhantes’, ‘massagistas’, motéis, etc, com tal conduta, já há muito, tolerada e publicizada, com grande sofisticação, e divulgada diaria- mente pelos meios de comunicação”. Como lembrou André Nicolitt, em recentes declarações veiculadas na mídia, lamenta-se que no ano em que se comemora o centenário de Jorge Amado, a crítica às tentativas moralistas de controle da sexualidade (e da população etiquetada de “excluída”), presentes no romance Gabriela, cravo e canela (1958), que se passa na pacata Ilhéus em plena década de 20, ainda se mostre atual (e necessária). Das questões processuais a) Da inépcia da denúncia: Constata-se que a denúncia não atendeu de maneira integral a exigên- cia contida no artigo 41 do Código de Processo Penal, a saber: descrever a conduta dos acusados, individualizando-as, com todas as suas circunstâncias penalmente relevantes. Em que pese descrever diversas características da so- ciedade empresária e reproduzir elementos inquisitoriais obtidos durante a investigação preliminar, ao individualizar/descrever a conduta dos acusados, o Ministério Público limitou-se a afirmar que “o primeiro denunciado é sócio administrador da sociedade e diretamente responsável pela sua manutenção, ao passo que o segundo, é o gerente, viabiliza o seu funcionamento, cabendo- -lhe a chefia e o pagamento dos ‘funcionários’ da casa” (fl. 02-B). Salta aos olhos, pois, que não se atribui aos acusados nenhuma conduta dirigida à violação do bem jurídico que se quer proteger com a norma penal mencionada na denúncia. De igual sorte, as condutas de Roberto e Everton, FGV DIREITO RIO 10

Description:
Public Policy — Abortion, Homosexuality, Drug Addiction.Spectrum. Books, 1965. (10) Sobre a questão, de forma exemplar na ponderação dos .. sificação, corrupção, adulteração de produtos medicinais ou terapêuticos, o genocídio. Entre os crimes equiparados, segundo o artigo 5º da Consti
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