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Contra o Cristianismo - A ONU e a União Européia como Nova Ideologia PDF

194 Pages·2014·1.23 MB·Portuguese
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Eugenia ROCCELLA & Lucetta SCARAFFIA CONTRA O CRISTIANISMO A ONU E A UNIÃO EUROPÉIA COMO NOVA IDEOLOGIA Apêndices organizados por Assuntina Morresi Tradução de Rudy Albino de Assunção ÍNDICE Capa Folha de Rosto Introdução Primeira parte: Os Direitos Humanos: realidade e utopia Construir um mundo novo: a Declaração dos Direitos Humanos de 1948 O problema do direito natural Fraternidade e humanitarismo A sacralização dos direitos humanos Críticas e ampliação dos direitos humanos A Igreja Católica e a Organização das Nações Unidas As relações entre as religiões O medo da bomba demográfica A Igreja e a União Européia Segunda parte: Não cresçais, não vos multipliqueis Os direitos reprodutivos As origens dos direitos reprodutivos Antinatalismo e eugenia Do planejamento familiar aos direitos humanos Rockefeller, a bomba demográfica e o papel das mulheres O UNFPA e o caso da China A ambigüidade do feminismo dos direitos O caso do Irã Liberdade das mulheres e direitos reprodutivos A esterilização é um direito reprodutivo? A saúde das mulheres A Europa e os direitos reprodutivos Contra a América e com a IPPF A Europa contra o Vaticano O novo léxico como projeto cultural O eufemismo para não “ferir a sensibilidade” A linguagem esterelizada O léxico programático: a sorte do “gênero” O deslizamento temático e a livre escolha Apêndices 1 - Anos, acontecimentos, documentos 2 - Margaret Sanger: vida e pensamento 3 - IPPF (International Planned Parenthood Federation – Federação Internacional de Planejamento Familiar) Fontes Créditos Sobre as Autoras Sobre a Obra INTRODUÇÃO [...] na Europa e na América não há dúvida de que a luta está entre o catolicismo e o humanitarismo. Podemos não levar em conta todo o resto. E acredito eu – se você quer mesmo que eu diga o que penso – que, humanamente falando, o catolicismo agora irá decair rapidamente. É perfeitamente verdadeiro que o protestantismo está morto. Os homens afinal reconhecem que uma religião sobrenatural envolve uma autoridade absoluta, e que o julgamento privado em matérias de fé não é nada além do princípio da desintegração. E também é verdade que, na medida em que a Igreja Católica é a única instituição que ainda reivindica autoridade sobrenatural, com toda a sua lógica impiedosa, ela tem de novo a fidelidade de praticamente todos os cristãos nos quais ainda resta alguma crença sobrenatural. Existem uns poucos gurus, especialmente na América e aqui, mas eles são insignificantes. Tudo isso está muito bem; mas, por outro lado, você deve lembrar que o humanitarismo, ao contrário das previsões de todos, está se tornando uma verdadeira religião, ainda que anti-sobrenatural. Ele é panteísmo. R. H. BENSON, O Senhor do Mundo, 1907[ 1 ] Todo o mundo rendeu homenagem a João Paulo II, falecido em 2 de abril de 2005, e a cerimônia de seu funeral tornou-se um grande êxito universal da Igreja Católica. Êxito devido sobretudo – manifesto nos testemunhos de pêsames – ao indiscutível compromisso que Wojtyla assumiu na defesa dos direitos humanos. Mas precisamente a interpretação deste ponto é controvertida, e o Vaticano – frente a instituições internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a União Européia (UE) – também é apontado como inimigo da aplicação de alguns direitos, em particular aqueles que estão ligados à procriação. Trata-se de uma questão importante e complexa. Estudiosos do direito e filósofos aprofundam o problema conceitual das origens dos direitos e da sua definição, em textos não acessíveis facilmente para quem não é especialista. E os estudiosos são muito numerosos. No que se refere ao funcionamento concreto das organizações internacionais, a incrível variedade e quantidade de material produzido (sobretudo pela ONU) tende a desanimar as pesquisas, deixando tudo nas mãos das burocracias internacionais, em uma situação quase privada de verdadeiros controles, sobretudo da parte da desorientada opinião pública. As poucas pesquisas que enfrentaram estes temas se limitaram a examinar as intenções,[ 2 ] sem adentrar nas modalidades das realizações concretas. E as intenções expressas oficialmente são, obviamente, sempre boas, fáceis de compartilhar por todos, porque são fruto de mediações entre ideologias diferentes, e de uma atenta seleção lingüística. Mas a questão parece mais contraditória se se desce ao terreno escorregadio, mas também revelador, da práxis. Tentamos adentrar nesta selva de documentos, conscientes de que nossa busca é somente um primeiro reconhecimento, necessariamente limitado, realizado sobre um terreno que, na Itália, foi pouco explorado. Mas se não se quer deixar tudo nas mãos dos especialistas e dos entendidos, deve-se tentar abrir passagem na selva de fontes e de estudos. Antes de tudo, é preciso compreender como nasceram os direitos humanos e qual foi sua matriz histórica e ideológica. Problema aberto e espinhoso, porque aflora uma diferença que parece insuperável entre quem reconhece as raízes judaico-cristãs e quem vê somente as iluministas. A esta divisão corresponde outra, entre quem os considera fruto do direito natural e quem os vê como um produto do direito positivo, e os considera, portanto, modificáveis. São questões que já foram expostas em 1948, no momento da redação da Declaração dos Direitos Humanos aprovada pela ONU, mas que se aguçaram nas últimas décadas, quando, depois da perda de força das ideologias políticas, os direitos humanos converteram-se na única ideologia que pode justificar intervenções e guerras. Esta “sacralização dos direitos humanos”, como a definiu Marcel Gauchet, converteu-se no fio vermelho da política internacional e chega a legitimar todo tipo de imposição realizada em seu nome: uma espécie de pensamento único ante o qual deveriam desaparecer todas as demais formas culturais de interpretação do mundo, incluídas as religiões tradicionais. As religiões são, na realidade, as formas culturais e institucionais mais demonizadas pelos organismos internacionais, porque são consideradas inimigas – enquanto concorrentes – do pensamento único dos direitos e, enquanto portadoras de críticas às formas extremas de individualismo ao qual chegaram as atuais formulações dos direitos. Em particular, a Igreja Católica é considerada a inimiga principal, ainda que tenha não somente aderido à Declaração de 1948, mas de certo modo a fez sua, considerando-a uma realização da ética cristã, apesar das modificações às quais, nas últimas décadas, foram submetidos os direitos. Hoje, com efeito, a decidida oposição da Santa Sé às restrições da liberdade religiosa e à extensão dos chamados “direitos reprodutivos” – junto à rejeição da ordenação sacerdotal de mulheres – fez da Igreja Católica uma das instituições que com maior clareza se rebelam contra a “religião dos direitos”; não a única voz crítica, mas sim a mais importante por seu grande prestígio internacional. Um olhar, ainda que seja parcial, sobre tudo que está acontecendo, faz descobrir um mundo que, inclusive por medo do fundamentalismo islâmico, parece querer substituir toda tradição religiosa pela ética laica fundada nos direitos humanos, concebidos como negociáveis ou modificáveis. É uma ética que tende a se configurar como religião, que compreende e supera todas as demais, e que deveria garantir o progresso universal e a convivência pacífica de qualquer forma de diversidade. Junto a esta forte aversão às religiões tradicionais – ou melhor, em relação aos monoteísmos, considerados como uma possível fonte de atitudes intolerantes – desenvolve-se uma confiança cega na difusão, em todo o mundo, do modelo de comportamento sexual que está prevalecendo nos países ocidentais. O necessário ponto de partida é a separação, a mais rigorosa possível, entre sexualidade e procriação, até fazer do sexo só uma atividade lúdica individual, culturalmente desestruturada, que não tem nenhum motivo para ser rodeada de uma rede de convenções sociais e normas morais. Para afirmar este modelo, as instituições internacionais centraram sua atenção nos direitos das mulheres, assumindo como central a questão dos direitos reprodutivos, e adotando a ideologia do “gênero”. Esta conduz à supressão da distinção tradicional entre masculino e feminino, substituindo-a por uma versão mais fluida e indeterminada de identidade sexual. Trata-se de uma revolução cultural que pretende libertar o indivíduo do próprio destino biológico, que não vem somente a se contrapor à idéia de natureza defendida pela Igreja Católica, mas que abre muitas contradições no interior da sociedade. Antes de tudo, a que se dá entre a primeira afirmação dos direitos – já assinalada com clareza pelo sociólogo francês Luc Boltanski[ 3 ] –,ou seja, a igualdade de todo ser humano, e a recusa a considerar seres humanos dotados de direitos os fetos abortados e os embriões descartados ou usados com fins de pesquisa. Segundo Boltanski, esta contradição remonta a dois mil anos atrás, no momento em que foi abolida a diferença entre homens livres e escravos, aos quais não se reconhecia o mesmo direito de pertença à humanidade. Mas esta contradição não é fácil de resolver, porque a possibilidade de decidir quem deve nascer e quem não – ou seja, quem deve ser reconhecido possuidor de direitos humanos e quem não – vai além dos limites do aborto, e desemboca no retorno humilhante da eugenia. A procriação, dissociada das relações naturais e simbólicas da maternidade e paternidade, é equiparada à pura biologia; ao intervir no processo unitário que leva da concepção ao nascimento, ao decompor e recompor, a maternidade perde todo sentido e a vida humana fica reduzida à matéria vivente que pode ser manipulada no laboratório. A própria idéia de livre escolha até hoje associada, na formulação dos direitos reprodutivos, à decisão de quando ser e de ser mãe ou não, alarga sua sombra até a seleção das características genéticas do filho. Mais que um modelo de comportamento sexual distinto, mas conceitualmente análogo aos que o precederam na história, trata-se de uma verdadeira e própria utopia, porque se baseia na idéia de que os seres humanos podem encontrar a felicidade na realização dos próprios desejos sexuais, sem limites morais, biológicos, sociais e relacionais ligados à procriação. Uma utopia que tem suas raízes na revolução sexual ocidental dos anos sessenta do século XX, e que, no entanto, continua sem ser discutida, ainda que pareça não ter cumprido suas promessas. Uma utopia que evoca outra, de infausta memória: que a seleção dos novos seres humanos pode criar uma humanidade melhor, mais saudável, mais bela. A imposição desta utopia aos países de Terceiro Mundo parece constituir o objetivo central da atividade de muitas organizações internacionais, e condiciona ajudas financeiras e relações diplomáticas. A isto se acrescenta – melhor dito, é o lógico complemento – a utopia irênica[ 4 ] de quem acredita que somente a abolição das religiões – sobretudo, repetimos, as monoteístas – pode conseguir o fim dos conflitos para a humanidade. Trata-se de um pensamento tão difundido, e tão bem arraigado que não se pode pôr em questão facilmente, sobretudo nas sedes internacionais. E quem se atreve a fazê-lo, como a Igreja Católica, é criticado, penalizado e acusado de querer obstaculizar a construção de um radiante futuro de harmonia. R. H. Benson, O Senhor do Mundo (Ecclesiae, Campinas, 2013), p. 17-18. Precisamente em relação aos direitos humanos e as das mulheres saiu recentemente na Itália uma coleção de estudos: S. Bartolini (dir.), A volto scoperto. Donne e diritti umani (Roma, 2002), e um ensaio de A. Rossi Doria, “Diritti umani e diritti delle donne”, Contemporanea 4 (outubro de 2004). L. Boltanski, La condition foetale. Une sociologie de l’engendrement et de l’avortement (Paris, 2004). O irenismo é uma atitude pacífica e conciliadora em relação a outras religiões. Seu problema está quando se passa a aceitar erros doutrinais ou contradições explícitas a fim de se evitar conflitos. Esta posição é condenada pela Igreja, assim como uma nova espécie de mentalidade irênica que busca algo parecido a uma supra-religião, onde todas as formas de espiritualidade encontrariam um fim transcendental (Nova Era, ecumenismo, perenialismo e etc). PRIMEIRA PARTE

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Um olhar, ainda que seja parcial, sobre tudo o que está acontecendo, faz descobrir um mundo que, inclusive por medo do fundamentalismo islâmico, parece querer substituir toda tradição religiosa por uma ética laica fundada nos direitos humanos, concebidos como negociáveis ou modificáveis. É u
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