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Conceitos Fundamentais da Poética PDF

194 Pages·1997·10.386 MB·Portuguese
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LITERATURA E EXISTÊNCIA SEGUNDO EMILSTAIGER o professor EMIL STAIGER tornou-se um dos principais críticos contemporâ neos graças a uma aguda compreensão do fenômeno literário, onde um obsti nado empenho de totalidade o preser vou sempre do perigo da atomização. Conhecedor profundo das literaturas clássicas, e amparado por uma visão aberta da existência, STAIGER busca o entendimento integrado de linguagem e vida. Os estilos literários, o lírico, o épico e o dramático (tragédia e comé dia), são aqui motivos para uma re flexão que transcende os níveis ou os limites dessa compartimentação opera cional. A filosofia da ·1inguagem de EMIL STAIGER formula uma compreensão extralingüística da palavra poética. Desde que o. homem conseguiu inte grar dentro de uma totalidade o com plexo de suas relações, êle instaurou uma linguagem. E se é verdade que não existe linguagem independente da sua forma instrumental, também é certo que a apreensão que se queira global tem de descer à fonte do sistema ele signos, à estrutura geradora da mensa gem. É assim pensando e procedendo que EMIL STAIGER abriu novas perspec tivas de entendimento do fenômeno li terário, revolucionando mesmo o ensi no da literatura. CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA POÉTICA 3a edição Tempo Brasileiro Rio de Janeiro - 1997 BIBLIOTECATEMPO UNNERSITÁRIO- 16 Co1eçãodirigida porEDUARDOPORTELLA, ProfessordaUniversidadeFederaldoRio deJaneiro Tradução de CELESTE AÍDA GALEÃO, ProfessoradaUniversidadeFederal daBahía Revista, naparte grega, porROSACARINO LOURO, ProfessoradaUniversidadeFederal doRio deJaneiro Capa de PATRÍCIAAQUINO ANA LUIZAMORALES Traduzido dooriginal alemão Grundbegriffe derPoetik, daAtlantis-Verlag, daSuíça. Direitosreservados a EDIÇÕESTEMPOBRAS~EIRO Rua Gago Coutinho, 61- Laranjeiras CaixaPostal 16099- CEP:22221-070 Telefax: (021) 20~:5949 Rio deJaneiro- RJ- Brasil ·A LUDWIG BINSWANGER NOTA DO TRADUTOR As afirmações de Staiger são .ilustradas na maioria das vêzes com composições alemãs e gregas. No caso de poesias líricas, em que o clima, como defende o próprio Staiger, é ir -reproduzível, ou de composições em vers~ focalizando algum aspecto da métrica, transcrevo no corpo da obra os versos originais e em nota de pé de página limito-me a uma tradu \ ção literal, que reflete unicamente o conteúdo. Da Ilíada e da Odísséia apresento a tradução de Carlos Alberto Nunes, igualmente em versos como a tradução alemã de que se serve o autor- As notas numeradas são de Staiger; as notas do tradutor vêm introduzidas por um asterisco. 9 m1r4.A~Mft"".'' 'I " INTRODUÇAO Por Conceitos Fundamentais da Poética se entendem aqui as·noções de épico, lírico, dramático e até certo ponto trágico e cómico ~ num sentido, porém, que se distingue do co mumente usado até agora e que logo de início deverá ser explicado. De há muito Poética não mais significa ensinamentos práticos para habilitar leigos a escrever corretamente poesia, obras épicas e dramas. Mas um ranço da conceituação mais antiga impregna ainda ensaios de hoje, quando êstes par.ecem ver realizada em modelos de poemas, obras épicas ou dramas, a essência do lírico, épico e dramático. Essa maneira de enfo car o problema se apresenta como herança da antiguidade. Naqueles tempos, cada gênero literário era representado por um pequeno número de obras. Era lírica tôda poesia que se assemelhasse em composição, extensão e principalmente na métrica às criações dos autores líricos considerados clássicos, Alcman, Estesíêoro, Alceu, Safo, Ibico, Anacreonte, Simônides, Baquílides e Píndaro. Os romanos podiam, assim, classificar Horácio como lírico, mas não Catulo, já que êste escolhera outros pés métricos. Mas da antiguidade até hoje, os.modelos multiplicaram-se indefinidamente. A Poética encontrará, por tanto, dificuldades quase insuperáveis, e, caso solucionadas, de muito pouco proveito, se continuar procurando classificar lodos os exemplos isolados. A Poética teria - para continuar mos dentro do gênero lírico - que comparar baladas, canções, hinos, odes, sonetos e epigramas entre si, percorrer sua evolu- 13 ção durante um ou dois milénios consecutivos, e descobrir o que há de comum entre essas composições, chegando então, finalmente, a um conceito global do queseria o gênero lírico. Mas um conceito que tenha validez geral será, por outro lado, vazio de significação. Além disso, no momento em que surgir um nôvo artista lírico com um modêlo inédito, o conceito per. derá sua validade. Por estas razões, a possibilidade de uma arte poética tem sido muitas vêzes contestada. Fala-se das van tagens de se poder seguir "sem preconceitos" as transforma ções históricas, e despreza-se, assim, todo o tipo de sistemati zação tornada dogma. Essa renúncia à Poética é compreensível, enquanto esta mantenha a pretensão de catalogar em compartimentos estan ques tôdas as poesias, composições épicas e dramas existentes, A individualidade de cada poesia exigiria tantas divisões quan tas poesias existam - e.isso tornaria supérflua qualquer ten tativa de ordenação. Se desacreditamos .da possibilidade de determinar a es sência da poesia lírica, da composição épica ou do drama, não nos parece, porém, fora de propósito uma definição do lírico, do épico e do dramático. Usamos, por exemplo, a expressão "drama lírico". "Dra ma" significa aqui lima composição para o palco e "lírico" refere-se ao tom, que se mostra mais importante na determi nação da essência que a "exterioridade da forma dramática". Qual é, aqui, o critério para determinação do gênero? Quando chamo um drama de lírico, ou um romance de dramático - como Schiller considera o "Hermano e Doro téia" é porque sei o que quer dizer lírico e dramático. Não 1 - passo a saber isso, ao me recordar de tôdas as poesias líricas e de todos os dramas que existem. Essa profusão enorme de obras viria apenas confundir-me. Antes tenho em mim uma .idéia do que seja lírico, épico e dramático. Idéia esta que me ocorreu a partir de algum exemplo. O exemplo terá sido, pro vàvelmente, uma obra literária. Mas nem mesmo isso é im prescindível. Posso ter vindo a conhecer a "significação ideal" - para falar como Husserl> - do "lírico" por meio de uma 1. Carta a GOethe de 26 de dezembro de 1797. 2. Loçisctu: Utitersuctiumçen: (Investigações Lógicas). 4." 00., Halle, 1928, vol, II, 1, pág. 91 e segs, 14 paisagem, e do épico, talvez, por uma leva de emigrantes; uma discussão pode ter-me incutido o sentido do "dramático". Essas significações mantêm-se firmes; na opinião de Husserl, é absurdo dizer-se que elas oscilam. O valor das obras que tentamos julgar de acôrdo com esta idéia é que pode variar; uma pode ser mais ou menos lírica, épica ou dramática que a outra. Também os "atas que conferem a significação" po dem aparentar caráter dúbio. Todavia, uma vez'captada a idéia do "lírico", esta é tão irremovível como a idéia do, triângulo ou como a idéia do "vermelho"; é uma idéia objetiva e foge a. meu arbítrio. É verdade que uma idéia pode ser imutável e, apesar dis so, falsa. Um daltônico não tem idéia correta do "vermelho". De acôrd~. Apenas essa questão refere-se exclusivamente à 'conveniência terminológica. Minha idéia de "vermelho" terá que corresponder ao que se considera no consenso geral como "vermelho". Do contrário, estou usando a palavra errôneamen te. Do mesmo modo a idéia de "lírico" tem que corresponder ao que geralmente denomina-se lírico, embora sem um con ceito claro. Isso não vem a ser a média do que é chamado ele Lírica, de acôrdo com as características formais. Ao falar ele "clima Iíríco" ("lyrische Stimmung") ou de "tom lírico", nin guém está pensando num epigrama; mas qualquer pessoa pen sa imediatamente em uma canção (Lied). A menção de "sere nidade épica" ou de "plenitude épica" não se vai pensar no "Messias" de Klopstock. Evoca-se Homero, e mesmo assim não todo o Homero, em especial, suas passagens primordialmente épicas, e só aos poucos cenas líricas ou dramáticas que se vão acrescentando às primeiras. É a partir de tais exemplos que se terá de elaborar as noções fundamentais dos gêneros poé ticos. Dêsse pont.o de vista, existe sem dúvida uma conexão en tre lírico e a Lírica, épico e a Épica, dramático e o Drama. Os exemplos mais típicos do 'lírico serão encontrados provável mente na Lírica, os do épico, nas Epopéias. Mas não vamos de antemão concluir que possa existir em parte alguma uma obra que seja puramente lírica, épica ou dramática. Nossos estudos, ao contrário, levam-nos à 'conclusão de que qualquer obra autêntica participa em diferentes graus e modos dos três gêneros literários, e de que essa diferença de participação vai explicar a grande multiplicidade de tipos já realizados his tõrícamente. 15

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