Clio-psyché hoje fazeres e dizeres psi na história do Brasil Ana Maria Jacó-Vilela Antônio Carlos Cerezzo Heliana de Barros Conde Rodrigues orgs. SciELO Books / SciELO Livros / SciELO Libros JACÓ-VILELA, AM., CEREZZO, AC., and RODRIGUES, HBC., orgs. Clio-psyché: fazeres e dizeres psi na história do Brasil [online]. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2012. 309 p. ISBN: 978-85-7982-061-8. Available from SciELO Books <http://books.scielo.org>. All the contents of this chapter, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution-Non Commercial-ShareAlike 3.0 Unported. Todo o conteúdo deste capítulo, exceto quando houver ressalva, é publicado sob a licença Creative Commons Atribuição - Uso Não Comercial - Partilha nos Mesmos Termos 3.0 Não adaptada. Todo el contenido de este capítulo, excepto donde se indique lo contrario, está bajo licencia de la licencia Creative Commons Reconocimento-NoComercial-CompartirIgual 3.0 Unported. Ana Maria Jacó-Vilela Antônio Carlos Cerezzo Heliana de Barros Conde Rodrigues Organizadores Clio-Psyché Hoje: Fazeres e dizeres psi na história do Brasil Rio de Janeiro 2012 Esta publicação é parte da Biblioteca Virtual de Ciências Humanas do Centro Edelstein de Pesquisas Sociais – www.bvce.org Copyright © 2012, Ana Maria Jacó-Vilela, Antônio Carlos Cerezzo e Heliana de Barros Conde Rodrigues. Copyright © 2012 desta edição on-line: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais Ano da última edição: 2001, Editora Relume Dumará. Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer meio de comunicação para uso comercial sem a permissão escrita dos proprietários dos direitos autorais. A publicação ou partes dela podem ser reproduzidas para propósito não comercial na medida em que a origem da publicação, assim como seus autores, seja reconhecida. ISBN: 978-85-7982-061-8 Centro Edelstein de Pesquisas Sociais www.centroedelstein.org.br Rua Visconde de Pirajá, 330/1205 Ipanema – Rio de Janeiro – RJ CEP: 22410-000. Brasil Contato: [email protected] SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ........................................................................................ IV Ana Maria Jacó-Vilela, Antônio Carlos Cerezzo e Heliana de Barros Conde Rodrigues PREFÁCIO .................................................................................................. VI Fazendo história Cecília M. B. Coimbra PARTE I FÁBRICAS DE INTERIORES: MONTAGENS E DESMONTES ........................... 1 A regulamentação da profissão de Psicólogo e os currículos de formação psi .............................................................................................................. 3 Cristiane Ferreira Esch, Ana Maria Jacó-Vilela História da organização dos psicólogos e a concepção do fenômeno psicológico .............................................................................................. 13 Ana Mercês Bahia Bock Práticas pedagógicas da psicossociologia nos anos 60 e 70 .................... 25 Marília Novais da Mata Machado História do trabalho comunitário em Psicologia ..................................... 33 Maria Lívia do Nascimento PARTE II A PSIQUIATRIA... ISSO SE CURA! ................................................................ 43 Metamorfose ou invenção: notas sobre a história dos novos serviços em saúde mental no Brasil ............................................................................ 44 Paulo Amarante, Ana Cláudia Moraes Gomes, Eduardo Henrique Guimarães Torre, Janayna Araújo Costa, Leandra Brasil da Cruz, Luciana Vieira Caliman, Maria Paula Trotta Véras, Paula Rebello Magalhães, Shirley Cavalcante de Lima e Walmero Silveira de Oliveira I A desinstitucionalização da loucura, os estabelecimentos de cuidado e as práticas grupais ....................................................................................... 60 Regina Duarte Benevides de Barros, Silvia C. Josephson, Luis Eduardo Godoy Catalán, Wilma Fernandes Mascarenhas, Alessandra Daflon dos Santos e Fernanda Pinheiro de Oliveira Narrações contemporâneas: vagabundos e turistas nas práticas da saúde mental ..................................................................................................... 68 Luis Antonio Baptista PARTE III DO PÓS-PSICANALÍTICO À PÓS-HISTÓRIA DA PSICANÁLISE .................... 85 A história da Gestalt–Terapia no Brasil: “peles-vermelhas” ou “caras- pálidas”? ................................................................................................. 88 Eleonôra Torres Prestrelo Terapia de família no Rio de Janeiro ...................................................... 97 Edna Lúcia Tinoco Ponciano Os PPPês: Profissionais “psi” nos serviços de saúde mental ................. 107 Ana Cristina Figueiredo A pós-psicanálise — entre Prozac e Florais de Bach ........................... 124 Jane Araújo Russo PARTE IV USTED PREGUNTARÁ POR QUÉ CANTAMOS............................................ 133 Breve história da constituição do grupo Plataforma Argentino............ 136 Patrícia Jacques Fernandes, Maria das Graças dos Santos Duarte e Heliana de Barros Conde Rodrigues Os “psicanalistas argentinos” no Rio de Janeiro: problematizando uma denominação ......................................................................................... 150 Maria das Graças dos Santos Duarte, Patrícia Jacques Fernandes e Heliana de Barros Conde Rodrigues “Um Robespierre rio-platense e um Danton tupiniquim?” —Episódios da análise institucional no Rio de Janeiro ................................................. 168 Heliana de Barros Conde Rodrigues II Un enfoque institucional en la organización de una cátedra de psicología institucional ........................................................................................... 191 Virginia Schejter PARTE V VIOLÊNCIA, SUSPEIÇÃO E SUBJETIVIDADES ........................................... 200 Ensaio para uma genealogia da suspeição nacional: capoeiras, malandros e bandidos.............................................................................................. 202 Ana Paula Jesus de Melo AIDS: Territórios, psicologia e suas imbricações ................................. 236 Antônio Carlos Cerezzo Prosopopeia ou o silêncio da psicologia sobre os inocentes ................. 250 Sylvia Leser PARTE VI A MOBILIDADE SOCIAL AO ALCANCE DE TODOS .................................... 261 Notas introdutórias de uma analítica no campo das modelizações vocacionais ............................................................................................ 262 Regina Maria Santos Dias A escola como espaço de invenção ....................................................... 275 Ana Lúcia C. Heckert, Cíntia Renata Corona, Juliene Macedo Manzini, Roger Elias B. Machado e Vinicius Luciano Fardin Pesquisas participativas e a pesquisa–intervenção na escola ................ 290 Mansa Lopes da Rocha, Sandra Ferreira Montano e Terezinha de Jesus Pimenta Trajetória do encontro entre psicólogos e educadores da rede pública de ensino do Rio de Janeiro ....................................................................... 302 Valéria da Hora Bessa e Marisa Lopes da Rocha III APRESENTAÇÃO Ana Maria Jacó-Vilela Antônio Carlos Cerezzo Heliana de Barros Conde Rodrigues A coletânea de textos que o leitor tem em mãos possui sua gênese nos trabalhos apresentados no II Encontro Clio-Psyché —Fazeres e dizeres Psi na história do Brasil—, realizado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) em novembro de 1999. Na passagem da oralidade à escritura, contudo, ganharam eles nuances originais, referências precisas e um cuidado estético que, se de forma alguma está ausente da palavra falada, tem determinadas particularidades na escrita, em função de sua confortável (e perigosa) fixidez. Neste sentido, a forma de organização dos trabalhos também é nova e se reflete nos títulos das seis seções que os reagrupam em temáticas que julgamos capazes de dimensionar o campo problemático dos saberes e práticas psi no período focalizado —no caso, a contemporaneidade—, por nós datado, mediante um “arbitrário refletido”, como tendo início nos anos 50 e 60. As denominações das seções refletem as concepções historiográficas dos organizadores e, por vezes, devem muito à intertextualidade —palavras que nos constituem, palavras antropofagicamente roubadas de escritos amigos e de amigos, próximos ou distantes no tempo e no espaço. Assim, vale mencionar a “fábrica de interiores” de Luis Antonio dos Santos Baptista, título de uma sempre inquietante tese de doutorado, recentemente transformada em livro1; a psiquiatria como algo que “se cura”, perspectiva tomada à provocação presente na capa de uma brochura mimeografada2 em 1 BAPTISTA, L.A.S. A fábrica de interiores. A formação psi em questão. Niterói: EDUFF, 2000. 2 LOURAU, R. La psychiatrie, ça se soigne! Rapport sur une “structure intermediaire” en psrchiatrie. L’Agora (1983–1990). Mimeo: 1992. IV que o saudoso René Lourau, analista institucional em tempo integral, embarca na aventura da desinstitucionalização com seus olhos de utopista ativo; o “pós-psicanalítico” do sociólogo Robert Castel, a nos alertar permanentemente sobre as múltiplas formas assumidas pela “gestão dos riscos”3; o verso “usted preguntará por qué cantamos”, tantas vezes evocado no belo poema de Mario Benedetti4, disparador de indagações preciosas sobre possibilidades teimosamente afirmadas, embora inevitavelmente problemáticas, de escaparmos ao encargo social de “guardiães da ordem”5. Através dessa última expressão, que apenas por acaso não está também incluída em nossos títulos, embora os condicione a todos, damos início aos agradecimentos àqueles que tornaram possível esta publicação: Cecília Maria Bouças Coimbra, nossa prefaciadora; Ana Paula Jesus de Melo, que transformou a abertura de cada seção em um pequeno ensaio à temática abordada; Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), que propiciou recursos tanto para o evento quanto para a presente edição; Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IP/UERJ) e Conselho Federal de Psicologia (CFP) que, contribuindo para a realização do II Encontro Clio-Psyché, indiretamente condicionaram a existência deste “objeto–livro”. Finalmente, e sem que isso signifique menor importância, NAPE/UERJ (responsável pela impressão de cartazes e folders); Rosilane Motta Neves (nossa gentil e eficiente secretária); mestrandos e bolsistas de Iniciação Científica, cujo entusiasmo com o evento, à época, foi proporcional ao nosso, hoje, momento em que o transcriamos na forma livro —Karina Pereira Pinto, Gabriela Salomão Alves Pinho, Maria das Graças dos Santos Duarte, Patrícia Jacques Fernandes, Cristiane Ferreira Esch, Ana Paula Melo Bitar e Daniela Albrecht Marques Coelho Garritano. Aos nossos leitores, o prazer do texto. 3 CASTEL, R. A gestão dos riscos. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1987. 4 Porque cantamos”, poema de Mario Benedetti. 5 COIMBRA, C.M.B. Guardiães da ordem. Uma viagem pelas práticas psi do Brasil do milagre. Rio de Janeiro: Oficina do Autor, 1995. V PREFÁCIO FAZENDO HISTÓRIA Cecília M. B. Coimbra A transformação do conceito de história —que migrou dos grandes feitos e fatos fundamentais, dos heróis e santos, dos seres ‘notáveis’ para junto deles colocaram-se os cidadãos comuns e os acontecimentos do cotidiano— resultou também em unia modificação do papel dos intelectuais. José Carlos Sebe Bom Meihy Este pequeno trecho que ilustra um pouco a concepção da chamada História Oral nos remete não só para a existência mas, fundamentalmente, para a importância que os múltiplos e diferentes atravessamentos históricos têm em nossas práticas cotidianas. Atravessamentos que, em nosso mundo psi, têm sido enfática e sistematicamente negados, ignorados e não percebidos como constituindo e produzindo nossas vidas. Assim, a história das práticas psi em nosso país aponta para a seguinte questão: por que os atravessamentos históricos têm sido negados, desqualificados, ignorados? É como se tais práticas, por sua pureza, estivessem acima das coisas terrenas, não podendo com elas se misturar. Em um passado recente, nos anos 60 e 70, quando se verificou o boom das práticas psi no Brasil, notadamente nos grandes centros urbanos, elas nos foram apresentadas para consumo como coisas em si, como objetos que, por terem uma determinada natureza, estariam imunes aos múltiplos e variados acontecimentos que marcavam a nossa história. Em nome da pureza da verdadeira prática psi negava-se peremptoriamente quaisquer atravessamentos históricos que pudessem contaminar, macular, os puros, VI verdadeiros, universais e eternos objetos psi com os quais trabalhávamos. Se hoje essa negação não se faz mais tão enfática e/ou sistematicamente como antes, sem dúvida permanece, hegemonicamente, no território psi, o desprezo por aqueles que tentam fazer outras leituras, diferentes das oficiais, incorporando dimensões históricas em suas análises. Esse desprezo tem se traduzido pela afirmação de que tais pessoas não são profissionais psi; podem ser historiadores, sociólogos, cientistas políticos, mas não psicólogos, psiquiatras ou psicanalistas. Daí minha satisfação e mesmo prazer —apesar de fazê-lo em plenas férias— em prefaciar este livro: uma coletânea de textos apresentados no II Encontro Clio-Psyché, realizado em 1999, na UERJ. A novidade, e mesmo a força, desses diferentes trabalhos é ter como fio condutor a história, e isto se encontra muito bem expresso no título Clio-Psyché Hoje —fazeres e dizeres psi na história do Brasil. Majoritariamente os artigos aqui presentes resgatam o que foi anunciado na epígrafe inicial: não uma determinada concepção oficial e dominante de história, mas visões sempre esquecidas, forjadas pelas práticas de diferentes segmentos e movimentos sociais, em suas lutas, em seu cotidiano, em suas resistências e teimosias. Esta história, de um modo geral, atravessa os diversos trabalhos aqui apresentados: uma história onde os diferentes segmentos da população não são meros espectadores dos fatos, mas sim participantes, produtores dos acontecimentos. Uma história onde as subjetividades dominantes —apesar do seu poderio e das suas tentativas— não conseguem silenciar e ocultar a produção de espaços singulares, de práticas diversas, diferentes e múltiplas. Walter Benjamin (1985: 223) a isto se referia quando falava que: O passado traz consigo um índice misterioso, que o impele à redenção. Pois não somos tocados por um sopro do ar que foi respirado antes? Não existem, nas vozes que escutamos, ecos de vozes que emudeceram? (...) sem dúvida, somente a humanidade redimida poderá apropriar-se totalmente do seu passado (...), pois nada do que um dia aconteceu pode ser considerado perdido pela história. VII