7 Poemas inéditos – Rodolfo Alonso Traduzidos por Anderson Braga Horta RodolfoAlonso (BuenosAires,1934)é umadasvozesmais reconhecidasdapoesia U latino-americana ma poesia que não usa as palavras pela sensualidade que contemporânea. Publicoumaisde20 desprendem, mas pelo silêncio que concentram: assim é a livros,incluindotambém deRodolfoAlonso.Poesiaquetentaexprimiromáximodevalores ensaioenarrativa. Primeirotradutorde no mínimo de matéria vocabular, impondo-se uma concisão que FernandoPessoana chega à mudez: Haycosasquenidigo. E que, por isso mesmo, se julga AméricaLatina.Desde com severidade:¿Parasalvar/unminuto/escribo/enlugardevivir? muitojovem,éomais ativotradutorde Emverdade,escrever,sobtamanhaexigência,éumatodevida,li- grandespoetas bertadeviolências,mistificaçõesecompromissos.Erestauraavidaes- brasileirosaocastelhano, sencial,captandooque,nasucessãodotempo,nemépercebidopelos começandoporseus amigosCarlos quetêmguladechegaraumpontoinexistente.RodolfoAlonsoob- DrummonddeAndrade serva,porexemplo,umacicatriz.Aparentemente,éumaobraacabada eMuriloMendes,e danatureza.Mas,porbaixodela,opoetadescobreofogocentralda culminandoentreoutros comManuelBandeirae chaga,permanente,aconsumirealimentar.Laheridayanosabesiexiste. OlavoBilac.A Sólolacicatriz,peroviviente,zumbayresiste,negándoseamorir,negándoseavivir. Thesauruspublicouem Talvezqueaambiçãodestepoeta–comosaberaocertoaambi- BrasíliasuaAntologia pessoal,bilíngüe.A ção da poesia? – seja trazer para a vida de todos os dias o fogo de AcademiaBrasileirade umachagavivadeamor,ardendonomaiorsilênciodecompreensão. Letrasacabade outorgar-lhesuasPalmas Carlos Drummond de Andrade (1968) Acadêmicas. 151 Traduzidos por Anderson Braga Horta Dones para donar Tedoyloquemedieron: aquelsagradoolor alatierramojada, yesavozqueeselviento entrelasramasaltas. Devuelvoloquetuve: losárboleshermanos, lasfloresquemodula laniebla,elgrillo,elpájaro cantandoenlagarúa. Niherencia,nilegado. Sólopasiónytiempo. Laintensavida,elaire, lamañanaradiante ycielosenlosojos. Nonosllevamosnada. ¿Esquelomerecimos? Lallamadelinstante, coloresenelsol, elcrepúsculojuntos. Elfuegodelahoguera dondevamosardiendo. ¿Yveoloquemeve? Enelmomentojusto, 152 7 Poemas inéditos – Rodolfo Alonso Dons para dar O que me deram dou-te. Dou aquele sagrado cheiro a terra molhada e essa voz que é o vento por entre as ramas altas. Quanto tive devolvo: as árvores irmãs, as flores que modula a névoa, o grilo, o pássaro cantando na garoa. Sem herança ou legado. Tão-só paixão e tempo. A intensa vida, o ar, a manhã radiante e a celagem nos olhos. Nada levamos, nada. É o que merecemos? A chama do momento, colorações no sol, o crepúsculo juntos. O fogo da fogueira em que vamos ardendo. E vejo o que me vê? No exato instante, o liso, 153 Traduzidos por Anderson Braga Horta ellisoresplandor delnetomediodía sobreunamesablanca yfrutasentonadas comoparientespróximos: laluz,lagama,eliris, limonesconbananas ylamanzanaverde. Enlalluviacabemos, instantáneos,depronto, íntimosygregarios, cercanosydistantes. Lalluviaesnuestrotemplo. Lacanciónevidente, lapalabraencarnada, loquellegódeafuera porquesonabadentro. ¿Oesquenosomos,lengua? Yelfuegodelaespecie, horizonteypasado. 154 7 Poemas inéditos – Rodolfo Alonso o claro resplendor do meio-dia nítido sobre uma mesa branca e frutas entoadas como parentes próximos: a luz, a gama, o íris, bananas com limões e com a maçã verde. Cabemos bem na chuva, instantâneos, de súbito, íntimos e gregários, próximos e distantes. A chuva é nosso templo. A canção evidente, a palavra encarnada, o que chegou de fora porque soava dentro. Ou não seremos, língua? E o fogo da espécie, horizonte e passado. 155 Traduzidos por Anderson Braga Horta No hay día de la muerte a la memoria de José Augusto Seabra Inmóvil,incesante, lamuerte,árida,impura. Infiel,infame,injusta, laduramuertedura. Impaciente,infecunda, lainútilmuerte,muda. Indudable,noduda lamuerteávidaypura. Epifanía Comoluzenlaluz suenaelinvierno,alsol. Serenamadurez, sabordesnudo quesuspendeysostiene sinsospecharquesabe, secreto,sóloensí, sientesinsentimiento, asimplesed, asimpleser, soloysumoenelsol sagradodelsilencio seco,soberbio,suelto sobreesefríoencendido. 156 7 Poemas inéditos – Rodolfo Alonso Não há dia da morte nalembrançado JoséAugustoSeabra Imóvel, incessante, a morte, árida, impura. Infiel, infame, injusta, a dura morte dura. Impaciente, infecunda, a inútil morte, muda. Não duvida, e é sem dúvida, a morte ávida e pura. Epifania Qual luz dentro da luz soa o inverno, ao sol. Serena madurez, sabor desnudo que suspende e sustenta sem suspeitar que sabe, secreto, só em si, sente sem sentimento, a simples sede, a simples ser, só e sumo no sol sagrado do silêncio seco, soberbo, solto sobre esse frio incendido. 157 Traduzidos por Anderson Braga Horta Antropofagia Sobrelaplayaapenasmancillada,casivirgenaún,noespantaelpiedeViernessinolaimplí- citaamenaza:otros,elOtro,queacasonosincluye. En lo alto de la colina de los pájaros Elmismomar,despuésdetodo,decobaltoentreramas,aestahora.Yelsordoretumbardel tsunamialotroladodelplaneta,rebelióndelaTierra,torturaquelaTierraseinflige,sinpro- yectonienigma. Aquílasgolondrinasabrumadasdecalorcontinúantrazandodeimproviso,aceleradas,enla combadelaire,laprecisafugacidaddesusondasdevuelo.Yhaytorcacitas,loros,tijeretas,palo- mas,tordos,chalchaleros,gaviotasyhastadesconocidosdevistosoplumaje,debellospardosyaún grises,revoloteandoindiferentes,abajooenloalto,volandodesplegados,entreelmarynosotros. Entreelazarylanecesidad. Consecuencias Undía,mirandosinhaberloprevistoelhuecoentreelpulgaryelíndicedemimanode- recha,yomehevistolatir.Esdecir,mehesorprendidovivo,hevistoalavidahaciendo sutrabajo,amicuerpohaciendosutrabajo,porsucuenta,sinqueyotuvieranadaquever en todo eso. 158 7 Poemas inéditos – Rodolfo Alonso Antropofagia Sobreapraiaapenasesflorada,quasevirgemainda,nãoespantaopédeSex- ta-Feira senão a implícita ameaça: outros, o Outro, que acaso nos inclui. No alto da colina dos pássaros Omesmomar,depoisdetudo,decobaltoentreramos,aestahora.Eosur- doretumbardotsunâmidooutroladodoplaneta,rebeliãodaTerra,tortura que a Terra se inflige, sem projeto nem enigma. Aquiasandorinhasangustiadasdecalorcontinuamtraçandodeimproviso, aceleradas,nacurvadoar,aprecisafugacidadedesuasondasdevôo.Ehátro- cazes,louros,tesourinhas,pombas,tordos,zorzais,gaivotaseatédesconheci- dosdevistosaplumagem,debelospardosetambémgrises,revoluteandoindi- ferentes, embaixo ou no alto, voando desenvoltos, entre nós e o mar. Entre o acaso e a necessidade. Conseqüências Um dia, fitando impremeditadamente o vão entre o polegar e o índice de minha mão direita, eu me vi pulsando. Quer dizer, me surpreendi vivo, vi a vida fazendooseutrabalho,meucorpofazendooseutrabalho,porsuaconta,sem que eu tivesse nada que vercomtudoisso. 159
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