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Ciência e Tecnologia no Brasil (volume 3) A Capacitação Brasileira para a Pesquisa Científica e Tecnológica PDF

2006·11 MB·Portuguese
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Ciência e Tecnologia no Brasil: a Capacitação Brasileira para a Pesquisa Científica e Tecnológica Volume 3 Simon Schwartzman (coord.) Antônio Paes de Carvalho Antonio C. Paiva Carlos J. P. de Lueena Eduardo Krieger Fábio Wanderley Reis Fernando Galembeck Geraldo L. Cavagnari Filho João Lúcio Azevedo José M. Rivéros Oswaldo Luiz Ramos Sandoval Carneiro Jr. Sérgio M. Rezende Sônia M. C. Dietrich Umberto G. Cordani Walzi C. Sampaio da Silva FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS EDITORA I ISBN 85-225-0206.4 Sumário Direitos desta edição reservados à Fundação Getulio Vargas Praia de Botufogo, 190-_ 22253~900 CP 62.591 --CEP 22252-970 Rio de Janeiro, RJ - Brasil Apresentação VII Documentos elaborados para o estudo de ciência política realizado pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getulio Vargas, para o :Ministério de Ciência e Tecnologia, no A capacitação braslleira para a pesquisa, âmbito do Programa de Apoio ao Desenvoh.'imento Científico e Ta:nológico (PADCr 11). As opi niões expressas nestes artigos são de exclur.iva responsabilidade dos autores. Eduardo M. Krieger e Fernando Galembeck 1 É vedada a reprodução total ou parcial desta obra. Biotecnologia, Antônio Paes de Carvalbo 19 Copyrighr © Fundação Getulio Vargus Botânica, ecologia, genética e zoologia, 1~ edição _ 1996 Sônia M. C. Dietricb 73 C()ort!eiUldor dti projelO: Simon Schwartzman Avaliação das ciências sociais, Fábio Wanderley Reis 93 Ediç{j() dQ texto: Lucia Klein Copidesque: Maria Isabel Penna Buarque de Almeida Computação, Carlos l. P. de Lucena 123 Editoraçiio eletriJnica: Denilza da Silva Oliveira, Blinne da Silva TOrfes, layr Peneira Vaz e Marilza Azevedo Barboza Engenharia, Revisão; Aleidis de Beltran, Marco Antonio Corrêa e FCttima Cwuni Sandoval Carneiro Jr. 149 Produção gr4fica: Helio Lourenço Netto Física, Sérgio M. Rezende 177 Phvsiolocical sciences (fisiologia), 'Antonio C. Paiva 215 Geociências, Umberto G. Cordani 239 Ciênciae tecnologia 00 Brasil: a capacitação brasiieim para a pesqUIsa lntcliqência artificial) científica e tecnológica, v. 3 I Simon Schwartzman (coord.). _ Rio de W:lzi c. Sampaio da Silva 263 Janeiro: Editora Fundação Getulio \4lrgus, 1996, 420p. Pesquisa agropecuári~ João Lúcio Azevedo 287 V, I publícado em inglês sobo título: Science alld technology in BmziJ: a new palie)' for a global world, I Pesquisa e tecnologia militar, I. Ciência e tecnologia_ Brasil. 2, Ciência e estado _ Brasil. 3. Tec Geraldo L Cavagnari Filho 321 nologia e estado - Brasil. I. Schwartzman, Símon, 1939- L Fundação Getulio Vargas. Química, José M. Rivera. 359 CDD-607.281 Saúde, Oswaldo Luiz Ramos 389 Apresentação Com este terceiro volume a Fundação Getulio Vargas completa a publicação dos trabalhos preparados para o estudo sobre a política de ciência c' tccnologia no Brasil, realizado entrc 1992 e 1993 pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas. I Os dois primeiros volumes incluíram, como capítulo inicial, um documento síntese com as principais recomendações e conClusões derivadas deste estudo, além de uma série de trabalhos sobre o con texto mais amplo, nacional e internacional, no qual a atividade de pesquisa cien~ tífica e tecnológica se desenvolve. Este volume reúne uma série de trabalhos sobre áreas específicas do conhecimento - escritos por autores de destaque nas respectivas áreas de pesquisa - que são precedidos por um documento síntese preparado por Eduardo Krieger e Fernando Galembeck. Ainda que realizados com o apoio do Ministério de Ciência c Tecnologia, no âmbito das atividades do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PADCT II), desenvolvido em colaboração com Banco Mundial, estes trabalhos foram escri Q tos com toda independência por seus autores e não refletem necessariamente as opiniões do governo brasileiro, do Banco Mundial ou do responsável pela coor denação do estudo.2 Em seu conjunto, e cada qual a seu modo, todos estes traba1hos contam uma história semelhante e têm uma origem comum. A ciência brasileira deu seus pri meiros passos mais significativos no início do século XX e vem desde então ten tando encontrar seu lugar na sociedade brasileira.3 Nos anos 30, mm a criação da Universidade de São Paulo, e depois da Universidade do Brasil, a pesquisa cien tífica encontra um nicho no nascente sistema universitário. Os anos do pós guerra são um período de grande otimismo quanto aos beneficias que a ciência e a tecnologia poderiam proporcionar ao desenvolvimento económico e social do país, e o intercâmbio científico e técnico com os países desenvolvidos se intensi fica, enquanto são criadas as primeiras instituições nacionais de fomento à pes~ quisa, dentre as quais a Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo e o Conse lho Nacional de Pesquisas (CNPq). Os anos de regime militar se iniciam com I Os volumes anteriores· são: Schwartzman. S. (coord,), Sciel1ce and techn%gy in Brozil: c new policyfor a global ward, Rio de Janeiro. Fundação Getulio VargllS. 1995; e Schwartzman, S. (cQQrd.), Ciência e tecnnlügia no BrasíJ: poilÍica indu,ftríal, mercado de trabalho e instituiçiies de apoio, Rio de Janeiro. Fundação Getulio Vargas. 1995. 2 Ainda que escritos entre .1992 e 1993. todos os trabalhos foram revistos em 1995 para esta edição. Na maioria dos casos não houve, no entanto, atualização dos dados, que têm corno referência o ano de t993. l Para uma visão em conjunto dessa história, ver Schwartzman, S, A space for sâence; lhe deveIop· .1 menJ 01 lhe scientific comnumiiy ln Brozil. Universit)' Park:. PennsyJvania. State University Press. 1991. VII conflitos intensos entre o governo e muitas das principais instituições científicas do país, mas, a partir sobretudo de meados da década de 70, os investimentos tar ainda insiste no papel do Estado como grande investidor em ambiciosos pro governamentais na área científica e tecnológica se íntensíficam~ e o governo jetos de alta tecnologia, enquanto Pac, de Carvalho, no outro, trata de identificar federal se reorganiza para apoiar a pesquisa de fonna mais consistente e com os mecanismos de ativação da iniciativa privada na área da biotecnologia. Entre maiores recursos. São os anos de criação do sistema nacional de pós-graduação, Os ~O!s, o trabalho de Lucena, sobre computação, testemunha a passagem de uma da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), da reformulação do CNPq e do pollúca de fechamento e auto-suficiência, que caracterizou o início dos anos 80 início da política nacional de informática, assim como da implantação do pro para uma política de muito mais abertura ao setor privado e ii tecnologia intema~ grama nuclear e de outros projetos de grande porte, sobretudo militares. A polí ClOnai, na qual o Estado continua a ter um papel central. Não se trata, somente, de tica do "Brasil Potência", que teve seu auge no governo de Ernesto Geisel, não d~er~nças entre autores, mas sobretudo de diferenças entre áreas, mostrando que tem continuidade no governo João Batista Figueiredo! nem é retomada tampouco nao e possível tratar todos os campos da pesquisa científica e tecnológica em um pelos governos civis que se sucederam desde 1985. O Brasil que emerge de 20 mesmo modelo de ação pública governamental. Apesar das diferenças, todos anos de regime militar é um país com graves desequilfbrios econômieos, sociais e estes trabalhos coincidem na noção de que não basta investir na pesquisa tecnoló gICa, nem na pesquisa acadêmica, para que bons resultados comecem a aparecer, institucionais, que precisam ser administrados em um ambiente de intensa com petição político-partidária, e neste quadro o setor de ciência e tecnologia não COn s~ os mecanismos de articulação e passagem entre os centros geradores de conhe-" segue ser mais do que um entre tantos na disputa por recursOS públicos cada vez CImentos e os usuários de seus produtos não estiverem adequadamente identifica dos e azeitados. mais escassos. O curto período, de menos de 10 anos, em que o setor de ciência e tecnologia . .~ ois trabalhos deste conjunto, sobre as ciências sociais e sobre a inteligêncía no Brasil pôde contar com recursos relativamente abundantes não foi suficiente artIfICial, foram escritos com um espírito diferente e chamam a atenção para outros para que cientistas e tecnólogos demonstrassem os eventuais benefícios que seus problemas, não contemplados nos demais, As ciências sociais e humanas nunca trabalhos poderiam trazer ao país, mas bastou para criar um conjunto muito signi c?nvi,,~eram de forma confortável com as ciências físicas e biológicas. e seu status ficativo de instituições e grupos especializados, que ficaram depois com a frustra CIentífICO tende a ser continuamente contestado. tanto por cientistas naturais ção do trabalho interrompido. Em maior ou menor grau, todos os trabalhos incluí quanto por seus próprios especialistas. No Brasil! as ciências sociais e as humani dos neste volume espelham a visão de que a pesquisa brasileira cresceu, mas não o dades não eram reconhecidas pelo CNPq até os anos 70. e ainda hoje não têm suficiente, e nem sempre com a qualidade que seria desejável. Existem centros e entrada na Academia Brasileira de Ciências e não recebem apoio do PADCT. O grupos de pesquisa de excelente nível, mas outros nem tanto. A falta de recursos é trabalho de Wanderley Reis sobre as ciências sociais é o único que coloca em um problema grave, mas mais séria ainda é a instabílidade institucional. a imprevi questão o conteúdo dos conhecimentos produzidos pela área qne analisa, e sua sibilidade e a falta de políticas bem definidas. As agências de fomento à pesquisa conclusão é bastante ~ontundente; as ciências sociais são, em princípio, tão cientí precisariam ser aperfeiçoadas, trabalhar melhor. O governo deveria ter políticas ficas. qnanto as demais áreas do conhecimento, mas, quando avaliadas deste ponto que estimulassem um interesse maior do setor produtivo pela ativídade de pes de VIsta, o que se produz no Brasil está muito longe dos padrões internacional quisa e desenvolvimento tecnológico. Todas essas considerações são de extrema mente aceítos. Esta conclusão. fadada a levantar controvérsias nos meios acadêmi importância, sobretudo quando vistas no contexto de cada área do conhecimento. cos, abre duas questões que nâo reríamos como desenvolver aqui, mas que devem É relativamente escassa, no entanto, a discussão sobre se a estratégia de desenvol ser assinaladas. A primeira é se problemas de conteúdo semelhantes aos identifica vimento científico e tecnológico que começou a se armar na década de 70 tinha dos por Wanderley Reis nas ciências sociais não surgiriam também nas ciências realmente um futuro promissor, e sobretudo se seria realista tentar voltar às condi naturais, ~e estas fossem submetidas a escrutíoios equivalentes. No Brasiljá se uti ções daqueles ànos, dadas as profundas modificações havidas desde então, tanto lIzam mdlcadores de produtividade, como publicações, citações, teses aprovadas nO país quanto no mundo. É esta preocupação que preside, por outro lado, a etc., como próxis de qualidade dos trabalhos cíentiticos, mas não existe, nas ciên cias naturais, a tradição de examinar de maneira crítica e aberta o trabalho reali maioria dos trabalhos publicados nos dois volumes anteriores deste projeto. zado pelos colegas, como é usual na área das ciências humanas e sociais. Vários destes trabalhos, sobretudo os relacionados com áreas mais aplicadas como a pesquisa agropecuária, a pesquisa militar, a computação, a biotecnología A segunda questão, mais complexa, é se o padrão de "científicidade" seria o e a qufmica, colocam o dedo em duas questões centrais, que são o relaciona melhor critério para avaliar todo o trabalho que Se realiza no país não só na área mento difícil e complexo entre as atividades de pesquisa e suas aplicações, e o das ciências sociais e humanas, mas também em todo o conjunto de atividades papel do Estado e do setor privado. A leitura conjunta destes trabalhos é extrema ~ue aparecem usualmente sob o nome genérico de 4'ciência e tecnologiaU, Uma mente ilustrativa. Em um extremo, o texto de Cavagnari sobre a tecnologia mili- literatura crescente questiona a existência de uma demarcação clara entre a Hciên_ da" e outras atividades relacionadas com o conhecimento, tanto nas ciências .11 VIII IX naturais quanto nas ciências sociais, em atividades como a educação, a inovação A capacitação brasileira para a pesquisa tecnológica, a difusão de conhecimentos e a elaboração de conceitos e interpreta ções simbólicas, que seriam mais típicas da política, da literatura e da história. Nesta visão, as ciências naturais estariam muito mais próximas das ciências sociais e das humanidades do que normalmente os cientistas estão dispostos a Eduardo M. Krieger* admitié Uma conclusão extrema, e certamente inadequada, desta visão seria Femando Galembeck** desqualificar todo trabalho que se procure fazer em nome da ciência e, dessa maneira, o pr6prío esforço de dar ao pais uma base científica e tecnológica moderna digna deste nome. A outra conclusão, muito mais difícil. mas cada vez 1. Introdução mais inevitável, é começar a distinguir com mais clareza o que é a atividade cien tífica propriamente dita, segundo o consenso das comunidades especializadas, e o Os estudos reunidos neste livro tratam da capacitação brasileira para as ati que são outras atividades eventualmente tão meritórias como esta, mas que preci vidades de pesquisa e desenvolvimento em diferentes disciplinas científicas e sariam ser conhecidas e avaliadas em seus próprios tenuos. profissjonais: computação; física; química; geociências; engenharias; ciências O texto de Sampaio da Silva coloca o dedo na questão da interdisciplinari biol6gicas, fisiológicas, da saúde e agrárias; biotecnologia; pesquisa militar; inte dade em Uma área particularmente diffcil, a da inteligência artificial, que requer á ligência artificia) e ciêncÍas sociais. que compõem parte significativa do conheci convergência das ciências ffsicas, biológicas, sociais e da filosofia. Aqui, como mento científico e tecnológico contemporâneos, com grande impacto sobre a cul em outras áreas, existem pessoas e grupos bem qualificados, mas ela sofre de um tura. as atividades econômicas e o desenvolvimento social. F...ste texto tem por problema especial-a falta de espaços institucionais adequados para seu cresci objetivo oferecer uma interpretação global dos resultados desses estudos e apre mento e desenvolvimento." A pesquisa científica e tecnológica no Brasil, organi sentar algumas propostas e sugestões para o encaminhamento da área de ciência e zada sobretudo em departamentos universitários, se estrutura em função de facul tecnologia no BrasiL dades profissionais, das disciplinas acadêmicas clássicas ou, no máximo, de algu O impacto das ciências da matéria sobre as ciências biológicas, da saúde e mas áreas aplicadas tradicionais, como a engenharia e a pesquisa agropecuária, e agrárias é muito grande e tem aumentado nas últimas décadas. Desde a emergên tem pouqufssimas condições de se organizar de forma semelhante àquela em qu~ cia da biologia molecular, que tornou possível a engenharia genética, muitos dos aS alividades de pesquisa vêm se estruturando em todo o mundo desenvolvido.' cientistas e tecnólogos da."í áreas Hexatas" passaram a incorporar as implicações A discussão sobre o caso da inteligência artificial sugere que não basta insistir n. biológicas do seu trabalho como um fator que pesa na decisão sobre a escolha e necessidade do trabalho interdisciplinar, nem na necessidade de outras caracterís definição de seus projetas. Por sua vez, os progressos nas áreas biológicas cria ticas que seriam típicas e essenciais para a pesquisa científica e tecnológica ram desafios, oportunidades e instrumentos para a pesquisa matemática e físico modernas, se não tivennos condições de entender e trabalhar também as estrutu química. o mesmo ocorrendo, embora em menor escala, entre as ciências da ras institucionais e culturais mais profundas sobre as quais nossa pesquisa cientí matéria e as ciências humanas. fica e tecnológica ainda se equilibra com tanta precariedade" O desenvolvimento e a produção de muitos setores econômicos dependem das ciências da matéria e das engenharias, como é o caso da indústria extrativa Simon Schwartzman mineral e suas correlatas, de grande parte da indústria de transformação, de bens de capital e de bens de consumo duráveis, das empresas de utilidades (telecomu nicações, energia, água e esgotos), dos serviços bancários e da indústria de anna- mentos e defesa. " As ciências da vida, por outro lado, têm um grande impacto sobre a saúde humana e animal, e sobre a agricultura e a prodUÇão de alimentos" O prolonga mento e a melhoria de qualidade da vida humana, o combate à fome, a manuten 4 Uma das referencias mais conhecidas e p<llêmicas é Latour. Bruno. Science iII m:tion; Jww to follow ção de ecossistemas ricos e da biodiversidade e uma importante fração das ati vi- scientists and engineers through society, Milton Keynes, Open Universitj' Press. 19&7. 5 Ver, a respeito, Gibbons, Michael; Limoges, Camille; Nowotny, Helga; Schwartzman. Simon; Scott, Peter & Trow, Martin. The mm' prnduction of knowledge - the dynamics of scíence and research in * Instítuto do Coração, São Paulo. contempurary societies. London, Sage. 1994. ** Instituto de Química da UuiveíStdade Estadual de Campinas. x dades econômicas dependem das ciências biológicas, da saúde e agrárias, básicas vida humana - o desencanto com a energia nuclear, os acidentes na exploração e e aplicadas. transporte de petróleo e em complexos industriais químicos, os problemas ambi No momento, estão em curso dois processos de transfonnação de atividades entais e sociais criados por uma agricultura intensiva em tecnologia, e a perversi humanas cujo impacto, embora imenso, ainda parece longe de ter-se completado: dade de um imenso arsenal espalhado pelos territórios das grandes potências e capaz de destruir toda a vida humana; • o uso maciço de equipamentos de computação na aquisição, annazenagem, pro cessamento e uso de informação de todos os tipos; • a crescente ínteração entre produtores e usuários do conhecimento, que trans fonnou a pesquisa básica em um elemento fundamental da estratégia de grandes • a mudança nos paradigmas da ciência experimental, nas expectativas de com empresas no mundo todo, tomando os cientistas atentos à questão da apropriação preensão de fenômenos naturais complexos e também nas expectativas de se dos resultados do seu trabalho e às implicações econômicas, sociais, ambientais e obter produtos simples ou sofisticados (como materiais poliméricos, revestimen políticas desses mesmos resultados. tos e nanoestruturas para optoeletrônica) através de processos industriais caótico detenninísticos. Outros fatores de convergência (em oposição à superespecialização) das dis ciplinas científicas e tecnológicas são: 2. Algumas tendências do setor • o progresso nos estudos de sistemas dinâmicos (ou complexos), a partir de áreas No Brasil, a idéia do reducionismo, introduzida a partir do século XVIII, se antes estanques como a hidrodinâmica, meteorologia, economia, química, mate aliou aos traços escolásticos da nossa cultura e ao desprezo pelas atividades mática, ecologia, lingüística e ciência da infonnação, criando uma nova lingua manuais (inclusive as da ciência experimental), para criar um paradigma de gem e novos paradigmas de interpretação de resultados experimentais. Isto apro ensino e de prática (ou falta de prática) científica e tecnológica. Foi com base ximou pesquisadores de áreas muito distintas, tornando-os mutuamente interes nessa perspectiva que se hierarquizou as ciências e que o conhecimento, nas uni sados nos respectivos trabalhos de investigação. Mais interessante ainda é o uso versidades, foi catalogado em ciências exatas, biológicas e humanas. O tenno crescente, em algumas disciplinas, de modelos gerados a partir de resultados exatas reflete a ideologia dominante, fundada na crença na possibilidade de se experimentais de outras disciplinas; tratar toda a matéria inanimada de uma forma euclidiana. A tendência à hierarquização somou-se muitas vezes a uma visão excessiva • o próprio crescimento do conhecimento e de técnicas experimentais que torna mente otimista sobre os sucessos do reducionismo (que foram, certamente, mui ram possíveis novos experimentos e novas descobertas, dos quais resultaram tos). Frases como "A física do século passado basta para explicar os fenômenos do novos conhecimentos e técnicas, e assim por diante. Para exemplificar, descober dia-a-dia; a da primeira metade do século XX basta para explicar os fenômenos do tas de propriedades de sólidos semicondutores permitiram a criação de uma ele espaço e moleculares" ou "A mecânica quântica resolve os problemas da química e trônica de estado sólido, que foi utilizada na construção de microcomputadores, a maior parte dos problemas da física" (amplamente desmentidas pelas décadas supercomputadores e estações de trabalho que hoje são utilizados para modelar e posteriores) foram repetidas acriticamente, criando uma atmosfera desfavorável ao calcular propriedades de sólidos, com um grau de detalhe e exatidão até então engajamento de pesquisadores jovens em muitas áreas de investigação. inconcebível, e que deverá conduzir a novos progressos na ciência dos materiais O ritmo de crescimento da quantidade de informação gerada tornou-se e dos biomateriais, na física e na química de sólidos, gerando, por sua vez, novos explosivo em meados deste século, associando-se a uma tendência crescente à materiais e dispositivos eletrônicos, optoeletrônicos e fotônicos; especialização. Essa tendência começa a se reverter a partir da década de 70, e mais acentuadamente nos últimos anos, em função dos seguintes fatores: • o uso intensivo de recursos computacionais, que criou felTamentas comuns para áreas de trabalho antes estanques. • a consciência ecológica, que despertou em pesquisadores preocupações antes inexistentes, criou oportunidades e problemas de pesquisa e também tornou Hoje, a matemática criou uma seção experimental, as teorias penetraram os impopulares muitos assuntos e subáreas inteiras; laboratórios de síntese química e de fabricação de materiais, e os mesmos tipos de instrumentos analíticos são encontrados em muitos laboratórios de física, quí • o fim de uma visão romântica da "ciência pela ciência", derivado da percepção mica, biologia, geologia e astrofísica. Os congressos temáticos adquirem impor dos enonnes riscos que o desenvolvimento científico e tecnológico introduziu na tância, em detrimento de congressos puramente disciplinares. Congressos inter- 1.111 2 3 nacionais sobre temas como magnetismo, supercondutores, macromoléculas, Resulta a situação atual, da qual algumas componentes importantes são: ciência de colóides e superfícies, catálise e fármacos reúnem grande número de investigadores e profissionais, colocando físicos, químicos, matemáticos, enge • a perenidade de um conflito estéril de interesses entre os defensores da "pes nheiros químicos, engenheiros mecânicos e de materiais ao lado de biólogos e quisa básica" e os da "pesquisa aplicada", ignorando a extrema interdependência pesquisadores de outras disciplinas. entre ambas e a necessidade de atividade vigorosa e simultânea em ,ambas; A interface das ciências "exatas" e das engenharias com as ciências biológi cas se aprofundou, o que é corroborado pela freqüência com que a motivação de • a ausência de vínculos entre pesquisadores universitários e profissionais de trabalhos fundamentais na química e na física passou a ser biológica, ao mesmo empresas; sociedades científicas e sociedades profissionais são corpos distintos, tempo em que o perfil da indústria química dos países desenvolvidos passa por que não se interpenetram nem interagem, à exceção de alguns casos notáveis; um processo de modificação, adquirindo uma forte componente biotecnológica. O reconhecimento destas tendências aponta para uma conclusão: é inútil • a existência de argumentos de rejeição mútua, entre profissionais de empresas concentrar a educação em especialidades. A educação deve privilegiar as habili e pesquisadores universitários, embora, no Brasil, esses profissionais tenham a dades mais genéricas e de multiuso, sejam manuais, sejam intelectuais. A forma mesma origem; esta questão será examinada em maior detalhe a seguir. ção profissional deve ser, antes de tudo, abrangentemente científica. A universidade e os seus ex-alunos 3. O contexto O governo brasileiro tem, em seus quadros superiores, muitos egressos das universidades públicas brasileiras. O mesmo se passa com as empresas, particu A sociedade brasileira, a ciência e a tecnologia larmente as estatais. Portanto, uma parte importante do estamento com poder de decisão e de execução do país formou-se no sistema universitário público. Caso Não existe na sociedade brasileira a consciência de uma necessidade de ati este poder se julgasse devedor do sistema que participou da sua formação, deve vidades de ciência e tecnologia, o que justifica a inexistência de atividades ria tratá-lo bem; caso contrário, deveria tratá-lo mal. importantes em áreas de ciências físicas, químicas, da terra e do espaço, matemá É óbvio que o poder público (federal e o da maioria dos estados) trata muito ticas e nas várias engenharias, até o primeiro terço deste século. Em contrapar mal as atividades de ciência e tecnologia. O poder econômico também não ofe tida, as ciências biológicas, agrárias e da saúde registram numerosos casos e ins rece apoio substancial: no Brasil não se registram legados ou doações importan tituições importantes, no fim do século passado e no início deste século: Oswaldo tes às universidades e instituições de pesquisa, com raras exceções. Cruz, Rocha Lima, Vital Brazil, Carlos Chagas e os institutos de Manguinhos, Os egressos das universidades conheceram nelas muitas coisas negativas: Butantã e Biológico. despreparo de docentes, obsolescência de equipamentos, instalações maltratadas, A partir dos anos 30, a opção pela industrialização se baseou em um modelo desvinculação da realidade adjacente e remota, grevismo docente, política parti importador de tecnologia, enfatizando a formação de recursos humanos adequa dária intramuros, falta de exigências quanto ao desempenho docente e discente, e dos à reprodução e utilização do conhecimento, mais do que à participação no ineficiência administrativa. Algumas dessas mesmas características tiveram, processo de sua criação. durante o regime militar, um papel contestador, em alguns casos muito positivo. O golpe de 1964 e os eventos que se lhe seguiram, particulannente até a Passada a fase de resistência ao regime militar, não ocorreu dentro das uni anistia, introduziram um novo complicador no processo: uma radicalização que versidades um processo de mobilização intelectual e científica associado a um separou se tores da comunidade acadêmica, largamente marginalizada pelo "sis novo projeto nacional. A partir de meadós dos anos 80, a universidade se trans tema", dos agentes do processo econômico. Com isso, a separação entre o saber e fonnou em uma das portas de saída mais utilizadas para a emigração: tornou-se o fazer aprofundou-se. Houve, entretanto, algumas exceções, em que uma con comum a figura do candidato à pós-graduação interessado, acima de tudo, em vergência de interesses aproximou militares, empresários e pesquisadores/profes uma rota para o exterior, preferivelmente sem retorno. Já nos primeiros anos da sores universitários, como foi o caso da indústria de informática. década de 90 este processo foi modificado, agora por um fator puramente Além disso, o regime militar fomentou o crescimento quantitativo e qualita externo: a grande oferta de trabalhadores científicos e técnicos de alto nível, cau tivo do sistema de ensino superior, em uma escala até então desconhecida no país, sada pelo desmonte do antigo sistema científico soviético e do sistema de pes estimulando o crescimento da pesquisa acadêmica, que, em algumas áreas, atingiu quisa militar americano (com reflexos sobre Israel e outros países), aumenta a um padrão de excelência, embor~ com menos sucessos na área tecnológica. competição que deve ser enfrentada pelos pesquisadores emigrantes brasileiros. I 4 5 iii A visão negativa que os egressos têm da universidade brasileira justifica o Esta consciência é um querer de ciência e tecnologia, que esbarra na dificul desinteresse que o público em geral e os detentores do poder têm pela universi dade de não saber fazer. Grande parte dos ex-alunos das universidades não dade; justifica, também, que a maior exceção a este quadro seja a do sistema uni conhece nem compreende o processo de geração de ciência e tecnologia, ou seja, versitário paulista, em que sucessivos governos, de diferentes vertentes partidá desconhece tanto o processo de acumulação do conhecimentoj quanto {) processo rjas, apoiaram as universidades, de fonna quase contínua e substancÍal, durante de revolução do conhecimento. O caso da tecnologia é o mais espantoso. Expres os últimos 50 anos. sões como "transferência de tecnologia" fazem parte do nosso cotidiano, como se tecnologias fossem simplesmente transferíveis. O acordo nuclear Brasil-Alema nha, por exemplo, propunha transferir uma tecnologia que ainda não estava pro A ação do poder público e do setor privado vada quando, na realidade. as tecnologias que funcionam são sempre propriedade Na história da ciência no país, é possivel identificar quatro momentos de alguém, eventualmente disposto a cedê-Ias como parte de um negócio. Outra importantes em que o poder público alavancou as atividades de pesquisa: idéia corrente é a de que só interessa o Ilnovo" produto da pesquisa, ao passo que não existe clareza quanto à noção de desenvolvimento incremental, ou seja\ de • a reação do governo do estado de São Paulo ao governo federal, criando a USP, pequenos ganhos que se acumulam ano a ano e que pennltem ao detentor da tec e seus desdobramentos a partir de 1935; nologia capaz de melhorá-Ia continuamente uma posição confortável face à con corrência e às novas tecnologias que surjam. A participação do setor privado em • a criação do CNPq; C&T é pequena e representa apenas 8% do total de gastos; o restante é fruto de investimento do setor público, dos quais cerca de 12% pelas eslatais. • a criação do Funtec e, mais tarde. da Finep, na esteira do projeto do Brasil potência, do regime militar no fim dos anos 60 e nos 70; 4. Desempenho comparativo das diferentes áreas • a criação do Ministério de Ciência e Tecnologia, o qual, ainda que cercado por A produção científica (medida em artigos publicados) gerada no Brasil em intenções mais ambíciosas que as realizações implementou uma política de for 1980 correspondeu a 30% da produção da América Latina e 0,34% da produção j mação de recursos humanos de alto nível. internacional. Dados de Schott indicam que a participação brasileira na produção mundial de artigos científicos é maior na área da física, decrescendo na seguinte Quanto às empresas brasileiras, em que pese o gigantismo de algumas esta ordem: biologia, matemática, geociê-ncias e ciências espaciais, qufmícá biomedj j tais e o sucesso de muitas delas. tanto estatais quanto privadas, a verdade é que cina, tecnologia e medicina clínica. A produção tecnol6gica medida em patentes seu envolvimento com a geração de ciência e tecnologia ainda é bastante é pequena. modesto, Casos exemplares são os da Usiminas, Metal Leve, e de alguns setores Dados de Briso!!a (1993) indicam haver 52.863 pesquisadores no país em da Petrobras e do complexo florestal papeleiro. No que concerne ao desenvolvi 1985/86. dos quais 11.492 doutores e 13.329 mestres com uma produção científica mento tecnológico em empresas, a atuação e as compras da Pelrobras, da Tele de 4.615 artigos internacionais. É a seguínte a distribuição percentual por área: brás, dos programas militares de pesquisa e de algumas instituições menores mas estratégicas (como o Laboratório de Luz Síncrotron) requereram o envolvimento de algumas centenas de empresas que, com isso, adquiriram qualificação e desen Área Pesquisadores Produção internacional (%) (%) volveram produtos e processos, mais tarde incorporados aos seus neg6cios com outros compradores, do Brasil e do exterior. Ciências exutas c da terra 19 36 Até cerca de 1980, entretanto, as atividades científicas e tecnológicas foram Ciências biológicas t7 26 muito mais objeto de atenção de pesquisadores e de uma cúpula governamental Ciências da saúde t7 19 do que assunto de interesse geral da população. A partir dessa época, a recessão Ciências humanas 13 6 de 1982183, a moratória e suas conseqüências, o discurso governamental de Ciências agrárias 12 6 1986-88 (e a sua parcial concretização, através do PADCT, do programa de bol Engenharias 10 5 sas para o exterior e do RHAE) e o discurso de modernidade de sucessivos candi datos ao governo crjaram uma nova consciência sobre a importância de ciência e Ciências sociais e aplicadas 7 2 tecnologia. Lingüística, letras e artes 5 0.1 I' I~ 6 7 I

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