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Cardeal Dom Paulo PDF

16 Pages·2016·4.85 MB·Portuguese
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50 | | DOM PAULO | anos de Episcopado | | Semanário da Arquidiocese de São Paulo | Edição Especial | 30 de junho de 2016 | www.arquisp.org.br | Cardeal Dom Paulo Há 50 anos, testemunha da esperança Luciney Martins/O SÃO PAULO CArdEAl odilo PEdro SChErEr ArCEbiSPo mEtroPolitAno dE São PAulo Od ia 2 de maio de 1966 foi de bênção e esperança para a Igreja: foi quando o Beato Paulo VI no- meou Frei Paulo Evaristo como bispo auxiliar da Arquidiocese de São Paulo. Pouco conhecido em São Paulo até então, o jovem novo bispo viria a se tornar uma per- sonalidade identificada com a cidade de São Paulo, não apenas pelo nome, mas pela sua vida e seu testemunho de pastor da Igreja. Há 50 anos, no dia 3 de julho de 1966, Frei Paulo Evaristo Arns foi ordenado bispo pela imposição das mãos do Cardeal Agnelo Rossi, então arcebispo de São Paulo, de Dom Anselmo Pietrulla, bispo de Tubarão (SC), e de Dom Honorato Piazzera, bispo coadju- tor de Lages (SC). A cerimônia aconteceu na Paróquia do Sagrado Coração de Jesus, em Forquilhinha, pequena cidade de Santa Ca- tarina, que viu nascer o menino Paulo Eva- risto aos 14 de setembro de 1921. A comunidade local, formada por des- cendentes de imigrantes alemães, alegrou-se imensamente, junto com a numerosa famí- lia Arns, que contava com vários membros consagrados a Deus na vida sacerdotal e religiosa. Alegrou-se também a Ordem dos Frades Franciscanos Menores, que tinha Frei Paulo entre seus membros e como com- petente professor de francês, letras clássicas, filosofia, história da Igreja e patrística, em Petrópolis (RJ) e Curitiba (PR). (Continua na página 2) 50 2 | | DOM PAULO | anos de Episcopado (Continuação) Concílio, especialmente na consti- mesmo quando ela precisa ir contra Essa esperança vem da certeza da O Cardeal Rossi confiou ao novo tuição pastoral Gaudium et Spes. A os poderes e a cultura dominante; fé no Deus bom, justo e misericor- bispo auxiliar o pastoreio da região Igreja precisava empenhar-se, como mesmo quando os frutos não apare- dioso, que não chamou à existência Norte (Santana) da Arquidiocese; já fermento na massa e sal da terra, na cem imediatamente, ou quando isso o homem para a frustração, mas havia vários outros bispos auxiliares renovação da vida social, cultural e cobra o preço da perseguição. para a plenitude e para a felicidade; na imensa Igreja particular de São política do país, em tempos difíceis “A esperança não decepciona”, a esperança cristã baseia-se no Deus Paulo, cuja população crescia rapida- de limitação e cerceamento das li- afirma a Escritura (Rm 5,5); mais fiel às suas promessas, que não en- mente. Com os migrantes, que che- berdades democráticas, de perse- do que nas capacidades humanas, tregou o mundo às forças do mal gavam sem parar à Metrópole, for- guição política e de graves violações ela está fundada em Deus. A espe- nem o deixa no abandono; no Deus mavam-se bairros novos na extensa da dignidade humana, promovi- rança é uma virtude teologal, rece- providente e próximo da humanida- periferia, necessitando de assistência da pelo Estado autoritário. E Dom bida do Espírito Santo no Batismo, de, Deus pedagogo e pai, que ama, religiosa e ação evangelizadora. Paulo empenhou-se pessoalmente, junto com a fé e a caridade. Ela ofe- ensina, corrige, tem paciência e ani- Com o chamado a Roma do mediando a solução de conflitos e rece o horizonte largo à nossa exis- ma seus filhos, com infinita ternura Cardeal Rossi para estar à frente dando coragem, amparo e confiança tência e aponta para a razão de ser e misericórdia. da Congregação para a A esperança cristã, Luciney Martins/O SÃO PAULO Evangelização dos Po- porém, não é passiva, vos, Paulo VI nomeou nem nos deixa de braços Dom Paulo como arce- cruzados; ela nos move bispo metropolitano de à conversão e a nos tor- São Paulo no dia 22 de narmos cooperadores outubro de 1970. Dom na obra de Deus. Ela nos Paulo foi feito cardeal leva ao empenho concreto pelo mesmo Beato Paulo para edificar este mundo VI no dia 5 de março de “segundo Deus” e a cola- 1973 e recebeu a igreja borar com todos aqueles titular de Santo Antônio que também abraçam este de Pádua, na Via Tusco- projeto, animados pela lana, em Roma. mesma esperança. Dom Paulo serviu A Igreja é sustentada a Arquidiocese de São pela “teimosa esperan- Paulo como arcebispo ça” e, por isso, anuncia o por quase 28 anos, até Evangelho, denuncia os que renunciou ao go- males e convida a tecer verno pastoral em 15 o convívio social na jus- de abril de 1998, por tiça, no respeito e na so- decorrência de idade. lidariedade. A esperança Sua dedicação à Igreja motiva e dá coragem para e ao povo de São Paulo o empenho na realização foi imensa. Tratava-se daquilo que é bom e na de implementar as re- edificação das realidades formas do Concílio Va- terrestres, conforme o rei- ticano II e de promover no de Deus. A esperança eficazmente a evangeli- cristã não deixa que nos zação, o testemunho e sintamos desolados e ven- a presença da Igreja na cidos, apesar do êxito ain- imensa Metrópole. Era da não alcançado. necessário ampliar as estruturas e a muitas pessoas que lutavam para e a compreensão mais profunda da O Cardeal Dom Paulo Evaristo serviços eclesiais, religiosos e assis- que o Brasil voltasse a ser um país vida. São Paulo nos lembra que não Arns exerceu seu ministério episcopal tenciais nas extensas periferias po- livre e democrático. temos aqui morada permanente e em São Paulo com grande dedicação, bres da cidade, traduzindo em novas Seu lema episcopal – ex spe in que neste mundo somos peregri- animado pela esperança, deixando práticas pastorais as decisões e ensi- spem (“de esperança em esperança”) - nos a caminho da “pátria definitiva” marcas profundas na cidade e na Ar- namentos do Concílio sobre a Igreja; marcou seu episcopado. Movido pela (cf. Fl 3,20). O livro do Apocalipse quidiocese. No dia 2 de julho, toda e isso requeria uma renovada forma- esperança cristã, Dom Paulo conti- identifica esta pátria definitiva com a esta Igreja Particular reúne-se em tor- ção do clero, dos religiosos e leigos. nuou firme na promoção daquilo que “Jerusalém celeste” (cf. Ap 20), pre- no dele para agradecer a Deus pelos 50 Fazia-se necessário promover a fé ensina e o amor exige, animan- parada por Deus para seus eleitos; anos de sua ordenação episcopal. Foi a justiça social, em sintonia com a do também a comunidade arquidio- Jesus identifica este lugar do futuro muita graça de Deus para ele e para a Doutrina Social da Igreja, afirmando cesana a caminhar e agir na mesma de Deus com a “casa do Pai”, onde há Igreja! Dom Paulo, na sua veneranda e defendendo a dignidade da pessoa, esperança. Esta, de fato, é a atitude muitas moradas (cf. Jo 14,2) e onde idade de quase 95 anos, continua a nos em conformidade com a antropolo- própria da Igreja de Cristo, que não ele já está, glorificado, junto do Pai e lembrar: coragem, nunca desanimar, gia cristã e as ricas orientações do esmorece no anúncio do Evangelho, do Espírito Santo. de esperança em esperança! Mantido pela Fundação Metropolitana Paulista • Publicação Semanal • www.osaopaulo.org.br • Diretor Responsável e Editor: Padre Michelino Roberto • Redator chefe: Daniel Gomes • Reporta- gem: Cônego Antônio Aparecido Pereira, Edcarlos Bispo, Filipe David, Nayá Fernandes e Fernando Geronazzo • Institucional: Rafael Alberto e Renata Moraes • Fotografia: Luciney Martins • Administração: Maria das Graças Silva (Cássia) • Secretaria de Redação: Djeny Amanda • Assinaturas: Ariane Vital • Diagramação: Jovenal Alves Pereira • Edição Gráfica: Ana Lúcia Comolatti • Revisão: Maria Aparecida Ferreira • Impressão: Atlântica Gráfica e Editora Ltda. • Redação e Administração: Av. 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Ou por e-mail • A Redação se reserva o direito de condensar e de não publicar Semanário da arquidioceSe de São Paulo as cartas sem assinatura • O conteúdo das reportagens, artigos e agendas publicados nas páginas das regiões episcopais é de responsabilidade de seus autores e das equipes de comunicação regionais. 50 anos de Episcopado | DOM PAULO | | 3 50 4 | | DOM PAULO | anos de Episcopado Arquivo pessoal Dom Paulo Evaristo Um incansável defensor lidariedade que é capaz de sacrificar os egoísmos individuais e grupais no altar de uma pátria, no altar de um estado, no altar de uma cidade”, dos direitos humanos expressou. “Neste momento, o Deus da es- perança nos conclama para a soli- dariedade e para a luta pacífica, mas EdCArloS biSPo humanos e pela democracia, como Mesmo diante do endurecimento do persistente, crescente, corajosa, em [email protected] em 1987, quando, durante os deba- regime militar, não se furtou em co- favor de uma geração que terá como tes da Constituinte, publicou deze- brar das autoridades que respostas símbolos os filhos de Vladmir Her- Em 1983, um jovem de rua, nas de artigos reforçando o papel da fossem dadas à sociedade. zog, sua esposa e sua mãe. O Deus Joílson de Jesus, foi morto a nova Carta Magna e da participação Na ocasião da celebração, o Car- da Vida, o Deus da História e o Deus pontapés por um procura- da população nesse processo. deal Arns afirmou: “Nosso Deus é da Esperança, coloca em nossas dor de Justiça aposentado. “Os cristãos terão ainda deve- um Deus de esperança. Acontece mãos a missão, exigente, mas pacífi- À época, o Cardeal Arns foi ao ve- res especiais. Nessa época, mais do facilmente que esquecemos o nos- ca, oposta a qualquer arbitrariedade lório na Casa do Menor, abriu a Ca- que em todas as outras, deverão eles so Deus, quando achamos que so- e a qualquer violência, no que temos tedral para um culto ecumênico em implorar a presença e as luzes do zinhos resolvemos os problemas. em nós de divino e de mais humano: memória ao jovem e exigiu justiça. Espírito Santo, em favor daqueles Mas Ele está aí, na hora do caos, Construamos a Paz, na Justiça e na “Basta de morte de crianças, jo- que vão abrir caminhos, definir ru- na hora da desesperança, nos acon- Verdade”, complementou na mesma vens, trabalhadores, homens e mu- mos e indicar meios para chegarmos tecimentos sem saída. Ele se apre- celebração. lheres que constroem a vida. Joílson àquilo que é chamado por todos de senta como Deus da esperança e Em 2013, durante uma home- simboliza todos os meninos e meni- ‘bem-comum’”, escreveu em um dos da salvação, volta a apontar-nos o nagem organizada pela família do nas de quem tem sido tirada a pos- textos da seção “Encontro com o caminho da justiça, a caminhada da jornalista Vladimir Herzog, a Con- sibilidade de viver”, relata a capa do Pastor”, de 1987. solidariedade nas sendas da paz. É gregação Israelita Paulista (CIP) e O SÃO PAULO de 15 de dezembro Em 1975, por exemplo, quando hora de unirmos os que ainda que- a Comissão Nacional de Diálogo de 1985. da morte do jornalista Vladimir Her- rem olhar para os olhos do irmão e Católico-Judaico, o rabino Henry Essa ação de Dom Paulo é um zog, o Cardeal Arns abriu as portas ainda querem ser dignos da luz que Sobel recordou como foi organizado dos muitos relatos de alguém que da Catedral da Sé para que um ato desvenda a falsidade. A esperança aquele ato inter-religioso e a ação de incansavelmente lutou pelos direitos inter-religioso fosse realizado (foto). reside na solidariedade. Aquela so- Dom Paulo na sua realização. 50 anos de Episcopado | DOM PAULO | | 5 “Eu estava consciente de que era “Cinco anos de intenso trabalho de 1985, o Cardeal recordou a im- colaboração de grande número de preciso fazer algo mais para que as resultaram nesse livro de trezentas portância da presença da Igreja no juristas e assistentes sociais para barbaridades não acontecessem ou- e poucas páginas. Quiséramos agra- enfrentamento de uma questão que ajudar aos refugiados, bem como tra vez. Procurei, então, Dom Paulo decer a todos os que sofreram mui- é tão atual e tão antiga ao mesmo a outras pessoas na solução de seus Evaristo Arns, um homem ilumina- tas vezes até o último limite de sua tempo. “As organizações religiosas problemas legais e sociais. Os es- do. Eu acreditava que entre religio- resistência física e psíquica e assim – sem excluir o apoio das entidades critórios do Cardeal contêm a ex- sos, talvez fosse possível encontrar mesmo tiveram a coragem de le- civis – cumpriram, quanto possível, pressão comovente de uma fé pro- algum caminho. Na época, a Cúria gar-nos o seu depoimento, para que o imperativo evangélico de amar o funda na dignidade humana e na Metropolitana de São Paulo era o nunca mais se repetisse no Brasil o próximo como a si mesmo, salvando liberdade individual, o que lhe tem grande centro das denúncias contra que com eles aconteceu”, escreveu dezenas de milhares e vidas, só na inspirado a ação exemplar”, afirma a violação dos direitos dos presos Dom Paulo em uma edição do “En- cidade de São Paulo”. a mensagem. políticos. Fui à casa de Dom Pau- contro com o Pastor” de 1985. Em mensagem publicada na lo, no Sumaré, na noite do dia 29, No livro, como descreve ele no mesma edição, o então secretá- Prêmio Da Paz No JaPão uma quarta-feira. Conversamos por artigo, “aparecem, quase diríamos, rio-geral da ONU, Javier Pérez de Em 1994, foi a vez do Japão agra- duas horas, então, nasceu a ideia, de viva voz, o que se sabe sobre Cuéllar, cumprimentou Dom Paulo decer a Dom Paulo seu trabalho em que partiu de Dom Paulo: ‘que tal ‘subversão’, tortura, vítimas, violên- e destacou que o prêmio concedido favor da construção de uma socie- realizarmos um ato em homenagem cia contra lei e pessoas humanas”. E ao Cardeal foi “em vista de seus es- dade de paz. Segundo a Fundação a Herzog?’, indagou o Cardeal. Isso prossegue, dando uma mensagem forços desinteressados e contínuos Niwano, o Cardeal Arns recebeu o nunca havia sido feito no Brasil. Eu de esperança para o povo brasileiro: na proteção dos direitos humanos, 11º Niwano “por sua colaboração acrescentei para que o ato não seja “Nutrimos a firme esperança de que assegurando o bem-estar aos refu- inter-religiosa para promover o de- visto como um ato judaico, vamos estamos ingressando num tempo de giados na América Latina”. senvolvimento, conservar o meio fazê-lo na Catedral da Sé. É óbvio: o paz e de liberdades democráticas “Figurando entre os membros ambiente e criar um mundo de paz problema não era um problema ju- que sustentem essa paz. Daí o nos- mais vulneráveis da sociedade, com a participação de cristãos, bu- daico, era um problema político. O so compromisso de lutarmos sem devem os refugiados, muitas ve- distas, mulçumanos e judeus”. ‘Vlado’ poderia ter sido um budista, violência, mas com firmeza perma- zes, enfrentar as dificuldades mais O Prêmio Niwano da Paz tem a o destino teria sido o mesmo. Dom nente em favor do respeito à pessoa duras para reconstruir suas vidas. finalidade “encorajar indivíduos e Paulo concordou”. humana”. Durante anos, o Cardeal Arns usou organizações que contribuem, de sua considerável autoridade mo- maneira significativa, para a coope- ‘Brasil: NUNCa mais’, Um reCoNHeCimeNto ral para abrir as portas das igrejas ração inter-religiosa, a fim de pro- livro imPortaNte Em 1985, o Cardeal Arns se tro- e dos conventos a fim de dar ajuda mover a causa da paz no mundo”. O Na defesa dos direitos humanos nou o primeiro brasileiro a receber o aos refugiados de diversos países Prêmio recebe o nome do seu fun- e na missão de não deixar que as Prêmio Nansen - concedido anual- da América Latina. Como incansá- dador, Nikko Niwano, primeiro pre- ações realizadas na ditadura militar mente a um indivíduo ou uma orga- vel defensor dos direitos humanos, sidente da Organização leiga budis- caíssem no esquecimento, o Carde- nização em decorrência do reconhe- fundou a Comissão Justiça e Paz de ta “Rissho Kosei-kai”. Com o valor al Arns e uma equipe de profissio- cimento pelos serviços dedicados São Paulo, a qual se tem dedicado a recebido, 20 milhões de ienes, algo nais juntaram documentos e relatos aos refugiados. defender os perseguidos e os opri- próximo a US$ 190 mil, foi construí- para editarem o livro “Brasil: Nunca Na coluna “Encontro com o Pas- midos em todo continente. A Co- da a Casa de Oração do Povo da Rua. mais”. tor” do O SÃO PAULO de outubro missão e as Igrejas providenciam a (Colaborou Daniel Gomes) 50 6 | | DOM PAULO | anos de Episcopado ‘o difícil no jornalismo é ter o limite. a verdade e a justiça são o limite’ nAyá FErnAndES A gente não se cAnsA de ganham pouco em comparação àque- [email protected] les que estão mandando no mundo. dizer: todo jornAlistA é um Quem manda no mundo? O dinhei- “Eu acho que a beleza cabe sAcerdote no cAmpo dele ro, por enquanto, mas devia ser a ho- em todo lugar. A beleza nestidade do povo e cada um de nós convence quando ela se deveria ser formado para isso, para dá aos outros para animar descobrir onde dói na vida do povo e o povo”, disse Dom Paulo Evaristo um caminho diferente, que o levou a procurando quem possa ajudar. Pro- onde pode desabrochar para ser povo Arns na tarde de 10 de junho, quan- dizer tantas vezes em sua vida: “Deus curando a quem deve ajudar, e a quem de Deus.” do de uma maneira simples e cheia de é bom”. Sim, Deus é bom e, na vida deve é ao povo. O povo é nosso dono. “Estou feliz em ver que o Jornal significado nos encontramos com a de Dom Paulo, foi também esperança Deus nos deu a tarefa de trabalhar com persevera com o nome de O SÃO beleza da vida de Dom Paulo e tudo o para tantos que com ele se encontra- o povo, pelo povo e no meio do povo, PAULO, ter a coragem de ser apósto- que ela representa. ram. “De esperança em esperança”, o como vocês fazem”. lo ou apóstola nos dias de hoje é uma Foi, para a maioria de nós, que tra- lema episcopal do Arcebispo emérito Ao ser perguntado sobre qual a coragem que não se encontra em todo balhamos no O SÃO PAULO, a pri- da Arquidiocese de São Paulo não esta- notícia gostaria de ver no Semanário lugar. Mas a gente não se cansa de di- meira visita à casa onde mora Dom va acompanhado pela citação bíblica. da Arquidiocese, Dom Paulo lem- zer: todo jornalista é um sacerdote no Paulo. Do alto, pode-se ver grande par- “Por quê?”, perguntamos a ele. “Para brou-se do Papa Francisco: “Que o campo dele. Rompe com o passado e te da cidade de Taboão da Serra (SP) e, que as pessoas pudessem pesquisar” – Papa esteja sempre no meio do povo”. abre o presente para o passado”, insistiu no jardim, uma escultura de São Fran- disse – “um aviso para vocês: colocar Aliás, o Cardeal Arns disse que está Dom Paulo. cisco nos diz que por ali, as histórias são sempre nos textos coisas inesperadas”. muito contente com o Papa Francis- Após a conversa na sala, saímos contadas quase sem palavras, formadas Inesperada também foi a caminha- co, “mas eu nunca encontrei com ele para a varanda onde nos foi oferecido por memórias, mas também pela força da deste homem que nasceu em Santa para conversar assim, de peito a pei- um café. “Eu nunca tomei cafezinho. da voz do Cardeal Arns. Catarina e percorreu o mundo, seja to como estou fazendo com vocês, e Tomo café com bolo e, quando a irmã O SÃO PAULO, jornal tão impor- com as próprias pernas, seja com suas dizer as coisas como elas são”. O que perguntou se deveria servir um café a tante na trajetória de Dom Paulo, foi ci- mensagens e palavras ou o trabalho na Dom Paulo diria a Francisco? “Que ele vocês, eu disse: ‘Café só? não!’”, comen- tado tantas vezes na nossa conversa, na defesa dos direitos humanos, reconhe- precisa perseverar!” tou, sorridente, Dom Paulo. “Eu um qual estiveram os jornalistas Fernan- cido internacionalmente. “Eu só nasci dia contei: servi 32 vezes o café, quando do Geronazzo, Edcarlos Bispo, Daniel em Santa Catarina e depois fui a outros Perseverar semPre andava pela diocese”. Ele falou ainda da Gomes e eu (foto), acompanhados por estados. Brasileiro em primeiro lugar, Diversas vezes, o Cardeal repetiu a mãe, de como ela tocava gaita para as Maria das Graças Silva, administradora depois catarinense”. palavra “perseverar” e nós, jovens jorna- irmãs dançarem; lembrou quando visi- do Jornal, e pelos padres Antônio Apa- Estávamos todos em torno dele, listas, sabendo-nos no início deste cami- tava a cidade de São Lourenço, em Mi- recido Pereira e João Mildner. Luciney que sentado em sua poltrona, come- nho, tínhamos ali, à nossa frente, não só nas Gerais, e “que todos os brasileiros Martins, como sempre, fotografou cada çou a falar-nos sobre o jornalismo. “O um conselho dado por quem já percor- são um pouco mineiros”, e, com uma instante. Nós jornalistas participamos SÃO PAULO está bonito. Acho que reu mais estrada do que nós, mas o tes- simplicidade única, abraçou e aben- mais com o olhar, com a admiração, venceu as fases difíceis. No meu tempo, temunho de uma vida, da vida de Paulo çoou a nós todos. com os ouvidos atentos do que com escrevi coisas tão duras, que às vezes Evaristo Arns, o Dom da esperança. “Eu nunca tive um café tão gosto- palavras. Muito provavelmente, elas doía o coração dos dois lados. Vocês es- “O SÃO PAULO apenas começou so como o de hoje”, disse-nos, no fim nos faltaram e iriam surgir depois, no tão animados para levantar este jornal e ele vai encontrando caminhos novos da visita. “Deus lhes pague, a amiza- relato que cada um faria daquele dia. até as nuvens onde Deus quer que ele para o futuro. Acho que um dia vai de vale muito. Sem amigos, a gente Dom Paulo falou sobre o jornalista, sua apareça?”, perguntou-nos, sem esperar ser um jornal diário, um dos grandes não pode fazer um jornal e O SÃO missão, sua tarefa neste mundo. a resposta. “O difícil no jornalismo é a jornais do Brasil”, disse, enquanto re- PAULO é realmente a união de todos A cruz sobre a cama e a foto do gente ter o limite e o limite é a verda- conheceu que a tarefa do jornalismo os paulistas em torno de uma grande pai e da mãe de cada um dos lados no de. A verdade e a justiça são o limite. é difícil e deve ter um objetivo claro ideia, a ideia de que o mundo pode quarto nos diziam que o morador da- O jornalista se faz suando e procuran- a ser seguido. “Ser jornalista é de fato ser melhor. O mundo pode, deve e há quela casa é uma pessoa que percorreu do caminhos, procurando novidades, ser abnegado na vida, porque vocês de ser melhor”. Luciney Martins/O SÃO PAULO 50 anos de Episcopado | DOM PAULO | | 7 Histórias contadas por quem viveu com um Dom Não há nada mais bonito do que campanha “Dom Paulo por São Paulo”, que suas palavras, mas com sua simplicidade e falar da própria experiência. Só convocou as pessoas a enviarem suas lem- coragem, aquela mesma do menino que, aos quem vive sabe o que uma pala- branças e histórias com o Cardeal Arns. Com domingos, ia brincar perto do rio, subir nas vra, gesto ou lembrança significa certeza, teríamos muitas e muitas outras his- árvores mais altas e descobrir o quão belo é para uma tomada de decisão ou para retomar o mundo. tórias para preencher essas páginas, mas aqui (Redação dos textos: Nayá Fernandes, a partir dos relatos da o sentido da própria caminhada. Os textos a podemos conhecer ainda melhor a figura do campanha “Dom Paulo por São Paulo”, promovida pelas equipes seguir foram, em sua maioria, resultado da bispo que a tantos ajudou, não somente com do jornal O SÃO PAULO, rádio 9 de Julho e portal ArquiSP). Um meNiNo ‘arteiro’ Eu era estudante de Pedagogia da Universidade de São Paulo em 2002 e minha tia, Maria Ângela Borsoi, tra- balhava como secretária de Dom Pau- lo. Ela fez a ele as perguntas que pedi para meu trabalho na matéria sobre Brinquedos e Brincadeiras na Educa- ção Infantil. Dom Paulo Evaristo Arns, 81 anos, infância passada na cidade de Forquilhinha (SC). Lembrou, de imediato, Na fila de trás, Dom que sempre brincava Paulo é o último da “na natureza, sempre esquerda para a direita na natureza”. Gostava arquivo pessoal/Dom Paulo evaristo de bola, disputa de cor- ridas, um jogo chamado “brigada” e rolar nas pirâmides de casca de arroz que resultavam do descascador que a família possuía. que iam “em fila, os menores, segu- imediatamente parava de funcionar nas árvores e colhia frutinhas para as Nas cascas de arroz, os meninos rando a raiz a ser plantada, e os maio- a engenhoca, e a turma miúda, mais irmãs. Um dia, até apanhou da mãe subiam até o topo, sentavam e abra- res à frente, fazendo os buracos”. que depressa, corria a descansar, porque subiu muito alto, correndo çavam os próprios joelhos, formando Ajudavam também nas colheitas, porque tinha que esperar o empre- perigo. como que uma bola com o corpo. E bem como na fabricação de tijolos, gado (adulto) que vinha para de- Brinquedos comprados: ele lembra assim soltavam-se lá do alto. Quem e lembra bem que eles, pequenos, semperrar a máquina. que ganhavam apenas no Natal. Che- chegava primeiro ao chão ganhava consideravam “a maior penitên- Esse trabalho infantil fazia par- gou a possuir um cavalinho de madei- a brincadeira. A “brigada” era uma cia” ter de carregar tijolos atrás do te da educação de todas as famílias ra e uma ou mais bolas de borracha. disputa só de meninos, onde se for- pai e dos tios – naturalmente, peso naquele tempo e, fora a “penitência” Lembra-se, também, de carrinhos de mavam dois grupos adversários, que adequado ao tamanho de cada um de carregar tijolos, era apreciado pela madeira (feitos pelos “grandes”), que se postavam no gramado, um diante – até as prateleiras onde aprendiam meninada, porque os pais incentiva- serviam para brincar: quer dizer, os do outro porém distanciados. O lado a arrumá-los um sobre o outro, em vam os filhos ao estudo e ao trabalho, bem pequenos, que não conseguiam que conseguisse prender mais adver- pequenas pilhas, para a secagem fi- deixando o necessário tempo livre ainda correr, eram postos dentro desses sários, “limpando” portanto o outro nal. As meninas também ajudavam. para as brincadeiras. E Dom Paulo carrinhos pelos maiores, que saíam a lado, ganhava o jogo. Dom Paulo lembra que, sendo este o lembra quanto seus pais incentiva- correr e empurravam os menores den- Esses jogos, de bola e brigada, trabalho que mais detestavam, uma vam as brincadeiras. tro desses carrinhos. Dom Paulo disse, eram jogados diariamente no tempo das irmãs mais velhas dele fazia Nas grandes festas, sobretudo no ainda, que “gostava muito mesmo era que restava após as aulas, as lições “arte”, não deixando que os “gran- Natal, 15 dias antes tudo era inter- de bola!”. De corrida também, até nos de casa e o trabalho. Como trabalho, des” percebessem: arrumava um rompido. A criançada “sumia”, entre tempos de jovem seminarista! entenda-se que cada família local de- “terrão”, que era uma pelota de terra primos, etc. com o incentivo de ir in- Observação: Dom Paulo, que tinha uma propriedade e educava as dura e ressequida, e fazia com que ventar surpresas para a grande festa. quase sempre é sério, sorriu bastante crianças, ou seja, as atividades eram o mesmo “caísse” dentro do mistu- Aos domingos – dia de descanso – e quando a entrevistadora chamava a agrícolas e os “pequenos” deviam aju- rador, uma espécie de batedeira que só aos domingos, a criançada tinha atenção para a “arteirice” dele, ou dos dar os “grandes”. Paulo ajudou muito misturava a massa de terra que vi- autorização para ir brincar perto do irmãos e irmãs ... no plantio da mandioca, contando ria a ser tijolo. Quando caía dentro, rio. Paulo era sempre o que subia Isabel Cristina Borsoi, Pedagogia – FEUSP 50 8 | | DOM PAULO | anos de Episcopado ‘Uma graNDe iNteligêNCia Quando Dom Paulo assumiu a Um altar soB meDiDa Dom Paulo, ele deveria estar cercado e Um graNDe Coração’ Arquidiocese, eu partia para o estran- Fiz o projeto da adaptação do gi- pelo povo e nunca num palco, muito No ano de 1986, quando o Cardeal geiro, mas tendo a ocasião de vir ao násio do Ibirapuera para a celebração pelo contrário, as arquibancadas cheias Arns retornava de uma de suas visitas nosso País periodicamente, sempre de 250 anos da Arquidiocese e 50 do seu povo estavam mais elevadas que pastorais, na qual tive a oportunidade procurava visitar Dom Paulo. Era o anos de ordenação sacerdotal de Dom ele. O altar no centro exato. Sobre o al- de acompanhá-lo como seminaris- Arcebispo de São Paulo tendo um Paulo [em 1995]. Pela primeira vez, o tar estava pendurada uma grande cruz ta da Arquidiocese, juntamente com trono e uma sala de recepção, mas altar foi colocado no centro geométri- de ferro sem o Cristo. A cruz tinha um seu motorista, ele fez um pequeno isso uma concessão imprescindível, co do ginásio. Todo o povo ao redor. pano branco simbolizando a Ressurrei- comentário, que haveria uma celebra- a vida dele que me encantava, era a E o altar era a mesa da sala de jantar ção. O piso era marcado com uma cruz ção naquela noite na Catedral da Sé vida do franciscano, com as irmãs da Marquesa de Santos. Tenho a toa- vermelha, cujo centro era a mesa euca- (em memória de Santo Dias, se não franciscanas, o estilo franciscano, se lha do altar até hoje. Foi o que pedi, fiz rística. Nas quatro pontas da cruz esta- me falha a lembrança) e a militância manifestando em gestos como de la- o projeto, acompanhei a organização vam o ambão, a cadeira da presidência, do Partido dos Trabalhadores estaria var pratos e talheres depois da refei- do espaço, comprei a toalha de linho a imagem de São Paulo e a imagem de presente, mas que esperava que o ato ção. E, nos primeiros anos de 1964, lá belga e quis ficar com ela. Nossa Senhora. religioso não se tornasse um ato po- estava ele, sempre disposto a acolher A celebração tinha que ter a cara de Regina Machado, arquiteta lítico-partidário. Confesso que não os trabalhadores, abrir todas as igrejas compreendi de imediato as palavras para acolher os perseguidos pela polí- do Cardeal Arns, somente mais tarde, cia ditatorial. Lembro essas pequenas pude entender o zelo do Pastor para coisas porque elas são as amostras, no que a mensagem do Evangelho não dia a dia, de uma grande inteligência fosse reduzida ao discurso de um par- e de um grande coração a serviço de tido político, qualquer que fosse esse Deus, da Igreja e do povo. partido. Frei Carlos Josaphat ‘mataram Um oPerário! ria. Com a Catedral e a praça lotadas, vamos toDos à sé’ Dom Paulo concelebrou com os bis- Era 31 de outubro de 1979, deslo- pos auxiliares e muitos padres a Eu- quei-me de um ponto da imensa pe- caristia de corpo presente. “Não está riferia de São Paulo, o Parque São Ra- certo matar assim um operário que fael, e de ônibus coletivo dirigia-me à lutava para dar pão aos filhos”, disse Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, ele, com voz firme. Porém, não deixou na Água Rasa, buscando ajuda para de animar a esperança: “Que Deus nos multiplicar uma folha de cânticos li- conserve a fé no sentido da vida e da túrgicos. Mas, no caminho, a lotação continuidade dela em favor de todos!” se foi fazendo diferente, multiplicada, Quinze anos depois, Dom Paulo Dom Paulo, ladeado com uma denúncia que crescia em recebeu-me amavelmente quando so- por ana Dias, viúva do uníssono: “Mataram um operário! licitei dele uma entrevista, objetivan- operário santo Dias Vamos todos à praça da Sé”. Mudei do pesquisar e escrever a respeito da arquivo pessoal/Dom Paulo evaristo meu rumo e acompanhei o povo de Operação Periferia. Um enorme inte- Deus de São Paulo. resse pela classe operária se fez notar ‘seNHor, eU muita idade, se for de vossa vontade Vivi uma das experiências de Igre- quando foi morto o operário Manoel Não teNHo Pressa’ me chamar, estou às ordens, Senhor’” ja que marcaram definitivamente a Fiel Filho, disse ele. E depois, a morte Eu tive a graça de conhecê-lo, de – e todo mundo repetiu – “mas, Se- minha vida. A praça da Sé acolheu heroica de Santo Dias ocasionou uma conviver com ele, de passear junto nhor” – continuou Dom Paulo – “eu o corpo do operário martirizado na espécie de aliança da Igreja de São com ele. E há histórias bonitas que eu não tenho pressa” – e todos caíram véspera, Santo Dias da Silva, um lei- Paulo com o mundo operário. vivi com Dom Paulo. Uma das mais na gargalhada: simplicidade de Dom go atuante e líder da Pastoral Operá- Maria Cecilia Domezi bonitas, eu me lembro, dele falando Paulo, falando como um pastor que na Igreja de Santana para os vovôs ama as crianças, os adultos, os adoles- e vovós que ali estavam, e dizia: “Eu centes e os idosos. olHa qUem CHegoU risto Arns, arcebispo metropolitano quero ensinar para vocês uma oração, Padre Cido Pereira, ex-diretor do O SÃO PAULO Para o Natal de São Paulo, escolhera, dentre tantos repitam comigo: ‘Senhor, eu já tenho Corria o ano de 1968. Noite de 24 lugares, celebrar conosco, ali naquela de dezembro. Havia uma movimenta- pequena igrejinha. Na época, eu conta- ção incomum na pequena e humilde va os meus 13 anos de idade e fui um, mesmo Com a rePressão, fesa dos perseguidos naquele tempo. capela de tábuas, que naquela época juntamente com minha saudosa mãe, a CeleBroU-se a viDa Lembro-me como se fosse hoje, na tinha na parede do seu altar o Crucifi- se juntar àquela multidão que encheu Eu era morador do bairro das missa de morte de Vladimir Herzog. cado sob um fundo pintado com cores e transbordou por todos os lados do Perdizes, na zona Oeste de São Pau- A Catedral estava tão lotada, ficaram fortes. Mas, aquela celebração reser- pequeno templo, como que a abraçar lo, e tivera uma formação religiosa pessoas do lado de fora, nas escada- vava algo especial. A então pequena aquele minúsculo oratório, de onde se na Igreja de São Domingos, da rua rias da entrada. Trinta metros distan- capela de madeira consagrada como ouviam as belas palavras e doces sorri- Caiuby. Aprendi com os dominicanos te, estava perfilada a tropa de repres- São Gabriel da Virgem Dolorosa, loca- sos do generoso Pastor que nos visita- que a fé andava sempre junto com a são militar. Mesmo assim, se celebrou lizada no Jardim Ipê, em Osasco (SP), va. Passados tantos anos, nunca se per- vida do povo. Nesse contexto de pres- a vida e a esperança. Ali estava Dom com capacidade para não mais do que deu de minha lembrança aquela noite, sões e prisões, é que emergiu Dom Paulo, expondo-se diante das tropas e cem pessoas, naquela noite venturosa aquela “Missa do Galo”, como se dizia. Paulo Evaristo Arns. Hoje sequer se dos generais. achava-se em festa: Dom Paulo Eva- José Paulo de Campos, da Chácara Mafalda faz ideia do risco de se assumir a de- João Paulo Naves Fernandes, poeta e sociólogo 50 anos de Episcopado | DOM PAULO | | 9 ‘Uma torre qUe nosso contato com a Paróquia Santa iNsPiração aCaDêmiCa Humanos promovida pelo Cardeal BrilHa até Na eUroPa’ Cristina, no Parque Bristol, e com a Em 1984, ingressei no curso de Ci- Dom Paulo Evaristo Arns. A mono- Dom Paulo é uma pessoa da espe- Pastoral da Moradia na Região Ipi- ências Sociais da PUC-SP, onde pude grafia foi apresentada com o título: rança, um combatente para proclamar ranga, em São Paulo. Essa convivên- conhecer o trabalho de Dom Paulo “‘Que Todos Sejam Um’: Ecumenis- a mensagem libertadora do Evange- cia permanece desde 1985. São mais Evaristo Arns. Ele apresentou-me um mo e Diálogo Inter-Religioso na Ação lho de Jesus, uma torre que brilha até de 30 anos de amizade e solidariedade “antropocristianismo” sintetizado, de Pastoral do Cardeal Arcebispo de São na Europa com sua pastoral perto do recíprocas. Pessoalmente, agradeço forma inesquecível, nas palavras do Paulo, Dom Paulo Evaristo Arns”. povo, especialmente perto das pessoas por essa perspectiva de uma pastoral Monsenhor Arnaldo Beltrami, “de- Quinze anos mais tarde, o texto, revi- à margem do povo. Suas visitas depois sem fronteiras geográficas, perto do pois que Deus se fez homem, o ca- sado, ampliado e atualizado, foi publi- das diferentes etapas do Concílio Va- povo e muito, muito perto das pesso- minho para Deus é o homem”. Dom cado pela editora Plêiade com o título ticano II na Alemanha, em Münster, as carentes, das pessoas que são um Paulo inspirou-me a escrever uma “‘Diálogo dos Deuses, Direitos dos com amigos do Freckenhorster Kreis presente de Deus no nosso caminho monografia para conclusão do mes- Homens’: Direitos Humanos e Diá- são inesquecíveis e motivaram muitas pastoral e pessoal. trado em Ciências da Religião na PU- logo Inter-Religioso na Ação Pastoral pessoas a entrar num compromisso Padre Bernward, da Comunidade C-SP, a respeito da ação ecumênica e de Dom Paulo Evaristo Arns”. pastoral. As visitas proporcionaram São Bonifácio, em Dortmund, na Alemanha inter-religiosa em prol dos Direitos Jorge Miklos o CarDeal e o rePórter nicômio de Franco da Rocha (SP), o Conheci Dom Paulo em 1976, há lavrador Aparecido Galdino. Graças à exatos 40 anos, quando, como repór- ação da Comissão Justiça e Paz, presi- ter da Folha de S.Paulo, fui designa- dida pelo advogado Mario Simas, Gal- do para a cobertura das atividades da dino conseguiu sair daquele inferno. Igreja Católica – leia-se cardeal arce- Demitido do jornal por conta da bispo de São Paulo. Repórter é como greve de 1979, Dom Paulo, sabendo goleiro, tem que ter sorte, e posso ga- disso, me chamou para perguntar se eu rantir que tirei a sorte grande, porque gostaria de ir atrás das duas primeiras passei a ter acesso a um sem número crianças do Cone Sul que, sequestradas, de notícias e informações que tinham haviam sido localizadas pelo “Clamor”, a ver diretamente com a resistência à movimento ligado à Cúria. Dito e feito. ditadura militar. Eu e outras pessoas fomos ao Uruguai, Em 1978, por exemplo, publiquei ao Chile e meses depois Dom Paulo uma série de reportagens denuncian- anunciava ao mundo a localização dos do a existência de um preso político irmãos Vitória e Anatole. – o único que se tem notícia – no Ma- Ricardo Carvalho, jornalista a simplicidade goooool, olímPiCo! um chute e ele fez, sem querer, um gol de quem ‘se fez como criança’ Conheço Dom Paulo há muitos olímpico, e ficou popularíssimo por anos, desde adolescente. Uma vez, eu causa disso. arquivo pessoal/Dom Paulo evaristo fui acompanhá-lo num programa de Ele contou essa história na TV o BisPo ‘era De Casa’ tar ou fazer uma visita na casa dele. televisão que existe até hoje chamado Cultura, mas na hora que ele ter- Sou de uma família de sete ir- Assim, Dom Paulo conviveu muito “Roda Viva” e depois do programa, minou de contar esse fato tão inte- mãos. O mais novo foi médico e o com a gente e temos um carinho, um os organizadores da TV Cultura pe- ressante e de forma tão agradável, mais velho também era médico. Nós amor muito grande por ele. Infeliz- diram que Dom Paulo fizesse uma descobriram que a câmera não tinha morávamos em Santana e frequentá- mente, meu irmão e meu pai já são pequena mensagem sobre saúde e gravado essa história dele, então, pe- vamos a igreja da região. Meu irmão falecidos, mas Dom Paulo considera- amizade. Ele contou uma história di- diram pra ele recontar porque era mais velho era muito religioso e Dom va meu irmão como um irmão dele. E zendo que quando foi professor, era uma fala espontânea. Aí, ele já não Paulo ia se tratar com ele. Meu Pai a gente o considera como uma pessoa meio intelectualizado e achava que contou a mesma história; a primeira também era muito amigo de Dom santa entre nós. precisava aprofundar o contato com que era tão bonita, tão interessante, Paulo e a cada 15 ou 20 dias, ia jan- Padre Gregório Lutz, redentorista os alunos. Um dia, os alunos o convi- ficou escondida e agora eu a revelo daram pra jogar futebol. Ele disse que pra vocês. jogava muito mal, mas puseram Dom Padre Tarcisio Mesquita, coordenador ‘a seNHora é miNHa Com as CriaNças Paulo pra marcar um escanteio dando de pastoral da Arquidiocese de São Paulo CostUreira’ e o CarDeal martiNi Dom Paulo vivia aqui no Jaçanã. No início da Pastoral do Menor, Ele rezava a missa no asilo aqui perto. fomos incentivados por Dom Luciano ‘lUtar Pela saúDe é gaba. Foi um sucesso. Muitos vieram Eu morava na mesma rua que ele e, Mendes a trabalhar na periferia. Assim CamiNHo Do evaNgelHo’ disputar o exemplar que, a muito quando já estava tudo arrumado para nasceu, em 1980, a Comunidade Nossa “Prezado amigo Dr. Márcio, pre- custo, conseguiu voltar comigo... A se mudar, ele falou assim para mim: Senhora da Esperança, a partir e com ciso lhe contar: seu oportuno pre- propósito: você teria mais alguns, “A senhora é minha costureira”. Uma as crianças. Dom Paulo foi muitas vezes sente de ‘Remédios Caseiros - Me- que pudesse me ceder? Parabéns! vez, ele mandava uma túnica, outra nessa comunidade, celebrando e tra- dicina Popular’ chegou em tão boa Lutar pela saúde do povo é trilhar vez, ele mandava uma calça, outra zendo visitas como o Cardeal Martini, hora, que o utilizei largamente como o caminho do Evangelho de Cristo. vez, me mandava um pijama. primaz de Milão, na Itália. ilustração, em palestra feita ontem à Que Deus o abençoe”. Valdevina Sartori Antoni, Marilda, Lurdinha e Terezinha, consagradas noite sobre o tema “Saúde para to- Bilhete de Dom Paulo direcionado ao Dr. Márcio, no evangelizadora da rádio 9 de Julho a serviço da Arquidiocese de São Paulo dos”, para o povo de Pindamonhan- dia 19 de agosto de 1981, na cidade de São Paulo 50 10 | | DOM PAULO | anos de Episcopado Um ilUstre visitaNte Dom Paulo foi à Alemanha. Já aqui Na ParaíBa no Brasil, por meu intermédio, ele Em 1989, meu tio Norbert com- combinou que alguém dos meus pa- pletou 89 anos de vida. Como eu o rentes o buscasse de carro. E assim sou, ele também era alemão. Quan- se fez. do, pouco depois dessa festa, ele No entanto, não somente o meu me contou que ganhou de presente tio Norbert e sua irmã, minha mãe, tantas caixas de charutos, que prova- em cuja casa ele pernoitou, mas velmente até o fim da sua vida não muitos outros parentes, amigos poderia fumar todos estes charutos, da minha família, também os pa- “Óh” – eu disse – “então me dá uma dres do lugar e da redondeza e as caixa, para levá-la a Dom Paulo; ele autoridades do município vieram também gosta de fumar de vez em cumprimentar o visitante ilustre. quando um charuto”. E o tio me deu Inesquecível ficou essa visita não uma caixa. somente para Dom Paulo, que se Com um sorriso, Dom Paulo lembra dela cada vez que eu o en- aceitou esse presente. E disse que contro, mas igualmente às pessoas na próxima viagem à Alemanha, na minha terra, que nunca nem Dom Paulo com os ele iria agradecer pessoalmente. No teriam sonhado de uma visita tão bispos auxiliares da arquidiocese de sP ano seguinte, por ocasião do gran- honrosa para eles. de encontro dos alemães católicos, Álvaro T. Rodrigues, de João Pessoa (PB) arquivo pessoal/Dom Paulo evaristo ‘CaDa Dia qUe Passa, gou grande parte do resultado da ele fiCa mais Belo’ venda para a construção de centros ‘mariNHeiros seguia o Pastor era o gradativo Dom Paulo, apóstolo ardoroso comunitários na periferia de São De Primeira viagem’ envolvimento do laicato na reno- de Jesus! Sempre me impressionou Paulo. Homem da Pastoral Operá- Os quatro primeiros anos de mi- vação conciliar que se iniciava em sua vida de oração, sua paixão por ria, dos direitos humanos, da Litur- nistério episcopal de Dom Paulo, todo o mundo católico. Convocou Jesus, pela Igreja e pelo povo. Tra- gia, da Catequese. E olhe, quando ele os viveu como bispo auxiliar na uma equipe missionária de leigos balhei 23 anos com Dom Paulo, na- eu conheci Dom Paulo Evaristo, ele Região Episcopal Norte [que depois e leigas que incluía casais, profes- quilo que chamávamos de colégio gostava de cachimbo, gostava de fu- se tornaria a Região Episcopal San- soras aposentadas, outros profis- episcopal de São Paulo. Homem do mar. Foi um pastor totalmente de- tana]. Quando assumiu a Região, sionais, membros da antiga Ação Vaticano II, ele fez a missão de re- dicado à evangelização. Dom Paulo encontrou três setores funcionando: Católica e alguns jovens. Para essa novar a Arquidiocese de São Paulo, faz 50 anos e, cada dia que passa, ele Santana, Tucuruvi e Limão. Tendo equipe, organizou um treinamento na comunhão e participação. As- fica mais belo! tomado posse no dia 2 de agosto em dinâmica de grupo. Dom Pau- sembleias memoráveis, pastorais. Dom Angélico Sândalo Bernardino, bispo emérito de 1966, reuniu pela primeira vez o lo em pessoa se fez aluno como Vendeu o palácio episcopal e entre- de Blumenal (SC), foi bispo auxiliar da Arquidiocese clero da Região. Com as reuniões do qualquer outro dos participantes. clero se sucedendo regularmente, já Nós todos, na qualidade de “ma- em janeiro de 1967, ficaram defini- rinheiros de primeira viagem”, nos ‘ele aJUDava a geNte, tos momentos marcantes. Claro que dos, após novo desenho, cinco seto- espantávamos com a simplicidade, aPesar Das DifiCUlDaDes’ quem estava fora do dia a dia dele vai res para a Região: Santana, Tremem- humildade e disponibilidade de Eu acho que Dom Paulo foi um sempre lembrar da postura diante bé, Tucuruvi, Limão e Vila Maria. Dom Paulo! homem que compreendia a moder- da ditadura, mas nós que estávamos Mas o objetivo que mais per- Paulo de Abreu Leme nidade, os passos que a modernida- sempre lá não conseguimos enu- de já tinha dado e que fez de tudo merar tudo. A cada dia, Dom Pau- pra colocar a Igreja nesses mesmos lo tinha muito respeito e ao mesmo ‘UNiversitários, Vão para a periferia!”. Obedientes a passos. Sofreu incompreensão, per- tempo ajudava a gente a ir adiante, vão Para a Periferia!’ esse pedido/ordem, procuramos ir seguição, mas é um homem de es- apesar das dificuldades. O amor ao Meu primeiro encontro com Dom às periferias e aprendermos a prati- perança tão firme, que sempre ca- povo, o querer estar junto do povo, Paulo foi quando ele visitava nossa car uma palavra nova criada para a minhou, sempre foi o sustentáculo era mais nítido em Dom Paulo. Paróquia – São José do Mandaqui, na ocasião “condivisão”. Criamos, nas daqueles que com ele trabalhavam. Dom Antonio Celso Queiroz, bispo emérito de zona Norte de São Paulo. Eu partici- CUBs, uma “Semana na Periferia”, Com Dom Paulo, a gente tinha mui- Catanduva (SP), foi bispo auxiliar da Arquidiocese pava do Movimento de Jovens e ele na qual os universitários, durante as nos falou de “futurição”, dizendo-nos férias, viviam uma semana nas co- que o futuro da Igreja dependia em munidades eclesiais de base. Como e ele CHoroU... De emoção vivi em São Paulo, tinha visto uma grande parte dos jovens. Ao sermos iniciativa propriamente escolar, sur- Fui ordenado sacerdote por Dom cena como aquela. Dom Paulo muito apresentados, Dom Paulo me per- giram os Centros Educacionais Co- Paulo dia 24 de junho de 1977 e gos- agradecido ao povo pela homenagem guntou: “Você sabe plantar bananei- munitários. Seu programa de rádio, taria de deixar esse testemunho em prestada a ele, no fim da missa, emo- ra? Por que um presidente de grupo ele o abria com a expressão: “Aos relação a Dom Paulo. Quando ele cionado, ele chorou. Ficou marcada de jovens hoje em dia precisa saber cristãos, católicos, homens que bus- deixou de ser arcebispo de São Paulo, na minha vida essa cena porque, en- plantar bananeira!”, disse. cam a Deus...”, ou seja, ao mais am- uma das paróquias que visitou foi a tre tantas coisas, eu sempre admirei Quando ele visitou a Pastoral plo leque de pessoas humanas. De que eu era pároco, a Santo Antônio em Dom Paulo sua sensibilidade e Universitária, denominada Co- fato, minha experiência com Dom do Bairro do Limão. No fim da mis- o carinho pela Arquidiocese de São munidades Universitárias de Base Paulo foi a de que a proposta cristã é sa, eu tive a experiência de ver Dom Paulo. (CUBs), do Movimento Comunhão uma boa notícia para todo homem e Paulo chorando. Nunca na minha Dom Antônio Carlos Rossi Keller, e Libertação, na homilia, nos disse: para o homem todo. vida como padre, em todos anos que bispo da Diocese de Frederico Westphalen (RS) “Falo como um pai, falo como bispo: Jair Militão da Silva

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Higienópolis, 890 - Higienópolis - 01238-000 • São Paulo - SP - Brasil • Fones: (11) 3660-3700 e 3760-3723 - Telefax: (11) . O livro do Apocalipse.
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