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Boletim da Sociedade das Ciências Antigas PDF

32 Pages·2011·0.86 MB·Portuguese
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Boletim da Sociedade das Ciências Antigas Publicação da Sociedade das Ciências Antigas — Todos os Direitos Reservados Volume 1I, edição XIV Junho de 2011 Nesta edição: Santo Inácio de Loyola - Sua Vida e Obra I ñigo Lopes de Loyola, o futuro rado pelo rei por causa de uma des- Santo Inácio, nasceu em 1491. tas brigas e obrigado a destruir a Santo Inácio de Não se sabe o dia nem o mês; presu- parte superior da casa-castelo. Mais Loyola - Sua 1 Vida e Obra me-se, porém, que tenha sido por tarde, depois de perdoado pelo so- volta de 1º de junho, festa de Santo berano, permitiram-lhe reconstruir o Iñigo, Abade de Oña (Burgos) pelo andar superior com tijolos. fato de o terem batizado com esse Breve História do Martinismo 17 nome. Nesta casa-fortaleza nasceu Iñigo. Os tempos eram mais calmos, não, Moderno Iñigo era filho de porém, sem algu- Beltrán Ibánez de mas querelas, que Oñaz e de Marina levam séculos para Sánches de Licona, desaparecer, sobre- A Humildade 26 da linhagem Oñaz- tudo num vale pe- Loyola, família no- queno e fechado bre de Guipúzcoa como o que forma ou da “Província”, o rio Urola, em cu- Contos como se chamou jas margens se as- 29 Espirituais este território até o sentam as aldeias de século passado. Os Azpeitia e Azcoitia. Loyolas viviam nu- A meio caminho ma casa-castelo que entre ambas ergue- era residência e fortaleza ao mesmo se o solar natal de Iñigo. tempo, construída em pedra, como tantas outras do país basco. Por volta dos seis anos, o menino perdeu a mãe. Seu pai, que morreu O duplo aspecto de lar e castelo se quando ele tinha dezesseis anos, ab- explica pelas frequentes guerras que dicou de todos os seus bens e títu- enfrentaram as principais famílias los, ainda em vida, em favor do filho bascas entre si e, logo depois, com a Martín, que passou a ser senhor de Irmandade das Vilas, formada pelas Oñaz e Loyola. Martín não era o pri- cidades que iam nascendo no fim do mogênito e sim Juan que, nesta altu- feudalismo. ra, já tinha morrido na guerra mila- nesa. Os Loyolas tinham sido sempre bem belicosos e até mesmo ferozes nes- O pai de Inácio, seu irmão Martín e a ses litígios. O avô de Iñigo foi dester- esposa deste, Madalena de Araoz, Página 2 Boletim da Sociedade das Ciências Antigas foram os que cuidaram da educação de Iná- cio, que desde cedo deve ter entendido que, Não se sabe qual foi o delito que Iñigo e seu sendo o último de uma família tão prolífica, ia irmão Pedro cometeram, num dia de carna- ter de construir o seu próprio futuro. Assim val; deve ter sido suficientemente grave para o entenderam também seus outros irmãos fazê-lo fugir e recorrer à sua condição cleri- que foram fazer fortuna na milícia (como Bel- cal, a fim de escapar da acusação. trán e Ochoa) ou na América (como Her- mando) ou na Igreja (como Pedro, que era A impressão que deixam estas primeiras no- sacerdote). tícias de sua vida é que Iñigo era um rapaz um tanto aloucado, com inclinação para bri- A infância de Iñigo foi a de um menino da gas e certamente muito cônscio dos privilé- nobreza, talvez um tanto mimado por sua gios que lhe vinham do seu nascimento e da condição de caçula e por ser órfão de mãe. A sua condição de fidalgo. educação religiosa que recebeu foi mais “piedosa” que sólida. O oratório familiar da O Jovem Cavaleiro casa-castelo era dominado por um entalhe flamengo representando a Anunciação, pre- Com quinze ou dezesseis anos, Iñigo foi sente feito por Isabel, a Católica, a Madalena, completar sua educação em Arévalo (hoje na esposa do seu irmão Martín. Dizia-se ser um Província de Ávila), na casa de Don Juan Ve- quadro milagroso. lásquez, Contador-Mor do reino de Castela. Como era amigo do pai de Iñigo, ofereceu-se para acolher, como mais um filho seu, o ca- çula dos Loyolas. O adolescente deve ter se sentido ali como em sua própria casa, rodeado dos filhos de Velásquez, alguns dos quais teriam mais ou menos a mesma idade que ele. Com eles vive em “grande estilo”. No palácio de Velásquez, veio a conhecer os reis e a corte, desfrutando de todos os privi- légios de alta aristocracia da época e dedican- Inácio entrega sua espada, para se do-se à “boa vida”: caçadas, justas, torneios, saraus, bailes, jogos de azar (baralho e dados) tornar um soldado do Cristo e aventuras galantes. Anos mais tarde, já con- vertido em Inácio de Loyola, confessaria que Iñigo recebeu a tonsura sendo ainda quase era “dado a vaidades mundanas” e que, na- adolescente, tornando-se, então, clérigo de “Ordens Menores”. Destarte, poderia rece- quela fase, cometeu “aventuras de mancebo”. ber um benefício eclesiástico, de caráter eco- nômico, vinculado a esta condição e título. Gostava muito de música e de baile, tinha Vê-se, entretanto, pelo processo aberto con- mão muito boa para a caligrafia e deve ter tra ele em Pamplona, que seu comportamen- lido um bom número de romances de cavala- to deixava muito a desejar. Das atas desse ria, os “best-sellers” daquele tempo. Foram processo se deduz que seus costumes, seu dez anos de alegria juvenil, sem pensar muito modo de divertir-se e seu penteado estavam no futuro. longe de ser os de um “homem de Igreja”. Volume 1I, edição XIV Página 3 Prova disto é o fato de que a desgraça repen- varra, o vice-rei reuniu tropas para defender tina que se abateu sobre os Velásquez pegou o território. Entre outros muitos convoca- desprevenidos tanto estes últimos como o dos, encontravam-se Iñigo e seu irmão Mar- próprio Iñigo. A morte de Fernando, o Cató- tín, senhor de Loyola. lico, foi a ruína daquela família. As primeiras medidas tomadas por Carlos I contrariaram Na época destes acontecimentos, Iñigo esta- Don Juan Velásquez que viu, nessas decisões, va com trinta anos. Não se casara nem tinha um prejuízo para o patrimônio real. Por isso patrimônio, além do seu valor pessoal. Sem a ele chegou a usar até a oposição das armas. inconsciência dos anos moços, continuava Derrotado e sobrecarregado por dívidas, aspirando a um lugar de honra na sociedade morreu em 1517. do seu tempo. Iñigo viu-se, então, sem protetor. Não tinha A Perna Quebrada nada. A viúva de Don Velásquez deu-lhe uma certa soma de dinheiro e cartas de recomen- Inácio tinha uma tia freira que, ao saber das dação para o duque de Nájera. correrias e encrencas em que se metia o so- brinho, profetizou-lhe: “Enquanto não que- Don Antonio Manrique de Lara era um no- brares uma perna não mudas de vida, pondo bre em ascensão. O duque apostara no futu- a cabeça no lugar”. Mal sabia a boa religiosa ro imperador e era vice-rei de Navarra. Iñigo que a profecia se havia de cumprir. Iñigo foi tornou-se homem de sua confiança, acompa- ferido por um obus no cerco de Pamplona e nhando-o em vários de seus empreendimen- este foi o princípio da mudança fundamental tos e em visitas à corte. É possível que, en- tão, sua atenção se fixasse na princesa Cata- de sua vida. rina de Áustria; os biógrafos do Santo pen- As tropas francesas e navarras que desejavam sam que ele faz alusão a ela quando diz, anos devolver o trono a Henrique de Labrit já es- mais tarde, que tinha os olhos postos numa tavam às portas da cidade, antes mesmo que dama que era mais que condessa ou duquesa. os partidários de Carlos I tivessem podido reunir forças suficientes para enfrentá-lo. A A serviço do duque de Nájera, lutou contra população entregou-se sem resistência, mas os inimigos de Carlos I. Foi assim que esteve os homens do duque de Nájera, Iñigo entre no assédio e conquista da própria cidade de eles, fecharam-se dentro das muralhas da for- Nájera, que se rebelara contra o rei, mas não quis participar do saque e pilhagem que se taleza. seguiram. O próprio duque o encarregou de A maioria dos sitiados, incluindo o alcaide, ao “acalmar” as aldeias Guipuzcoanas que tam- ver a desproporção da forças, estavam incli- bém se tinham sublevado. Deu mostras de nados a se renderem sem lutar. Era simples ser bom diplomata, pois sua missão teve bom suicídio fazer frente a um exército muito su- êxito. perior em número e mais bem provido de artilharias. Iñigo, porém, não estava de acor- Iñigo não era o que hoje chamamos de um do com essa postura, que lhe parecia deson- militar, isto é, um soldado profissional. Era rosa. Convenceu, pois, seus homens a não um nobre, um cavaleiro e, como tal, muito capitular. hábil no manejo das armas. Os canhões começaram a bombardear a for- A guerra, naquela época, tinha uma organiza- taleza em 20 de maio de 1521. Foi nesse ata- ção bem diversa das atuais. Assim, quando o que de artilharia que uma bala de canhão rei da França decidiu apoiar o exilado Henri- atingiu Iñigo, quebrando-lhe uma perna e dei- que de Labrit, pretendente ao trono de Na- Página 4 Boletim da Sociedade das Ciências Antigas xando a outra muito ferida. Dia 24 de maio, a zar nada que salvasse seu nome do esqueci- fortaleza rendeu-se, depois de graves estra- mento! Alguns poderão ter pensado: “Bem gos e rombos nas muralhas e ao ver caído o feito! Ele não fez mais que divertir-se e gozar heróico defensor que jurara lutar até a mor- a vida. Na verdade, não se perde grande coi- te. sa!” Os inimigos reconheceram cavalheiresca- A Grande Transformação mente o valor do caçula dos Loyolas e se ocuparam da saúde desse adversário. Mas o A morte não o levou. Já fora de perigo. Iñigo estrago nas pernas fora grande; por isso, de- notou que a perna quebrada ficara mais curta pois dos primeiros cuidados médicos, acon- que a outra e com um caroço que sobressaia. selharam-lhe que voltasse à sua casa, onde Coxo para o resto da vida? Nem pensar! Co- haveria mais facilidades do que numa praça mo poderia montar a cavalo, realizar belas de guerra. façanhas? Como poderia cortejar a dama dos De Pamplona o levaram a Loyola numa padi- seus sonhos, sendo um ridículo manquitola? ola. Imagine-se o que terá sido uma viagem Para eliminar essa deformidade, Iñigo exigiu e dessas! Com os ossos quebrados e desloca- suportou uma segunda operação, não menos dos, cada passo ou movimento causavam ao dolorosa que a outra. Depois passou meses ferido dores insuportáveis. deitado com molestos curativos e tendo de suportar pesos e outros mecanismos para Foi dolorosa também sua chegada ao castelo. Iñigo regressava muito ferido, derrotado, ain- esticar a perna. da que mantendo intacta sua honra de cava- Que faz um doente para passar o tempo de leiro. Provavelmente seu irmão Martín não repouso forçado? Fazia todo tipo de planos terá deixado de lembrar-lhe que tinha sido para o futuro, como ele diz, pensando nas um “cabeça dura”, ao ficar em Pamplona em façanhas que realizaria a serviço da sua dama. vez de optar, como ele e o próprio duque de Sonhava com os meios que usaria para apro- Nájera, por uma retirada estratégica. ximar-se dela, as mesuras, as belas frases e O estado do enfermo piorou. Os médicos proezas guerreiras que lhe dedicaria. aconselharam uma operação para pôr os os- Mas Iñigo se entedia. Toda a fantasia do mun- sos no lugar, uma vez que estavam desloca- do não basta. Pede romances de cavalaria dos talvez por causa dos trancos da viagem para distrair-se; como não os houvesse no ou porque os médicos de Pamplona não ti- castelo, trazem-lhe “Vida de Cristo” de Lu- nham feito bom serviço. Anos mais tarde, Inácio qualificou essa operação de carnificina. dolfo de Saxonia e a “Vida dos Santos”). Entretanto, deu mostras de grande resistên- Começou a leitura de má vontade, para ma- cia, não proferiu um só grito, limitando-se a tar o tempo e descobriu, com surpresa, que apertar os punhos. estava gostando. Notou também que sentia paz e alegria ao fechar tais livros, ao contrá- A operação não deu resultado, e Iñigo se viu rio do que acontecia quando cultivava seus às portas da morte, chegando a receber os sonhos cavaleirescos e guerreiros, que o dei- últimos sacramentos. Pensavam todos ser o xavam triste e frustrado. Essa diferença de fim. A má estrela de alguns de seus irmãos mais velhos parecia pesar também sobre ele. humor o deixava perplexo. Morrer aos trinta anos! Como um fidalgo, Por outro lado, Iñigo tinha visto de perto a sim, valente, e até ambicioso, mas sem reali- foice da morte, o que o fez examinar sua vida Volume 1I, edição XIV Página 5 passada. É o que sempre acontece com do- ponta já uma terna devoção à pessoa de entes graves, quando têm tempo para pensar. Cristo e à de sua Mãe. O balanço não era positivo. Na perspectiva Os irmãos de Iñigo, Martín e Pedro, bem co- de Deus, ele era um pecador e um mau cris- mo sua cunhada Madalena, estão preocupa- tão. dos: já não o houvem falar de proezas, amo- res e glória e, às vezes, surpreendem-no cho- rando ou totalmente absorto. Quando lhe perguntam o que tem, responde com evasi- vas. Em princípios de 1522. Iñigo já está quase restabelecido e anuncia sua partida. Diz que vai a Navarrete encontrar-se com o duque de Nájera, para cobrar uma dívida. A família o vê sair com apreensão... Que estaria tra- mando o caçula dos Loyolas?... Visão de Inácio sobre o Cristo O velho homem, o capitão, o amigo dos jo- gadores e das mulheres está morrendo e Ao calor de tais sentimentos, suscitados por dando surgimento a um novo Homem, com aquelas leituras piedosas, põe-se a meditar: uma nova resolução: servir a Deus. “Que aconteceria se eu fizesse o que fez São Francisco... e São Domingos?...” Não lhe fal- O Homem do Saco tavam audácia nem coragem; isto era indiscu- tível! Destarte, fez promessa do que lhe pa- Cavalgando uma mula, com seu irmão Pedro recia mais difícil de realizar; ir a Jerusalém e dois criados, deixou Loyola a caminho do descalço, comer só verduras e submeter-se santuário mariano de Aránzazu. Lá, depois de às mesmas penitências feitas pelos santos, e agradecer pela cura, despediu-se de Pedro e até maiores. tomou o rumo de Navarrete (Rioja), como dissera a sua família. Com o dinheiro do sol- Seu raciocínio estava cheio de um espírito do recebido, pagou algumas dívidas penden- ingenuamente competitivo: “São Domingos tes; em seguida despediu os criados e, sozi- fez isto? Pois eu também farei!” Se um ho- mem foi capaz daquilo, por que não o seria nho, encaminhou-se para Monteserrat. ele? Também neste ponto queria estar entre Iñigo estava decidido a pôr em prática o pro- os primeiros. pósito concebido em Loyola. Havia três pe- regrinações que um cristão podia empreen- Passam os meses de verão e outono; chega o der: Santiago, Roma e Jerusalém: a última lhe inverno. Pouco a pouco seu coração se volta parecia não só a mais custosa, pela distância, para Deus. Começa o trabalho de anotar mas também a mais perigosa. A Terra Santa certas passagens dos livros que lia. Põe-se, estava nas mãos dos turcos infiéis; a situação então, a copiar episódios de vida de Cristo, política era tensa, com perigo de guerra a escrevendo as palavras de Jesus com tinta qualquer momento. Em tais circunstâncias, ir vermelha e com azul as de Maria. a Jerusalém era um risco certo. Copiar, imitar: o propósito que acalenta é Mas não iria como um nobre, protegido por assemelhar-se aos santos e, com isto, des- seu dinheiro e posição social, mas como um Página 6 Boletim da Sociedade das Ciências Antigas peregrino desconhecido. A partir desse mo- com grande austeridade, decidido a acabar mento, ele começa a ocultar sua identidade. com sua aparência de fidalgo disfarçado: des- Não quer privilégios no trato, deseja come- cuida seu asseio pessoal e castiga o corpo çar uma vida nova e, neste empenho, via um com severos jejuns. O resultado não tardou empecilho na sua linhagem. e os garotos de Manresa o batizaram logo de “o homem do saco”, por seu aspecto desas- Enquanto ia de Ribeira para Aragão, houve o trado. Mas não consegue ficar despercebido, incidente com o mouro que duvidava da vir- porque logo lhe criam outro apelido; “O Ho- gindade de Maria. Sua cavalgadura, mais sábia mem santo”. Começam a correr rumores que ele, livra-o de um lance mau. Antes de fantásticos sobre sua identidade, as riquezas chegar a Montserrat, (o Mont-Salvat das len- que deixou e os pecados que o levaram a das do Graal), em cuja pendente e a uma alti- tanta penitência... tude de 720 m encontra-se a abadia benediti- na fundada em 1030, comprou pano de saco Também não consegue fazer de Manreza para fazer uma roupa de peregrino, bem tos- apenas um lugar de passagem, porque seu ca e áspera, munindo-se também de um bor- espírito começa a ser assaltado por senti- dão e uma cabaça. mentos contraditórios, o que o leva a dedi- car longas horas à oração e à leitura espiritu- Chegou aos pés da Virgem (la “Moreneta”) al: além disso castiga seu corpo com instru- por volta de 20 de março. Aí levou três dias mentos de penitência. Mas nem assim encon- preparando uma confissão geral de toda a tra a paz, chegando a duvidar das suas forças vida, sob a hábil direção de um dos monges e da misericórdia de Deus: “Poderás aguen- Beneditinos da abadia. Nas vésperas da tar esta vida por muito tempo?... Será que Anunciação (24 de março de 1522), passou a Deus já te perdoou?... Um dia, quando a an- noite inteira na igreja: foi sua “vigília de ar- gústia e a perplexidade atingiram o auge, che- mas’, como cavaleiro de Deus. Ofereceu à gou a pensar no suicídio, atirando-se por Virgem a espada e o punhal, doou a mula ao uma janela. mosteiro e suas vestes a um mendigo. Numa das grutas, na qual costumava meditar De madrugada, às escondidas, metido no seu e orar, às margens do rio Cardoner, Inácio saco de penitente, parte a pé, dirigindo-se a experimentou em Setembro de 1522 a sua Manresa, a fim de evitar o encontro com mística Igreja Primitiva, como ele a chamava. pessoas conhecidas que estavam na comitiva do nomeado papa Adriano VI. Assim dá uma Parecia-lhe que ser santo era algo que depen- volta por Manresa. dia só da sua vontade e das suas forças. É aí que ele descobre: ninguém serve e agrada a Logo, porém, o alcançaram os guardas de Deus por sua própria conta, baseando-se Montserrat, com o mendigo que usava suas apenas em seus próprios planos e decisões. roupas; ele salva o coitado dizendo que não roubara nada, que fora ele que lhe dera as Seja o que Deus Quiser roupas. O incidente perturba Iñigo por ver que sua generosidade pusera o pobre em Foi tempestuosa aquela primeira temporada perigo e também por descobrir que, apesar em Manresa. Ele adquirira em Loyola o cos- de sua aparência, não pode ocultar sua ori- tume de anotar tudo quanto se passava em gem e condição. seu espírito; começou, então, a perceber, relendo suas notas, que as diversidades de Em Manresa aloja-se num albergue de mendi- estados de ânimo tinham um significado: gos, como mais um deles. Vive de esmolas Volume 1I, edição XIV Página 7 Deus estava lhe mostrando, por meio deles, ando às margens do rio Cardoner, teve uma a sua vontade. Havia até certos bons desejos grande iluminação interior. Tudo lhe pareceu que camuflavam suas resistências a uma con- novo e diferente, como se estivesse vendo versão sincera e profunda. Outras vezes até coisas pela primeira vez. os jejuns e penitências atrapalhavam sua ora- ção em vez de ajudá-la. Copiar, imitar... Em Loyola acreditava que nisto consistia a vida cristã: ser como os san- Iñigo estava fazendo, sem o saber, os seus tos, imitar Jesus. Agora descobre que cada “Exercícios Espirituais”. Mediante a oração e homem tem uma vocação concreta e particu- a contemplação dos Evangelhos, ia-se entusi- lar e que Deus no-la mostra de muitos mo- asmando com a pessoa de Jesus, assimilando dos. O cristão deve descobrir e realizar esta suas atitudes e conformando toda sua vida missão que Deus lhe confia. com a do Cristo. A experiência daqueles di- as, cuidadosamente anotada em um caderno, E qual era a sua?... Iñigo continua a pensar na será o germe dos seus “Exercícios”, um dos viagem a Jerusalém, já não tanto para cumprir livros que mais influíram na Igreja. Retifican- uma grande façanha, mas por tratar-se da do alguns pontos, acrescentará aqui, cortará terra de Jesus. Se vive pobre, livre de com- ali, mas, naquelas suas notas, já está o méto- promissos materiais, já não é por penitência, do inaciano para encontrar a vontade de mas porque Cristo viveu assim. E começa a Deus e entregar-se à Pessoa de Jesus Cristo. ajudar os outros, a cuidar dos doentes e ne- cessitados, inclusive em suas necessidades Um dia, enquanto lia “Horas de Nossa Se- espirituais... porque Jesus curou, pregou e nhora” em voz alta, nas escadarias da Abadia nos livrou de nossos pecados. de Montserrat sua compreensão elevou-se e ele percebeu o mistério da Santíssima Trin- O peregrino entrega-se a Deus, disposto a dade, como uma harmonia musical, na forma seguir suas inspirações a cada momento. Não de música de órgão. Esta experiência foi tão sabe aonde estas o levarão, mas enquanto tocante que o fez chorar. não estiver certo de que lhe pede outra coi- sa, irá a Jerusalém. Até sonha em morrer lá, Em outra ocasião, vivenciou uma onda de como Cristo, anunciando aos infiéis o Evan- grande alegria espiritual, quando compreen- gelho. Passou quase um ano em Manresa, deu a forma que Deus usou na criação do hospedando-se em diversas casas e passou Mundo. Viu algo brilhante de onde raios certo tempo no convento dos Dominicanos. brancos eram emitidos, viu que Deus estava Também se retirava a uma gruta para rezar e criando Luz. Mas ele não pode explicar o fe- fazer penitência. Neste local ergue-se hoje nômeno. uma igreja dos jesuítas. O mais importante, porém, é que começou, por meio de conver- Um dia os olhos interiores de Inácio, enquan- sas, a ajudar espiritualmente as pessoas que to participava de uma missa na Igreja do desejavam ouvi-lo. Mosteiro, viram o momento em que o corpo do Senhor (a hóstia) era levantado, o que Em Barcelona embarcou para a Itália, depois pareciam ser raios de luz, vindos de cima. de conseguir passagem gratuita num navio. O Isto foi interpretado por ele como sendo a capitão, porém, exigiu que ele levasse provi- presença de Cristo. são consigo. Isto causou certo escrúpulo em Iñigo, que preferia confiar-se cegamente às Em Manresa, diz Iñigo, Deus o tratou como mãos de Deus; mas um bom confessor lhe um professor trata seu aluno: ensinava-o a deu a solução: iria mendigar nas ruas o ali- servir-lhe como ele desejava. Um dia, passe- mento para a viagem. Página 8 Boletim da Sociedade das Ciências Antigas Em 16 de março de 1523, um ano depois de Em Janeiro de 1537, Inácio encontra de novo sair do seu castelo, fez-se ao mar, só e po- seus seis companheiros em Veneza. Enquan- bre. Ninguém reconheceria naquele peregri- to esperavam a partida do navio dos peregri- no de aspecto macilento o elegante e apru- nos para Jerusalém trabalharam no hospital mado fidaldo dos Loyolas. de Veneza. Em Julho de 1523 parte para Palestina, a bor- Em 24 de Junho de 1537 recebe a ordenação do de um navio veneziano. Lugar gratuito sacerdotal em Veneza. Em fins de Setembro conseguido através de Andrea Grittium. do mesmo ano teve de reconhecer que a de- sejada peregrinação à Terra Santa se tornara impossível, por causa da guerra entre Veneza A Nova Vida de Inácio e os Turcos. Por isso, determinou-se a ir a Roma, juntamente com Fabro e Lainez, para Depois das experiências de Manresa e Jeru- colocar-se à disposição do Papa. A fins de salém Inácio deu inicio aos estudos avança- Outubro de 1537, os peregrinos da Compa- dos que culminaram com o recebimento do nhia de Jesus entravam na cidade papal de título de Mestre pela Universidade de Paris Roma. em 1534. Um pouco antes de chegar em Roma, na ca- pela de la Storta, Santo Inácio estando em oração, teve uma visão da Santíssima Trinda- de e ouviu do Pai estas palavras: “Eu vos se- rei propício em Roma”, Santo Inácio ouviu ainda como o Pai dizia a Cristo: “Quero que tomes este ao teu serviço”. Em 1539 Inácio e seus seguidores decidem formar uma nova Ordem. O Papa aprova o plano, resultando no estabelecimento da “Companhia de Jesus” (os jesuítas). Desde Fevereiro de 1541, a nova Ordem vi- veu numa casa ao lado da Igreja de Santa Ma- Em 1539 Inácio e seus seguidores ria degli Astalli. Em 1544, nesse mesmo lugar, decidem formar uma nova Ordem. O Pa- foi construída a antiga casa professa, na qual pa aprova o plano, resultando no estabe- Santo Inácio recebeu três pequenos quartos. lecimento da “Companhia de Jesus” Manteve o posto de geral dos jesuítas até No dia 15 de Agosto de 1534, Santo Inácio e 1552. Serviu durante o tempo em que houve seis companheiros (Pedro Fabro, Francisco uma grande expansão mundial da Companhia. Xavier, Afonso Salmerón, Diogo Lainez, Ni- Foi nesse período que completou a Consti- colau Bobadilla e Simão Rodrigues) fizeram tuição da Ordem. na Igrejinha dos Mártires de Montmartre, os votos de “pobreza, castidade e obediência”. Inácio morreu em 31 de julho de 1556 e em Pedro Fabro o único sacerdote do grupo ce- 1622 a Igreja Católica o declarou Santo. lebrou a Eucaristia, durante a qual foram emi- tidos os votos. Volume 1I, edição XIV Página 9 mensageiro, aos 16 anos, na corte de Don O Caminho dos Exercícios Juan Velasques, seu parente. Neste trabalho Espirituais - A Vida e o Método se dedicou ao jogo e à luta enquanto seguia os costumes da corte e romances. Espiritual de Inácio de Loyola  Inácio se apaixona por Dona Caterina, uma dama da família real, filha de Phillipe o Justo. Ingressando no Exército  Em 1517 Inácio ingressava no Exército.  Em maio de 1521 sofre um ferimento na perna enquanto lutava em Pamplona contra as tropas francesas. Lá mesmo foi cuidado por médicos franceses. Retorna então a Lo- yola para se recuperar. Curso Organizacional de Inácio  Em 24 de junho, seu estado de saúde era tal que chegou a receber os sacramentos. Contudo a partir de 28 de junho começou a  A vida de Inácio de Loyola. melhorar.  Consolação e Desolação Espiritual.  Durante este período crítico, Inácio pedia  O Treinamento da Vontade. Sistema e Or- material de leitura, romances e aventuras dem da Prática Espiritual. cavalheirescas, dois gêneros populares e co-  A técnica de tomada de decisão. muns naquela época.  As regras para o Discernimento dos Espíri- tos. O Despertar Espiritual de Inácio  Os Exercícios Espirituais: formato e reque- rimentos.  Primeira Semana: Meditações sobre o peca-  Os livros que recebeu da biblioteca do cas- telo (“Vida de Cristo” de Ludolfo of Saxonia do e o Inferno. e “Vida dos Santos”) tiveram grande influên-  Segunda Semana: Vida de Jesus.  Terceira Semana: Meditação sobre a Pai- cia sobre ele.  Inácio compreende que a vida que levava xão.  Quarta Semana: Ressurreição no Amor Di- até então, não refletia a nobreza de espírito que seu coração ansiava. Lendo a vida dos vino. santos se sentiu tomado por uma espécie de  Esquema dos fundos submarinos. inspiração que queria refletir em sua própria  Meditações tradicionais de Inácio. vida.  Quando se encontra completamente resta- Vida de Inácio de Loyola belecido, uma chama diferente brilhava em seus olhos: o desejo de se tornar um sol-  Inácio nasceu (provavelmente antes de 23 dado de Cristo, de ir e batalhar por seu ver- de outubro de 1491) no castelo da família dadeiro Rei. Loyola.  A família pertencia à nobreza provincial do Aos 32 e sobre uma Mula país Basco. Dentro da família Loyola havia uma tradição de soldados e guerreiros.  O velho homem, o capitão, o amigo dos  O primeiro trabalho de Inácio foi como Página 10 Boletim da Sociedade das Ciências Antigas jogadores e das mulheres está morrendo e dando surgimento a um novo Homem, com A Nova Vida de Inácio uma nova resolução: servir a Deus.  Montado numa mula Inácio viaja para as  Depois das experiências de Manresa Inácio costas do mar mediterrâneo e chega a Mon- deu inicio aos estudos avançados que culmi- tserrat (o Mont-Salvat das lendas do Graal). naram com o recebimento do título de Mes-  Ele passa a noite de 24 de março de 1522 em Montserrat fazendo a vigília das Armas na tre pela Universidade de Paris em 1534.  Em 1539 Inácio e seus seguidores decidem capela de um abade Beneditino. Decide dedi- formar uma nova Ordem. O Papa aprova o car sua vida à Deus. Mas para onde ir agora plano, resultando no estabelecimento da que esta resolução foi tomada? “Companhia de Jesus” (os jesuítas).  Manteve o posto de geral dos jesuítas até Manresa 1552. Serviu durante o tempo em que houve uma grande expansão mundial da Companhia.  Inácio desce de Montserrat em direção à Foi nesse período que completou a Consti- uma pequena vila, chamada Manresa. É 25 de tuição da Ordem. Março de 1522.  Inácio morreu em 30 de julho de 1556. Em  Aqui ele experimenta a oração, meditação 1622 a Igreja Católica o declarou Santo. profunda e varias práticas ascetas.  Destas experiências resulta o sentimento Consolação e Desolação Espiritual Inaciano. Tais práticas serão posteriormente incorporadas aos “Exercícios Espirituais”.  A Consolação Espiritual:  é a experiência interna da presença de Experiências em Manresa Deus, experiência da visão de si mesmo, dos outros e de toda a realidade à Luz de Deus.  Um dia, enquanto lia “Horas de Nossa Se-  é a experiência interna de impulsos de nhora” em voz alta, nas escadarias da Abadia amor a Deus, que se dá totalmente a mim de Montserrat sua compreensão elevou-se e através de Cristo, na sua morte e ressurrei- ele percebeu o mistério da Santíssima Trin- ção; Deus que manifesta seu amor através de dade, como uma harmonia musical, na forma experiências positivas ou que me faz desco- de música de órgão. Esta experiência foi tão brir o positivo em experiências negativas. tocante que o fez chorar.  é todo aumento de fé, esperança e amor.  Em outra ocasião, vivenciou uma onda de  é toda alegria interna que nos atrai para as grande alegria espiritual, quando compreen- coisas de Deus, para o bem e para o amor. deu a forma que Deus usou na criação do  é toda tranqüilidade e paz sentidas em Mundo. Viu algo brilhante de onde raios Deus. brancos eram emitidos, viu que Deus estava criando Luz. Mas ele não pode explicar o fe-  A Desolação Espiritual: (é o oposto da nômeno. Consolação).  Um dia os olhos interiores de Inácio, en-  é a experiência interna da distância de quanto participava de uma missa na Igreja do Deus, é a perturbação do coração, impulso Mosteiro, viram o momento em que o corpo para a falta de confiança, à falta de esperança, do Senhor (a hóstia) era levantado, o que ao desamor. pareciam ser raios de luz, vindos de cima.  é toda tristeza interna que nos afasta das Isto foi interpretado por ele como sendo a coisas de Deus. presença de Cristo.

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escrevendo as palavras de Jesus com tinta vermelha e . asmando com a pessoa de Jesus, assimilando Martinista” e Robert Ambelain, Soberano Grão .
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