ziguezagueando pelo Islã Karla Lima ziguezagueando pelo Islã 1ª edição São Paulo Edição da Autora 2010 Copyright © 2010, 1ª edição Karla Lima Nesta edição respeitou-se o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa em vigor desde janeiro de 2009. Capa Pya Lima [Estúdio Um a Zero] Projeto gráfico Esper Leon [Nhambikwara Editoração] Impressão e acabamento Prol Editora Gráfica Para entrar em contato com a autora [email protected] Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Lima, Karla Ziguezagueando pelo Islã / Karla Lima. -- 1. ed. -- São Paulo : Ed. do Autor, 2010. ISBN 978-85-906488-1-9 Bibliografia. 1. Islamismo I. Título. 10-12850 CDD-297 Índices para catálogo sistemático: 1. Islamismo : Religião 297 Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem prévia autorização da autora. A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei 9.610/98 e punida pelo artigo 184 do Código Penal. Ao meu pai, que em 1986 me aconselhou a ser jornalista e morreu, 20 anos depois, sem ver a realização de seu sonho. De onde quer que esteja agora, espero que veja. E se orgulhe. Sumário 9 • Prefácio 15 • Nota da autora 17 • Introdução 27 • nascimento Ou de como o deserto deu à luz uma religião cujo profeta era analfabeto 63 • infância Ou de como uma recitação que durou 23 anos virou best seller 14 séculos depois 88 • adolescência Ou de como conciliar expansão e unidade, autonomia e submissão, hormônios e fé 118 • maioridade Ou de como se purificar pela caridade e zerar pecados cumprindo uma romaria 172 • morte Ou de como abater animais, entender xiitas e sunitas e merecer o paraíso 208 • renascimento Ou de como viver plenamente sem ter de morrer para ressuscitar 215 • Apêndices 219 • Agradecimentos 223 • Bibliografia e referências bibliográficas PREFÁCIO Ainda um foca, perguntei a uma velha amiga de minha mãe se havia muçulmanos na pequena cidade onde vivíamos, com pouco mais de 60 mil habitantes. A interlocutora, católica romana e de orgulhosa origem libanesa, assinava Rayes e, tomada de um súbito desconforto, respondeu aos sussurros: “Sim, eles estão também por aqui. Mas se escondem”. frente ao meu desassossego com a resposta imprecisa – procurava personagens para um ensaio fotográfico – a adorável professora foi mais enfática. “É melhor não falar sobre eles. Nem com eles”, censurou-me, na raiz. Naquele momento, as estatísticas já impressionavam – o islamismo era a religião que mais crescia no mundo – mas eram apenas números que não encontravam respaldo imediato na realidade visível. As mulheres de véu – decerto o signo mais emblemático da religião para os não muçulmanos – eram eté- reas e distantes imagens no noticiário e no cinema e a ameaça, circunscrita apenas aos longínquos territórios quase invisíveis do Médio Oriente. O espanto, no entanto, veio dez anos depois. Quem passa na superfície pela estação Edgware Road, uma das paradas na linha Bakerloo do metrô londrino, e, à direita, avança meia quadra, vê uma monótona sequência de inusitados estabelecimentos comer- ciais dirigidos aos árabes e descendentes que vivem na capital inglesa. Supermercados e açougues halal, bares e restaurantes onde se fuma o narguilé (mas não se bebe cerveja nem outro tipo de álcool), dezenas de mulheres de véu e outras, mais raras, com todo o corpo coberto pela burca. Em uma esquina, homens árabes vendiam MP3 players com o que, suponho, fossem tre- chos recitados do Alcorão em áudio. fechadas, as caixas verdes simulavam o livro. Abertas, guardavam o apetrecho sobre um PREfáCIO • 9 veludo vermelho aparentemente barato. No ar, ouvia-se árabe. Andei pela rua por algumas horas, absorvendo uma insólita sen- sação: a de ser estrangeiro duplamente. A 150 metros dali, em frente a outra entrada da estação Edgware Road, ramalhetes se empilhavam, os mais frescos sobre os mais velhos, já murchos. Uma semana antes, em 7 de julho de 2005, um atentado terrorista naquele lugar matou seis pessoas. Contabilizados os mortos na série de atentados daquela ocasião, somaram-se 52 vítimas fatais. Estacionado na esquina, levemente perplexo, nunca pude imaginar que a tensão entre fé e fanatismo, paz e conflito, tole- rância e ódio ganharia contornos tão banal e materialmente per- cebidos como numa rua de Londres. A maior das contradições: os ataques terroristas poderiam matar indistintamente, inclusive crentes na fé islâmica, principalmente naquele lugar. Sete dias depois, na quinta-feira seguinte, novas tentativas de ataque abala- ram a cidade (tanto quanto seja possível fazê-lo aos ingleses, tão folcloricamente fleumáticos). Mais uma vítima: o brasileiro Jean Charles de Menezes, confundido pela polícia com um terrorista e morto, a tiros, na estação Stockwell do metrô. Quem lia os jornais – bastava um alerta para que edições extras saíssem mornas das rotativas, a qualquer hora do dia – não encontrava respostas objetivas. As brigadas de Abu Hafs Al Masri, em nome da Al Qaeda, reivindicavam a autoria das explosões e o clima de alarme não tinha ressonância na vida comum dos londrinos. Em muitos casos, o mais dramático eram apenas as leves alterações de rotina: trocar de estação de trem e metrô, já que muitas delas estavam fechadas; alterar percursos e prosseguir, como se nada estivesse acontecendo no coração da capital. Um veterano jornalista inglês, que havia se dedicado ao mais puro jornalismo marrom algumas décadas antes, explicou- me, resignado: “O que podemos fazer? Eles – disse, referindo-se 10 • ZIGUEZAGUEANDO PELO ISLÃ
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