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Arte e Cultura PDF

278 Pages·2013·1.26 MB·Portuguese
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[Dados sobre esta edição: Ed. eletrônica baseada na 1ª ed. impressa - Texto integral. Sem imagens.] Clement Greenberg ARTE E CULTURA Ensaios críticos Tradução de Otacílio Nunes AS DUAS VIDAS DE CLEMENT GREENBERG Rodrigo Naves C lement Greenberg (1909-94) é o mais importante crítico de arte norte- americano do século XX. Provavelmente não só dos Estados Unidos. No entanto Arte e cultura foi a única coletânea de ensaios que organizou pessoalmente.[1] Sua trajetória se confunde com a do surgimento da primeira grande geração de artistas americanos – Pollock, De Kooning, Rothko, Hofmann, Gorky, Gottlieb, Kline, Barnett Newman, Clyfford Still, Motherwell, David Smith, e outros –, um movimento que se convencionou chamar expressionismo abstrato, nome que Greenberg empregava a contragosto em geral entre aspas. Sua formação sofreu os percalços de um meio artístico ainda um tanto incipiente e suas idas e vindas de certo modo refletem as dificuldades de alguém que lidava com um ofício vago, sem lugar e continuidade definidos. Filho de imigrantes judeus poloneses (mas vindos de um meio cultural lituano), socialistas, Greenberg nasceu no Bronx, em Nova York. Frequentou a escola pública da cidade, teve uma infância de classe média, estudou desenho na Art Students League, diplomou-se em Letras pela Universidade de Syracuse e por dois anos cruzou os Estados Unidos, trabalhando na empresa atacadista do pai. Foi tradutor, funcionário federal de 1936 a 1942 – a maior parte do tempo na alfândega do porto de Nova York –, passou quase um ano na Aeronáutica e por treze anos foi editor da revista Commentary.[2] Se essa vida atabalhoada forçou Greenberg ao autodidatismo, por certo também contribuiu para uma relação mais verdadeira com a arte, já que seu envolvimento com a produção moderna não derivava de obrigação profissional ou acadêmica, e sim de uma real afinidade. (E não custa sugerir que essa posição social e profissional dúbia não apenas deve ter ajudado a torná-lo mais sensível às indagações modernas como também pode ter contribuído para a formação de uma personalidade mais apta ao juízo crítico, à procura de avaliações que prescindem de normas fixas.) Greenberg publicou seus primeiros textos na Partisan Review, uma revista de esquerda que à época se afastava das posições sectárias do Partido Comunista, e de 1944 a 1949 foi o crítico de arte de The Nation, publicação também de esquerda. Seria descuido deixar de observar um nexo forte entre o seu tipo de envolvimento com a arte e suas posições políticas, então na esfera do trotskismo.[3] Poucos críticos acertaram tanto quanto Greenberg. Em 1945, por ocasião da segunda individual de Jackson Pollock – então com apenas 33 anos –, ele o declara “o mais forte pintor de sua geração e talvez o maior a aparecer desde Miró”.[4] Hoje alguém discorda? E se Pollock foi seu artista predileto – a quem no entanto não deixava de fazer reparos –, quase todos os mais importantes artistas do período foram analisados e reconhecidos por ele em cima do lance, de Gorky a David Smith, de De Kooning (a quem posteriormente criticará enfaticamente) a Barnett Newman. Só quem conviveu com um meio de arte precário e indolente – o nosso, por exemplo – pode ter a exata dimensão da importância de uma figura como Greenberg. Pois não se tratava apenas de ter o olho afiado e saber converter adequadamente suas avaliações em argumento. Era preciso ter a coragem de emitir seus juízos com franqueza, e isso num ambiente em que as relações pessoais tinham ainda o seu peso. Os textos de Greenberg – em geral curtos e diretos – evitam qualquer torneio verbal e fogem de metáforas e descrições poéticas até onde é possível. Seu tom categórico e assertivo pode causar estranheza pelo excesso de confiança. Mas talvez fosse a forma realmente mais efetiva de ajudar a ordenar um meio ainda pouco criterioso. “Miró é o único pintor a surgir desde 1925 […] cuja arte ampliou os limites da pintura ocidental […]”;[5] a ordem cubista “é a única ordem possível à pintura ambiciosa de nosso tempo”;[6] “a longo prazo há apenas dois tipos de arte: a boa e a má”[7] – e assim vai, numa cadência sempre marcada por opiniões fortes. O tom seguríssimo tem algo de arrogância. Mas não parece que fosse esse o sentido de raciocínios tão peremptórios. Ao menos não foram essas as suas consequências. Tratava-se antes de apresentar como valor e qualidade uma atividade que não pode prescindir deles e que ainda não alcançara nos Estados Unidos um estatuto adequado. Nesses nossos dias de pouca escolha, em que qualquer opinião mais forte parece resvalar para o autoritarismo, sem dúvida os textos de Greenberg soam por demais severos. E não por acaso seus inimigos mais renhidos são pós-modernos e multiculturalistas dos mais diversos matizes. Mas foi com atitudes como as suas – ancoradas, obviamente, numa expressiva produção artística – que a arte americana pôde chegar aonde chegou. O crítico via com clareza a necessidade de formar um verdadeiro meio cultural no campo das artes plásticas norte-americanas, e procurava a seu modo colaborar para isso: “A arte de um país não pode viver e se perpetuar exclusivamente com sentimentos espasmódicos, espíritos elevados e o infinito refinamento da sensibilidade”.[8] Muito poucos levantam objeções mais sérias em torno das escolhas do crítico Clement Greenberg, sobretudo aquelas escolhas que fez até a década de 60. Seria realmente difícil. Com uma ou outra exceção, seus julgamentos recaíram sobre os melhores trabalhos de sua época. No entanto, a rejeição ao Greenberg teórico (se é que ele existe) é hoje quase uma unanimidade. Greenberg não chegou a formular uma teoria propriamente original da arte moderna. Seus textos mais abrangentes[9] de certa maneira sintetizam e sistematizam formulações que já se encontravam em vários outros autores, em geral artistas.[10] Para ele, a arte – mas sobretudo a pintura – moderna se caracteriza por uma atitude reflexiva e autocrítica que tende a afastar de seu âmbito tudo aquilo que não lhe diga respeito exclusivamente. “As limitações que constituem o meio da pintura – a superfície plana, a forma do suporte, as propriedades do pigmento – eram tratadas pelos Grandes Mestres como fatores negativos, que podiam ser reconhecidos apenas implícita ou indiretamente. Sob o modernismo essas mesmas limitações vieram a ser vistas como fatores positivos e foram reconhecidas abertamente. As telas de Manet tornaram-se as primeiras pinturas modernistas em virtude da franqueza com a qual elas declaravam as superfícies planas sob as quais eram pintadas.”[11] Para Greenberg, a pintura moderna abandona progressivamente a tentativa de representar ilusionisticamente um espaço tridimensional sobre um suporte plano, e passa a tirar consequências estéticas de suas reais particularidades. Nesse movimento, haveria ainda uma tendência inelutável em direção à arte abstrata, já que toda referência às formas da realidade restabeleceria, ao menos em parte, a ilusão de volume e profundidade. É em torno dessas questões que giram as críticas a Greenberg. Seu sistema seria não apenas estreito e unívoco como também incapaz de incorporar trabalhos de arte que lidavam com outras interrogações. E, de fato, Greenberg praticamente irá desconsiderar movimentos como a pop e o minimalismo. No entanto, me parece que a tática de dividir sua atividade – o crítico e o teórico – perde de vista um elemento central. Embora realmente esse esquema teórico apareça como uma recorrência meio maçante nas análises de Greenberg, também é verdade que ele dificilmente – ao menos até a década de 60 – se mostrou como empecilho para uma recepção generosa das novas produções.[12] Afinal, o que havia na aparência (sobretudo na aparência de então, sem a distância histórica) da pintura de Pollock que poderia evocar a decidida dinâmica do plano pictórico de Greenberg, em seu permanente movimento em direção a uma afirmação de sua própria superficialidade? O próprio crítico, em uma de suas primeiras análises de Pollock, em abril de 1946, não falaria de “sua habilidade para criar uma arte genuinamente violenta [meu grifo] e extravagante, sem perder o controle estilístico”?[13] Parece então que até um certo ponto o horizonte teórico de Greenberg soube incorporar decididamente o caráter reflexivo e não determinado do juízo estético, tal como formulado por Kant na Crítica do juízo, não por acaso uma das principais influências confessas de Greenberg.[14] E convém lembrar que boa parte das formulações teóricas de Greenberg foram publicadas antes do surgimento do expressionismo abstrato, em textos como “Vanguarda e Kitsch” (1939) – incluído no presente volume, p. 27 – e “Towards a Newer Laocoon” (1940). De fato, a “linha” que conduz de Manet a Miró – passando por Matisse e, sobretudo, pelo cubismo de Picasso e Braque – sofre uma (como sempre) inesperada inflexão nas obras dos expressionistas abstratos norte-americanos, alcançando uma presença física e uma intensidade sensível poucas vezes vistas anteriormente. Greenberg soube como ninguém avaliar e analisar sua importância e novidade. Em seus artigos não faltam nem mesmo elogios inesperados a artistas que evidentemente iam numa direção que ele não privilegiava. Mas estão lá palavras entusiasmadas e esclarecedoras sobre Hopper, John Marin e mesmo sobre fotógrafos como Eugène Atget e Cartier-Bresson (embora considerasse que para a fotografia o tema, algo que o exasperava, fosse fundamental). E por mais que considerasse o cubismo de Picasso e Braque o horizonte insuperável da evolução artística moderna, julgava Matisse um pintor mais completo que ambos e “o maior pintor vivo”.[15] Outras vezes, porém, o peso dos pressupostos prevalece, e fica difícil concordar com sua desqualificação das figuras dilaceradas de Giacometti, apenas porque Greenberg não vê sentido em manter o volume na escultura moderna (ainda que ponha Brancusi nas alturas, como aquele que justamente levara a tradição do volume escultórico a seus limites). Bem como seus ataques a Harold Rosenberg – o outro mais importante crítico do período, que também o fustigava – em nada ampliam o entendimento de suas propostas e concepções. O ressentimento em relação a Greenberg, salvo engano, vem sobretudo das posições que passa a assumir na década de 60. Por essa época a pop e o minimalismo adquirem força e influência crescentes. E Greenberg decididamente não os assimila a seu cânone. Para ele – muito sob a influência do pensamento de Heinrich Wölfflin, a quem deve bastante teoricamente – a dinâmica da arte supunha um certo encadeamento: “Nada poderia estar mais longe da autêntica arte de nosso tempo que a ideia de ruptura de continuidade. Arte é – entre outras coisas – continuidade, e é impensável sem ela”.[16] Mesmo os momentos de aparente ruptura supõem um solo e uma cultura comuns e a afirmação de uma tradição: “Com o passar do tempo essa feiura [das telas de Pollock] se transformará num novo padrão de beleza”.[17] Mas tanto a pop quanto o minimalismo introduziam questões difíceis de serem digeridas pela concepção de Greenberg. A pop incorpora – ironicamente ou não – os modos mais correntes de produção e difusão de imagens, deixando claro que já não haveria a possibilidade de uma experiência autêntica da realidade e que portanto os dias da pintura estariam contados. Mas nessa marcha ela se aproxima excessivamente das aparências do cotidiano e resvala no que, para Greenberg, seria o pior dos riscos: o kitsch. Para ele, “Grant Wood [um dos principais expoentes do realismo regionalista norte-americano e autor do famoso Gótico americano, quadro que retrata um casal de camponeses idosos e austeros diante de sua casa] era melhor que todos os artistas pop, com a exceção do protopop Jasper Johns […]”.[18] O crítico e filósofo Arthur C. Danto relata uma palestra de Greenberg em que afirmava que estávamos em um período pop e que, se essa voga não terminasse logo, não nos livraríamos da decadência.[19] Algo parecido ocorreria com o minimalismo, um movimento que no entanto Greenberg olhava com um pouco mais de respeito. Para o crítico, o espírito do minimalismo “é bastante semelhante ao da pop. Ele exige pouco do olhar”.[20] Em função disso, “o minimalismo permanece excessivamente um ato de ideação, e não suficientemente mais do que isso. Sua ideia permanece uma ideia, algo deduzido, em vez de sentido ou descoberto”.[21] Como se pode observar, para Greenberg a arte continua a valer como força visual, e não é por outra razão que obras como a de Duchamp pouco lhe interessaram. Se de fato a visualidade é posta à margem nessas duas tendências, restaria a Greenberg tentar encontrar o elo perdido da continuidade artística em outro lugar. A pop era “vulgar em termos de ‘pura’ pintura”,[22] o que supõe que esse suporte continuava a oferecer outras possibilidades e direções. Mas a essa altura o expressionismo abstrato se academicizara, tornando-se um maneirismo nas mãos dos milhares de adeptos tardios. Desde o começo da década de 50 Greenberg estreitou seus contatos com alguns artistas de Washington – Morris Louis e Kenneth Nolland – ou aproximando-os de Hellen Frankenthaler, já com um trabalho mais amadurecido. Também Jules Olitski se aproxima do grupo. Mas Greenberg não abandona suas manias e procura filiações para esses novos trabalhos. Dessa vez será principalmente Barnett Newman quem servirá de precursor a obras que rompiam com o aspecto pictórico – no sentido de Wölfflin – do expressionismo abstrato. A partir de 1958, Greenberg procura dar face pública à nova tendência, organizando exposições e produzindo textos. Em 1964, escreve “Post Painterly Abstraction”, uma espécie de plataforma do novo movimento, apontando a “abertura [openness] e clareza” de obras como as de Nolland, Louis, Olitski e Frankenthaler, diferentes do aspecto pictórico e cerrado da corrente que apoiara anteriormente.[23] Mas um grande crítico só alcança sua melhor forma na companhia de grandes obras. Os novos eleitos de Greenberg tinham sua força – é inegável. Nem de longe porém se igualavam à grandeza dos trabalhos produzidos pelos expressionistas abstratos. Mais do que isso: tanto pessoalmente[24] quanto artisticamente eles não saberiam se opor à argúcia e autoconfiança de um crítico do porte de Greenberg. Sem a resistência de grandes trabalhos de arte que tensionassem seu esquema teórico, Greenberg sofre sua maior derrota justamente no momento em que se impõe com mais força. Muito já se falou do formalismo de Clement Greenberg. E de fato em suas análises ele privilegia sobretudo o esclarecimento da estrutura das obras, além de

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Publicado originalmente em 1961, Arte e cultura é a única coletânea de ensaios organizada por seu autor, Clement Greenberg, mais importante e influente crítico de arte norte-americano do século XX. Grande defensor do expressionismo abstrato e de seu principal expoente, Jackson Pollock, Greenber
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