UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE SOCIOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA Amélia Siegel Corrêa ALFREDO ANDERSEN (1860-1935): RETRATOS E PAISAGENS DE UM NORUEGUÊS CABOCLO Volume I SÃO PAULO 2011 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE SOCIOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA Amélia Siegel Corrêa ALFREDO ANDERSEN (1860-1935): RETRATOS E PAISAGENS DE UM NORUEGUÊS CABOCLO Volume I VERSÃO CORRIGIDA Tese apresentada ao programa de Pós- Graduação em Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, para a obtenção do título de Doutor em Sociologia. Orientador: Prof. Dr. Leopoldo Waizbort SÃO PAULO 2011 AGRADECIMENTOS Sempre gostei de ler agradecimentos, por achar que eles trazem muito do processo do trabalho, de toda rede de apoio indispensável para sua realização, mas principalmente daquele que o faz, o pesquisador de carne e osso. Assim, antes de mais nada, agradeço à Fapesp pela bolsa concedida, que foi fundamental para a dedicação que o trabalho requereu e aos pareceristas que leram e contribuíram para o desenvolvimento da tese. Sou grata ao meu orientador Leopoldo Waizbort que sempre me deu liberdade para definir os rumos deste trabalho, ao mesmo tempo em que soube me colocar as implicações e consequências das decisões que tomei. Agradeço a orientação e a generosa dose de paciência e compreensão que teve nos momentos difíceis que enfrentei durante o percurso do doutorado. Agradeço à Ângela e ao Vicente, por serem gentis e prestativos nas questões burocraticas da pós-graduação. Devo agradecimentos especiais ao Professor Sérgio Miceli, que para a minha sorte acompanhou o trabalho desde o início, quando era apenas um projeto, passando pela leitura crítica da qualificação, e que apontou caminhos importantes que busquei seguir. À Professora Cláudia Valadão sou grata pela leitura cuidadosa que fez do trabalho na qualificação, pelos questionamentos pertinentes que me colocou e pelas dicas e sugestões. À Professora Lilia Schwarcz, pelo que aprendi no seu curso sobre a leitura de imagens, mas também pela sua gentileza singular nas conversas e dicas. A reserva técnica da Fapesp tornou possível uma estada de três meses na Noruega e na Dinamarca que foi fundamental para o trabalho. Ter participado do curso sobre arte norueguesa na International Summer School da Universidade de Oslo, ministrado pelos professores Clarence Sheffield e Mark Mansfield, me proporcionou um mergulho na cultura escandinava, pela qual me apaixonei. Agradeço também aos funcionários da Biblioteca da Galeria Nacional de Oslo, pela gentileza e prestatividade, e especialmente à Tove Dahl Johansen, da Biblioteca Nacional, que se mostrou uma entusiasta desta pesquisa, me auxiliou na busca de fontes, e, para completar, fez inúmeras traduções. Ainda na Noruega, fui muito bem acolhida em Kristiansand pela Ragnhild e o Einar Jensen, que me levaram para conhecer os lugares importantes, os quadros que se encontravam nos acervos da família, leram cartas, contaram histórias. Da mesma forma a Gunvor Satra foi especialmente gentil em me abrir os porões da sua casa, onde encontramos algumas raridades. O Professor Gunvald Opstad foi extremamente generoso ao me abrir o seu arquivo pessoal e de sobra me ensinou muito sobre a história da cidade. Ao Roger Tronstad do Arquivo Municipal de Kristiansand pelo auxílio em busca de fontes. Espero que um dia eles possam conhecer esta tese. Sou imensamente grata ao Prof. Carlo Ginzburg que com muita gentileza me recebeu no meu estágio na Scuola Normale Superiore di Pisa, e que me proporcionou uma experiência acadêmica inesquecível de seguir um curso seu. A Ângela e o Ricardo Marcelo Fonseca tem parcela de culpa nessa história, e a eles e aos pequenos também devo agradecimentos especiais. Agradeço também à Capes pela concessão da bolsa de estudos no exterior. Várias foram as instituições que tornaram possível o levantamento de dados necessários para esta tese, e aos seus funcionários sou muito grata: da Biblioteca Pública do Paraná, em especial aos da Seção de Documentação Paranaense, do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, do Arquivo Público do Paraná, da Biblioteca do Museu Paranaense, do Círculo de Estudos Bandeirantes, da Biblioteca Nacional, da Biblioteca do Masp e, obviamente, da Biblioteca do Museu Alfredo Andersen. Sou grata a toda a equipe do Museu Alfredo Andersen, que recentemente se tornaram colegas: Cleuzeli, Denise, Gil, Ilza, Janine, Lucas, Maximone, Marta, Ronald, Rosângela, Soraia, Tita e Viviane. À Dr.a Edna Fujika, ao Dr. Carlos Rocha e à Valéria Lima, que me ajudaram a manter a sanidade mental. À Leocádia e à Fátima, pelo carinho que tem pela nossa família e por manter a casa em pé. Sempre eficiente e prestativa, a Solange Rocha me ajudou a encontrar inúmeras peças desse grande quebra cabeças, além de ter sido fundamental para o fechamento da tese. À Antônia Schwiden, Ivonete Santos e Léia Rachel Castellar, pela competente revisão, editoração das imagens e do texto. Ao amigo Laércio Lopes, que com a sua alma nobre e generosa contribuiu muito para a viabilização desta pesquisa, e também à querida Laura. Ao Dr. Wilson Andersen Ballão, que foi sempre um entusiasta deste trabalho e com quem tive longas conversas sobre o Alfredo. Aos meus amigos da pós-graduação Alexandro Paixão, Anderson Trevisan, Célia Arribas, Dmitri Fernandes, Fábio Keinert, Juliana Neves, Lilian Sampaio, Sérgio Franco e Tamara Grigorowitschs. À Aninha Trovão, Lennita Ruggi e Miriam Adelman que, para além de companheiras de profissão, são grandes amigas. Ao Zé Szwako, que foi um divertido companheiro de angústias doutorais. Às queridas amigas Elisa, Isabela Ribas, Isabela Sela, Ju Evans, Ju Pereira, Lu Carone, Teka e ao amigo Pedro Jr. A Flávia Rossi é uma das pessoas mais generosas que tive o prazer de conhecer. Ela me acolheu como uma irmã nas minhas estadas em São Paulo, e fez com que todo este percurso fosse mais leve e prazeroso. Lá pelas tantas um argentino tomou conta do pedaço, e tudo ficou ainda mais divertido, e por isso sou grata também ao Patrício Tierno. A toda a família Correa Marques, em especial ao Tio Arnaldo, Tia Aracy e Suely, que sempre me receberam como muito carinho. À Tia Male e à Tia Lenita, e à toda família Corrêa. À minha irmã Isabela pelo apoio e pela solidariedade e à minha mãe Teresinha, pelo seu coração maior que o mundo, pelas risadas e por estar sempre ao meu lado. Devo muito do meu caminho acadêmico ao incentivo do J. Pedro, meu pai, que sempre acreditou nas minhas escolhas e mas mais que isso, foi um modelo de inteligência, perspicácia e simplicidade. O Luís Fernando foi muito mais do que um companheiro amoroso com quem divido a vida, me deu um suporte fundamental para realizar esta pesquisa e foi o principal interlocutor e incentivador deste trabalho. No meio disso tudo a família aumentou com a chegada do Francisco, e depois dele a vida nunca mais foi a mesma: as olheiras se tornaram frequentes, mas sorrimos e cantamos como nunca antes. Aos três eu dedico este trabalho. Um homem se propõe a tarefa de desenhar o mundo. Ao longo dos anos, povoa um espaço com imagens de províncias, reinos, de montanhas, de baías, de naus, de ilhas, de peixes, de moradas, de instrumentos, de astros, de cavalos e de pessoas. Pouco antes de morrer, descobre que este paciente labirinto de linhas traça a imagem de seu rosto. Jorge Luís Borges RESUMO Esta tese investiga a trajetória e a produção artística do artista norueguês radicado no Paraná, Alfredo Andersen (1860-1935) a partir de uma perspectiva histórico- sociológica. Nascido em Kristiansand, no sul da Noruega, o pintor teve sua formação artística realizada em ateliês particulares em seu país e na Academia de Belas Artes de Copenhagen, na Dinamarca, então locais periféricos em se tratando de Europa. A análise da sua fase norueguesa auxilia na compreensão da construção de seu esquema, em particular pela presença em sua juventude do movimento nacionalista, que trouxe para o artista, de um lado, uma visão do nacional ligada ao folk e, de outro, uma forma de ver a paisagem como um elemento identitário. A tese busca reinterpretar também sua vinda para o Brasil e sua fixação em Paranaguá, comparando as condições e alternativas que se apresentavam ao artista na Europa e as oportunidades que pode ter vislumbrado no Brasil. Rapidamente acolhido pelo meio local, Andersen desenvolve uma obra vasta e é considerado pai da pintura paranaense, mito que este estudo buscou desconstruir com o apoio de uma sociologia das biografias do pintor, que trouxe à tona os principais interessados em alçá-lo a essa condição. A tese analisou os principais gêneros praticados por Andersen dentro do contexto em que foram produzidos, buscando compreender seus significados sociais, e cada um trouxe elementos do intrincado quebra-cabeças que caracterizava a sua trajetória, repleta de tensões e ambiguidades. Com a análise da retratística foi possível compreender a função que sua arte teve para as elites locais, que se aburguesavam e buscavam distinção, e um gosto local bastante conservador. Já sua obra paisagística, que o levou a ser considerado pela historiografia como um regionalista, se mostrou um terreno fértil para perceber sua relação ambivalente com o paranismo, e a construção de uma alternativa mais autoral que desenvolveu nas marinhas. Com sua experiência social marcada pela condição de estrangeiro e pelo casamento nativo, as cenas de gênero se mostraram documentos ricos para a apreensão da sua posição na cena local e configuram uma faceta pouco valorizada e talvez a mais rica do pintor. Palavras-chave: Alfredo Andersen. Trajetória. Sociologia da arte. Pintura regionalista. identidade. ABSTRACT This thesis investigates the trajectory and the artistic production of the Norwegian painter settled in the state of Paraná, Alfredo Andersen (1860-1935) through a historical- sociological perspective. Born in Kristiansand, Norway, the artists had his artistic training held in private studios and at the Academy of Fine Arts of Copenhagen, Denmark, then peripheral when it comes to Europe. The analysis of his norwegian phase search to comprehend the construction of his schema, and also his involvement with the nationalistic movement, which brought the artist, on the one hand, a vision of the national folk and on the other, a way of seeing landscape as an element of identity. The thesis also seeks to review his migration to Brazil and his settling in Paranaguá, by comparing the conditions and alternatives that were presented to him in Europe and the opportunities that he might have seen in Brazil. His plastic services quickly found a market, and by the importance of his work he is considered the father of Paraná’s painting, a myth that this study sought to deconstruct through a sociology of his biographies, that brought up the main interests behind that canonization. Also, this study analyzed the main genres painted by Andersen inside the context of their production, seeking to understand their social meanings, and each one brought elements of the intricate puzzle that characterized his trajectory, full of tensions and ambiguities, specially concerning his relation with the local elites. By analyzing portraiture, it was possible to understand the role that his art had to the rising bourgeoisie, that sought distinction, and had a conservative taste. Meanwhile, his landscapes, which led to him being considered by the historiography as a regionalist, has proved a fertile ground to see his ambivalent relationship with paranismo, and the construction of an alternative solution within his marines. With his social experience marked by the condition of beeing a foreigner and by the marriage with a native, the genre scenes were rich documents to the apprehension of his position in the local field and are perhaps the richest of the painter. Key words: Alfredo Andersen. Trajectory. Sociology of art. Regionalist painting. Identity. LISTA DE FOTOS Foto 1 - Risoleta Machado Lima "Senhorita Curityba" em visita ao ateliê de Alfredo Andersen................................................................................. 32 Foto 2 - Alfredo Andersen com irmãs e amigos................................................ 35 Foto 3 - Da direita para a esquerda: Andersen, Johansen, e Isaachsen, no ateliê do último.................................................................................... 59 Foto 4 - Andersen e amigos em Kristiansand. c. 1890..................................... 74 Foto 5 - Porto de Cabedelo, Paraíba. 1892...................................................... 81 Foto 6 - Andersen no Porto de Cabedelo.1892................................................ 82 Foto 7 - Andersen em seu ateliê. c. 1910......................................................... 90 Foto 8 - Piquenique na Serra - Andersen, engenheiros e suas famílias........... 105 Foto 9 - Andersen, engenheiros e suas famílias na Serra do Mar.................... 106 Foto 10 - Interior da residência da família Lange................................................ 111 Foto 11 - Procissão de Nossa Senhora do Rocio, Paranaguá, c. 1895.............. 170 Foto 12 - 1.a Exposição Estadual de Pintura em 1919 ....................................... 209 Foto 13 - 1.a Exposição Estadual de Pintura da Associação Comercial do Paraná, 1919....................................................................................... 210 Foto 14 - Maria Amélia e Jan Woiski em prática de representação de modelo vivo no ateliê de Alfredo Andersen na Rua Marechal Deodoro na década de 1910............................................................... 216 Foto 15 - Andersen e Ana................................................................................... 222 Foto 16 - Andersen em frente a Escola Alemã, Curitiba, década de 1910......... 243 SUMÁRIO INTRODUÇÃO..................................................................................................... 11 CAPÍTULO 1 - RETRATOS (DE) NORUEGUESES............................................ 32 1.1 PINTOR EM FORMAÇÃO........................................................................... 45 1.2 TRADIÇÃO E VANGUARDA NA ARTE NORUEGUESA ............................ 51 1.3 RETRATO DE HAMSUN QUANDO JOVEM............................................... 53 CAPÍTULO 2 - PAISAGEM E CULTURA NA TERRA DOS FIORDES............... 61 2.1 O ROMANTISMO NACIONAL..................................................................... 61 2.2 NACIONALISMO E POLÍTICA: A BUSCA DE UM CAMINHO PRÓPRIO... 67 2.3 PAISAGEM E CULTURA............................................................................. 70 2.3.1 O homem nacional: cultura popular e raízes camponesas........................ 72 2.3.2 Paisagens (quase) urbanas....................................................................... 74 2.3.3 "Toda arte nacional é ruim, toda boa arte é nacional"............................... 75 2.4 PINTOR A BORDO: EM BUSCA DE AVENTURAS E OUTRAS PAISAGENS................................................................................................ 78 CAPÍTULO 3 - RETRATOS (DE) PARANAENSES............................................ 86 3.1 FOTOGRAFIA, UMA ALIADA...................................................................... 87 3.2 AO GOSTO DO FREGUÊS, OU COMO SER CIVILIZADO EM PARANAGUÁ.............................................................................................. 91 3.3 NOS TRILHOS DA MODERNIDADE: DA SOCIABILIDADE COM OS ENGENHEIROS ESTRANGEIROS............................................................. 105 3.4 POLÍTICOS E LITERATOS, TROCAS E FAVORES................................... 113 3.4.1 Imagens da elite ervateira.......................................................................... 114 3.4.2 Vicente Machado e a consolidação política dos conservadores................ 117 3.4.3 Romário Martins, Affonso Camargo e a gestão política paranista............. 121 3.4.4 Festa inquieta............................................................................................ 124 CAPÍTULO 4 - RETRATOS DA TERRA, PAISAGENS DO MAR....................... 140 4.1 PINTURA DE PAISAGEM NO BRASIL: DA ACADEMIA IMPERIAL DE BELAS ARTES AO GRUPO GRIMM........................................................... 141 4.2 PAISAGEM, REGIONALISMOS E IDENTIDADE........................................ 146 4.2.1 Pinheiro, metáfora do homem.................................................................... 155 4.2.3 A Serra do Mar e a estrada de ferro.......................................................... 158
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