ebook img

A vida de laboratório : a produção dos fatos científicos PDF

155 Pages·1997·6.874 MB·Portuguese
Save to my drive
Quick download
Download
Most books are stored in the elastic cloud where traffic is expensive. For this reason, we have a limit on daily download.

Preview A vida de laboratório : a produção dos fatos científicos

--_._~ A VIDA DE LASORATORIO A produy1io dos fatos cientificos BRUNO LATOUR STEVE WOOLGAR ESTE LlVRO, PUBLlCADO NO AMBITO DO PROGRAMA DE PARTICIPAC;AO A PUBLlCA<;AO, CONTOU COM 0 APOIO DO A MINISTERIO FRANCES DAS RELACOES EXTERIORES, DA REL UME DUMARA EMBAIXADA DA FRAN<;::A NO BRASIL E DA MAISON DE f FRANCE DO RIO DE JANEIRO Rio de 1aneiro © 1979- SagePublications,Inc. © 1986- PrincetonUniversityPress © 1997- Copyrightdatraduyoocomos a direitoscedidosparaestaediyllo !t DUMARA DISTRIBUIDORA DE PUBLlCA<;:OES LTDA. RuaBarataRibeiro, 17/Sala202 .... .....::-::::::--- 22011-000- RiodeJaneiro,RJ UFRGS. Tel.: (021)542-0248- Fax: (021)275-02 Biblioteca Setorlal ,de Bibliote,onom1a ! e Comun,cacai) N°CHAMADA: 60 ~' Tradur;tio 1 :' AngelaRamalhoVianna I ' 02,." l-' . -J .../', _ Revistio N°D8RA: AoInstituto Salkeespecialmente aoprofessor ArgemirodeFigueiredo I ,/1-123'1 RogerGuillemin cujo desinteresse tornou Capa :N° OtUI."U: possivelestapesquisa. GustavoMeyer , ;(Jj(J'Sf, Desenhode: M.C. Escher .iATA_: _ Editorar;tio /13 12 O:':"::U_--1 DilmoMilheiros .,'.); _. 3061-.1.0..---' ....., CIP-Brasil. Catalogayoo-na-fonte. SindicatoNacional dosEditoresdeLivros,RJ. Latour,Bruno L383v Avidadelaborat6rio:aproduyllodosfatoscientlficosIBrunoLatour, SteveWooigar;[traduyiloAngelaRamalhoVianna].- RiodeJaneiro:Relume Dumara, 1997 Traduyllode: Laviedelaboratoire Incluibibliografia ISBN 85-7316-123-X I.Ciencia-Filosofia.I.Wooigar,Steve.11.Titulo.1Il.Titulo:Aprodu yiladosfatoscientlficos. CDD501 97-0910 CDU50:1 Todososdireitosreservados.Areproduyllonllo~autorizadadestapublicayllo,por qualquermeio,sejaelatotalouparcial,constituiviolayilodaLei n°5.988. , SUMARIO Advertenciados editores brasileiros Capitulo I Embora este livro tenha side originalmente escrito em ingles, a AETNOGRAFIA DAS CIENCIAS 9 presente tradUy30 foi feita - com a concordancia dos autores e da PrincetonUniversityPress, editoraoriginal-apartirdaedi~ao france Capitulo2 sa. A0P9aOjustifica-seporqueurndosautores, BrunoLatour,acornpa VISITADE UM ANTROPOLOGOAO LABORATORIO 35 nhou a. tradw;:ao para sua lingua materna, 0 frances introduzindo ao ' mesma tempo TIatas de rodape e refen3ncias bibliognificas adicionais. o Capitulo 3 prirneiro capitulo foi reescrito, adaptado para urn publico rnais arn ACONSTRU<;AO DEUM FATO: 0 CASODOTRF(H) 101 pIo. Forarntarnbernsuprirnidos0prefacioe0posfaciodaedi9aonorte americana, porque, segundo Latour, eram de "polleD interesse e esta Capitulo4 yam distanciados das controversiasangio-saxOnicas". MICRO-SOCIOLOGIADOS FATOS 159 Capitulo5 ACREDIBILIDADECIENTiFICA 205 Capitulo 6 AORDEM CRlADAAPARTIRDA DESORDEM 265 BIBLIOGRAFIA 299 CAPITULO A ETNOGRAFIA DAS CIENCIAS TRECHO DE UM DIARIODECAMPO' 9.05: Wylieatravessaasalaeentranaescrit6ria.Dizalgumacaisa apressadamente. Falaquefezumagrandebabagem. Mandauaartiga... (a restanaa se campreende). 9.05.3: Barbaraentra. Pergunta aJean que tipa de salvente deve usar nas calonias. Jean respande de dentra da escrit6ria. Barbara vai embara, voltaparasuabancada. 9.05.4: Jane entra e pergunta a Marvin: "Quanda vace prepara a intravenosacommartina, asolw;ao esalinaous6com agua?" Marvin, a que escreve sentado mesa, responde semlevantaracabe9a. Jane saL 9.06.15: Guilleminentranasalaediumaespiadanasescrit6rias, esfar,anda-se parajuntargente a bastante para fazer uma reuniaa de e E trabalha: "Esse urnneg6cia de4 mil d6lares. precisa resalve-Ia na maximo nos pr6ximosminutes." Elesome. 9.06.20: Nick entra pela parta da se,aa de quimica. Entrega urn frasca a Marvin: "Aqui estaa seus 200 microgramas. Naa esque,a de anotar0 numero de c6digono livro."Nicksai. . Todas as referencias aconversas e observar.;:Oes sao feitas pelo numero do diario, seguido do numerodapaginados dados doetn6grafo, Bruno Latour, durante os dais anosdetrabalhode campo, 1975-1977. As demaisreferencias, com nome de autare data,estaonabibliografia. , ' 10 A ETNOGRAFIADASCIENCIAS A ETNOGRAFIADASCIENCIAS 1J Silencio.Asaladereunioesestavazia.Mergulhadosnapenumbra, TRECHOSDE UM COMENTARlO alguns pesquisadores escrevem, sentados as suas mesas. Atraves das Tododiaeassim. astrabalhadores entramno laboratorio, trazen vidra~as vemos os outros, que trabalham no laboratoria, em esparyos profusamente iluminados. donamaosacolasdepapelpardocom0 almo,o. astecnicoscome~am imediatamente aprepararosbiotestes, limpam as mesas de dissecayao 9.09: Larry entra mastigando uma ma,§. Lan,a uma olhadela ao ou pesam produtos quimicos. Recolhem as pilginas de dados que saem ultimo numero de Nature. dos contadores e das calculadoras que ficaram funcionando durante a 9.09.1: Catherine entra, senta-se il grande mesa, desenrola folhas noite. As seeretariassentam-se em suas maquinas de escrevereeome decomputadorecome,aapreencherumafolhadepapelquadriculado. yam acorrigir os manuseritos, eternamente atrasados. Os pesquisado Marvin sai do escrit6rio, alhaporsabre 0 ombro."Humm, pareceque res chegam urnpoueomais tarde, urndepoisdooutro, trocandobreves vai indobern." 9.10: Umasecretilriasurgepelaportadeentrada, vaiaoescritorio comentirios sobre 0 que deve ser feito naquele dia. Depois de alguns instantes,vaoparasuasbancadas.Outrosempregadosdepositamcarre de Wylie, trazendo urn artigo recem-datilografado. Discutem durante urntempo arespeito dos compromissos daagenda. "E paraterya-feira, gamentos de animais, produtos quimicos e pilhas de correspondencia. ultima chance", dizela. Dir-se-iaque0 trabalhodetodoseleseguiadoporurncampo invisivel, Ou que eles formam urn quebra-cabe,a quase terminado e que talvez 9.10.2: Bern atnls dela entra Rose, a assistente encarregada das chegue ase completaraindahoje. Tanto os edificios emqueessas pes encomendas. Ela diz a Wylie que 0 aparelho que ele quer comprarvai soas trabalham quanta as carreiras que seguem estao salvaguardados custar300dolares. Conversam no escritorio de John. Risos. Ela sai. a silencio volta. pelo lnstitutoSalk. a dinheiro do contribuintenorte-americano che"oa, todomes,viaNationalInstituteofHealthouNationalScienceFoundation. 9.12: Wyliecome,aagritar,dedentrodoescritorio:"Ei,Marvin, voceconheceurngrupo que achaque ascelulas cancerosas secretam As vezes hacoletas privadas, organizadas paragarantir0 trabalho dos pesquisadores. As futuras conferenc;ias eexposiyoes saoansiosamente somatostatina?" Marvin responde aos gritos, sem sair do lugar: "Li alga a esse respeito nos resumos da conferencia de Asilomar; foi aguardadasportodos. Acadadezminutos0 telefonetoea,ampliadoem apresentado como urn fato comprovado." Wylie: "E 0 que eram es todo 0 laboratoriopeloalto-falantedas secretirias: eurncolega, 0 res ponsilvel por urn jomal, urn funcionilrio. No laboratorio hil urn tluxo sesdados?" Marvin:"'Nemseimais, eles observaram urn crescimen continuodebrincadeiras,deargumentosedeconselhos:"'Porque voce to de [palavradesconhecida] econcluiramque isso eraporcausada nao tenta fazer isso?" Os grandes quadros-negros estao cheios de ins somatostatina. Nao lemhro mais setestaram diretamenteaatividade criyoes. Os computadores cospem listagens sem parar. Sobre as escri biologica. Talvez. Nao sei." Wylie: "Por que voce nilo tenta na se vaninhas, acumulam-se paginas de dados que, poucoapouco, cobrem gunda-feira, no proximo bioteste?" os artigos dos colegas, generosamente anotados. 9.13: Nick e Catherine entram na sala ruidosamente, terminando No final do dia, manuseritos, capias ealgumas amostras de subs umadiscussao. "Naoacredito ern uma palavradeste artigo", dizNick. tanciascarasembaladasemgelosecoforamremetidospelocorreia. Os "Nao",respondeCatherine,"estataomaleserito. Corncertezafoiredi tecnicos ja foram embora. A atmosfera fica mais relaxada. Corre-se gidoporurnmedico". LaoyamurnolharemdireyaoaMarvinecaemna menos. As brincadeirasentre ospesquisadoresaumentam, eles, com os gargalhada. [...] i, 12 A ETNOGRAFIADASCIENCIAS A ETNOGRAFIADASCIENCIAS 13 pes em cima da mesa, bebem uma enesima dose daquele horrivel cafe ou extracientificos. A "dimensao cognitiva" nao estaria, ai tambem, norte-americano, em copinhos de plastico. Hoje foram gastos alguns amplamente exagerada? E 0 que.dizer dos antropologos de gabinete milharesded6lares.Algunsdiapositivos,picosevales,comoideogramas quejamaisestiveram no campo? Agraciado com urna bolsa da Funda chineses, foram acrescentados ao botim do laborat6rio. Talvez tenha 9ao Fulbright, escolhi urn laboratorio da Califtlrnia, dirigido por urn side decifrado urn caractere minusculo do livro da natureza. Algumas pesquisadorde origem francesa, da Borgonhacomo eu. 0 lahoratorio, . intui90esfortaleceram-se. Algunsenunciadostiveramsuacredibilidade ricoecelebre,fomeciaurnexcelentecontrastecomosfuncionarioscosta levemente aumentada ou diminuida, como os pontos do indice Dow martinenses queeu acabarade estudar. JonesnaBolsadeNovaYork. Talveztenhasidourndiaperdido. Talvez Chegueiao InstitutoSalle Vi apenascasamatasde concreto."Parece os animais tenham sidesacrificadosem vao, talvez se tenha desperdi queestarnosemurnfilmedefic~ao cientifica", diziamcomfreqih~ncia os 9adoradioatividade nasculturasde celulas. Mastalvez, pelocontrario, visitantes.Naesplanadademarmorevazia,desenbadapeloarquitetoKhan, algumas ideiasminusculas tenham se unido de fonnamais estreita. encontrei-mediantedeurnamisturadetemplogregoemaysoleu.Apresen Agora urn empregado filipino lava 0 chao e esvazia as latas de tadoaJonas Salk, vi-mediantedeurn sabio. Disseram-mequeparatodos lixo. Eurndiacomoosoutros. 0 laboratorio ticavazio. So permanece osnorte-americanosmediosestesabio,0 homemdavacinacontraapolio oobservador,que se interroga, com espanto, arespeito do que aconte mielite,0'apropriairnagemdosaber- comoPasteur,0homemdaraiva,na ceu diante de seus olhose pergunta-se comochegouate ali. Fran9a. DequemefalaJones?De Picassoedamulherdo Minotauroque eleatualrnenteabrigaemseulabirinto. Saiodoescritorio. Diantedafalesia, urncruzadordeesquadradei TRECHO DE UMA APRESENTAC;AO DECAMPO xa a enseada de San Diego - primeira base naval militar do mundo _ Fil6sofo, ao prestarmeu servi~o nacional em regime de coopera para acertar'os I'onteiros pelos marcos eletranices de La Jolla, diante 9ao,tiveasortedeencontrarosantropologosdoORSTOMnaCostado doInstituto.}:asfunduras deurn doscanh5essubmarinosmaisprofun Martim. Comoeraformadopelometododeles,pediram-meparaexpli dos da costa oeste, os homens-ras do Instituto Oceanogratico Scripps carporqueassociedadesfrancesastinbamtantaditiculdadeemencon testam os instrumentos de suas pr6ximas buscas. No ceu, destaca-se trar profissionais costa-marfinenses competentes para substituir as umanuvemdehomensvoadoresmulticoloridos,saidos diretamentede expatriados(Latour, 1973).Variasrespostas"cognitivas"ofereciam-se urn desenbo de Da Vinci. Suas asas-delta, vindas diretamente do pro pararesponderaessaquestao.Falavam-medamentalidadeafricana,da grama espacial, ticam imoveis gra9aS.a forte corrente de ar que sobe alma negra ede psicologia. A pesquisa entretanto levava-me adesco perpendicularment, a Black Beach, unica praia nudista deste pais tao brir, sem a menor diticuldade, dezenas de fatores sociais bern explici hipocrita. Proxim~ ao riacho que corre ao longo da esplanadade mar tos. A dimensao cognitivatinha ombros largos. Ao ler a literatura dos more, Francis Crick, 0 homem do codigo genetico, e Leslie Orgel, 0 antropologos e ao falar com eles, percebi seu cientiticismo. Eles estu homem das origens, conversam animados. Alguem cochicha no meu davam outras culturas e outras praticas com urn respeito meticuloso. ouvido: "Elessao Ger:os." mas com urnlunda de ciencia. Perguntei-me entao 0 que dizer do dis Guiam-me ate o· SIbsolo. Por tras das divisorias de vidro, posso curso cientifico seele fosse estudadocom0 cuidado queos etn6grafos ler,em letrasdouradas, ~aboratoriesforNeuroendocrinology. Eaique tern quandoestudamas culturas, as sociedadeseosdiscursospre, para you passar dois anos. Este 0' 0 meu campo. Apresentam-me a Wylie 14 A ETNOGRAFIADASCIENCIAS A ETNOGRAFIADASCIENCIAS 15 Vale. urn sulista, aestrela ascendente do grupo, comentam. Depois. a arno. Quando ele entrou,todos sentiramas pernastremerem. Pareciam urnpequenohornemruivo,redondocomourn anaodaBrancadeNeve, doentes. Eutambem. Todomundo suou. Eutambem.Nao,eunaotinha RogerBurgus, urndosquimicos dogrupo. Dizemqueestenotavelqui lidoaquele livro,nao, eunao entendiaessapalavra. Haviammisturado mico e um has been que quer abandonar a quimica para predicar em duas letras; uma amostra nilo tinha chegado; os ratos tinham 0 pelo uma escola fundamentalista. Depois apresentam-me a uma suiya, bayo; ocorrera uma contaminayao: Fulano nao 0 havia citado; as mar Catherine Rivier, depois aNickLing, umquimico chines. Outro sui~o. gensdeeITOhaviamsidecalculadasaspressas;faltavaumaliimpadana Jean Rivier, recebe-me de bra90S abertos e, em seguida, me introduz sala de fisiologia... Cada urn ouvia a serie de catastrafes, todas elas aos livras de contabilidade do grupo: cillculos de credito, quem deve irremedhiveis.Maisinformadosdoqueeu,elescalculavammentalmente e e quantaaquem;quem 0 melhor; quem 0 maiscitado: quemrouballa suas taxas de adrenalina e a baixado acido asc6rbico pravocadas pela ideiadequem; quanta custaraaproximaexperh~ncia.Achei queestava tensao. Era neles, e nao nos ratos, que se faziam experiencias sobre na Bolsa. harmonios. Ja tomado pelo delirio de persegui~ilodo grupo, disse a Um israelense, Larry Lazarus, puxou-me de lade e falou sobre mim mesmo: "Somoscobaias." cita~oes, sobre seu capital de credito, que nilo Ihe rendia muito; ele Fizeram-mepercorrer0 laborat6rio. Adireita, nafisiologia, s6 ha estavamal,achavaque0 crectitodequedispunhaimpedia-odeconcluir mulheres de jaleco branco, e elas nilo param de trabalhar. S6 ha um osartigos. Queriairembora. Urnjovemmexicanonaofalou deeredito, homem na fisiologia, urn negro colossal, com argolas nas orelhas. Eo mas depurificay5es. Emboraeutivesserecebidoumasevera educa9ao criadore matador de ratos brancos. Hamilhares de ralaS, ratos puros, E religiosa, naocompreendiaaindaporqueademoradeumapurificayao segundomedizem, incestuososhadezenasdegerayoes. naguilhotina podiasermotivedetristeza.Viurnalemao,duasvezesdoutor,dequem que rolam suas cabeyas. Maos habeis quebram cranios, extirpam 0 ce naogostei logo decara. Urngarotaoentrounasala. EraMarvin Brown, rebro, separamcuidadosamenteaship6fises, quesaodepositadassobre urn medico. A conversa generalizou-se. Falou-se de investimentos, de urn leito de gelD seco. 0 resto dos corpos eposto em sacolas de pape lucros, de espa~os,de bolsas, de subven~oes, de vantagens comparati Hio, que 0 grande zeIadorde animais ira incinerarem seguida. Em ou vas. Percebi que estava lidando comjovens executivos dinfunicos. Fa tros lugaresnao sematam ratos. Umatorturacontroladaos interroga e lou-sedeestrategia, deformas deauxilio, depontosde passagemobri obriga a confessar. EIes dormern em gaiolas: vftimas de incisoes, gat6rios, de investir em lugares, de ordenar ideias, de arruinar reputa excisoes, injeyoes, manipulados, disciplinados, vigiados, controlados. o ~oes,deIiquidaradversarios,deguerrilhas.AcheiquetinhaateITissado vermelho do sanguee0 branco da pelesao igualmentecegantessob nomeiodeumareuniaodeEstado-maior. Falou-sedecontrole,devigi aJuzcruadosprojetores. Eunaosabiamaisseesserealeraracionalese lancia, deteste, de contamina~ao,detrai~ao,de inteligenciatomrela essas hecatomhes tinham COmo objetivo atingir 0 melhor dos mundos ~iloao inimigo. Achei queestavatratandocomalgumdispositivo poli cientificos possiveis. Nietzsche havia me ensinado a perguntar: quem cia!. Falaramdeviradasradicais,derevblu~oes,detransforrha~oesrapi falara da crueldade de um homem que nilo quer ser enganado? Quem das, deminasedeexplosao.Acheiqueestavaemmeioaconspiradores. falara dacrueldadede um homem que nilo quer se enganar? De subito, eles se transformaram em vitimas. S6falavam de al Dafisiologia, fui levado aquimica. "Saocozinheiros, enao ayou guem que os haviaroubado, que hav·ia desviado seus recursos, que os gueiros e carrascos", disse amim mesmo. Naverdade, s6 se falava de expropriara, que osexplorava. Todosi;-a~dvamde urn unico, ausente, 0 pureza. Vma ascese que eujarnais ate entao vira era exercida sobre a I 16 A ETNOGRAFIADASCIENCIAS I A ETNOGRAFIADASelENe/As 17 bilionesima parte de grama de extrato de cerebro. Qualquer hip6fise finlandes queachavaquefalava ingles. 0 professorGuilleminpermitiu que penetrassenesse local deveriapassarporumaseqUenciadeprovas muito generosamente que eu assistisse atadas as reuni5es, que lesse mais longas que qualquer ritual iniciat6rio narrado por urn etn6grafo. • toda acorrespondencia, qualquer rascunho, echegou mesmo a deixar Somente as fra95es maispuras resistiam. Moidas, liofilizadas, extrai que eu trabalhasse dejalecobranco, como urn auxiliar de laborat6rio. das do acetato, filtradas no gel leitoso das colonias Sephadex, nova Ao final dealguns meses, este etn610go frances, mal balbuciando0in mente liofilizadas, fracionadas, mais urnavez filtradas, depois disper gU~s e ignorante em materia de ciencia, tamara-se invisivel. Quando sadas em papeis absorventes finos, empurradasporbombas, esquarte havia alguma visita no laborat6rio, indieavam meu escrit6rio: "Aqui jadas entre potentes campos magneticos, bombardeadas por espectr6 est.nossocromat6grafodealtapressao, aqui, nossofil6sofo residente metros, as moleculas, arrancadas de qualqueroutra rela9ao, nao podi la, nossoespectr6metrodemassa."Foienta~ quecomeceiaestudarseria~ am sermaispuras doque isso. Incapazesdeseocultarpormais tempo, mente aquele mundo estranho. Amaneirados antrop610gos, meusances alijazem, invisiveis,emfrascosdeplasticocuidadosamenteetiquetados. trais, naome furtei adarurnpoueo de ordem eeompreensaoadesordem Mas,peloquepudecompreender,haviaumamoleculaqueos qui heterogeneaeconfusade urn laborat6rio de biologia. Ap6s dois anos de micosaindanaohaviamobtido. Elanuncaestavasuficientementepura. presen9aininterruptanoCora9aodestelaborat6rio, uni-me,nahoraderedi Amedidaquemencionavamapureza,aexcita9aoaumentava. Osasce I gir,aSteveWoolgar,soci61ogoinglesqueeoncluiaumatesesobreadeseo tastornavam-se ca9adores. Falava-seaotelefone, de T6quioaOxford. bertadospulsar(Woolgar,1978)equeseapaixonarapelaetnometodologia, Os colegas, muito distantes, maldiziam certo laborat6rio, 0 unico que asslmcomopeloproblemadareflexividade (Woolgar, 1976a,b). Decidi pudera acuar a besta, puro licorne da ascese. Cristalizada, a molecula mosredigiremconjuntoestaprimeiraetnografiadeurnlaborat6rio. aguardava. Extraida do cerebro onde reagia com milhares de compa nheiras, abandonada pelas proteinas que a protegiame que nao pude RAZAODE SER DAETNOGRAFIADE UM LABORATORIO ramresistiratripsina,elanaopodiaatuarcomosempreatuara, dissimu Para nossagrande surpresa, esta era de fato aprimeira. Cente lar-se em milhOes de artefatos, misturar-se ao ruido de fundo, deslizar J nas de etn61ogos visitaram todas as tribos imagimiveis, penetraram comolimaenguiadeurnpesomolecularaDutro. Seunomejacorrianas bocasdoshomensdebranco,atrasdaestreitaparede deplasticoquimi N: ~~ ~oi camenteinerte.Compreendiqueseconseguissempurifica-laaindamais, I epoca queestelivro escrito,ignonivamosqueMikeLynch,emLosAngeles, aalouns,QUllometrosdo InstltutoSalk, tambem acabavadeentrarem um laborat6rio, iriamtomarchampanhe, cadaqual escreveriadezenas deartigos evol d~ :Ob aeglde Garfinkel (1985), 0 que prova que nas ciencias inexatas tambem ha de~cobertas taria os olhos parauma constru9ao sueca chamada Karolinska. Como slmultaneas".KarinKnorr-Cetina(1981)publicoumaistardeurnestudo metlcu!ososobre umoutro lab~rat6rio, tamberndebiologia, eaindatrabalha, naAle- me haviamdito, eu iriapresenciardescobertas cientificas. manha,emumestudocomparatlvodostreslaborat6rios.Outroscamposparciaisforam Emurnbreve paperanunciei-Ihescorajosamenteque,voltandoda est~d.ados: Parau~levantamentomaisatual,verWooigar(1982)eKnorr-Cetina(1983). I o,~nICO ~m Africa, eu iriaagoraestuda-Ioscomose eles fossem urnatriboex6tica. 1I,;roescntopor antrop610goprofissional,SharonTraweek,sobre atisica ~ampo ~e (0 eoaceleradorImear Standford).ParticlePhysicsCulture:BuyingTImeand Comel;aram arir, sem acreditar muito no que Quviam. Eutrazia como TakmgSpace,estaparaserpubllcadonaHarvard UniversityPress(vertambemTraw k N~ pioneiro:~~ lmicabagagem0livrodeMarcAuge(1975),edecidiconstruirredesde 1980, 1981); Franya,GerardLemaineeBernard-PierreLecuyerforamos estud~dosClentlStasnotrabalho(LemaineetaI., 1969,1972,1982).Maistarde,0grupode prova semelhantes as redes de acusa9ao de bruxaria que ele tao bern ~Iguns Lemameesboyou estudosdecampo,massoburnangulomaisepisternol6gico do construira.Deram-meurnescrit6rio,queeudividiacomurnencantador queetnografico(GerardDannon,naneurofisiologia,DominiqueLestel,naetologia). 18 AETNOGRAFIADASCIENCIAS A ETNOGRAFIADASCIENCIAS 19 fiorestas profundas, repertoriaram os costumes mais ex6ticos, foto Aliteraturasobreacienciaegigantesca. Mas,talcomoateologia grafaram e documentaram as rela,5es familiares ou os cultos mais ouaapologetica,nocasodareligiao, elasup5equeseconsidereacien complexos. E, no entanto, nossa industria, nossa tecnica, nossa ci ciacomofato adquirido. Foradessaliteraturapia- daqual umagranct"e encia, nossa administral(ao permanecem bern pOlleo estudadas. Ex partese parece mais com0Manual do inquisidor-, contam-se nos de pulsos do campo na Africa, na America Latina ou na Asia, os dos de umadas maos alguns livros excelentes de mem6rias e de anali etn61ogos 56 se sentem capazes de estudar, em nossas sociedades, 0 ses, escritospelospr6prioscientistas,.comoosdeWatson (1968)ou de que e mais parecido com os campos que acabavam de deixar: as Fleck (1979). P6r mais estimulantes que sejam essas obras, elas nao artes e tradi,5es populares, a bruxaria, as representa,5es simb6li podemremediara ausenciade pesquisa, de observa,ao direta, de co;J cas, os camponeses, os marginais de todos os tipos, os guetos. E: tradi~ao. ~s Imaginem que aciencia economica pudesse ser reduzida com temor e escrupulo que avan9am em nossas cidades. Chegando lembran,as, pormaisapaixonantesquefossem, deMarcelDassault,ou aocerne delas,estudamasociabilidadedoshabitantes, masnao ana deJean Riboud? Que a cienciapoliticapudesseserensinadanas esco lisam as coisas feitas pelos urbanistas, pelos engenheiros do metro las a partir das Mem6rias do general De Gaulle ou do Memorial de ou pela camara municipal; quando penetram de salto alto em uma SantaHelena?Asitua,aonaomelhoranemurnpoucoquandoseacres fabrica, estudam os openirios, que ainda se parecem urn pOlleD corn centa,aliteraturapiaeasmem6rias, aquiloquepoderiamoschamarde os pobres ex6ticos e mudos que os etn6logos tern 0 habito de sufo literatura"licenciosa", em que os cie'ntistas, humanos, muito humana carsob seuscomentarios, mas nao as engenheiroseos patr5es. Tern mente sao"desnudados", exibidos em seu lodo e ao avesso, sejapelos urn pOlleo mais de coragem quando se trata da medicina, reputada colegas, seja porjomalistas. Essa literatura diverte os pesquisadores, como uma ciencia "mole". Mesmo oeste caso, cantudo, eles estu aomesmotempoqueosaborrece,masnaodestr6ia literaturapia, com as dam de preferencia a etnomedicina ou as medicinas paralelas. a qual forma par. Uma dessas obras, no entanto, merece ser lida ao medicos propriamenteditos,asmedicinas centraisnao saoobjeto de mesmotempoque0presentetrabalho.NicholasWade(1981)publicou qualquerestudometiculoso.Nemfalemos dabiologia, dafisica, das urn relato detalhado da competi,ao entre Roger Guillemin e Andrew matematicas. Cienciadaperiferia, aantropologianaosabe voltar-se Schallypelo premioNobel. Pode-se lerproveitosamenteesse panfieto para 0 centro.2 casose queiraacrescentaraorelatequese segueos"pequenosfatos"e Asitua,ao,comosempre,emaisgraveaindaquandosetratadecien os"aspectospsicol6gicos"dos grandes cientistas.3 ciasexatas.Ao levantarnossabibliografia,percebemosquenaohaviaurn e Paradar independenciaas analises da ciencia, necessario, pois, unicolivro,nemmesmournUnicoartigoquedescrevesseapraticacientffi nao se basearunicamenteno que os pesquisadores edescobridores di cadeprimeiramilo, independentementedoqueospr6prioscientistaspu zem de si mesmos. mes devem tomar-se 0 que os antrop610gos cha dessemdizer, equefossesimetriCoemsuasexplicaryoes, redefinindotam mamde"informantes",certamenteinformantesprivilegiados,massem- bern as noryoes vagas das ciencias humanas. Passemos em revista esses diversoslimitesqueprocuramosultrapassarnopresentetrabalho. JSeraprecisodizerque0 leitorilaovaiencontrarnestelivronemdesmistificayao,nem, denunciade umacienciacujoideal estaria pervertidopelohomem, oudesviado peJa 2Entreosantrop6logos,provavelmentefoiRobertHortonquemprimeiroreconheceu0 industria,-pelo dinheiro e pelo seculo? Os que denunciam a ciencia ou querem problema,eissodeformamaisclara,maiscorajosa(1967; 1982).Vertambemacritica desmistifica-Iaaindasaocientistas- reformadoresoumissionarios,talvez,mas,ain queGoody(1979)fezde0 pensamentoselvagem,deLevi-Strauss. daassim,cientistasatearaizdoscabelos. l 20 A ETNOGRAFIADASCIENCIAS A ETNOGRAFIADASCIENCIAS 21 preinformantesdequemseduvida. Foinessalinhaque, com0 nomede quandosetratadeCopernicooudeNewton.Adistanciatemporalsubs sociologiaoudepsico-sociologi_adaciencia~ desenvolveu-seuma titeratu titui adistanciaespacialdoantrop610go. Parecemenos absurdo ligara facadavezmais irnportante sabreas instituivoes cientificas; so~re acoo fisicadeIKe,plerao seu seculodoqueadeEinsteinou Feynman. Mas a correnciaentrepesquisadores(LemaineeMatalon,1969;Bow-dieu, 1976), hist6ria da Ciencia ainda emuito timida, sobretudo na Franya, e, na sobreaevolu,aodasdisciplinas(LemaineetaI., 1976),ousobresuapsico maiorpartedas vezes, ela nao passa de Litna roupagem dahist6ria das logia(Mitroff, 1974).Aimportanciadessestrabalhosparaacompreensao ideias, qui,ada epistemologia. da institui,ao cientifica nao precisaser demonstrada. E, no entanto, eles No entanto, nos ultimos 20 anos, ahist6ria social da ciencia foi mantem intacto0 quebra-cabe,aantropologicoquequeremosresolver.Na totalmenterenovadapelos ingleses, que abandonaramos seculos XVII verdade, essa literaturachegaaserurn impasse com rela,ao ao conteudo e XIX parase implantarem com bravurano seculo XX, pondo rapida cientifico, OU, 0 que dano mesmo, ela isola a"dirnensao cognitiva" dos mente emOperayaOas conjunyoescom as sociologias,como e0 exem "fatores sociais" que acircundam. Dais Iivros servelll...para ilustrar essa plo de Bloor (1982), Collins (1982) ou Pinch (1982). Eevidente que questao. Edge e Mulkay (1976; Mulkay e Edge, 1982) escreveram uma nos apoiamos nessa literatura (CalIon e Latour, 1982, 1985). Collins excelenteobrasabre0 desenvolvimentodaradioastronomia. Nela, apren indicaacaminho: cumpreestudaracienciaatua1,aqueestasendofeita, de-se muito sabre a radioastronomia e algumas caisas sabre as em meio atodaacontroversia, de modo asair definitivamente do con radioastronomos.Aparentemente,entao,0temacentral-istoe,aprodu,ao forto intelectual dos historiadores que estao sempre chegando atrasa socialdoobjetocientifico- foisemduvidaabordado.Emnenhummomen dos. Em lugar de estudar as ciencias "sancionadas", cabe estudar as ta, no entanto, efetua-se auniaoentre esses dais conjuntos -0 conteudo cienciasabertas e incertas. cientificoe0contextosocial.0 misteriopermaneceirresolvido.Ecomose Adespeito dos progressos consideraveisque esses estudos repre contextoeconteudofossemdoisliquidosquepodemosfingirmisturarpela sentanicomrelayaoaantigahist6riadasciencias,umaanaHseatentade agitayao, masquese sedimentamtao logo deixados emrepollso. E0 que seus resultados (Shapin, 1985)revelaque, embora agitados com aSlu demonstrarnLemaineetal. (1977)emestudosobre0 trabalhodeJouvet,0 cia, os dois liquidos continuam anao se misturar. As explicayoessoci grande fisiologista liones. As pesquisas sobre 0 sono, por urn lado, e a ais deCollinseseuscolegasaindaficammuito distantesdasuti! estru sociedade dos fisiologistas, por outro, encontram-sejustapostos em tran turacognitiva que elas revelam. Tudo em vao, as ondas gravitacionais qiiilacoexistencia, como aguaeazeite emrepouso. Como urn fisiologista excedem em muito as disputas de Weber~obre areplicayao de sua ex fazfisio10gia?Misterio.Umasocio10giadossaberessuperpoe-se,mistura periencia (Collins, 1982), assim como a bacteriologia nascente ultra seaumaepistemologia. passa de muito 0 meio social dePasteur e Pouchet, reconstituido por Ao ladedessas literaturas,existe, felizrriente, emcruzamento com Farlly eGeison (1982). Quandose observarn com ciJidado as analises ahist6ria social e asociologia, uma seriede trabalhosadminiveis, es de Shapin(1982) oudeMacKenzie(1985), distingue-sefacilmente urn sencialmente em lingua inglesa, que se esfor,am por tra,ar rela,ces, sanduiche: umadeliciosafatiadehistoriadas ideiasentreduasfatias de nosmaioresdetalhes, entrecontextoeconteudo.Ahist6riadascit~ncias paosociologico,as vezes urn pouco dormido. Isso porque os historia presta-semelhoraoestabelecimentodeurn la,oestreitoentre aprMica doress'~ciais, assim comoos soci610gosdascontroversias,prendern-se dospesquisadoreseosobjetosqueelesproduzem. Acoragemquefalta aos documento,s (arquivos, artigos, transcri,ces de entrevistas), e nao aos fil6sofos e historiadores para 0 estudo das ciencias atuais retorna va~:ditet~r,nente ao campo. Essaretirada estrategica impede-os de ver I

See more

The list of books you might like

Most books are stored in the elastic cloud where traffic is expensive. For this reason, we have a limit on daily download.